terça-feira, 5 de julho de 2011

Peru: Duas famílias disputam Machu Picchu


Já faz 100 anos que o explorador americano Hiram Bingham deu fama à cidadela inca de Machu Picchu, mas ainda resta uma questão pendente a ser resolvida sobre este sítio arqueológico: determinar quem é seu proprietário legal.

Duas famílias da cidade peruana de Cuzco, região onde fica a cidadela inca, estão imersas há vários anos em uma disputa judicial contra o Estado peruano para dirimir a situação legal do santuário e do terreno sobre o qual ele fica.

As famílias Zavaleta e Abrill dizem possuir documentos que as credenciam como proprietárias legítimas de Machu Picchu e que contradizem a postura do Estado peruano, quem se atribui a titularidade do complexo, com base na lei vigente.

Em entrevistas com a Agência Efe, Roxana Abrill e José Zavaleta disseram que seus ancestrais em questão, um político da época e um importante agricultor de Cuzco, jamais poderiam imaginar que um acordo privado derivaria em um "grande problema legal" quase interminável e com "pouca" vontade política para ser resolvido.

Foi em 1944 quando seus ascendentes repartiram o complexo arqueológico, apesar de existir uma lei que tornava o Estado peruano proprietário das ruínas arqueológicas. Um acabou ficando com as ruínas e o outro com o terreno.

A transferência surpreendentemente contou com o beneplácito de um notário. Hoje, o documento oficial é o melhor trunfo de defesa das famílias e a maior dor de cabeça do Estado peruano.

A indeterminação sobre a titularidade do terreno e das ruínas há décadas prejudica as famílias. Os Zavaleta, agricultores de pequena escala, são proibidos de circular maquinaria agrícola pelo terreno por se tratar de patrimônio protegido. "Somos proprietários sem parecer", lamenta José, porta-voz dos sete irmãos herdeiros, alguns já falecidos.

Entre 2000 e 2006, os dois grupos recorreram separadamente à Justiça para apresentar suas respectivas denúncias contra o Estado peruano e exigir, assim, uma desapropriação em condições. Também não faltou a exigência de uma generosa indenização de US$ 100 milhões no caso dos Abrill.

As novas gerações querem escavar - nas palavras dos Zavaleta - a "barbaridade" legal que o Estado nunca teve a vontade de solucionar e que se traduziu em uma confusão difícil de compreender.

Dizem também que, em caso de vitória no julgamento, se reconheceria a ajuda prestada por seus antecessores a todos os arqueólogos que um dia foram a Machu Picchu à procura do tesouro cultural inca.

As famílias estão cientes de que os casos se politizaram. Eles dizem que nem reuniões com instituições públicas nem cartas aos presidentes peruanos conseguiram até o momento escavar suas exigências.

Suas exigências são vistas por alguns como uma "loucura" - por desafiar o Estado - e também como uma disputa que busca lucros .

Por enquanto, isso está custando caro ao complexo arquitetônico, que faz parte de uma área natural protegida: sofre desamparo e frequentes invasões de habitantes que deterioram o ambiente.

José Zavaleta alerta que a cidadela inca se vê ameaçada por comunidades fora do controle estatal, que invadem a área natural e até incendeiam-na.

Para Abrill, a questão está clara: "o Estado não dá a importância necessária ao saneamento físico legal deste bem cultural", tombado pela Unesco como Patrimônio da Humanidade desde 1983.

As famílias lembram que outros países já resolveram casos idênticos a este. No México, com as ruínas de Chichen Itzá, "havia este tipo de problema, e o Estado finalmente reconheceu as propriedades de algumas comunidades e resolveu o assunto", explica José Zavaleta, que recorreu inclusive à Corte Interamericana de Direitos Humanos para a questão.

Esta joia cultural peruana celebra o centenário de seu "descobrimento para o Ocidente", com a única certeza de ter pertencido à vasta raiz inca, mas com a dúvida sobre se são todos os peruanos ou apenas alguns privilegiados os donos do local.

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