domingo, 7 de novembro de 2010

Intelectuais protestam contra racismo em Israel

BBC

Escritor Uri Avnery diz que nĂ£o quer ver 'ascensĂ£o do fascismo' em Israel

VĂ¡rios importantes intelectuais de Israel protestaram neste domingo em Tel Aviv contra manifestações crescentes de racismo que, dizem, afetam os cidadĂ£os Ă¡rabes do paĂ­s.

Os manifestantes, entre eles escritores e artistas de renome, cirticaram decretos recentes de rabinos proibindo o aluguel de apartamentos a cidadĂ£os Ă¡rabes e a promulgaĂ§Ă£o de leis de carĂ¡ter discriminatĂ³rio no Parlamento.

O protesto ocorreu na Alameda Rotschild, no centro de Tel Aviv, em frente ao prĂ©dio onde foi realizada a histĂ³rica declaraĂ§Ă£o da fundaĂ§Ă£o do Estado de Israel, em 1948, conhecida como DeclaraĂ§Ă£o da IndependĂªncia.

De acordo com os organizadores, o local foi escolhido para marcar o que consideram a contradiĂ§Ă£o entre a realidade atual no paĂ­s e o conteĂºdo da declaraĂ§Ă£o, que garantia "igualdade total de direitos polĂ­ticos e sociais para todos os cidadĂ£os, sem discriminaĂ§Ă£o de religiĂ£o, raça ou gĂªnero".

Participantes do protesto ouvidos pela BBC Brasil mencionaram o "perigo da ascensĂ£o do fascismo em Israel".

O jornalista e escritor Uri Avnery, 87, que lutou na guerra de 1948 pela criaĂ§Ă£o de Israel, disse Ă  BBC Brasil que participou do protesto "porque quando eu tinha nove anos vi a ascensĂ£o do fascismo na Alemanha e nĂ£o quero vĂª-la, pela segunda vez, no Estado que ajudei a construir".

De acordo com o escritor Sefi Rachlevsky, "a DeclaraĂ§Ă£o da Independencia estĂ¡ sendo pisada pelos atos e as leis que vemos hoje".

Sefi Rachlevsky diz que declaraĂ§Ă£o de independĂªncia foi 'pisada'

"Em um paĂ­s em que tantos cidadĂ£os jĂ¡ sofreram perseguições e racismo, nĂ£o podemos permitir que coisas como essas aconteçam."

Aluguéis vetados

No dia 25 de outubro, o rabino-chefe da cidade de Tzfat (norte de Israel), Shlomo Eliahu, e mais 17 rabinos publicaram um decreto proibindo os habitantes da cidade de alugarem apartamentos para cidadĂ£os Ă¡rabes.

O decreto atinge centenas de estudantes Ă¡rabes que cursam a Faculdade de Tzfat.

Segundo o decreto, os habitantes da cidade devem boicotar aqueles que alugarem propriedades a "nĂ£o judeus".

O presidente da uniĂ£o dos estudantes Ă¡rabes da Faculdade, Mahmoud Abu Salah, disse que a maioria dos proprietĂ¡rios de imĂ³veis estĂ¡ obedecendo ao decreto dos rabinos.

Abu Salah tambĂ©m afirmou que esta Ă© a primeira vez em que os estudantes Ă¡rabes se deparam com tal rejeiĂ§Ă£o por parte de proprietĂ¡rios de apartamentos em Tzfat.

O decreto foi endossada pelo rabino Ovadia Yossef, lider espiritual do partido Shas, que faz parte da coalizĂ£o governamental.

Para o escritor Yoram Kaniuk, "nĂ£o Ă© possivel parar o fascismo com palavras, sĂ£o necessĂ¡rios atos significativos".

Durante a manifestaĂ§Ă£o deste domingo, o escritor anunciou que pretende exigir que o MinistĂ©rio do Interior apague seu registro como judeu da carteira de identidade e o defina como "sem religiĂ£o".

'NĂ£o quero ser judeu'

"Se isso Ă© judaismo entĂ£o nĂ£o quero ser judeu", declarou Kaniuk.

O jurista Mordechai Kremnitzer mencionou projetos de lei em tramitaĂ§Ă£o no Parlamento que podem atingir diretamente a populaĂ§Ă£o Ă¡rabe de Israel. É o caso de uma lei que, se aprovada, permitirĂ¡ que comissões de admissĂ£o em povoados pequenos vetem a entrada de novos membros "que possam afetar o carĂ¡ter da comunidade".

Para a professora de HistĂ³ria da Arte Gila Balas, existem hoje em Israel "todos os sintomas que havia na Europa no começo do fascismo".

"NĂ£o podemos ficar quietos, temos que fazer algo para impedir que esse processo continue", disse Balas Ă  BBC Brasil. "EstĂ£o utilizando caminhos supostamente legais para promulgar leis antidemocrĂ¡ticas, justamente como aconteceu na Europa."

Sarkozy Ă© acusado de espionar jornalistas

AE

Um novo escĂ¢ndalo estĂ¡ batendo Ă s portas do presidente da França, Nicolas Sarkozy. Ele agora Ă© suspeito de espionar jornalistas, segundo acusaĂ§Ă£o do jornal Le Canard EnchainĂ©, que tem como base fontes do serviço secreto.

Segundo o diĂ¡rio, o presidente supervisionaria um gabinete do serviço de inteligĂªncia, que monitoraria contatos telefĂ´nicos de repĂ³rteres com suas fontes. Os jornalistas espionados estariam envolvidos em apurações sobre as suspeitas de corrupĂ§Ă£o e ilegalidades no governo.

O caso foi revelado nesta semana. Segundo a investigaĂ§Ă£o do jornal, um grupo de agentes da DivisĂ£o Central de InformaĂ§Ă£o Interior (DCRI) estaria rastreando as contas telefĂ´nicas de jornalistas para localizar suas fontes. O esquema contaria com a colaboraĂ§Ă£o das telefĂ´nicas.

"Assim que um jornalista começa uma investigaĂ§Ă£o embaraçosa para o presidente ou para seus prĂ³ximos, Sarkozy pede a Bernard Squarcini (diretor da DCRI) que descubra quem Ă© o ousado", disse anonimamente ao Canard EnchainĂ© um informante do serviço secreto.

Questionado no dia 29 sobre os crimes, Sarkozy afirmara: "NĂ£o vejo em que isso possa concernir o chefe de Estado." CoincidĂªncia ou nĂ£o, trĂªs jornalistas do jornal Le Monde, da revista Le Point e do site Mediapart que trabalhavam em investigações sobre o governo tiveram seus microcomputadores roubados nas Ăºltimas semanas.

Milton Nascimento - Travessia

Veja como defender seus direitos se foi prejudicado no Enem

AE

A OAB-Brasil recomenda que estudantes prejudicados no Enem procurem o MinistĂ©rio PĂºblico (MP). O conselho veio do prĂ³prio presidente do Ă³rgĂ£o, Ophir Cavalcante.

Para Cavalcante, nem mesmo a alegaĂ§Ă£o do Inep de que os estudantes teriam um ambiente virtual para reclamações Ă© suficiente para que o "direito dos inscritos seja preservado".

O advogado da Ă¡rea cĂ­vel ClĂ¡udio Castello de Campos Pereira tambĂ©m recomenda que os alunos lesados procurem o MP, a fim de conseguir uma aĂ§Ă£o coletiva contra o MinistĂ©rio da EducaĂ§Ă£o (MEC).

Pereira acredita que todo o aluno que se sentir prejudicado pode procurar a Justiça para reclamar seus direitos, em uma aĂ§Ă£o de indenizaĂ§Ă£o moral.

"O estudante pode pleitear uma indenizaĂ§Ă£o, pois teve prejuĂ­zo de ordem moral. O que ele tenha de prejuĂ­zo material comprovado tambĂ©m pode pleitear", explica o advogado.

Para a aĂ§Ă£o de indenizaĂ§Ă£o, basta que o estudante comprove ter feito a prova, levando Ă  Justiça o cartĂ£o de confirmaĂ§Ă£o e tambĂ©m o caderno de prova com erros, alĂ©m de documentos pessoais, como RG e CPF.

Pereira aconselha que o aluno procure o Juizado Especial Federal, em que o teto de indenizaĂ§Ă£o Ă© de atĂ© 20 salĂ¡rios mĂ­nimos. "NĂ£o precisa nem procurar um advogado", diz.

JĂ¡ se o aluno preferir contratar um advogado para obrigar o MEC a aplicar outra prova, tambĂ©m Ă© possĂ­vel. Mas o advogado acha mais interessante que os alunos formem grupos e procurem o MP Federal, em uma aĂ§Ă£o coletiva.

O estudante que teve prejuĂ­zo material deve provar que foi lesado. Por exemplo, se teve de gastar muito para se locomover para fazer a prova ou se tinha uma proposta de emprego engatilhada por conta do Enem.

"Os juĂ­zes podem levar em questĂ£o teoria americana do desestĂ­mulo. No caso, a puniĂ§Ă£o serve como exemplo para desestimular essa negligĂªncia, para que ela nĂ£o volte a ocorrer. Erros reiterados podem levar que juiz puna essa conduta negligente", diz Pereira.

MEC pode aplicar outro Enem para prejudicados por erro em prova


O MinistĂ©rio da EducaĂ§Ă£o (MEC) pode aplicar outro exame do Enem para candidatos prejudicados no sĂ¡bado pelo erro de montagem no caderno de prova amarelo. Essa Ă© uma das possibilidades contempladas na promessa do MEC de analisar "caso a caso" queixas de estudantes, mas sĂ³ serĂ¡ adotada em Ăºltima hipĂ³tese. O EstadĂ£o.edu apurou que, pelo balanço oficial, cerca de 20 mil alunos receberam cadernos com problemas, mas a maioria conseguiu trocĂ¡-los. Dessa forma, a estimativa Ă© de que o nĂºmero de candidatos com direito Ă  nova prova seja bem inferior, de aproximadamente 2 mil.

Como Ă© de praxe em vestibulares, os fiscais tĂªm um estoque de segurança para repor exames com problemas. No caso do Enem, essa margem era de 10%, do total de provas impressas. Havia ainda a possibilidade de recorrer aos cadernos dos alunos que deixaram de fazer o Enem no sĂ¡bado (cerca de 27% do total de 4,6 milhões de inscritos).

Apesar de o MEC considerar que a maioria dos alunos que receberam o caderno com erro de montagem foi alertada pelos fiscais e pĂ´de fazer a troca, o EstadĂ£o.edu identificou hoje na porta dos locais de exame pelo menos trĂªs vestibulandos (em Curitiba e Belo Horizonte) que disseram ter recebido um segundo caderno com problemas.

A confusĂ£o aconteceu porque, para evitar cola no local dos exames, o Enem tem quatro versões do caderno de prova: amarelo, azul, rosa e branco. As questões sĂ£o as mesmas, o que varia Ă© a ordem. Em milhares de casos, por um erro no encarte, folhas do caderno de prova amarelo estavam misturadas a folhas da prova branca. Com isso, estudantes se depararam com textos repetidos ou questões ausentes. Somando os dois fatores, vestibulandos como Henrique Reis, de Belo Horizonte, por exemplo, identificaram problemas em 31 das 90 questões do exame.

Estudantes que fizeram a prova no sĂ¡bado enfrentaram outro tipo de problema, a inversĂ£o do cabeçalho do cartĂ£o-resposta entregue a todos os candidatos. Embora o nĂºmero das 90 questões no caderno de prova e no cartĂ£o coincidissem, havia discrepĂ¢ncia no cabeçalho do gabarito. As 45 questões de CiĂªncias Humanas estavam sob a tarja CiĂªncias da Natureza e vice-versa.

O Inep afirmou que avisou fiscais para orientar os alunos. Mas a imprensa divulgou vĂ¡rios casos de estudantes que nĂ£o foram alertados sobre o erro ou entĂ£o sĂ³ receberam o aviso horas depois do inĂ­cio da prova. Muitos deles afirmaram que se confundiram ou nĂ£o tiveram tempo de fazer a marcaĂ§Ă£o correta. O MEC admitiu que vĂ¡rios estudantes podem ter sido prejudicados e prometeu abrir espaço no seu site para receber queixas de candidatos, que serĂ£o analisadas caso a caso.

Site para reclamações do Enem serĂ¡ aberto na quarta-feira. Requerimento com reclamações deverĂ¡ ser feito atĂ© 16 de novembro



Leandro Colon

O presidente do Inep, Joaquim JosĂ© Soares Neto, anunciou que o Ă³rgĂ£o vai disponibilizar a partir da prĂ³xima quarta-feira a pĂ¡gina online para os estudantes pedirem a correĂ§Ă£o invertida das provas do sĂ¡bado por causa da troca do cabeçalho do cartĂ£o-resposta. O prazo para o preenchimento do requerimento vai atĂ© o dia 16 de novembro, segundo ele.

Soares Neto afirmou que o Enem 2010 foi um "sucesso". "MissĂ£o cumprida", disse. Para ele, os episĂ³dios dos erros de impressĂ£o e montagem das provas e de impressĂ£o do cartĂ£o-resposta nĂ£o abalaram a credibilidade do exame.

Sobre a falha nas montagens da prova amarela, no sĂ¡bado, o presidente do Inep informou que o MinistĂ©rio da EducaĂ§Ă£o vai procurar os estudantes prejudicados para avaliar a possibilidade de realizar um novo exame para essas pessoas. Soares Neto negou falha na segurança do Enem 2010 e disse que ainda nĂ£o pode apontar culpados pelos erros cometidos no processo deste ano.

"NĂ£o vejo como isso possa minar o Enem", disse. "Me sinto muito orgulhoso em ter liderado esse processo. NĂ£o houve problemas graves", reforçou.

AtĂ© o inĂ­cio da noite, o Inep ainda nĂ£o tinha uma versĂ£o sobre as trocas dos cabeçalhos do cartĂ£o-resposta da prova de sĂ¡bado.

Indagado pelo Estado sobre a responsabilidade do Inep na fiscalizaĂ§Ă£o da impressĂ£o do material, mencionada no edital de contrataĂ§Ă£o da grĂ¡fica, Soares Neto esquivou-se. Disse que ainda estĂ¡ em fase de apuraĂ§Ă£o do que ocorreu. "NĂ£o posso trabalhar com hipĂ³teses".

Para o presidente do Inep, o uso de telefones celulares durante a aplicaĂ§Ă£o do Enem, confirmado por pessoas que fizeram a prova, nĂ£o mostra uma falta de segurança. "NĂ£o acho que houve falha", disse o presidente do Inep, justificando que nĂ£o cabe ao ministĂ©rio fazer a segurança dos locais de prova.

Em Ă©poca de crise na EducaĂ§Ă£o uma homenagem a AnĂ­sio Teixeira

"Numa democracia, nenhuma obra supera a de educaĂ§Ă£o. HaverĂ¡, talvez, outras aparentemente mais urgentes ou imediatas, mas estas mesmas pressupõem, se estivermos numa democracia, a educaĂ§Ă£o. Todas as demais funções do estado democrĂ¡tico pressupõem a educaĂ§Ă£o. Somente esta nĂ£o Ă© conseqĂ¼Ăªncia da democracia, mas a sua base, o seu fundamento, a condiĂ§Ă£o mesmo para a sua existĂªncia."

Quem foi AnĂ­sio Teixeira:

AnĂ­sio SpĂ­nola Teixeira (CaetitĂ©, 12 de julho de 1900 — Rio de Janeiro, 11 de março de 1971) foi um jurista, intelectual, educador e escritor brasileiro. Personagem central na histĂ³ria da educaĂ§Ă£o no Brasil, nas dĂ©cadas de 1920 e 1930, difundiu os pressupostos do movimento da Escola Nova, que tinha como princĂ­pio a Ăªnfase no desenvolvimento do intelecto e na capacidade de julgamento, em detrimento da memorizaĂ§Ă£o. Reformou o sistema educacional da Bahia e do Rio de Janeiro, exercendo vĂ¡rios cargos executivos. Foi um dos mais destacados signatĂ¡rios do Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, em defesa do ensino pĂºblico, gratuito, laico e obrigatĂ³rio, divulgado em 1932. Fundou a Universidade do Distrito Federal, em 1935, depois transformada em Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil.

A fim de melhor desempenhar esta funĂ§Ă£o viaja, em 1925, para a Europa, onde observa o sistema educacional de diversos paĂ­ses - implementando em seguida vĂ¡rias reformas no ensino do estado.

AnĂ­sio consegue ampliar o sistema educacional, privilegiando a formaĂ§Ă£o de professores. Em sua terra natal, CaetitĂ©, reinaugura a Escola Normal, fechada em 1901 por Severino Vieira.

Em 1927 vai aos Estados Unidos, onde trava conhecimento com as ideias do filĂ³sofo e pedagogo John Dewey, que muito vĂ£o influenciar seu pensamento. No ano seguinte demite-se do cargo pelo fato do novo governador nĂ£o concordar com suas ideias sobre mudanças no ensino.

Volta aos Estados Unidos (1928), onde faz pĂ³s-graduaĂ§Ă£o. De volta ao Brasil traduz, pela primeira vez em portuguĂªs, dois trabalhos de Dewey.

Muda-se para o Rio de Janeiro, ocupando a Diretoria da InstruĂ§Ă£o PĂºblica do Distrito Federal, em 1931, em cujo mandato institui a integraĂ§Ă£o da "Rede Municipal de EducaĂ§Ă£o", do fundamental Ă  universidade. Diversas melhorias e mudanças foram feitas, mas a que maior polĂªmica gerou foi a criaĂ§Ă£o da Universidade do Distrito Federal, em 1935.
Em 1932 participa do Manifesto dos Pioneiros da EducaĂ§Ă£o Nova, tendo publicado neste perĂ­odo duas obras sobre educaĂ§Ă£o que, junto a suas realizações, deram-lhe projeĂ§Ă£o nacional.

Durante a Ăºltima fase do Estado Novo, AnĂ­sio afasta-se da vida pĂºblica. Dedica-se, entĂ£o, Ă  mineraĂ§Ă£o - atividade de alguns parentes. Aproxima-se mais do amigo Monteiro Lobato e publica EducaĂ§Ă£o para a Democracia, alĂ©m de realizar diversas traduções.
Na dĂ©cada de 1940 foi Conselheiro da UNESCO (OrganizaĂ§Ă£o das Nações Unidas para a EducaĂ§Ă£o, a CiĂªncia e a Cultura).
Voltando o paĂ­s ao regime democrĂ¡tico, em 1946, AnĂ­sio Ă© convidado para ser o SecretĂ¡rio de EducaĂ§Ă£o e SaĂºde. Dentre outras realizações, constrĂ³i na Liberdade - o mais populoso e pobre bairro da capital baiana - o "Centro Educacional Carneiro Ribeiro", mais conhecido por Escola Parque, lugar para educaĂ§Ă£o em tempo integral e que serviria de modelo para os futuros CIACs e CIEPs.

Nos anos 50, dirigiu o Instituto Nacional de Estudos PedagĂ³gicos, ou INEP, Ă³rgĂ£o do Governo Federal, que desde o governo de Fernando Henrique Cardoso se chama Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais AnĂ­sio Teixeira. Foi tambĂ©m o criador e primeiro dirigente da Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de NĂ­vel Superior (atual CAPES), criada em 11 de julho de 1951, pelo Decreto nº 29.741, pelo presidente GetĂºlio Vargas, e que AnĂ­sio dirigiu atĂ© o golpe de 1964. A CAPES subordinava-se diretamente ao Presidente da RepĂºblica mas, depois de 1964, passou a integrar o organograma do MinistĂ©rio da EducaĂ§Ă£o. De todo modo, com a ditadura militar, AnĂ­sio deixou a sua direĂ§Ă£o.

Foi um dos idealizadores do projeto da Universidade de BrasĂ­lia (UnB), inaugurada em 1961, da qual veio a ser reitor em 1963, para ser afastado apĂ³s o golpe militar de 1964.

Diversas circunstĂ¢ncias obscuras cercam a morte de AnĂ­sio Teixeira. Dois meses antes da sua, ele escreveu: "Por mais que busquemos aceitar a morte, ela nos chega sempre como algo de imprevisto e terrĂ­vel, talvez devido seu carĂ¡ter definitivo: a vida Ă© permanente transiĂ§Ă£o, interrompida por estes sobressaltos bruscos de morte".

Por intercessĂ£o do amigo Hermes Lima, AnĂ­sio candidata-se a uma vaga da Academia. Inicia, assim, a sĂ©rie de visitas protocolares aos Imortais.

Depois da Ăºltima visita, ao lexicĂ³grafo AurĂ©lio Buarque de Holanda Ferreira, AnĂ­sio desaparece. Preocupada, sua famĂ­lia investiga o paradeiro, sendo informada pelos militares de que ele se encontrava detido.

Uma longa procura por informações tem inĂ­cio - repetindo um drama vivido por centenas de famĂ­lias brasileiras durante a ditadura militar. Mas, ao contrĂ¡rio das desencontradas informações e pistas falsas, seu corpo Ă© finalmente encontrado.

AnĂ­sio estava no fosso do elevador do prĂ©dio do imortal AurĂ©lio, na Praia de Botafogo, no Rio. Dois dias haviam se passado de seu desaparecimento. NĂ£o havia sinais de queda, nem hematomas que a comprovassem. A versĂ£o oficial foi de "acidente".

Calava-se, para um Brasil mergulhado em sombras, uma voz em defesa da educaĂ§Ă£o - portador da "subversiva" ideia de um paĂ­s melhor. Era o dia 14 de março de 1971.

Opiniões sobre o homem e a obra que realizou:

"... CidadĂ£o Ă­ntegro, puro, decente. AlĂ©m de inteligentĂ­ssimo, dono de cultura invulgar, mestre inconteste no que se refere Ă  educaĂ§Ă£o, AnĂ­sio Teixeira foi um brasileiro raro. TĂ£o extraordinĂ¡rio a ponto de ter sido alvo durante toda a vida de restrições, suspeitas, aleivosias, perseguições, misĂ©rias de todo o tipo com que os imundos o perseguiram - sobram imundos no Brasil. Tentaram de todas as maneiras impedir AnĂ­sio Teixeira de realizar sua missĂ£o civilizadora mas ele era irredutĂ­vel e invencĂ­vel. O que o Brasil de hoje possui de melhor e de maior deve-se em grande parte a este humanista baiano de grandeza universal. ..." Jorge Amado

"... AnĂ­sio Teixeira Ă© o pensador mais discutido, mais apoiado e mais combatido do Brasil. NinguĂ©m como ele provoca a admiraĂ§Ă£o de tantos. NinguĂ©m Ă© tambĂ©m tĂ£o negado e tem tantas vezes o seu pensamento deformado (...) Suas teses educacionais se identificam tanto com os interesses nacionais e com a luta pela democratizaĂ§Ă£o de nossa sociedade que dificilmente se admitiria pudessem provocar tamanha reaĂ§Ă£o num paĂ­s republicano." Darcy Ribeiro

"Suas obras e seus conceitos continuam sendo ricas fontes de conhecimento e de inspiraĂ§Ă£o para os que se preocupam com a educaĂ§Ă£o e com o futuro do nosso paĂ­s.
AnĂ­sio deixou como herança um acervo que tem sido objeto de pesquisas, monografias e teses. Seus textos sĂ£o revisitados com frequĂªncia como fonte primĂ¡ria para as investigações da histĂ³ria da educaĂ§Ă£o brasileira, por estudiosos de variadas Ă¡reas do conhecimento." Nilda Teves

Bibliografia:


-Aspectos americanos de educaĂ§Ă£o. Salvador. Tip. De SĂ£o Francisco, 1928, 166 p.

-A educaĂ§Ă£o e a crise brasileira. SĂ£o Paulo: Cia. Editora Nacional, 1956, 355 p.

-EducaĂ§Ă£o Ă© um direito. 2a. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1996, 221 p.

-EducaĂ§Ă£o e o mundo moderno. 2* ed. SĂ£o Paulo: Cia. Editora Nacional, 1977, 245 p.

-EducaĂ§Ă£o e universidade. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1998, 187 p.

-EducaĂ§Ă£o no Brasil. SĂ£o Paulo: Cia. Editora Nacional 1969, 385 p.

-EducaĂ§Ă£o nĂ£o Ă© privilĂ©gio. 5a. ed. Rio de Janeiro.- Editora UFRJ, 1994, 250 p.

-EducaĂ§Ă£o para a democracia: introduĂ§Ă£o Ă  administraĂ§Ă£o educacional. 2a. ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997, 263 p.

-EducaĂ§Ă£o progressiva: uma introduĂ§Ă£o Ă  filosofia da educaĂ§Ă£o. 2a. ed. SĂ£o Paulo: Cia. Editora Nacional, 1934, 210 p.

-Em marcha para a democracia: Ă  margem dos Estados Unidos. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, s.d., 195 p.

-Ensino superior no Brasil: anĂ¡lise e interpretaĂ§Ă£o de sua evoluĂ§Ă£o atĂ© 1969. Rio de Janeiro: Editora da FundaĂ§Ă£o GetĂºlio Vargas, 1989, 186 p.

-Pequena introduĂ§Ă£o Ă  filosofia da educaĂ§Ă£o: a escola progressiva ou a transformaĂ§Ă£o da escola. SĂ£o Paulo: Cia. Editora Nacional, 1968, 150 p.

TEIXEIRA, AnĂ­sio e ROCHA E SILVA, MaurĂ­cio. DiĂ¡logo sobre a lĂ³gica do conhecimento. SĂ£o Paulo: Edart Editora, 116 p.


O Manifesto dos Pioneiros da EducaĂ§Ă£o Nova - 1932:

A RECONSTRUĂ‡ĂƒO EDUCACIONAL NO BRASIL - AO POVO E AO GOVERNO

Na hierarquia dos problemas nacionais, nenhum sobreleva em importĂ¢ncia e gravidade ao da educaĂ§Ă£o. Nem mesmo os de carĂ¡ter econĂ´mico lhe podem disputar a primazia nos planos de reconstruĂ§Ă£o nacional. Pois, se a evoluĂ§Ă£o orgĂ¢nica do sistema cultural de um paĂ­s depende de suas condições econĂ´micas, Ă© impossĂ­vel desenvolver as forças econĂ´micas ou de produĂ§Ă£o, sem o preparo intensivo das forças culturais e o desenvolvimento das aptidões Ă  invenĂ§Ă£o e Ă  iniciativa que sĂ£o os fatores fundamentais do acrĂ©scimo de riqueza de uma sociedade. No entanto, se depois de 43 anos de regime republicano, se der um balanço ao estado atual da educaĂ§Ă£o pĂºblica, no Brasil, se verificarĂ¡ que, dissociadas sempre as reformas econĂ´micas e educacionais, que era indispensĂ¡vel entrelaçar e encadear, dirigindo-as no mesmo sentido, todos os nossos esforços, sem unidade de plano e sem espĂ­rito de continuidade, nĂ£o lograram ainda criar um sistema de organizaĂ§Ă£o escolar, Ă  altura das necessidades modernas e das necessidades do paĂ­s. Tudo fragmentĂ¡rio e desarticulado. A situaĂ§Ă£o atual, criada pela sucessĂ£o periĂ³dica de reformas parciais e freqĂ¼entemente arbitrĂ¡rias, lançadas sem solidez econĂ´mica e sem uma visĂ£o global do problema, em todos os seus aspectos, nos deixa antes a impressĂ£o desoladora de construções isoladas, algumas jĂ¡ em ruĂ­na, outras abandonadas em seus alicerces, e as melhores, ainda nĂ£o em termos de serem despojadas de seus andaimes...

Onde se tem de procurar a causa principal desse estado antes de inorganizaĂ§Ă£o do que de desorganizaĂ§Ă£o do aparelho escolar, Ă© na falta, em quase todos os planos e iniciativas, da determinaĂ§Ă£o dos fins de educaĂ§Ă£o (aspecto filosĂ³fico e social) e da aplicaĂ§Ă£o (aspecto tĂ©cnico) dos mĂ©todos cientĂ­ficos aos problemas de educaĂ§Ă£o. Ou, em poucas palavras, na falta de espĂ­rito filosĂ³fico e cientĂ­fico, na resoluĂ§Ă£o dos problemas da administraĂ§Ă£o escolar. Esse empirismo grosseiro, que tem presidido ao estudo dos problemas pedagĂ³gicos, postos e discutidos numa atmosfera de horizontes estreitos, tem as suas origens na ausĂªncia total de uma cultura universitĂ¡ria e na formaĂ§Ă£o meramente literĂ¡ria de nossa cultura. Nunca chegamos a possuir uma "cultura prĂ³pria", nem mesmo uma "cultura geral" que nos convencesse da "existĂªncia de um problema sobre objetivos e fins da educaĂ§Ă£o". NĂ£o se podia encontrar, por isto, unidade e continuidade de pensamento em planos de reformas, nos quais as instituições escolares, esparsas, nĂ£o traziam, para atraĂ­-las e orientĂ¡-las para uma direĂ§Ă£o, o pĂ³lo magnĂ©tico de uma concepĂ§Ă£o da vida, nem se submetiam, na sua organizaĂ§Ă£o e no seu funcionamento, a medidas objetivas com que o tratamento cientĂ­fico dos problemas da administraĂ§Ă£o escolar nos ajuda a descobrir, Ă  luz dos fins estabelecidos, os processos mais eficazes para a realizaĂ§Ă£o da obra educacional.

Certo, um educador pode bem ser um filĂ³sofo e deve ter a sua filosofia de educaĂ§Ă£o; mas, trabalhando cientificamente nesse terreno, ele deve estar tĂ£o interessado na determinaĂ§Ă£o dos fins de educaĂ§Ă£o, quanto tambĂ©m dos meios de realizĂ¡-los. O fĂ­sico e o quĂ­mico nĂ£o terĂ£o necessidade de saber o que estĂ¡ e se passa alĂ©m da janela do seu laboratĂ³rio. Mas o educador, como o sociĂ³logo, tem necessidade de uma cultura mĂºltipla e bem diversa; as alturas e as profundidades da vida humana e da vida social nĂ£o devem estender-se alĂ©m do seu raio visual; ele deve ter o conhecimento dos homens e da sociedade em cada uma de suas fases, para perceber, alĂ©m do aparente e do efĂªmero, "o jogo poderoso das grandes leis que dominam a evoluĂ§Ă£o social", e a posiĂ§Ă£o que tem a escola, e a funĂ§Ă£o que representa, na diversidade e pluralidade das forças sociais que cooperam na obra da civilizaĂ§Ă£o. Se tĂªm essa cultura geral, que lhe permite organizar uma doutrina de vida e ampliar o seu horizonte mental, poderĂ¡ ver o problema educacional em conjunto, de um ponto de vista mais largo, para subordinar o problema pedagĂ³gico ou dos mĂ©todos ao problema filosĂ³fico ou dos fins da educaĂ§Ă£o; se tem um espĂ­rito cientĂ­fico, empregarĂ¡ os mĂ©todos comuns a todo gĂªnero de investigaĂ§Ă£o cientĂ­fica, podendo recorrer a tĂ©cnicas mais ou menos elaboradas e dominar a situaĂ§Ă£o, realizando experiĂªncias e medindo os resultados de toda e qualquer modificaĂ§Ă£o nos processos e nas tĂ©cnicas, que se desenvolveram sob o impulso dos trabalhos cientĂ­ficos na administraĂ§Ă£o dos serviços escolares.

Movimento de renovaĂ§Ă£o educacional

Ă€ luz dessas verdades e sob a inspiraĂ§Ă£o de novos ideais de educaĂ§Ă£o, Ă© que se gerou, no Brasil, o movimento de reconstruĂ§Ă£o educacional, com que, reagindo contra o empirismo dominante, pretendeu um grupo de educadores, nestes Ăºltimos doze anos, transferir do terreno administrativo para os planos polĂ­tico-sociais a soluĂ§Ă£o dos problemas escolares. NĂ£o foram ataques injustos que abalaram o prestĂ­gio das instituições antigas; foram essas instituições criações artificiais ou deformadas pelo egoĂ­smo e pela rotina, a que serviram de abrigo, que tornaram inevitĂ¡veis os ataques contra elas. De fato, porque os nossos mĂ©todos de educaĂ§Ă£o haviam de continuar a ser tĂ£o prodigiosamente rotineiros, enquanto no MĂ©xico, no Uruguai, na Argentina e no Chile, para sĂ³ falar na AmĂ©rica espanhola, jĂ¡ se operavam transformações profundas no aparelho educacional, reorganizado em novas bases e em ordem a finalidades lucidamente descortinadas? Porque os nossos programas se haviam ainda de fixar nos quadros de segregaĂ§Ă£o social, em que os encerrou a repĂºblica, hĂ¡ 43 anos, enquanto nossos meios de locomoĂ§Ă£o e os processos de indĂºstria centuplicaram de eficĂ¡cia, em pouco mais de um quartel de sĂ©culo? Porque a escola havia de permanecer, entre nĂ³s, isolada do ambiente, como uma instituiĂ§Ă£o enquistada no meio social, sem meios de influir sobre ele, quando, por toda a parte, rompendo a barreira das tradições, a aĂ§Ă£o educativa jĂ¡ desbordava a escola, articulando-se com as outras instituições sociais, para estender o seu raio de influĂªncia e de aĂ§Ă£o?

Embora, a princĂ­pio, sem diretrizes definidas, esse movimento francamente renovador inaugurou uma sĂ©rie fecunda de combates de idĂ©ias, agitando o ambiente para as primeiras reformas impelidas para urna nova direĂ§Ă£o. Multiplicaram-se as associações e iniciativas escolares, em que esses debates testemunhavam a curiosidade dos espĂ­ritos, pondo em circulaĂ§Ă£o novas idĂ©ias e transmitindo aspirações novas com um caloroso entusiasmo. JĂ¡ se despertava a consciĂªncia de que, para dominar a obra educacional, em toda a sua extensĂ£o, Ă© preciso possuir, em alto grau, o hĂ¡bito de se prender, sobre bases sĂ³lidas e largas, a um conjunto de idĂ©ias abstratas e de princĂ­pios gerais, com que possamos armar um Ă¢ngulo de observaĂ§Ă£o, para vermos mais claro e mais longe e desvendarmos, atravĂ©s da complexidade tremenda dos problemas sociais, horizontes mais vastos. Os trabalhos cientĂ­ficos no ramo da educaĂ§Ă£o jĂ¡ nos faziam sentir, em toda a sua força reconstrutora, o axioma de que se pode ser tĂ£o cientĂ­fico no estudo e na resoluĂ§Ă£o dos problemas educativos, como nos da engenharia e das finanças. NĂ£o tardaram a surgir, no Distrito Federal e em trĂªs ou quatro Estados as reformas e, com elas, as realizações, com espĂ­rito cientĂ­fico, e inspiradas por um ideal que, modelado Ă  imagem da vida, jĂ¡ lhe refletia a complexidade. Contra ou a favor, todo o mundo se agitou. Esse movimento Ă© hoje uma idĂ©ia em marcha, apoiando-se sobre duas forças que se completam: a força das idĂ©ias e a irradiaĂ§Ă£o dos fatos.

Diretrizes que se esclarecem

Mas, com essa campanha, de que tivemos a iniciativa e assumimos a responsabilidade, e com a qual se incutira, por todas as formas, no magistĂ©rio, o espĂ­rito novo, o gosto da crĂ­tica e do debate e a consciĂªncia da necessidade de um aperfeiçoamento constante, ainda nĂ£o se podia considerar inteiramente aberto o caminho Ă s grandes reformas educacionais. É certo que, com a efervescĂªncia intelectual que produziu no professorado, se abriu, de uma vez, a escola a esses ares, a cujo oxigĂªnio se forma a nova geraĂ§Ă£o de educadores e se vivificou o espĂ­rito nesse fecundo movimento renovador no campo da educaĂ§Ă£o pĂºblica, nos Ăºltimos anos. A maioria dos espĂ­ritos, tanto da velha como da nova geraĂ§Ă£o ainda se arrastam, porĂ©m, sem convicções, atravĂ©s de um labirinto de idĂ©ias vagas, fora de seu alcance, e certamente, acima de sua experiĂªncia; e, porque manejam palavras, com que jĂ¡ se familiarizaram, imaginam muitos que possuem as idĂ©ias claras, o que lhes tira o desejo de adquiri-las... Era preciso, pois, imprimir uma direĂ§Ă£o cada vez mais firme a esse movimento jĂ¡ agora nacional, que arrastou consigo os educadores de mais destaque, e levĂ¡-lo a seu ponto culminante com uma noĂ§Ă£o clara e definida de suas aspirações e suas responsabilidades. Aos que tomaram posiĂ§Ă£o na vanguarda da campanha de renovaĂ§Ă£o educacional, cabia o dever de formular, em documento pĂºblico, as bases e diretrizes do movimento que souberam provocar, definindo, perante o pĂºblico e o governo, a posiĂ§Ă£o que conquistaram e vĂªm mantendo desde o inĂ­cio das hostilidades contra a escola tradicional.

Reformas e a Reforma

Se nĂ£o hĂ¡ paĂ­s "onde a opiniĂ£o se divida em maior nĂºmero de cores, e se nĂ£o se encontra teoria que entre nĂ³s nĂ£o tenha adeptos", segundo jĂ¡ observou Alberto Torres, princĂ­pios e idĂ©ias nĂ£o passam, entre nĂ³s, de "bandeira de discussĂ£o, ornatos de polĂªmica ou simples meio de Ăªxito pessoal ou polĂ­tico". Ilustrados, as vezes, e eruditos, mas raramente cultos, nĂ£o assimilamos bastante as idĂ©ias para se tornarem um nĂºcleo de convicções ou um sistema de doutrina, capaz de nos impelir Ă  aĂ§Ă£o em que costumam desencadear-se aqueles "que pensaram sua vida e viveram seu pensamento". A interpenetraĂ§Ă£o profunda que jĂ¡ se estabeleceu, em esforços constantes, entre as nossas idĂ©ias e convicções e a nossa vida de educadores, em qualquer setor ou linha de ataque em que tivemos de desenvolver a nossa atividade jĂ¡ denuncia, porĂ©m, a fidelidade e o vigor com que caminhamos para a obra de reconstruĂ§Ă£o educacional, sem estadear a segurança de um triunfo fĂ¡cil, mas com a serena confiança na vitĂ³ria definitiva de nossos ideais de educaĂ§Ă£o. Em lugar dessas reformas parciais, que se sucederam, na sua quase totalidade, na estreiteza crĂ´nica de tentativas empĂ­ricas, o nosso programa concretiza uma nova polĂ­tica educacional, que nos prepararĂ¡, por etapas, a grande reforma, em que palpitarĂ¡, com o ritmo acelerado dos organismos novos, o mĂºsculo central da estrutura polĂ­tica e social da naĂ§Ă£o.

Em cada uma das reformas anteriores, em que impressiona vivamente a falta de uma visĂ£o global do problema educativo, a força inspiradora ou a energia estimulante mudou apenas de forma, dando soluções diferentes aos problemas particulares. Nenhuma antes desse movimento renovador penetrou o Ă¢mago da questĂ£o, alterando os caracteres gerais e os traços salientes das reformas que o precederam. NĂ³s assistĂ­amos Ă  aurora de uma verdadeira renovaĂ§Ă£o educacional, quando a revoluĂ§Ă£o estalou. JĂ¡ tĂ­nhamos chegado entĂ£o, na campanha escolar, ao ponto decisivo e climatĂ©rico, ou se o quiserdes, Ă  linha de divisĂ£o das Ă¡guas. Mas, a educaĂ§Ă£o que, no final de contas, se resume logicamente numa reforma social, nĂ£o pode, ao menos em grande proporĂ§Ă£o, realizar-se senĂ£o pela aĂ§Ă£o extensa e intensiva da escola sobre o indivĂ­duo e deste sobre si mesmo nem produzir-se, do ponto de vista das influĂªncias exteriores, senĂ£o por uma evoluĂ§Ă£o contĂ­nua, favorecida e estimulada por todas as forças organizadas de cultura e de educaĂ§Ă£o. As surpresas e os golpes de teatro sĂ£o impotentes para modificarem o estado psicolĂ³gico e moral de um povo. É preciso, porĂ©m, atacar essa obra, por um plano integral, para que ela nĂ£o se arrisque um dia a ficar no estado fragmentĂ¡rio, semelhante a essas muralhas pelĂ¡gicas, inacabadas, cujos blocos enormes, esparsos ao longe sobre o solo, testemunham gigantes que os levantaram, e que a morte surpreendeu antes do cortamento de seus esforços...

Finalidades da educaĂ§Ă£o

Toda a educaĂ§Ă£o varia sempre em funĂ§Ă£o de uma "concepĂ§Ă£o da vida", refletindo, em cada Ă©poca, a filosofia predominante que Ă© determinada, a seu turno, pela estrutura da sociedade. E' evidente que as diferentes camadas e grupos (classes) de uma sociedade dada terĂ£o respectivamente opiniões diferentes sobre a "concepĂ§Ă£o do mundo", que convĂ©m fazer adotar ao educando e sobre o que Ă© necessĂ¡rio considerar como "qualidade socialmente Ăºtil". O fim da educaĂ§Ă£o nĂ£o Ă©, como bem observou G. Davy, "desenvolver de maneira anĂ¡rquica as tendĂªncias dominantes do educando; se o mestre intervĂ©m para transformar, isto implica nele a representaĂ§Ă£o de um certo ideal Ă  imagem do qual se esforça por modelar os jovens espĂ­ritos". Esse ideal e aspiraĂ§Ă£o dos adultos toma-se mesmo mais fĂ¡cil de apreender exatamente quando assistimos Ă  sua transmissĂ£o pela obra educacional, isto Ă©, pelo trabalho a que a sociedade se entrega para educar os seus filhos. A questĂ£o primordial das finalidades da educaĂ§Ă£o gira, pois, em torno de uma concepĂ§Ă£o da vida, de um ideal, a que devem conformar-se os educandos, e que uns consideram abstrato e absoluto, e outros, concreto e relativo, variĂ¡vel no tempo e no espaço. Mas, o exame, num longo olhar para o passado, da evoluĂ§Ă£o da educaĂ§Ă£o atravĂ©s das diferentes civilizações, nos ensina que o "conteĂºdo real desse ideal" variou sempre de acordo com a estrutura e as tendĂªncias sociais da Ă©poca, extraindo a sua vitalidade, como a sua força inspiradora, da prĂ³pria natureza da realidade social.

Ora, se a educaĂ§Ă£o estĂ¡ intimamente vinculada Ă  filosofia de cada Ă©poca, que lhe define o carĂ¡ter, rasgando sempre novas perspectivas ao pensamento pedagĂ³gico, a educaĂ§Ă£o nova nĂ£o pode deixar de ser uma reaĂ§Ă£o categĂ³rica, intencional e sistemĂ¡tica contra a velha estrutura do serviço educacional, artificial e verbalista, montada para uma concepĂ§Ă£o vencida. Desprendendo-se dos interesses de classes, a que ela tem servido, a educaĂ§Ă£o perde o "sentido aristolĂ³gico", para usar a expressĂ£o de Ernesto Nelson, deixa de constituir um privilĂ©gio determinado pela condiĂ§Ă£o econĂ´mica e social do indivĂ­duo, para assumir um "carĂ¡ter biolĂ³gico", com que ela se organiza para a coletividade em geral, reconhecendo a todo o indivĂ­duo o direito a ser educado atĂ© onde o permitam as suas aptidões naturais, independente de razões de ordem econĂ´mica e social. A educaĂ§Ă£o nova, alargando a sua finalidade para alĂ©m dos limites das classes, assume, com uma feiĂ§Ă£o mais humana, a sua verdadeira funĂ§Ă£o social, preparando-se para formar "a hierarquia democrĂ¡tica" pela "hierarquia das capacidades", recrutadas em todos os grupos sociais, a que se abrem as mesmas oportunidades de educaĂ§Ă£o. Ela tem, por objeto, organizar e desenvolver os meios de aĂ§Ă£o durĂ¡vel com o fim de "dirigir o desenvolvimento natural e integral do ser humano em cada uma das etapas de seu crescimento", de acordo com uma certa concepĂ§Ă£o do mundo.

A diversidade de conceitos da vida provĂ©m, em parte, das diferenças de classes e, em parte, da variedade de conteĂºdo na noĂ§Ă£o de "qualidade socialmente Ăºtil", conforme o Ă¢ngulo visual de cada uma das classes ou grupos sociais. A educaĂ§Ă£o nova que, certamente pragmĂ¡tica, se propõe ao fim de servir nĂ£o aos interesses de classes, mas aos interesses do indivĂ­duo, e que se funda sobre o princĂ­pio da vinculaĂ§Ă£o da escola com o meio social, tem o seu ideal condicionado pela vida social atual, mas profundamente humano, de solidariedade, de serviço social e cooperaĂ§Ă£o. A escola tradicional, instalada para uma concepĂ§Ă£o burguesa, vinha mantendo o indivĂ­duo na sua autonomia isolada e estĂ©ril, resultante da doutrina do individualismo libertĂ¡rio, que teve aliĂ¡s o seu papel na formaĂ§Ă£o das democracias e sem cujo assalto nĂ£o se teriam quebrado os quadros rĂ­gidos da vida social. A escola socializada, reconstituĂ­da sobre a base da atividade e da produĂ§Ă£o, em que se considera o trabalho como a melhor maneira de estudar a realidade em geral (aquisiĂ§Ă£o ativa da cultura) e a melhor maneira de estudar o trabalho em si mesmo, como fundamento da sociedade humana, se organizou para remontar a corrente e restabelecer, entre os homens, o espĂ­rito de disciplina, solidariedade e cooperaĂ§Ă£o, por uma profunda obra social que ultrapassa largamente o quadro estreito dos interesses de classes.

Valores mutĂ¡veis e valores permanentes

Mas, por menos que pareça, nessa concepĂ§Ă£o educacional, cujo embriĂ£o jĂ¡ se disse ter-se gerado no seio das usinas e de que se impregnam a carne e o sangue de tudo que seja objeto da aĂ§Ă£o educativa, nĂ£o se rompeu nem estĂ¡ a pique de romper-se o equilĂ­brio entre os valores mutĂ¡veis e os valores permanentes da vida humana. Onde, ao contrĂ¡rio, se assegurarĂ¡ melhor esse equilĂ­brio Ă© no novo sistema de educaĂ§Ă£o, que, longe de se propor a fins particulares de determinados grupos sociais, Ă s tendĂªncias ou preocupações de classes, os subordina aos fins fundamentais e gerais que assinala a natureza nas suas funções biolĂ³gicas. É certo que Ă© preciso fazer homens, antes de fazer instrumentos de produĂ§Ă£o. Mas, o trabalho que foi sempre a maior escola de formaĂ§Ă£o da personalidade moral, nĂ£o Ă© apenas o mĂ©todo que realiza o acrĂ©scimo da produĂ§Ă£o social, Ă© o Ăºnico mĂ©todo susceptĂ­vel de fazer homens cultivados e Ăºteis sob todos os aspectos. O trabalho, a solidariedade social e a cooperaĂ§Ă£o, em que repousa a ampla utilidade das experiĂªncias; a consciĂªncia social que nos leva a compreender as necessidades do indivĂ­duo atravĂ©s das da comunidade, e o espĂ­rito de justiça, de renĂºncia e de disciplina, nĂ£o sĂ£o, aliĂ¡s, grandes "valores permanentes" que elevam a alma, enobrecem o coraĂ§Ă£o e fortificam a vontade, dando expressĂ£o e valor Ă  vida humana? Um vĂ­cio das escolas espiritualistas, jĂ¡ o ponderou Jules Simon, Ă© o "desdĂ©m pela multidĂ£o". Quer-se raciocinar entre si e refletir entre si. Evita de experimentar a sorte de todas as aristocracias que se estiolam no isolamento. Se se quer servir Ă  humanidade, Ă© preciso estar em comunhĂ£o com ela.

Certo, a doutrina de educaĂ§Ă£o, que se apoia no respeito da personalidade humana, considerada nĂ£o mais como meio, mas como fim em si mesmo, nĂ£o poderia ser acusada de tentar, com a escola do trabalho, fazer do homem uma mĂ¡quina, um instrumento exclusivamente apropriado a ganhar o salĂ¡rio e a produzir um resultado material num tempo dado. "A alma tem uma potĂªncia de milhões de cavalos, que levanta mais peso do que o vapor. Se todas as verdades matemĂ¡ticas se perdessem, escreveu Lamartine, defendendo a causa da educaĂ§Ă£o integral, o mundo industrial, o mundo material, sofreria sem duvida um detrimento imenso e um dano irreparĂ¡vel; mas, se o homem perdesse uma sĂ³ das suas verdades morais, seria o prĂ³prio homem, seria a humanidade inteira que pereceria". Mas, a escola socializada nĂ£o se organizou como um meio essencialmente social senĂ£o para transferir do plano da abstraĂ§Ă£o ao da vida escolar em todas as suas manifestações, vivendo-as intensamente, essas virtudes e verdades morais, que contribuem para harmonizar os interesses individuais e os interesses coletivos. "NĂ³s nĂ£o somos antes homens e depois seres sociais, lembra-nos a voz insuspeita de Paul Bureau; somos seres sociais, por isto mesmo que somos homens, e a verdade estĂ¡ antes em que nĂ£o hĂ¡ ato, pensamento, desejo, atitude, resoluĂ§Ă£o, que tenham em nĂ³s sĂ³s seu princĂ­pio e seu termo e que realizem em nĂ³s somente a totalidade de seus efeitos".

O Estado em face da educaĂ§Ă£o

a) A educaĂ§Ă£o, uma funĂ§Ă£o essencialmente pĂºblica

Mas, do direito de cada indivĂ­duo Ă  sua educaĂ§Ă£o integral, decorre logicamente para o Estado que o reconhece e o proclama, o dever de considerar a educaĂ§Ă£o, na variedade de seus graus e manifestações, como uma funĂ§Ă£o social e eminentemente pĂºblica, que ele Ă© chamado a realizar, com a cooperaĂ§Ă£o de todas as instituições sociais. A educaĂ§Ă£o que Ă© uma das funções de que a famĂ­lia se vem despojando em proveito da sociedade polĂ­tica, rompeu os quadros do comunismo familiar e dos grupos especĂ­ficos (instituições privadas), para se incorporar definitivamente entre as funções essenciais e primordiais do Estado. Esta restriĂ§Ă£o progressiva das atribuições da famĂ­lia, - que tambĂ©m deixou de ser "um centro de produĂ§Ă£o" para ser apenas um "centro de consumo", em face da nova concorrĂªncia dos grupos profissionais, nascidos precisamente em vista da proteĂ§Ă£o de interesses especializados", - fazendo-a perder constantemente em extensĂ£o, nĂ£o lhe tirou a "funĂ§Ă£o especĂ­fica", dentro do "foco interior", embora cada vez mais estreito, em que ela se confinou. Ela Ă© ainda o "quadro natural que sustenta socialmente o indivĂ­duo, como o meio moral em que se disciplinam as tendĂªncias, onde nascem, começam a desenvolver-se e continuam a entreter-se as suas aspirações para o ideal". Por isto, o Estado, longe de prescindir da famĂ­lia, deve assentar o trabalho da educaĂ§Ă£o no apoio que ela dĂ¡ Ă  escola e na colaboraĂ§Ă£o efetiva entre pais e professores, entre os quais, nessa obra profundamente social, tem o dever de restabelecer a confiança e estreitar as relações, associando e pondo a serviço da obra comum essas duas forças sociais - a famĂ­lia e a escola, que operavam de todo indiferentes, senĂ£o em direções diversas e Ă¡s vezes opostas.

b) A questĂ£o da escola Ăºnica

Assentado o princĂ­pio do direito biolĂ³gico de cada indivĂ­duo Ă  sua educaĂ§Ă£o integral, cabe evidentemente ao Estado a organizaĂ§Ă£o dos meios de o tornar efetivo, por um plano geral de educaĂ§Ă£o, de estrutura orgĂ¢nica, que torne a escola acessĂ­vel, em todos os seus graus, aos cidadĂ£os a quem a estrutura social do paĂ­s mantĂ©m em condições de inferioridade econĂ´mica para obter o mĂ¡ximo de desenvolvimento de acordo com as suas aptidões vitais. Chega-se, por esta forma, ao princĂ­pio da escola para todos, "escola comum ou Ăºnica", que, tomado a rigor, sĂ³ nĂ£o ficarĂ¡ na contingĂªncia de sofrer quaisquer restrições, em paĂ­ses em que as reformas pedagĂ³gicas estĂ£o intimamente ligadas com a reconstruĂ§Ă£o fundamental das relações sociais. Em nosso regime polĂ­tico, o Estado nĂ£o poderĂ¡, de certo, impedir que, graças Ă  organizaĂ§Ă£o de escolas privadas de tipos diferentes, as classes mais privilegiadas assegurem a seus filhos uma educaĂ§Ă£o de classe determinada; mas estĂ¡ no dever indeclinĂ¡vel de nĂ£o admitir, dentro do sistema escolar do Estado, quaisquer classes ou escolas, a que sĂ³ tenha acesso uma minoria, por um privilegio exclusivamente econĂ´mico. Afastada a idĂ©ia do monopĂ³lio da educaĂ§Ă£o pelo Estado num paĂ­s, em que o Estado, pela sua situaĂ§Ă£o financeira nĂ£o estĂ¡ ainda em condições de assumir a sua responsabilidade exclusiva, e em que, portanto, se torna necessĂ¡rio estimular, sob sua vigilĂ¢ncia as instituições privadas idĂ´neas, a "escola Ăºnica" se entenderĂ¡, entre nĂ³s, nĂ£o como "uma conscriĂ§Ă£o precoce", arrolando, da escola infantil Ă  universidade, todos os brasileiros, e submetendo-os durante o maior tempo possĂ­vel a uma formaĂ§Ă£o idĂªntica, para ramificações posteriores em vista de destinos diversos, mas antes como a escola oficial, Ăºnica, em que todas as crianças, de 7 a 15, todas ao menos que, nessa idade, sejam confiadas pelos pais Ă  escola pĂºblica, tenham uma educaĂ§Ă£o comum, igual para todos.

c) A laicidade, gratuidade, obrigatoriedade e coeducaĂ§Ă£o

A laicidade, gratuidade, obrigatoriedade e coeducaĂ§Ă£o sĂ£o outros tantos princĂ­pios em que assenta a escola unificada e que decorrem tanto da subordinaĂ§Ă£o Ă  finalidade biolĂ³gica da educaĂ§Ă£o de todos os fins particulares e parciais (de classes, grupos ou crenças), como do reconhecimento do direito biolĂ³gico que cada ser humano tem Ă  educaĂ§Ă£o. A laicidade, que coloca o ambiente escolar acima de crenças e disputas religiosas, alheio a todo o dogmatismo sectĂ¡rio, subtrai o educando, respeitando-lhe a integridade da personalidade em formaĂ§Ă£o, Ă  pressĂ£o perturbadora da escola quando utilizada como instrumento de propaganda de seitas e doutrinas. A gratuidade extensiva a todas as instituições oficiais de educaĂ§Ă£o Ă© um princĂ­pio igualitĂ¡rio que torna a educaĂ§Ă£o, em qualquer de seus graus, acessĂ­vel nĂ£o a uma minoria, por um privilĂ©gio econĂ´mico, mas a todos os cidadĂ£os que tenham vontade e estejam em condições de recebĂª-la. AliĂ¡s o Estado nĂ£o pode tornar o ensino obrigatĂ³rio, sem tornĂ¡-lo gratuito. A obrigatoriedade que, por falta de escolas, ainda nĂ£o passou do papel, nem em relaĂ§Ă£o ao ensino primĂ¡rio, e se deve estender progressivamente atĂ© uma idade conciliĂ¡vel com o trabalho produtor, isto Ă©, atĂ© aos 18 anos, Ă© mais necessĂ¡ria ainda "na sociedade moderna em que o industrialismo e o desejo de exploraĂ§Ă£o humana sacrificam e violentam a criança e o jovem", cuja educaĂ§Ă£o Ă© freqĂ¼entemente impedida ou mutilada pela ignorĂ¢ncia dos pais ou responsĂ¡veis e pelas contingĂªncias econĂ´micas. A escola unificada nĂ£o permite ainda, entre alunos de um e outro sexo outras separações que nĂ£o sejam as que aconselham as suas aptidões psicolĂ³gicas e profissionais, estabelecendo em todas as instituições "a educaĂ§Ă£o em comum" ou coeducaĂ§Ă£o, que, pondo-os no mesmo pĂ© de igualdade e envolvendo todo o processo educacional, torna mais econĂ´mica a organizaĂ§Ă£o da obra escolar e mais fĂ¡cil a sua graduaĂ§Ă£o.

A funĂ§Ă£o educacional

a) A unidade da funĂ§Ă£o educacional

A consciĂªncia desses princĂ­pios fundamentais da laicidade, gratuidade e obrigatoriedade, consagrados na legislaĂ§Ă£o universal, jĂ¡ penetrou profundamente os espĂ­ritos, como condições essenciais Ă  organizaĂ§Ă£o de um regime escolar, lançado, em harmonia com os direitos do indivĂ­duo, sobre as bases da unificaĂ§Ă£o do ensino, com todas as suas conseqĂ¼Ăªncias. De fato, se a educaĂ§Ă£o se propõe, antes de tudo, a desenvolver ao mĂ¡ximo a capacidade vital do ser humano, deve ser considerada "uma sĂ³" a funĂ§Ă£o educacional, cujos diferentes graus estĂ£o destinados a servir Ă s diferentes fases de seu crescimento, "que sĂ£o partes orgĂ¢nicas de um todo que biologicamente deve ser levado Ă  sua completa formaĂ§Ă£o". Nenhum outro princĂ­pio poderia oferecer ao panorama das instituições escolares perspectivas mais largas, mais salutares e mais fecundas em conseqĂ¼Ăªncias do que esse que decorre logicamente da finalidade biolĂ³gica da educaĂ§Ă£o. A seleĂ§Ă£o dos alunos nas suas aptidões naturais, a supressĂ£o de instituições criadoras de diferenças sobre base econĂ´mica, a incorporaĂ§Ă£o dos estudos do magistĂ©rio Ă  universidade, a equiparaĂ§Ă£o de mestres e professores em remuneraĂ§Ă£o e trabalho, a correlaĂ§Ă£o e a continuidade do ensino em todos os seus graus e a reaĂ§Ă£o contra tudo que lhe quebra a coerĂªncia interna e a unidade vital, constituem o programa de uma polĂ­tica educacional, fundada sobre a aplicaĂ§Ă£o do princĂ­pio unificador que modifica profundamente a estrutura intima e a organizaĂ§Ă£o dos elementos constitutivos do ensino e dos sistemas escolares.

b) A autonomia da funĂ§Ă£o educacional

Mas, subordinada a educaĂ§Ă£o pĂºblica a interesses transitĂ³rios, caprichos pessoais ou apetites de partidos, serĂ¡ impossĂ­vel ao Estado realizar a imensa tarefa que se propõe da formaĂ§Ă£o integral das novas gerações. NĂ£o hĂ¡ sistema escolar cuja unidade e eficĂ¡cia nĂ£o estejam constantemente ameaçadas, senĂ£o reduzidas e anuladas, quando o Estado nĂ£o o soube ou nĂ£o o quis acautelar contra o assalto de poderes estranhos, capazes de impor Ă  educaĂ§Ă£o fins inteiramente contrĂ¡rios aos fins gerais que assinala a natureza em suas funções biolĂ³gicas. Toda a impotĂªncia manifesta do sistema escolar atual e a insuficiĂªncia das soluções dadas Ă s questões de carĂ¡ter educativo nĂ£o provam senĂ£o o desastre irreparĂ¡vel que resulta, para a educaĂ§Ă£o pĂºblica, de influencias e intervenções estranhas que conseguiram sujeita-la a seus ideais secundĂ¡rios e interesses subalternos. Dai decorre a necessidade de uma ampla autonomia tĂ©cnica, administrativa e econĂ´mica, com que os tĂ©cnicos e educadores, que tĂªm a responsabilidade e devem ter, por isto, a direĂ§Ă£o e administraĂ§Ă£o da funĂ§Ă£o educacional, tenham assegurados os meios materiais para poderem realizĂ¡-la. Esses meios, porĂ©m, nĂ£o podem reduzir-se Ă s verbas que, nos orçamentos, sĂ£o consignadas a esse serviço pĂºblico e, por isto, sujeitas Ă s crises dos erĂ¡rios do Estado ou Ă s oscilações" do interesse dos governos pela educaĂ§Ă£o. A autonomia econĂ´mica nĂ£o se poderĂ¡ realizar, a nĂ£o ser pela instituiĂ§Ă£o de um "fundo especial ou escolar", que, constituĂ­do de patrimĂ´nios, impostos e rendas prĂ³prias, seja administrado e aplicado exclusivamente no desenvolvimento da obra educacional, pelos prĂ³prios Ă³rgĂ£os do ensino, incumbidos de sua direĂ§Ă£o.

c) A descentralizaĂ§Ă£o

A organizaĂ§Ă£o da educaĂ§Ă£o brasileira unitĂ¡ria sobre a base e os princĂ­pios do Estado, no espĂ­rito da verdadeira comunidade popular e no cuidado da unidade nacional, nĂ£o implica um centralismo estĂ©ril e odioso, ao qual se opõem as condições geogrĂ¡ficas do paĂ­s e a necessidade de adaptaĂ§Ă£o crescente da escola aos interesses e Ă s exigĂªncias regionais. Unidade nĂ£o significa uniformidade. A unidade pressupõe multiplicidade. Por menos que pareça, Ă  primeira vista, nĂ£o Ă©, pois, na centralizaĂ§Ă£o, mas na aplicaĂ§Ă£o da doutrina federativa e descentralizadora, que teremos de buscar o meio de levar a cabo, em toda a RepĂºblica, uma obra metĂ³dica e coordenada, de acordo com um plano comum, de completa eficiĂªncia, tanto em intensidade como em extensĂ£o. Ă€ UniĂ£o, na capital, e aos estados, nos seus respectivos territĂ³rios, Ă© que deve competir a educaĂ§Ă£o em todos os graus, dentro dos princĂ­pios gerais fixados na nova constituiĂ§Ă£o, que deve conter, com a definiĂ§Ă£o de atribuições e deveres, os fundamentos da educaĂ§Ă£o nacional. Ao governo central, pelo MinistĂ©rio da EducaĂ§Ă£o, caberĂ¡ vigiar sobre a obediĂªncia a esses princĂ­pios, fazendo executar as orientações e os rumos gerais da funĂ§Ă£o educacional, estabelecidos na carta constitucional e em leis ordinĂ¡rias, socorrendo onde haja deficiĂªncia de meios, facilitando o intercĂ¢mbio pedagĂ³gico e cultural dos Estados e intensificando por todas as formas as suas relações espirituais. A unidade educativa, - essa obra imensa que a UniĂ£o terĂ¡ de realizar sob pena de perecer como nacionalidade, se manifestarĂ¡ entĂ£o como uma força viva, um espĂ­rito comum, um estado de Ă¢nimo nacional, nesse regime livre de intercĂ¢mbio, solidariedade e cooperaĂ§Ă£o que, levando os Estados a evitar todo desperdĂ­cio nas suas despesas escolares afim de produzir os maiores resultados com as menores despesas, abrirĂ¡ margem a uma sucessĂ£o ininterrupta de esforços fecundos em criações e iniciativas.

O processo educativo

O conceito e os fundamentos da educaĂ§Ă£o nova

O desenvolvimento das ciĂªncias lançou as bases das doutrinas da nova educaĂ§Ă£o, ajustando Ă  finalidade fundamental e aos ideais que ela deve prosseguir os processos apropriados para realizĂ¡-los. A extensĂ£o e a riqueza que atualmente alcança por toda a parte o estudo cientĂ­fico e experimental da educaĂ§Ă£o, a libertaram do empirismo, dando-lhe um carĂ¡ter e um espĂ­rito nitidamente cientĂ­fico e organizando, em corpo de doutrina, numa sĂ©rie fecunda de pesquisas e experiĂªncias, os princĂ­pios da educaĂ§Ă£o nova, pressentidos e Ă s vezes formulados em rasgos de sĂ­ntese, pela intuiĂ§Ă£o luminosa de seus precursores. A nova doutrina, que nĂ£o considera a funĂ§Ă£o educacional como uma funĂ§Ă£o de superposiĂ§Ă£o ou de acrĂ©scimo, segundo a qual o educando Ă© "modelado exteriormente" (escola tradicional), mas uma funĂ§Ă£o complexa de ações e reações em que o espĂ­rito cresce de "dentro para fora", substitui o mecanismo pela vida (atividade funcional) e transfere para a criança e para o respeito de sua personalidade o eixo da escola e o centro de gravidade do problema da educaĂ§Ă£o. Considerando os processos mentais, como "funções vitais" e nĂ£o como "processos em si mesmos", ela os subordina Ă  vida, como meio de utilizĂ¡-la e de satisfazer as suas mĂºltiplas necessidades materiais e espirituais. A escola, vista desse Ă¢ngulo novo que nos dĂ¡ o conceito funcional da educaĂ§Ă£o, deve oferecer Ă  criança um meio vivo e natural, "favorĂ¡vel ao intercĂ¢mbio de reações e experiĂªncias", em que ela, vivendo a sua vida prĂ³pria, generosa e bela de criança, seja levada "ao trabalho e Ă  aĂ§Ă£o por meios naturais que a vida suscita quando o trabalho e a aĂ§Ă£o convĂ©m aos seus interesses e Ă s suas necessidades".

Nessa nova concepĂ§Ă£o da escola, que Ă© uma reaĂ§Ă£o contra as tendĂªncias exclusivamente passivas, intelectualistas e verbalistas da escola tradicional, a atividade que estĂ¡ na base de todos os seus trabalhos, Ă© a atividade espontĂ¢nea, alegre e fecunda, dirigida Ă  satisfaĂ§Ă£o das necessidades do prĂ³prio indivĂ­duo. Na verdadeira educaĂ§Ă£o funcional deve estar, pois, sempre presente, como elemento essencial e inerente Ă  sua prĂ³pria natureza, o problema nĂ£o sĂ³ da correspondĂªncia entre os graus do ensino e as etapas da evoluĂ§Ă£o intelectual fixadas sobre a base dos interesses, como tambĂ©m da adaptaĂ§Ă£o da atividade educativa Ă s necessidades psicobiolĂ³gicas do momento. O que distingue da escola tradicional a escola nova, nĂ£o Ă©, de fato, a predominĂ¢ncia dos trabalhos de base manual e corporal, mas a presença, em todas as suas atividades, do fator psicobiolĂ³gico do interesse, que Ă© a primeira condiĂ§Ă£o de uma atividade espontĂ¢nea e o estĂ­mulo constante ao educando (criança, adolescente ou jovem) a buscar todos os recursos ao seu alcance, "graças Ă  força de atraĂ§Ă£o das necessidades profundamente sentidas". É certo que, deslocando-se por esta forma, para a criança e para os seus interesses, mĂ³veis e transitĂ³rios, a fonte de inspiraĂ§Ă£o das atividades escolares, quebra-se a ordem que apresentavam os programas tradicionais, do ponto de vista da lĂ³gica formal dos adultos, para os pĂ´r de acordo com a "lĂ³gica psicolĂ³gica", isto Ă©, com a lĂ³gica que se baseia na natureza e no funcionamento do espĂ­rito infantil.

Mas, para que a escola possa fornecer aos "impulsos interiores a ocasiĂ£o e o meio de realizar-se", e abrir ao educando Ă  sua energia de observar, experimentar e criar todas as atividades capazes de satisfazĂª-la, Ă© preciso que ela seja reorganizada como um "mundo natural e social embrionĂ¡rio", um ambiente dinĂ¢mico em Ă­ntima conexĂ£o com a regiĂ£o e a comunidade. A escola que tem sido um aparelho formal e rĂ­gido, sem diferenciaĂ§Ă£o regional, inteiramente desintegrado em relaĂ§Ă£o ao meio social, passarĂ¡ a ser um organismo vivo, com uma estrutura social, organizada Ă  maneira de uma comunidade palpitante pelas soluções de seus problemas. Mas, se a escola deve ser uma comunidade em miniatura, e se em toda a comunidade as atividades manuais, motoras ou construtoras "constituem as funções predominantes da vida", Ă© natural que ela inicie os alunos nessas atividades, pondo-os em contato com o ambiente e com a vida ativa que os rodeia, para que eles possam, desta forma, possuĂ­-la, apreciĂ¡-la e senti-la de acordo com as aptidões e possibilidades. "A vida da sociedade, observou Paulsen, se modifica em funĂ§Ă£o da sua economia, e a energia individual e coletiva se manifesta pela sua produĂ§Ă£o material". A escola nova, que tem de obedecer a esta lei, deve ser reorganizada de maneira que o trabalho seja seu elemento formador, favorecendo a expansĂ£o das energias criadoras do educando, procurando estimular-lhe o prĂ³prio esforço como o elemento mais eficiente em sua educaĂ§Ă£o e preparando-o, com o trabalho em grupos e todas as atividades pedagĂ³gicas e sociais, para fazĂª-lo penetrar na corrente do progresso material e espiritual da sociedade de que proveio e em que vai viver e lutar.

Plano de reconstruĂ§Ă£o educacional

a) As linhas gerais do plano

Ora, assentada a finalidade da educaĂ§Ă£o e definidos os meios de aĂ§Ă£o ou processos de que necessita o indivĂ­duo para o seu desenvolvimento integral, ficam fixados os princĂ­pios cientĂ­ficos sobre os quais se pode apoiar solidamente um sistema de educaĂ§Ă£o. A aplicaĂ§Ă£o desses princĂ­pios importa, como se vĂª, numa radical transformaĂ§Ă£o da educaĂ§Ă£o pĂºblica em todos os seus graus, tanto Ă  luz do novo conceito de educaĂ§Ă£o, como Ă  vista das necessidades nacionais. No plano de reconstruĂ§Ă£o educacional, de que se esboçam aqui apenas as suas grandes linhas gerais, procuramos, antes de tudo, corrigir o erro capital que apresenta o atual sistema (se Ă© que se pode chamar sistema), caracterizado pela falta de continuidade e articulaĂ§Ă£o do ensino, em seus diversos graus, como se nĂ£o fossem etapas de um mesmo processo, e cada um dos quais deve ter o seu "fim particular", prĂ³prio, dentro da "unidade do fim geral da educaĂ§Ă£o" e dos princĂ­pios e mĂ©todos comuns a todos os graus e instituições educativas. De fato, o divorcio entre as entidades que mantĂªm o ensino primĂ¡rio e profissional e as que mantĂªm o ensino secundĂ¡rio e superior, vai concorrendo insensivelmente, como jĂ¡ observou um dos signatĂ¡rios deste manifesto, "para que se estabeleçam no Brasil, dois sistemas escolares paralelos, fechados em compartimentos estanques e incomunicĂ¡veis, diferentes nos seus objetivos culturais e sociais, e, por isto mesmo, instrumentos de estratificaĂ§Ă£o social".

A escola primĂ¡ria que se estende sobre as instituições das escolas maternais e dos jardins de infĂ¢ncia e constitui o problema fundamental das democracias, deve, pois, articular-se rigorosamente com a educaĂ§Ă£o secundĂ¡ria unificada, que lhe sucede, em terceiro plano, para abrir acesso Ă s escolas ou institutos superiores de especializaĂ§Ă£o profissional ou de altos estudos. Ao espĂ­rito novo que jĂ¡ se apoderou do ensino primĂ¡rio nĂ£o se poderia, porĂ©m, subtrair a escola secundĂ¡ria, em que se apresentam, colocadas no mesmo nĂ­vel, a educaĂ§Ă£o chamada "profissional" (de preferĂªncia manual ou mecĂ¢nica) e a educaĂ§Ă£o humanĂ­stica ou cientĂ­fica (de preponderĂ¢ncia intelectual), sobre uma base comum de trĂªs anos. A escola secundĂ¡ria deixarĂ¡ de ser assim a velha escola de "um grupo social", destinada a adaptar todas as inteligĂªncias a uma forma rĂ­gida de educaĂ§Ă£o, para ser um aparelho flexĂ­vel e vivo, organizado para ministrar a cultura geral e satisfazer Ă s necessidades prĂ¡ticas de adaptaĂ§Ă£o Ă  variedade dos grupos sociais. É o mesmo princĂ­pio que faz alargar o campo educativo das Universidades, em que, ao lado das escolas destinadas ao preparo para as profissões chamadas "liberais", se devem introduzir, no sistema, as escolas de cultura especializada, para as profissões industriais e mercantis, propulsoras de nossa riqueza econĂ´mica e industrial. Mas esse princĂ­pio, dilatando o campo das universidades, para adaptĂ¡-las Ă  variedade e Ă s necessidades dos grupos sociais, tĂ£o longe estĂ¡ de lhes restringir a funĂ§Ă£o cultural que tende a elevar constantemente as escolas de formaĂ§Ă£o profissional, achegando-as Ă s suas prĂ³prias fontes de renovaĂ§Ă£o e agrupando-as em torno dos grandes nĂºcleos de criaĂ§Ă£o livre, de pesquisa cientĂ­fica e de cultura desinteressada.
A instruĂ§Ă£o pĂºblica nĂ£o tem sido, entre nĂ³s, na justa observaĂ§Ă£o de Alberto Torres, senĂ£o um "sistema de canais de Ăªxodo da mocidade do campo para as cidades e da produĂ§Ă£o para o parasitismo". É preciso, para reagir contra esses males, jĂ¡ tĂ£o lucidamente apontados, pĂ´r em via de soluĂ§Ă£o o problema educacional das massas rurais e do elemento trabalhador da cidade e dos centros industriais jĂ¡ pela extensĂ£o da escola do trabalho educativo e da escola do trabalho profissional, baseada no exercĂ­cio normal do trabalho em cooperaĂ§Ă£o, jĂ¡ pela adaptaĂ§Ă£o crescente dessas escolas (primĂ¡ria e secundĂ¡ria profissional) Ă s necessidades regionais e Ă s profissões e indĂºstrias dominantes no meio. A nova polĂ­tica educacional rompendo, de um lado, contra a formaĂ§Ă£o excessivamente literĂ¡ria de nossa cultura, para lhe dar um carĂ¡ter cientĂ­fico e tĂ©cnico, e contra esse espĂ­rito de desintegraĂ§Ă£o da escola, em relaĂ§Ă£o ao meio social, impõe reformas profundas, orientadas no sentido da produĂ§Ă£o e procura reforçar, por todos os meios, a intenĂ§Ă£o e o valor social da escola, sem negar a arte, a literatura e os valores culturais. A arte e a literatura tem efetivamente uma significaĂ§Ă£o social, profunda e mĂºltipla; a aproximaĂ§Ă£o dos homens, a sua organizaĂ§Ă£o em uma coletividade unĂ¢nime, a difusĂ£o de tais ou quais idĂ©ias sociais, de uma maneira "imaginada", e, portanto, eficaz, a extensĂ£o do raio visual do homem e o valor moral e educativo conferem certamente Ă  arte uma enorme importĂ¢ncia social. Mas, se, Ă  medida que a riqueza do homem aumenta, o alimento ocupa um lugar cada vez mais fraco, os produtores intelectuais nĂ£o passam para o primeiro plano senĂ£o quando as sociedades se organizam em sĂ³lidas bases econĂ´micas.

b) O ponto nevrĂ¡lgico da questĂ£o

A estrutura do plano educacional corresponde, na hierarquia de suas instituições escolares (escola infantil ou prĂ©-primĂ¡ria; primĂ¡ria; secundĂ¡ria e superior ou universitĂ¡ria) aos quatro grandes perĂ­odos que apresenta o desenvolvimento natural do ser humano. É uma reforma integral da organizaĂ§Ă£o e dos mĂ©todos de toda a educaĂ§Ă£o nacional, dentro do mesmo espĂ­rito que substitui o conceito estĂ¡tico do ensino por um conceito dinĂ¢mico, fazendo um apelo, dos jardins de infĂ¢ncia Ă  Universidade, nĂ£o Ă  receptividade mas Ă  atividade criadora do aluno. A partir da escola infantil (4 a 6 anos) Ă  Universidade, com escala pela educaĂ§Ă£o primĂ¡ria (7 a 12) e pela secundĂ¡ria (l2 a 18 anos), a "continuaĂ§Ă£o ininterrupta de esforços criadores" deve levar Ă  formaĂ§Ă£o da personalidade integral do aluno e ao desenvolvimento de sua faculdade produtora e de seu poder criador, pela aplicaĂ§Ă£o, na escola, para a aquisiĂ§Ă£o ativa de conhecimentos, dos mesmos mĂ©todos (observaĂ§Ă£o, pesquisa, e experiĂªncia), que segue o espĂ­rito maduro, nas investigações cientĂ­ficas. A escola secundĂ¡ria, unificada para se evitar o divĂ³rcio entre os trabalhadores manuais e intelectuais, terĂ¡ uma sĂ³lida base comum de cultura geral (3 anos), para a posterior bifurcaĂ§Ă£o (dos 15 aos 18), em seĂ§Ă£o de preponderĂ¢ncia intelectual (com os 3 ciclos de humanidades modernas; ciĂªncias fĂ­sicas e matemĂ¡ticas; e ciĂªncias quĂ­micas e biolĂ³gicas), e em seĂ§Ă£o de preferĂªncia manual, ramificada por sua vez, em ciclos, escolas ou cursos destinados Ă  preparaĂ§Ă£o Ă s atividades profissionais, decorrentes da extraĂ§Ă£o de matĂ©rias primas (escolas agrĂ­colas, de mineraĂ§Ă£o e de pesca) da elaboraĂ§Ă£o das matĂ©rias primas (industriais e profissionais) e da distribuiĂ§Ă£o dos produtos elaborados (transportes, comunicações e comĂ©rcio).
Mas, montada, na sua estrutura tradicional, para a classe mĂ©dia (burguesia), enquanto a escola primĂ¡ria servia Ă  classe popular, como se tivesse uma finalidade em si mesma, a escola secundĂ¡ria ou do 3º grau nĂ£o forma apenas o reduto dos interesses de classe, que criaram e mantĂªm o dualismo dos sistemas escolares. É ainda nesse campo educativo que se levanta a controvĂ©rsia sobre o sentido de cultura geral e se põe o problema relativo Ă  escolha do momento em que a matĂ©ria do ensino deve diversificar-se em ramos iniciais de especializaĂ§Ă£o. NĂ£o admira, por isto, que a escola secundĂ¡ria seja, nas reformas escolares, o ponto nevrĂ¡lgico da questĂ£o. Ora, a soluĂ§Ă£o dada, neste plano, ao problema do ensino secundĂ¡rio, levantando os obstĂ¡culos opostos pela escola tradicional Ă  interpenetraĂ§Ă£o das classes sociais, se inspira na necessidade de adaptar essa educaĂ§Ă£o Ă  diversidade nascente de gostos e Ă  variedade crescente de aptidões que a observaĂ§Ă£o psicolĂ³gica regista nos adolescentes e que "representam as Ăºnicas forças capazes de arrastar o espĂ­rito dos jovens Ă  cultura superior". A escola do passado, com seu esforço inĂºtil de abarcar a soma geral de conhecimentos, descurou a prĂ³pria formaĂ§Ă£o do espĂ­rito e a funĂ§Ă£o que lhe cabia de conduzir o adolescente ao limiar das profissões e da vida. Sobre a base de uma cultura geral comum, em que importarĂ¡ menos a quantidade ou qualidade das matĂ©rias do que o "mĂ©todo de sua aquisiĂ§Ă£o", a escola moderna estabelece para isto, depois dos 15 anos, o ponto em que o ensino se diversifica, para se adaptar jĂ¡ Ă  diversidade crescente de aptidões e de gostos, jĂ¡ Ă  variedade de formas de atividade social.

c) O conceito moderno de Universidade e o problema universitĂ¡rio no Brasil

A educaĂ§Ă£o superior que tem estado, no Brasil, exclusivamente a serviço das profissões "liberais" (engenharia, medicina e direito), nĂ£o pode evidentemente erigir-se Ă  altura de uma educaĂ§Ă£o universitĂ¡ria, sem alargar para horizontes cientĂ­ficos e culturais a sua finalidade estritamente profissional e sem abrir os seus quadros rĂ­gidos Ă  formaĂ§Ă£o de todas as profissões que exijam conhecimentos cientĂ­ficos, elevando-as a todas a nĂ­vel superior e tornando-se, pela flexibilidade de sua organizaĂ§Ă£o, acessĂ­vel a todas. Ao lado das faculdades profissionais existentes, reorganizadas em novas bases, impõe-se a criaĂ§Ă£o simultĂ¢nea ou sucessiva, em cada quadro universitĂ¡rio, de faculdades de ciĂªncias sociais e econĂ´micas; de ciĂªncias matemĂ¡ticas, fĂ­sicas e naturais, e de filosofia e letras que, atendendo Ă  variedade de tipos mentais e das necessidades sociais, deverĂ£o abrir Ă s universidades que se criarem ou se reorganizarem, um campo cada vez mais vasto de investigações cientĂ­ficas. A educaĂ§Ă£o superior ou universitĂ¡ria, a partir dos 18 anos, inteiramente gratuita como as demais, deve tender, de fato, nĂ£o somente Ă  formaĂ§Ă£o profissional e tĂ©cnica, no seu mĂ¡ximo desenvolvimento, como Ă  formaĂ§Ă£o de pesquisadores, em todos os ramos de conhecimentos humanos. Ela deve ser organizada de maneira que possa desempenhar a trĂ­plice funĂ§Ă£o que lhe cabe de elaboradora ou criadora de ciĂªncia (investigaĂ§Ă£o), docente ou transmissora de conhecimentos (ciĂªncia feita) e de vulgarizadora ou popularizadora, pelas instituições de extensĂ£o universitĂ¡ria, das ciĂªncias e das artes.

No entanto, com ser a pesquisa, na expressĂ£o de Coulter, o "sistema nervoso da Universidade", que estimula e domina qualquer outra funĂ§Ă£o; com ser esse espĂ­rito de profundidade e universalidade, que imprime Ă  educaĂ§Ă£o superior um carĂ¡ter universitĂ¡rio, pondo-a em condições de contribuir para o aperfeiçoamento constante do saber humano, a nossa educaĂ§Ă£o superior nunca ultrapassou os limites e as ambições de formaĂ§Ă£o profissional, a que se propõem as escolas de engenharia, de medicina e direito. Nessas instituições, organizadas antes para uma funĂ§Ă£o docente, a ciĂªncia estĂ¡ inteiramente subordinada Ă  arte ou Ă  tĂ©cnica da profissĂ£o a que servem, com o cuidado da aplicaĂ§Ă£o imediata e prĂ³xima, de uma direĂ§Ă£o utilitĂ¡ria em vista de uma funĂ§Ă£o pĂºblica ou de uma carreira privada. Ora, se, entre nĂ³s, vingam facilmente todas as fĂ³rmulas e frases feitas; se a nossa ilustraĂ§Ă£o, mais variada e mais vasta do que no impĂ©rio, Ă© hoje, na frase de Alberto Torres, "mais vaga, fluida, sem assento, incapaz de habilitar os espĂ­ritos a formar juĂ­zos e incapaz de lhes inspirar atos", Ă© porque a nossa geraĂ§Ă£o, alĂ©m de perder a base de uma educaĂ§Ă£o secundĂ¡ria sĂ³lida, posto que exclusivamente literĂ¡ria, se deixou infiltrar desse espĂ­rito enciclopĂ©dico em que o pensamento ganha em extensĂ£o o que perde em profundidade; em que da observaĂ§Ă£o e da experiĂªncia, em que devia exercitar-se, se deslocou o pensamento para o hedonismo intelectual e para a ciĂªncia feita, e em que, finalmente, o perĂ­odo criador cede o lugar Ă  erudiĂ§Ă£o, e essa mesma quase sempre, entre nĂ³s, aparente e sem substĂ¢ncia, dissimulando sob a superfĂ­cie, Ă s vezes brilhante, a absoluta falta de solidez de conhecimentos.

Nessa superficialidade de cultura, fĂ¡cil e apressada, de autodidatas, cujas opiniões se mantĂªm prisioneiras de sistemas ou se matizam das tonalidades das mais variadas doutrinas, se tem de buscar as causas profundas da estreiteza e da flutuaĂ§Ă£o dos espĂ­ritos e da indisciplina mental, quase anĂ¡rquica, que revelamos em face de todos os problemas. Nem a primeira geraĂ§Ă£o nascida com a repĂºblica, no seu esforço herĂ³ico para adquirir a posse de si mesma, elevando-se acima de seu meio, conseguiu libertar-se de todos os males educativos de que se viciou a sua formaĂ§Ă£o. A organizaĂ§Ă£o de Universidades Ă©, pois, tanto mais necessĂ¡ria e urgente quanto mais pensarmos que sĂ³ com essas instituições, a que cabe criar e difundir ideais polĂ­ticos, sociais, morais e estĂ©ticos, Ă© que podemos obter esse intensivo espĂ­rito comum, nas aspirações, nos ideais e nas lutas, esse "estado de Ă¢nimo nacional", capaz de dar força, eficĂ¡cia e coerĂªncia Ă  aĂ§Ă£o dos homens, sejam quais forem as divergĂªncias que possa estabelecer entre eles a diversidade de pontos de vista na soluĂ§Ă£o dos problemas brasileiros. É a universidade, no conjunto de suas instituições de alta cultura, prepostas ao estudo cientĂ­fico dos grandes problemas nacionais, que nos darĂ¡ os meios de combater a facilidade de tudo admitir; o ceticismo de nada escolher nem julgar; a falta de crĂ­tica, por falta de espĂ­rito de sĂ­ntese; a indiferença ou a neutralidade no terreno das idĂ©ias; a ignorĂ¢ncia "da mais humana de todas as operações intelectuais, que Ă© a de tomar partido", e a tendĂªncia e o espĂ­rito fĂ¡cil de substituir os princĂ­pios (ainda que provisĂ³rios) pelo paradoxo e pelo humor, esses recursos desesperados.

d) O problema dos melhores

De fato, a Universidade, que se encontra no Ă¡pice de todas as instituições educativas, estĂ¡ destinada, nas sociedades modernas a desenvolver um papel cada vez mais importante na formaĂ§Ă£o das elites de pensadores, sĂ¡bios, cientistas, tĂ©cnicos, e educadores, de que elas precisam para o estudo e soluĂ§Ă£o de suas questões cientĂ­ficas, morais, intelectuais, polĂ­ticas e econĂ´micas. Se o problema fundamental das democracias Ă© a educaĂ§Ă£o das massas populares, os melhores e os mais capazes, por seleĂ§Ă£o, devem formar o vĂ©rtice de uma pirĂ¢mide de base imensa. Certamente, o novo conceito de educaĂ§Ă£o repele as elites formadas artificialmente "por diferenciaĂ§Ă£o econĂ´mica" ou sob o critĂ©rio da independĂªncia econĂ´mica, que nĂ£o Ă© nem pode ser hoje elemento necessĂ¡rio para fazer parte delas. A primeira condiĂ§Ă£o para que uma elite desempenhe a sua missĂ£o e cumpra o seu dever Ă© de ser "inteiramente aberta" e nĂ£o somente de admitir todas as capacidades novas, como tambĂ©m de rejeitar implacavelmente de seu seio todos os indivĂ­duos que nĂ£o desempenham a funĂ§Ă£o social que lhes Ă© atribuĂ­da no interesse da coletividade. Mas, nĂ£o hĂ¡ sociedade alguma que possa prescindir desse Ă³rgĂ£o especial e tanto mais perfeitas serĂ£o as sociedades quanto mais pesquisada e selecionada for a sua elite, quanto maior for a riqueza e a variedade de homens, de valor cultural substantivo, necessĂ¡rios para enfrentar a variedade dos problemas que põe a complexidade das sociedades modernas. Essa seleĂ§Ă£o que se deve processar nĂ£o "por diferenciaĂ§Ă£o econĂ´mica", mas "pela diferenciaĂ§Ă£o de todas as capacidades", favorecida pela educaĂ§Ă£o, mediante a aĂ§Ă£o biolĂ³gica e funcional, nĂ£o pode, nĂ£o diremos completar-se, mas nem sequer realizar-se senĂ£o pela obra universitĂ¡ria que, elevando ao mĂ¡ximo o desenvolvimento dos indivĂ­duos dentro de suas aptidões naturais e selecionando os mais capazes, lhes dĂ¡ bastante força para exercer influĂªncia efetiva na sociedade e afetar, dessa forma, a consciĂªncia social.

A unidade de formaĂ§Ă£o de professores e a unidade de espĂ­rito

Ora, dessa elite deve fazer parte evidentemente o professorado de todos os graus, ao qual, escolhido como sendo um corpo de eleiĂ§Ă£o, para uma funĂ§Ă£o pĂºblica da mais alta importĂ¢ncia, nĂ£o se dĂ¡, nem nunca se deu no Brasil, a educaĂ§Ă£o que uma elite pode e deve receber. A maior parte dele, entre nĂ³s, Ă© recrutada em todas as carreiras, sem qualquer preparaĂ§Ă£o profissional, como os professores do ensino secundĂ¡rio e os do ensino superior (engenharia, medicina, direito, etc.), entre os profissionais dessas carreiras, que receberam, uns e outros, do secundĂ¡rio a sua educaĂ§Ă£o geral. O magistĂ©rio primĂ¡rio, preparado em escolas especiais (escolas normais), de carĂ¡ter mais propedĂªutico, e, as vezes misto, com seus cursos geral e de especializaĂ§Ă£o profissional, nĂ£o recebe, por via de regra, nesses estabelecimentos, de nĂ­vel secundĂ¡rio, nem uma sĂ³lida preparaĂ§Ă£o pedagĂ³gica, nem a educaĂ§Ă£o geral em que ela deve basear-se. A preparaĂ§Ă£o dos professores, como se vĂª, Ă© tratada entre nĂ³s, de maneira diferente, quando nĂ£o Ă© inteiramente descuidada, como se a funĂ§Ă£o educacional, de todas as funções pĂºblicas a mais importante, fosse a Ăºnica para cujo exercĂ­cio nĂ£o houvesse necessidade de qualquer preparaĂ§Ă£o profissional. Todos os professores, de todos os graus, cuja preparaĂ§Ă£o geral se adquirirĂ¡ nos estabelecimentos de ensino secundĂ¡rio, devem, no entanto, formar o seu espĂ­rito pedagĂ³gico, conjuntamente, nos cursos universitĂ¡rios, em faculdades ou escolas normais, elevadas ao nĂ­vel superior e incorporadas Ă s universidades. A tradiĂ§Ă£o das hierarquias docentes, baseadas na diferenciaĂ§Ă£o dos graus de ensino, e que a linguagem fixou em denominações diferentes (mestre, professor e catedrĂ¡tico), Ă© inteiramente contrĂ¡ria ao princĂ­pio da unidade da funĂ§Ă£o educacional, que, aplicado, Ă s funções docentes, importa na incorporaĂ§Ă£o dos estudos do magistĂ©rio Ă s universidades, e, portanto, na libertaĂ§Ă£o espiritual e econĂ´mica do professor, mediante uma formaĂ§Ă£o e remuneraĂ§Ă£o equivalentes que lhe permitam manter, com a eficiĂªncia no trabalho, a dignidade e o prestĂ­gio indispensĂ¡veis aos educadores.
A formaĂ§Ă£o universitĂ¡ria dos professores nĂ£o Ă© somente uma necessidade da funĂ§Ă£o educativa, mas o Ăºnico meio de, elevando-lhes em verticalidade a cultura, e abrindo-lhes a vida sobre todos os horizontes, estabelecer, entre todos, para a realizaĂ§Ă£o da obra educacional, uma compreensĂ£o recĂ­proca, uma vida sentimental comum e um vigoroso espĂ­rito comum nas aspirações e nos ideais. Se o estado cultural dos adultos Ă© que dĂ¡ as diretrizes Ă  formaĂ§Ă£o da mocidade, nĂ£o se poderĂ¡ estabelecer uma funĂ§Ă£o e educaĂ§Ă£o unitĂ¡ria da mocidade, sem que haja unidade cultural naqueles que estĂ£o incumbidos de transmitĂ­-la. NĂ³s nĂ£o temos o feiticismo mas o princĂ­pio da unidade, que reconhecemos nĂ£o ser possĂ­vel senĂ£o quando se criou esse "espĂ­rito", esse "ideal comum", pela unificaĂ§Ă£o, para todos os graus do ensino, da formaĂ§Ă£o do magistĂ©rio, que elevaria o valor dos estudos, em todos os graus, imprimiria mais lĂ³gica e harmonia Ă s instituições, e corrigiria, tanto quanto humanamente possĂ­vel, as injustiças da situaĂ§Ă£o atual. Os professores de ensino primĂ¡rio e secundĂ¡rio, assim formados, em escolas ou cursos universitĂ¡rios, sobre a base de uma educaĂ§Ă£o geral comum, dada em estabelecimentos de educaĂ§Ă£o secundĂ¡ria, nĂ£o fariam senĂ£o um sĂ³ corpo com os do ensino superior, preparando a fusĂ£o sincera e cordial de todas as forças vivas do magistĂ©rio. Entre os diversos graus do ensino, que guardariam a sua funĂ§Ă£o especĂ­fica, se estabeleceriam contatos estreitos que permitiriam as passagens de um ao outro nos momentos precisos, descobrindo as superioridade em gĂ©rmen, pondo-as em destaque e assegurando, de um ponto a outro dos estudos, a unidade do espĂ­rito sobre a base da unidade de formaĂ§Ă£o dos professores.

O papel da escola na vida e a sua funĂ§Ă£o social

Mas, ao mesmo tempo que os progressos da psicologia aplicada Ă  criança começaram a dar Ă  educaĂ§Ă£o bases cientĂ­ficas, os estudos sociolĂ³gicos, definindo a posiĂ§Ă£o da escola em face da vida, nos trouxeram uma consciĂªncia mais nĂ­tida da sua funĂ§Ă£o social e da estreiteza relativa de seu cĂ­rculo de aĂ§Ă£o. Compreende-se, Ă  luz desses estudos, que a escola, campo especĂ­fico de educaĂ§Ă£o, nĂ£o Ă© um elemento estranho Ă  sociedade humana, um elemento separado, mas "uma instituiĂ§Ă£o social", um Ă³rgĂ£o feliz e vivo, no conjunto das instituições necessĂ¡rias Ă  vida, o lugar onde vivem a criança, a adolescĂªncia e a mocidade, de conformidade com os interesses e as alegrias profundas de sua natureza. A educaĂ§Ă£o, porĂ©m, nĂ£o se faz somente pela escola, cuja aĂ§Ă£o Ă© favorecida ou contrariada, ampliada ou reduzida pelo jogo de forças inumerĂ¡veis que concorrem ao movimento das sociedades modernas. Numerosas e variadĂ­ssimas, sĂ£o, de fato, as influĂªncias que formam o homem atravĂ©s da existĂªncia. "HĂ¡ a herança que a escola da espĂ©cie, como jĂ¡ se escreveu; a famĂ­lia que Ă© a escola dos pais; o ambiente social que Ă© a escola da comunidade, e a maior de todas as escolas, a vida, com todos os seus imponderĂ¡veis e forças incalculĂ¡veis".

Compreender, entĂ£o, para empregar a imagem de C. BouglĂ©, que, na sociedade, a "zona luminosa Ă© singularmente mais estreita que a zona de sombra; os pequenos focos de aĂ§Ă£o consciente que sĂ£o as escolas, nĂ£o sĂ£o senĂ£o pontos na noite, e a noite que as cerca nĂ£o Ă© vazia, mas cheia e tanto mais inquietante; nĂ£o Ă© o silĂªncio e a imobilidade do deserto, mas o frĂªmito de uma floresta povoada".

Dessa concepĂ§Ă£o positiva da escola, como uma instituiĂ§Ă£o social, limitada, na sua aĂ§Ă£o educativa, pela pluralidade e diversidade das forças que concorrem ao movimento das sociedades, resulta a necessidade de reorganizĂ¡-la, como um organismo maleĂ¡vel e vivo, aparelhado de um sistema de instituições susceptĂ­veis de lhe alargar os limites e o raio de aĂ§Ă£o. As instituições periescolares e postescolares, de carĂ¡ter educativo ou de assistĂªncia social, devem ser incorporadas em todos os sistemas de organizaĂ§Ă£o escolar para corrigirem essa insuficiĂªncia social, cada vez maior, das instituições educacionais. Essas instituições de educaĂ§Ă£o e cultura, dos jardins de infĂ¢ncia Ă s escolas superiores, nĂ£o exercem a aĂ§Ă£o intensa, larga e fecunda que sĂ£o chamadas a desenvolver e nĂ£o podem exercer senĂ£o por esse conjunto sistemĂ¡tico de medidas de projeĂ§Ă£o social da obra educativa alĂ©m dos muros escolares. Cada escola, seja qual for o seu grau, dos jardins Ă s universidades, deve, pois, reunir em tomo de si as famĂ­lias dos alunos, estimulando e aproveitando as iniciativas dos pais em favor da educaĂ§Ă£o; constituindo sociedades de ex-alunos que mantenham relaĂ§Ă£o constante com as escolas; utilizando, em seu proveito, os valiosos e mĂºltiplos elementos materiais e espirituais da coletividade e despertando e desenvolvendo o poder de iniciativa e o espĂ­rito de cooperaĂ§Ă£o social entre os pais, os professores, a imprensa e todas as demais instituições diretamente interessadas na obra da educaĂ§Ă£o.

Pois, Ă© impossĂ­vel realizar-se em intensidade e extensĂ£o, uma sĂ³lida obra educacional, sem se rasgarem Ă  escola aberturas no maior numero possĂ­vel de direções e sem se multiplicarem os pontos de apoio de que ela precisa, para se desenvolver, recorrendo a comunidade como Ă  fonte que lhes hĂ¡ de proporcionar todos os elementos necessĂ¡rios para elevar as condições materiais e espirituais das escolas. A consciĂªncia do verdadeiro papel da escola na sociedade impõe o dever de concentrar a ofensiva educacional sobre os nĂºcleos sociais, como a famĂ­lia, os agrupamentos profissionais e a imprensa, para que o esforço da escola se possa realizar em convergĂªncia, numa obra solidĂ¡ria, com as outras instituições da comunidade. Mas, alĂ©m de atrair para a obra comum as instituições que sĂ£o destinadas, no sistema social geral, a fortificar-se mutuamente, a escola deve utilizar, em seu proveito, com a maior amplitude possĂ­vel, todos os recursos formidĂ¡veis, como a imprensa, o disco, o cinema e o rĂ¡dio, com que a ciĂªncia, multiplicando-lhe a eficĂ¡cia, acudiu Ă  obra de educaĂ§Ă£o e cultura e que assumem, em face das condições geogrĂ¡ficas e da extensĂ£o territorial do paĂ­s, uma importĂ¢ncia capital. Ă€ escola antiga, presumida da importĂ¢ncia do seu papel e fechada no seu exclusivismo acanhado e estĂ©ril, sem o indispensĂ¡vel complemento e concurso de todas as outras instituições sociais, se sucederĂ¡ a escola moderna aparelhada de todos os recursos para estender e fecundar a sua aĂ§Ă£o na solidariedade com o meio social, em que entĂ£o, e sĂ³ entĂ£o, se tornarĂ¡ capaz de influir, transformando-se num centro poderoso de criaĂ§Ă£o, atraĂ§Ă£o e irradiaĂ§Ă£o de todas as forças e atividades educativas.

A democracia, - um programa de longos deveres

NĂ£o alimentamos, de certo, ilusões sobre as dificuldades de toda a ordem que apresenta um plano de reconstruĂ§Ă£o educacional de tĂ£o grande alcance e de tĂ£o vastas proporções. Mas, temos, com a consciĂªncia profunda de uma por uma dessas dificuldades, a disposiĂ§Ă£o obstinada de enfrentĂ¡-las, dispostos, como estamos, na defesa de nossos ideais educacionais, para as existĂªncias mais agitadas, mais rudes e mais fecundas em realidades, que um homem tenha vivido desde que hĂ¡ homens, aspirações e lutas. O prĂ³prio espĂ­rito que o informa de uma nova polĂ­tica educacional, com sentido unitĂ¡rio e de bases cientĂ­ficas, e que seria, em outros paĂ­ses, a maior fonte de seu prestĂ­gio, tornarĂ¡ esse plano suspeito aos olhos dos que, sob o pretexto e em nome do nacionalismo, persistem em manter a educaĂ§Ă£o, no terreno de uma polĂ­tica empĂ­rica, Ă  margem das correntes renovadoras de seu tempo. De mais, se os problemas de educaĂ§Ă£o devem ser resolvidos de maneira cientĂ­fica, e se a ciĂªncia nĂ£o tem pĂ¡tria, nem varia, nos seus princĂ­pios, com os climas e as latitudes, a obra de educaĂ§Ă£o deve ter, em toda a parte, uma "unidade fundamental", dentro da variedade de sistemas resultantes da adaptaĂ§Ă£o a novos ambientes dessas idĂ©ias e aspirações que, sendo estruturalmente cientĂ­ficas e humanas, tĂªm um carĂ¡ter universal. É preciso, certamente, tempo para que as camadas mais profundas do magistĂ©rio e da sociedade em geral sejam tocadas pelas doutrinas novas e seja esse contato bastante penetrante e fecundo para lhe modificar os pontos de vista e as atitudes em face do problema educacional, e para nos permitir as conquistas em globo ou por partes de todas as grandes aspirações que constituem a substĂ¢ncia de uma nova polĂ­tica de educaĂ§Ă£o.

Os obstĂ¡culos acumulados, porĂ©m, nĂ£o nos abateram ainda nem poderĂ£o abater-nos a resoluĂ§Ă£o firme de trabalhar pela reconstruĂ§Ă£o educacional no Brasil. NĂ³s temos uma missĂ£o a cumprir: insensĂ­veis Ă  indiferença e Ă  hostilidade, em luta aberta contra preconceitos e prevenções enraizadas, caminharemos progressivamente para o termo de nossa tarefa, sem abandonarmos o terreno das realidades, mas sem perdermos de vista os nossos ideais de reconstruĂ§Ă£o do Brasil, na base de uma educaĂ§Ă£o inteiramente nova. A hora crĂ­tica e decisiva que vivemos, nĂ£o nos permite hesitar um momento diante da tremenda tarefa que nos impõe a consciĂªncia, cada vez mais viva da necessidade de nos prepararmos para enfrentarmos com o evangelho da nova geraĂ§Ă£o, a complexidade trĂ¡gica dos problemas postos pelas sociedades modernas. "NĂ£o devemos submeter o nosso espĂ­rito. Devemos, antes de tudo proporcionar-nos um espĂ­rito firme e seguro; chegar a ser sĂ©rios em todas as coisas, e nĂ£o continuar a viver frivolamente e como envoltos em bruma; devemos formar-nos princĂ­pios fixos e inabalĂ¡veis que sirvam para regular, de um modo firme, todos os nossos pensamentos e todas as nossas ações; vida e pensamento devem ser em nĂ³s outros de uma sĂ³ peça e formar um todo penetrante e sĂ³lido. Devemos, em uma palavra, adquirir um carĂ¡ter, e refletir, pelo movimento de nossas prĂ³prias idĂ©ias, sobre os grandes acontecimentos de nossos dias, sua relaĂ§Ă£o conosco e o que podemos esperar deles. É preciso formar uma opiniĂ£o clara e penetrante e responder a esses problemas sim ou nĂ£o de um modo decidido e inabalĂ¡vel".

Essas palavras tĂ£o oportunas, que agora lembramos, escreveu-as Fichte hĂ¡ mais de um sĂ©culo, apontando Ă  Alemanha, depois da derrota de Iena, o caminho de sua salvaĂ§Ă£o pela obra educacional, em um daqueles famosos "discursos Ă  naĂ§Ă£o alemĂ£", pronunciados de sua cĂ¡tedra, enquanto sob as janelas da Universidade, pelas ruas de Berlim, ressoavam os tambores franceses... NĂ£o sĂ£o, de fato, senĂ£o as fortes convicções e a plena posse de si mesmos que fazem os grandes homens e os grandes povos. Toda a profunda renovaĂ§Ă£o dos princĂ­pios que orientam a marcha dos povos precisa acompanhar-se de fundas transformações no regime educacional: as Ăºnicas revoluções fecundas sĂ£o as que se fazem ou se consolidam pela educaĂ§Ă£o, e Ă© sĂ³ pela educaĂ§Ă£o que a doutrina democrĂ¡tica, utilizada como um princĂ­pio de desagregaĂ§Ă£o moral e de indisciplina, poderĂ¡ transformar-se numa fonte de esforço moral, de energia criadora, de solidariedade social e de espĂ­rito de cooperaĂ§Ă£o. "O ideal da democracia que, - escrevia Gustave Belot em 1919, - parecia mecanismo polĂ­tico, torna-se princĂ­pio de vida moral e social, e o que parecia coisa feita e realizada revelou-se como um caminho a seguir e como um programa de longos deveres". Mas, de todos os deveres que incumbem ao Estado, o que exige maior capacidade de dedicaĂ§Ă£o e justifica maior soma de sacrifĂ­cios; aquele com que nĂ£o Ă© possĂ­vel transigir sem a perda irreparĂ¡vel de algumas gerações; aquele em cujo cumprimento os erros praticados se projetam mais longe nas suas conseqĂ¼Ăªncias, agravando-se Ă  medida que recuam no tempo; o dever mais alto, mais penoso e mais grave Ă©, de certo, o da educaĂ§Ă£o que, dando ao povo a consciĂªncia de si mesmo e de seus destinos e a força para afirmar-se e realizĂ¡-los, entretĂ©m, cultiva e perpetua a identidade da consciĂªncia nacional, na sua comunhĂ£o Ă­ntima com a consciĂªncia humana.


Fernando de Azevedo
Afranio Peixoto
A. de Sampaio Doria
Anisio Spinola Teixeira
M. Bergstrom Lourenço Filho
Roquette Pinto
J. G. Frota PessĂ´a
Julio de Mesquita Filho
Raul Briquet
Mario Casassanta
C. Delgado de Carvalho
A. Ferreira de Almeida Jr.
J. P. Fontenelle
RoldĂ£o Lopes de Barros
Noemy M. da Silveira
Hermes Lima
Attilio Vivacqua
Francisco Venancio Filho
Paulo MaranhĂ£o
Cecilia Meirelles
Edgar Sussekind de Mendonça
Armanda Alvaro Alberto
Garcia de Rezende
Nobrega da Cunha
Paschoal Lemme
Raul Gomes.

Professores temporĂ¡rios protestam pela falta de pagamento

Rodrigo Bialli/Banda B

Cerca de 3 mil professores temporĂ¡rios, contratados para substituir profissionais estatutĂ¡rios durante perĂ­odo de licença , ainda nĂ£o receberam os salĂ¡rios. Eles teriam trabalhado desde o mĂªs de agosto e, segundo o sindicato da categoria, o governo diz nĂ£o possuir dinheiro em caixa para quitar a dĂ­vida.

De acordo com a presidente da AssociaĂ§Ă£o dos Professores do ParanĂ¡ (APP), Marley Fernando de Carvalho, a secretaria de EducaĂ§Ă£o foi procurada pelos profissionais, porĂ©m, alegou que ainda nĂ£o possui uma soluĂ§Ă£o para a falta de verba. “Houve uma confirmaĂ§Ă£o de que devido alguns problemas nĂ£o seria possĂ­vel realizar o pagamento. Problema de verdade Ă© professor nĂ£o receber”, comenta, em entrevista Ă  rĂ¡dio Banda B. (Ouça o Ă¡udio no Ă­cone acima)

Uma professora, identificada apenas como Valdeci, disse que prestou serviços no municĂ­pio de Pinhais por quase trĂªs meses e atĂ© o momento a Ăºnica coisa que recebeu foram ameaças. “ Eu paguei para trabalhar. Quando eu fui reclamar acabei recebendo um e-mail ameaçador, dizendo que se nĂ£o ficasse quieta talvez nĂ£o seria contratada outras vezes”, comenta.

A APP planeja realizar uma mobilizaĂ§Ă£o caso os salĂ¡rios nĂ£o sejam depositados atĂ© a sexta-feira. O evento deve ocorrer no prĂ³ximo dia 08, Ă s 9h, em frente ao PalĂ¡cio das AraucĂ¡rias, no Centro CĂ­vico.

CNI defende 'medidas mais duras' para conter real

AE

O presidente da ConfederaĂ§Ă£o Nacional da IndĂºstria (CNI), Robson de Andrade, afirmou hoje que o governo deveria adotar "medidas mais duras" para coibir a valorizaĂ§Ă£o do cĂ¢mbio, que chegou a bater hoje em R$ 1,67. "A quarentena Ă© uma alternativa a ser aliada Ă  questĂ£o tributĂ¡ria (IOF) e as propostas que possam ser aplicadas e que nĂ£o atinjam a OMC e acordos internacionais", destacou. "O que acontece Ă© que a situaĂ§Ă£o estĂ¡ se agravando. O cĂ¢mbio estĂ¡ se apreciando e medidas internacionais que estĂ£o sendo tomadas por outros paĂ­ses vĂ£o agravar ainda mais a questĂ£o do cĂ¢mbio", ressaltou. Ele se referiu inclusive Ă  decisĂ£o do Fed de injetar US$ 600 bilhões na economia norte-americana, o que, para ele, deve ampliar o fluxo de capitais especulativos para o Brasil no curto prazo.

Andrade citou que as medidas que o governo deveria implementar devem ter como foco principal os capitais especulativos que ingressam no PaĂ­s com o objetivo de aproveitar o diferencial de juros. A taxa real no Brasil estĂ¡ prĂ³xima a 5,70%, enquanto Ă© negativa nos EUA, no JapĂ£o, na zona do euro e na Inglaterra. "O investidor estrangeiro toma hoje recursos no mercado norte-americano a praticamente 0% e aplica aqui a 10%, 11%, 12% ao ano, fora o ganho que ele tem com a apreciaĂ§Ă£o do real", destacou. "NĂ³s podemos tributar a entrada destes recursos de tal maneira que esse ganho seja reduzido, ou podemos criar quarentenas. Tem formas de fazer e o governo tem mecanismos para fazer", disse.

Segundo o presidente da CNI, Ă© correta a decisĂ£o do governo de elevar para 6% o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) dos investimentos estrangeiros em renda fixa, mas a medida nĂ£o resolve o problema da valorizaĂ§Ă£o do cĂ¢mbio. "O investidor brasileiro paga imposto de renda (para aplicaĂ§Ă£o em renda fixa). Por que o capital estrangeiro nĂ£o pode pagar imposto de renda?", questionou. "A situaĂ§Ă£o requer medidas mais duras, mais drĂ¡sticas", disse.

Ele ressaltou que tal tributaĂ§Ă£o poderia ser revogada quando a situaĂ§Ă£o do cĂ¢mbio ficasse mais favorĂ¡vel para a economia nacional. Ele afirmou que o PaĂ­s precisa ter mecanismos de defesa comercial, da economia e do emprego. "O Brasil tem uma economia forte, um mercado interno muito aquecido, muito bom. A indĂºstria brasileira tem tambĂ©m que pensar no longo prazo, no mercado que estĂ¡ lĂ¡ fora", disse.

"NĂ³s estamos com reservas cambiais, como disse a presidente eleita, suficientes para enfrentar dificuldades que eventualmente o PaĂ­s possa ter. Se nĂ³s estamos nessa situaĂ§Ă£o confortĂ¡vel, vamos usĂ¡-la para proteger a nossa economia", disse. Na avaliaĂ§Ă£o de Andrade, sĂ£o bem vindos os investimentos de longo prazo que vem para o PaĂ­s para ampliar a capacidade produtiva nacional. "Mas nĂ³s podemos determinar que o investimento estrangeiro no Brasil tenha tambĂ©m uma conotaĂ§Ă£o de exportaĂ§Ă£o, nĂ£o (sĂ³) com o olho no mercado interno, mas com uma visĂ£o de mercado mundial. Tem que assumir um compromisso de exportaĂ§Ă£o", destacou.

Para o presidente da CNI, um problema derivado da valorizaĂ§Ă£o cambial no Brasil Ă© o avanço das importações e a queda das exportações de manufaturados. "Esse problema vai criar lĂ¡ na frente uma desindustrializaĂ§Ă£o, um problema com o emprego, com o setor de tecnologia e com produtividade de todos os setores (produtivos)", frisou.

PrejuĂ­zo de R$ 1 milhĂ£o por ano com pichações

Fernanda Deslandes/ParanĂ¡Online

A Prefeitura de Curitiba gasta R$ 1 milhĂ£o por ano para reparar danos causados por vandalismo. SĂ£o consertados objetos e imĂ³veis depredados, lĂ¢mpadas da iluminaĂ§Ă£o pĂºblica e instalados cabos de luz sobre pontos onde a fiaĂ§Ă£o foi roubada. Entretanto, o maior gasto com reparo de atos de vandalismo Ă© devido Ă s pichações.

AtĂ© outubro de 2010, 563 ocorrĂªncias de pichaĂ§Ă£o foram atendidas pela Guarda Municipal (GM). Foram presas 65 pessoas, e apreendidos 71 menores de 18 anos, em flagrante.

Em 2008 foram 151 flagrantes, e outros 122 foram registrados em 2009. Todos os detidos sĂ£o encaminhados Ă  Delegacia do Meio Ambiente ou Ă  Delegacia do Adolescente, no caso dos menores. Os bairros mais atingidos pelo crime sĂ£o o Centro, SĂ­tio Cercado, SĂ£o Francisco, Cajuru e PortĂ£o.

De acordo com Odgar Nunes Cardoso, diretor da GM de Curitiba, um meio para reduzir a incidĂªncia do crime Ă© a prevenĂ§Ă£o. “A parte da puniĂ§Ă£o deve ser a Ăºltima aplicada. Temos que conscientizar para que as pessoas aprendam a preservar os locais onde moram”, ressalta.

A GM trabalha em parceria com as organizações nĂ£o-governamentais (ONGs) Despiche e Vida Urbana, realizando palestras em escolas pĂºblicas e particulares para alunos da 1.ª Ă  5.ª sĂ©rie.

“Explicamos o problema que a pichaĂ§Ă£o causa, o custo que gera para o municĂ­pio e para a comunidade. Mostramos o benefĂ­cio de manter a escola, a comunidade e a cidade limpas”, afirma.

As palestras acontecem tambĂ©m duas vezes por semana no projeto Guarda Mirim, promovidas por guardas voluntĂ¡rios. O resultado Ă© imediato. “Nos locais onde fazemos as palestras a pichaĂ§Ă£o diminui sensivelmente. As crianças cobram da comunidade. PorĂ©m, na Ă¡rea pĂºblica, infelizmente tem uma disputa muito grande de territĂ³rio e o crime continua acontecendo, por isso contamos com as denĂºncias que podem ser anĂ´nimas atravĂ©s dos telefones 156 e 153”, lembra.

Lei

O artigo 65 da Lei n.º 9.605, de 1998, prevĂª pena de trĂªs meses a um ano de prisĂ£o para pichadores. Quando o crime Ă© feito em local tombado pelo patrimĂ´nio histĂ³rico, a pena sobe para um ano de reclusĂ£o. Para os adolescentes, a lei determina o cumprimento de medidas socioeducativas como prestaĂ§Ă£o de serviço Ă  comunidade ou a reparaĂ§Ă£o do dano.

Em Curitiba, alĂ©m da lei ambiental, existe uma lei municipal que prevĂª o pagamento de multa de R$ 750 para quem for preso em flagrante pela GM (no caso dos menores apreendidos, a multa deverĂ¡ ser paga pelos pais ou responsĂ¡veis).

O detido ainda perde, por dois anos, o direito de participar de concursos pĂºblicos municipais. A mesma lei, em vigor desde 2008, proĂ­be estabelecimentos comerciais, pessoas fĂ­sicas e jurĂ­dicas, de vender tinta spray para menores de 18 anos.

PrĂ©dios histĂ³ricos

A pena Ă© superior para presos por pichações em locais pĂºblicos e histĂ³ricos por que a reforma deste tipo de estabelecimento Ă© mais difĂ­cil. É o que defende Telmo Padilha Cesar, coordenador de projetos do grupo Defender (Defesa Civil do PatrimĂ´nio HistĂ³rico).

“Para o patrimĂ´nio pĂºblico e privado as despesas muitas vezes ficam por conta de raspagem, lixaĂ§Ă£o e repintura. No caso de patrimĂ´nio histĂ³rico o custo Ă© mais elevado, uma vez que deverĂ£o ser utilizadas tintas e tĂ©cnicas que nĂ£o mutilem o monumento”, explica.

Para ele, a perda das caracterĂ­sticas fĂ­sicas do imĂ³vel Ă© a perda de um pedaço da histĂ³ria do local. “O custo Ă© proporcional ao tamanho do dano, mas de qualquer forma Ă© uma despesa promovida por gente que nĂ£o respeita aquilo que Ă© seu e faz parte da sua prĂ³pria histĂ³ria”, ressalta.

Ele lembra do trabalho da ONGs na Travessa da Lapa, que culminou em quatro anos de limpeza e manutenĂ§Ă£o livre de pichações, comemorados em 2008. Segundo Telmo, isso sĂ³ foi possĂ­vel por que houve fiscalizaĂ§Ă£o por parte tambĂ©m da sociedade depois de um intenso trabalho de conscientizaĂ§Ă£o.

“A pichaĂ§Ă£o Ă© um modismo que vem em ondas. Onde a sociedade e os poderes pĂºblicos se omitem, o lugar sofre com mais frequĂªncia e violĂªncia ações de vandalismo”, garante.

O grupo Defender apoia projetos de educaĂ§Ă£o patrimonial e a restauraĂ§Ă£o de bens protegidos pela lei, e sugere a inclusĂ£o nos orçamentos pĂºblicos dos custos de manutenĂ§Ă£o do patrimĂ´nio edificado, histĂ³rico ou nĂ£o.

“NĂ£o existe nada mais importante para o desenvolvimento cultural, social e econĂ´mico do que o PatrimĂ´nio Cultural, seja ele material, natural ou imaterial”, frisa.

 
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