O prefeito de Curitiba, Luciano Ducci (PSB), estava sem os sapatos quando recebeu a reportagem da Gazeta do Povo em seu gabinete. Ele os havia mandado para a limpeza, pois estavam cheios de barro, apĂ³s visita a obras de uma creche municipal no Conjunto Moradias Itaqui, no bairro Campo de Santana, sul da cidade. Apesar da derrota eleitoral jĂ¡ no primeiro turno – ele ficou em terceiro lugar, com uma diferença de 4.402 votos para Gustavo Fruet (PDT) –, Ducci pretende inaugurar o maior nĂºmero de obras atĂ© o fim do ano. Para acompanhĂ¡-las de perto, continua percorrendo a capital.
Durante os 45 minutos em que conversou com a reportagem, Ducci estava sereno e descontraĂdo. Disse que nĂ£o guarda mĂ¡goas de ninguĂ©m pela derrota. Ao avistar o certificado e o trofĂ©u do Americas Award, prĂªmio em reconhecimento ao esforço da prefeitura em reduzir a mortalidade infantil, contou que nĂ£o quis viajar para recebĂª-lo pessoalmente. “Achei que eu ia estar no segundo turno.” A entrega foi feita em 26 de outubro, na ColĂ´mbia, pelo Cifal e pela Unitar, Ă³rgĂ£os das Nações Unidas.
Como o sr. avalia o resultado da eleiĂ§Ă£o?
Ducci ainda nĂ£o definiu o que farĂ¡ a partir de janeiro, quando deixa a cadeira de prefeito. Mas confirmou que continuarĂ¡ caminhando ao lado do governador Beto Richa (PSDB).
A opiniĂ£o das pessoas se refletiu nas urnas. Agora o que faço Ă© desejar a Gustavo Fruet que faça uma boa gestĂ£o. Falo isso como curitibano, como prefeito, como pessoa que gosta muito de Curitiba, que tem famĂlia, filhos aqui, e que, daqui um tempo, quem sabe, terĂ¡ netos aqui. Espero que ele faça uma gestĂ£o que seja uma continuidade de tudo o que tivemos. NĂ£o Ă© Ă toa que Curitiba Ă© a melhor cidade do Brasil para se viver, que Ă© referĂªncia no paĂs e no mundo.
O sr. acompanhou a campanha do segundo turno?
Para ser sincero, nĂ£o acompanhei nenhum programa eleitoral, nenhum debate. Mas vĂ¡rias pessoas me falaram: aquela tua proposta estĂ¡ com o fulano, aquela outra estĂ¡ com o outro... Praticamente todas as nossas propostas do primeiro turno foram incorporadas [por Fruet ou Ratinho JĂºnior] no segundo turno. Fico contente, porque mostra que a gente estava com as melhores propostas.
Em 2012, a taxa de reeleiĂ§Ă£o dos prefeitos de capitais caiu bastante, chegou a apenas 50%, contra 95% em 2008. O sr. foi um dos que nĂ£o conseguiu se reeleger. Como avalia esse fenĂ´meno nacional?
Cada caso Ă© um caso. NĂ³s fizemos uma boa gestĂ£o. Tenho tranquilidade para falar isso, pois os indicadores sociais mostram isso. Quando se diz que Ă© a cidade que mais reduziu a pobreza e a misĂ©ria no Brasil, pelos dados da FundaĂ§Ă£o Getulio Vargas; quando temos a menor taxa de desemprego; o maior salĂ¡rio mĂ©dio do paĂs, ultrapassando SĂ£o Paulo; o quarto maior PIB [municipal]; a melhor nota do Ideb; e a menor taxa mortalidade infantil, dĂ¡ para ter segurança de que fizemos uma boa gestĂ£o. Agora temos um parque de obras na cidade, atĂ© pela boa gestĂ£o feita na busca por recursos. Mas talvez isso tenha atĂ© atrapalhado um pouco [na eleiĂ§Ă£o]. Mas talvez as propostas mais direcionadas ao indivĂduo tenham sido mais aceitas do que as proposta de entendimento de um projeto para a cidade.
O sr. avalia que o curitibano foi muito exigente? Que estava acostumado com inovações, obras originais, e sentiu falta disso?
NĂ£o soube mostrar de forma adequada a transformaĂ§Ă£o pela qual a cidade vem passando, que tem sido diferente da que ocorreu em outras Ă©pocas. HĂ¡ o LigeirĂ£o, um grande avanço no transporte pĂºblico, e os Ă´nibus hĂbridos elĂ©tricos. Mas a grande transformaĂ§Ă£o tem ocorrido na Ă¡rea social, e nĂ£o soubemos explorĂ¡-la bem durante a gestĂ£o e nem durante a campanha. Nos indicadores sociais, Curitiba deu um grande salto. HĂ¡ pouco, eu estava no Conjunto Moradias Itaqui, no sul de Curitiba. Ali nĂ£o tinha nada hĂ¡ dois anos. Hoje sĂ£o centenas de casas, pessoas e famĂlias morando ali, que saĂram das beiras dos rios. EstĂ¡ praticamente pronta uma creche para atender as famĂlias. HĂ¡ uma ampliaĂ§Ă£o de escola estadual e a proposta de construĂ§Ă£o de uma unidade de saĂºde. Foi essa transformaĂ§Ă£o, na Ă¡rea social, que fizemos. E as obras tambĂ©m estĂ£o aĂ: o viaduto estaiado, as trincheiras da [Rua] Chile, da Guabirotuba, da Linha Verde. E nĂ³s viabilizamos recursos para o metrĂ´. Conseguimos montar toda a modelagem do metrĂ´ com o governo federal. Seremos modelo de licitaĂ§Ă£o de parceria pĂºblico-privada. SĂ³ nĂ£o saiu a licitaĂ§Ă£o ainda porque falta definir a porcentagem do componente nacional do maquinĂ¡rio do metrĂ´.
O sr. vai atender ao pedido de Gustavo Fruet para suspender a licitaĂ§Ă£o do metrĂ´?
Temos de conversar, tem de ver a opiniĂ£o do governo federal. Se o projeto estiver pronto, Ă© uma coisa, pois acho que Ă© justo que quem batalhou e viabilizou os recursos faça a licitaĂ§Ă£o. Cabe ao prefeito eleito cancelar a licitaĂ§Ă£o, se achar que Ă© conveniente. Mas acho que nĂ£o vai chegar a esse ponto. HĂ¡ momentos de diĂ¡logo. O que nĂ£o pode Ă© perder os recursos da obra [R$ 1 bilhĂ£o repassados pela UniĂ£o a fundo perdido]. Todo mundo Ă© favorĂ¡vel ao projeto do metrĂ´; isso vai impulsionar um grande desenvolvimento para o sul da cidade. Hoje o modal terĂ¡ uma capacidade para 450 mil passageiros, mas no futuro poderĂ¡ chegar a 1 milhĂ£o de passageiros. Muita gente Ă© contra, quer defender o modelo atual. Eu sou das pessoas que mais defende o modelo atual. Se nĂ£o defendesse, nĂ£o estaria com o LigeirĂ£o, com o Ă´nibus hĂbrido elĂ©trico, com o desalinhamento das estações-tubo do Santa CĂ¢ndida atĂ© Praça do JapĂ£o. JĂ¡ existe a proposta de fazer o LigeirĂ£o CentenĂ¡rio-Campo Comprido e atĂ© de colocĂ¡-lo em todos os eixos [de transporte]. Mas pensar no metrĂ´ Ă© pensar daqui 40, 50 anos. NĂ£o Ă© um projeto para 4 anos.
Mas o sr. concorda em deixar o assunto em suspenso pelos prĂ³ximos dois meses?
Vou conversar com o governo federal, que Ă© um parceiro importante. Tudo que estĂ¡ modelado, viabilizado, Ă© em cima de um projeto que estĂ¡ sendo discutido hĂ¡ trĂªs anos. EntĂ£o entendo que, se for recomeçar o projeto, provavelmente serĂ¡ perdido dinheiro ou nĂ£o serĂ¡ suficiente para outro projeto. Fazer outra linha [de Ă´nibus para substituir o metrĂ´], como o Inter 2, por exemplo, Ă© totalmente inviĂ¡vel. Se somar os passageiros do Interbairros e do Ligeirinho Inter 2, chega a 150 mil passageiros.
O sr. aposta numa grande projeĂ§Ă£o do PSB?
Elegemos seis governadores [em 2010], foi um excelente resultado. Agora, na eleiĂ§Ă£o municipal, consolidamos o partido na RegiĂ£o Sul – com exceĂ§Ă£o de Curitiba, que foi lamentĂ¡vel para nĂ³s perdermos a eleiĂ§Ă£o por 4 mil e poucos votos. Mas o projeto nacional consolidou o partido [o PSB elegeu 5 prefeitos de capitais].
Com a vitĂ³ria do PSB sobre vĂ¡rios candidatos do PT nas eleições municipais, hĂ¡ possibilidade de o partido se aproximar mais do PSDB? Ou a legenda trilharĂ¡ caminho prĂ³prio?
O PSB nunca foi sublegenda do PT. Fez parte da chapa que elegeu a presidente Dilma. Por enquanto, continua fazendo parte dessa base, sem nenhum tipo de mudança.
O sr. guarda alguma mĂ¡goa de lideranças polĂticas ou de partidos pela sua campanha?
EleiĂ§Ă£o, quando a gente ganha, Ă© todo mundo que ganha. E, quando perde, Ă© o candidato. Nesse caso, quem perdeu fui eu. NĂ£o hĂ¡ como mudar isso. VocĂª pode achar um monte de motivos para explicar por que perdemos a eleiĂ§Ă£o, mas nada muda o resultado. EntĂ£o nĂ£o adianta olhar para o passado, temos que olhar para o futuro.
Vai continuar caminhando no futuro com o mesmo grupo polĂtico?
Eu tenho um respeito muito grande pelo governador Beto Richa. Ele Ă© minha principal liderança aqui no ParanĂ¡. Nacionalmente, tenho um partido que admiro muito, com um presidente que Ă© um grande lĂder nacional, o Eduardo Campos [governador de Pernambuco]. As coisas serĂ£o feitas de forma combinada. (GP)