terça-feira, 7 de maio de 2013

Ata da reunião da Comissão Estadual da Verdade do Estado do Paraná ocorrida no dia 26/04/2013


Reunião do dia 26/04/2013

No vigésimo sexto dia do mês de abril do ano de 2013 às 9 horas da manhã, no Palácio das Araucárias, Rua Jacy Loureiro de Campos s/nº – Centro Cívico, nesta Capital, foi dado início à Reunião da Comissão Estadual da Verdade do Estado do Paraná. Fizeram-se presentes os membros Ivete Maria Caribé da Rocha, Márcio Mauri Kieller Gonçalves, Neide de Azevedo Lima, Pedro Rodolfo Bodê de Moraes, e Olympio de Sá Sotto Maior Neto, assim como o Secretário Executivo – Dr. José Antônio Peres Gediel – e os convidados e colaboradores Carlos Molina (COHAPAR), Melina G. Fachin (Comissão da Verdade da OAB-PR), Carlos Molina (COHAPAR), Raquel Osowski e Juliana de Almeida Furlan (Ministério Público do Estado do Paraná), Diego Coletti Oliva e Samara Feitosa (UFPR), Samira Tomé (Casa Latino-americana), Schirle Margaret dos Reis Branco (Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Direitos Humanos do Ministério Público do Estado do Paraná), Elísio Marques (Arquivo Manoel Joaquim Corrêa), Mara de Carli (Assessoria de imprensa da Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos), Wilson Previdi (PCB), Maria Aparecida Blanco (Tribunal de Justiça do Estado do Paraná) e Demétria Filippidis (depoente).
Após as devidas apresentações, o Coordenador da Comissão Estadual da Verdade dá início à reunião, partindo logo ao primeiro ponto da pauta, qual seja, a aprovação da ata. A aprovação fica postergada devido ao pedido de retificação formulada pela Dr. Schirle Branco. Já no segundo ponto – discussão do art. 20, inciso I do Regimento Interno, que trata da periodicidade das reuniões da CEV – fica decidido, de forma unânime, que as reuniões ordinárias serão quinzenais, sem prejuízo da possibilidade de realização de reuniões extraordinárias, quando preciso, conforme inciso II do art. 20 do Regimento Interno. Os membros ainda decidem que, ao menos neste início dos trabalhos da CEV, até decisão diversa, haja uma reunião extraordinária a cada semana carente de reunião ordinária, de forma que as reuniões ocorram semanalmente. Já quanto ao Ofício 004/CEV, que encaminha o Regimento Interno à Secretária de Estado Maria Tereza Uille Gomes, os membros aprovam a redação com a retificação de que o ofício não solicitará aprovação do Regimento Interno, mas tão somente dará a ciência do mesmo. Já no próximo ponto da pauta (aprovação e destinação do Ofício 005/CEV, que trata do caso trazido pela Dra. Ivete na última reunião, no qual o Superior Tribunal Militar – STM – negou vistas aos autos de sua cliente, a Sra. Tereza Urban), a Dra. Ivete sugere que o ofício seja mandado não apenas ao STM, mas a diversos órgãos que poderiam auxiliar na resolução do caso, como a Secretaria  Nacional de Direitos Humanos.  Ademais, fica deliberado que esta discussão será retomada na próxima reunião, após a Dra. Ivete, que se propôs a retificar alguns pontos do ofício em pauta, o fizer. Assim, o Coordenador da CEV parte aos encaminhamentos dos casos “Tereza Urban”, “Zuleika” e “Demétria”. O Dr. Márcio Mauri Kieller Gonçalves faz a proposta de analisar o primeiro caso de maneira conjunta, a fim de estabelecer um padrão de pesquisas a servir de exemplo às próximas.  Contudo, o Coordenador da CEV e os demais membros presentes, devido à dificuldade de manter um trabalho conjunto, sugere ao Dr. Márcio que elabore o roteiro padrão a ser seguido. Após este diálogo, o Dr. Olympio, sem oposição, se oferece a fazer a relatoria do “caso Zuleika”. Já sobre o “caso Demétria”, o Secretário-executivo da CEV, Dr. José Antônio Peres Gediel, se propôs a realizar, juntamente com o estagiário da SEJU Gustavo Henrique Fávero, uma pesquisa inicial. Os membros aceitam, e assim fica decidido. Por outro lado, a relatoria do caso de Tereza Urban fica sob responsabilidade da Dra. Ivete, que menciona a grande contribuição que exercerá a obra da própria jornalista Teresa Urban, “Ditadura Abaixo”. Encaminhados estes casos, o Dr. Márcio aproveita o momento para distribuir aos membros e convidados da CEV o  livro “80 Anos: A História do Sindicato dos Bancários de Curitiba e Região, Suas Lutas e Conquistas”, que serve como uma importante fonte de informações acerca da repressão no período da Ditadura Militar. Nisto, os membros iniciam discussão sobre a criação de um rol indicativo de obras a serem consultadas em auxílio às atividades da CEV, no que o Dr. Pedro Bodê indica duas obras adquiridas por ele recentemente, que tratam sobre depoimentos de agentes da repressão. Finalizadas estas observações, o Coordenador da CEV concede a palavra à Dra. Melina Fachin, que apresenta a Minuta de Decreto elaborada pelo Dr. Luiz Edson Fachin, a qual visa modificar os Decretos Estaduais trazidos ao conhecimento da CEV pelo Sr. Molina e que impossibilitariam o acesso ao Arquivo Público de maneira coletiva. Neste ponto, antes de ser discutida a Minuta de Decreto, a Sra. Demétria Filippidis, com a palavra expõe seu caso, afirmando que funcionários do Arquivo Público apagaram partes dos documentos que traziam informações sobre os agentes que exerceram a dura perseguição sofrida por sua família na época ditatorial. Com essa informação, o Secretário-executivo sugere que a CEV emita ofício ao Diretor do Arquivo Público e ao Diretor do Instituto de Identificação do Paraná, convidando-os a participar da próxima reunião da CEV, a fim de estabelecer uma parceria, de tal forma que casos como o mencionado pela Sra. Demétria  não voltem a ocorrer. Acatada esta proposta, os membros da CEV discutem a Minuta de Decreto exposta pela Dra. Melina Fachin, aprovando-a, de forma unânime, e deliberando no sentido de remetê-la à Secretária de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, para os devidos encaminhamentos. Decidido neste sentido, o Dr. Olympio aproveita a oportunidade para expôr Minuta de Termo de Cooperação, a ser estabelecido com a Comissão Nacional da Verdade (CNV), a exemplo do que já ocorreu com a Comissão da Verdade da OAB/PR e com o Fórum Paranaense pelo Resgate da Verdade, Memória e Justiça, da UFPR. Após discussão, fica decidido que será encaminhado ofício à CNV, propondo a realização do Termo de Cooperação. Com a palavra, a Dra. Ivete informa a todos que participará de reunião com todas as Comissões Estaduais da Verdade, entidades ligadas à defesa de Direitos Humanos e a Comissão Nacional da Verdade em São Paulo, dias 27 e 28 de abril. Para o próximo ponto da pauta (discussão com o Sr. Faxina acerca da colaboração da mídia com a CEV), o Sr. Faxina não pôde se fazer presente, mas encaminhou a Sra. Mara, Assessora de Imprensa da SEJU, para substituí-lo neste debate. Após tomar ciência do trabalho desta Comissão, a Sra. Mara informou que irá participar de reunião com a Secretaria de Estado da Comunicação Social, para verificar a possibilidade de contratação de empresa para a elaboração de registro e divulgação dos trabalhos da CEV. O Dr. Olympio, por outro lado, ressaltou que seria possível a realização deste trabalho sem contratação, de forma gratuita pela Faculdade de Jornalismo da UNIBRASIL. Em seguida, a palavra foi concedida ao Sr. Wilson Previdi, militante do PCB, que se diz compromissado com a CEV para pesquisar acerca do caso do Professor Raimundo, que foi morto no começo da década de 50, sob circunstâncias duvidosas, sendo seu corpo encontrado no “Véu da Noiva”. Quanto à questão da divulgação dos materiais elaborados pela CEV, os presentes se mostram preocupados em relação à edição das entrevistas, e ressaltam o fato de que, no material editado para a publicação, não deve haver distorção ou manipulação do trabalho integral, que será devidamente guardado. Em relação à contratação da produtora, a Sra. Mara esclarece que precisa ter uma ideia de quantos depoimentos teriam que ser gravados, no que a Comissão afirma que serão, no mínimo, 50 depoimentos até o término dos trabalhos. Sobre o “caso Demétria”, o Dr. Pedro Bodê afirma que a CEV entrará em contato para marcar a data do depoimento. Sobre o “caso Zuleika”, por outro lado, o Dr. Olympio diz que já colheu material, inclusive já realizando oitiva. Já no que se refere à inclusão de demais nomes a serem ouvidos pela CEV, o Coordenador solicita que sejam enviados à Secretaria-executiva, para o devido encaminhamento. Dito isto, o Dr. Pedro Bodê, ao lembrar que não houve retorno do Ofício 003/CEV (que pede ao Secretário de Estado da Segurança Pública a abertura dos Arquivos da Polícia Militar), afirma ser imprescindível a cobrança das respostas, visto o exíguo prazo desta Comissão. Exaurida a pauta, o Coordenador da CEV dá espaço para os informes gerais. Com a palavra, o Dr. Márcio Kieller cita a promoção, por parte do Diretório Central dos Estudantes da UEM, da modificação do nome  da Praça 31 de Março, em Maringá, exemplo a ser seguido por esta Comissão. O Dr. Olympio, por sua vez, informa que, se todos estiverem de acordo, poderá verificar a disponibilidade da sala de reuniões do Ministério Público para sediar a próxima reunião da Comissão. Sobre isto, todos se manifestam favoravelmente. O Secretário-executivo, Dr. Gediel, também faz seus informes: há uma lista de servidores do Estado que estariam dispostos a vir trabalhar junto à CEV, independente de cargo ou benefícios; informa também que o protocolo referente à estrutura para eventuais viagens que os membros da CEV venham a realizar já se encontra com a Secretária. Assim, sugere aos membros da CEV que realizem reunião com a Secretária de Estado Maria Tereza para tratar destes assuntos. Ao ser indagado pelo Dr. Pedro Bodê se há alguma sugestão de data, o Dr. Gediel se compromete a verificar a agenda da Secretária e avisar os membros da CEV. A respeito dos funcionários que se dispõem a trabalhar com a CEV, a Dra. Ivete cita o nome da Sra. Margarida, funcionária da Fundação Cultural que estaria interessada. Sobre isto, o Dr. Márcio também informa que, assim como a Dra. Ivete, possui algumas sugestões de nomes que podem ser úteis à CEV. Ademais, a próxima reunião fica marcada para o dia 09 de maio de 2013, às 9 horas da manhã, local a ser confirmado. Assim, o Coordenador da CEV, Dr. Pedro Bodê, declara encerrada a reunião.


 Ivete Maria Caribé da Rocha


Luiz Edson Fachin
Márcio Mauri Kieller Gonçalves


Neide de Azevedo Lima
Olympio de Sá Sotto Maior Neto
Pedro Rodolfo Bodê de Moraes


Ney Braga conspirou contra Jango em 1964, diz general da reserva


“O Ney (Braga) não só era favorável (ao golpe) como integrava o grupo de conspiradores. Ele disse para mim: Ítalo, eu preciso governar o estado e não posso me expor. Mas você tem o meu aval para fazer o que tem de ser feito.” 

Ítalo Conti



Embora o Paraná tenha tido papel secundário na implantação da ditadura militar no país, o governo paranaense apoiou silenciosamente, desde 1962, os militares que planejavam depor o presidente da República João Goulart. É isso que afirma, em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, o general da reserva Ítalo Conti, secretário de Segurança de Ney Braga, o governador do Paraná entre 1961 e 1965.
Quando o golpe foi deflagrado, há exatos 45 anos, em 31 de março de 1964, Ney Braga acabava de voltar de Belo Horizonte de uma reunião que havia tido com o governador de Minas Gerais, José de Magalhães Pinto. Segundo Conti, o governador havia ido a Minas Gerais conversar sobre o golpe que estava na iminência de acontecer. Foi em território mineiro (ver quadro) que começou o movimento militar para depor Jango.
“O Ney não só era favorável (ao golpe) como integrava o grupo de conspiradores”, afirma Ítalo Conti. “Ele disse para mim: Ítalo, eu preciso governar o estado e não posso me expor. Mas você tem o meu aval para fazer o que tem de ser feito.” Segundo Conti, o governador paranaense não quis se envolver publicamente para não prejudicar a administração do estado.
O ex-secretário de Segurança afirma que, desde 1962, Ney Braga o havia incumbido de preparar um batalhão da Polícia Militar que pudesse ser usado no momento necessário, já que o alto comando do Exército no Paraná era ligado a Jango. “Havia tenentes e capitães do Exército que estavam do nosso lado. Mas não sabíamos como eles iriam se comportar quando houvesse a deposição de João Goulart.”
Quando o golpe “estourou”, porém, Ney Braga, que era coronel do Exército, foi um dos primeiros a apoiar a deposição do então presidente. Já no 1º de abril, ele fez um pronunciamento favorável à deposição de João Goulart e à tomada do poder pelos militares.
Sem luta
Sem disparar um único tiro, os militares golpistas rapidamente conseguiram dominar a situação no Paraná. Conti lembra que a pessoa que poderia frustrar os militares revoltosos era o general Silvino Castor da Nóbrega, comandante da 5ª Região Militar no Paraná, que apoiava Jango.
No dia 31 de março de 1964, o general voltava para Curitiba em um avião da Força Aérea Brasileira de uma reunião com o chefe da Casa Militar, general Assis Brasil, que tentava conter os militares golpistas. Segundo o ex-secretário de Segurança, o general teve sua rota de vôo alterada para não aterrissar em Curitiba. “O piloto do avião recebeu ordens de um tenente que era ligado a nós, que havia recebido ordens para levar o comandante (Silvino da Nóbrega) a Porto Alegre.” Conti afirma que foi dito a Silvino da Nóbrega que a neblina impedia a aterrissagem. “Quando ele chegou no Rio Grande, já estava tudo dominado.”
O pesquisador José Carlos Dutra, que estudou o golpe militar no Paraná, afirma que o general Silvino da Nóbrega tentou organizar uma resistência dando ordens aos batalhões de Blumenau e Joinville para que se deslocassem na direção de São Paulo. “Tal ordem não foi cumprida e o general foi destituído do comando, acusado de apoiar os comunistas. Respondeu a inquérito policial-militar e, posteriormente, foi transferido para a reserva remunerada”, diz Dutra, em um de seus estudos.
Segundo ele, apesar de o Paraná não estar no centro dos acontecimentos, por pouco não houve luta armada no estado. “Devido aos fatos relacionados ao comandante da 5ª Região Militar (...), o comandante do 2º Exército determinou o deslocamento de tropas paulistas em direção a Curitiba pela Rodovia Régis Bittencourt (BR-116), prevendo a possibilidade de confronto com as tropas do general Silvino e considerando, também, ser passagem obrigatória de tropas que poderiam vir do Rio Grande do Sul”, afirma Dutra. O conflito, porém, não ocorreu.
Sem resistência
Ao tomar o poder, os militares conseguiram desestruturar os movimentos de esquerda. “Houve uma debandada geral”, afirma o jornalista paranaense Milton Ivan Heller, que militou no Partido Comunista até 1959. “No dia do golpe, o clima era de bastante apreensão, porque as emissoras de rádio e jornais traziam relatos, faziam uma campanha sórdida. Aquilo criou um clima de histeria.” Segundo Heller, somente mais tarde é que a esquerda conseguiu se reestruturar, principalmente a partir de 1968, quando o regime militar tornou-se ainda mais rígido, com a suspensão dos direitos civis por meio do Ato Institucional Número 5 (AI-5).
“Quando o golpe aconteceu, a primeira sensação era de que era mentira. Ficamos perplexos, porque como estudante secundarista acreditava que estávamos avançando com o governo de Jango, em direção a um processo de libertação”, afirma o atual procurador-geral do estado do Paraná, Carlos Frederico Marés, que militava no movimento estudantil na época. “A segunda reação foi de resistência. Teríamos de buscar uma maneira de nos livrar do regime militar. E a terceira sensação foi a de medo, do que os militares podiam fazer no poder.”
Quatro anos depois, Marés, como presidente do Diretório Central dos Estudantes da UFPR, estaria envolvido em um dos episódios mais marcantes da luta contra a ditadura militar no Paraná: a ocupação da UFPR por estudantes que protestavam contra a cobrança de mensalidades. Esse episódio ficou marcado para a posteridade por uma foto de um jovem que, com um estilingue, enfrenta militares a cavalo. A imagem rendeu ao fotógrafo Edison Jansen, do jornal O Estado do Paraná, o Prêmio Esso – a maior premiação jornalística do país.
O jovem da foto era o estudante de Medicina José Ferreira Lopes, o Doutor Zequinha, que a partir de 1968, com o AI-5 teve de ir para a clandestinidade. “Quando o golpe aconteceu, eu estava em São Paulo, como estudante secundarista. A sensação foi de impotência, porque não houve reação contrária.” (Gazeta do Povo)

Mais sobre o general Ítalo Conti

Repressão aos conflitos de terras no Sudoeste e proximidade com o alto comando da ditadura: 

"Ney Braga, liderando o grupo de políticos renovadores que chegou ao poder em 1960, convocou Ítalo Conti para a vida pública, na recém-criada Secretaria de Segurança Pública. Nela, ele se viu mediando conflitos e auxiliando de maneira decisiva a resolver os conflitos de terra que convulsionavam o interior paranaense. A pacificação do Sudoeste, com a criação do Grupo Executivo das Terras do Sudoeste do Paraná (Getsop) e a atuação de Brasilio Marques Sobrinho (outro militar protagonista da história moderna paranaense) à frente do DGTC e da Secretaria de Segurança Pública comandada por Ítalo Conti são dos maiores feitos sociopolíticos de que se tem notícia em nosso país. Onde ontem se instalava um governo provisório e revoltoso encontra-se hoje a civilização pujante da região de Pato Branco e de Francisco Beltrão.
Os primeiros anos da década de 60 foram marcados pela renúncia do presidente Janio Quadros, a posse contestada de João Goulart, a crise político-militar que levou ao movimento militar de março de 1964. No círculo central do poder estadual e transitando com desenvoltura no governo central estava Ítalo Conti. E, nos estertores do regime militar, o presidente Figueiredo, que havia sido seu contemporâneo na Escola Militar de Realengo, o chamava seguidamente a Brasilia para conversar e desabafar."
Belmiro Valverde Jobim Castor/Gazeta do Povo

Atividades Profissionais e Cargos Públicos do general Ítalo Conti:

Aspirante de Arma, 1937; Segundo-Tenente, 1938; Primeiro-Tenente, 1940; Capitão, 1944; Major, 1951; Tenente-Coronel, 1957; General-de-divisão; Secretário de Segurança Pública, PR,1961-1966; Secretário do Trabalho e Assistência Social, PR,1966-1969; Chefe da Casa Civil, 1966, PR.

Como deputado a serviço da ditadura:

Deputado Federal, 1971-1975, PR, ARENA. Dt. Posse: 01/02/1971; Deputado Federal, 1975-1979, PR, ARENA. Dt. Posse: 01/02/1975; Deputado Federal, 1979-1983, PR, PDS. Dt. Posse: 01/02/1979; Deputado Federal, 1983-1987, PR, PDS. Dt. Posse: 01/02/1983.

* Aos 97 anos ele faleceu em 07/11/2012.

Entrevista com três generais sobre o golpe e o Paraná:


O GOLPE NA OPINIÃO DOS MILITARES

Se a pesquisa em fontes secundárias é importante, para o estudioso de qualquer tema nada substitui a busca das informações diretamente nas fontes primárias. Daí se pode extrair a "matéria-prima" que pode ser, depois, trabalhada, analisada e interpretada pela Sociologia Política.

Desse modo, a seguir serão apresentadas as opiniões de alguns militares que participaram ativamente do golpe militar de 1964, pois ocupavam cargos importantes no Paraná. Foram entrevistados os generais: Raymundo Negrão Torres, oficial combatente da arma de artilharia, hoje na reserva remunerada e na época da revolução Major; fazia parte do Estado-Maior do Comando da 5ª Região Militar e 5ª Divisão de Infantaria, além de ocupar o importante cargo de Chefe da Seção de Informações; Ítalo Conti, ex-combatente da 2ª Guerra Mundial, em que lutou na Itália como integrante da Força Expedicionária Brasileira (FEB), no posto de Capitão; à época da revolução possuía o posto de Coronel e ocupava o cargo de Secretário de Segurança do Estado do Paraná; por fim, Justo de Moraes, que possuía o posto de Capitão da arma de artilharia, ocupava o cargo de Ajudante-Geral (responsável pela área de pessoal) do Comando da Artilharia Divisionária, com sede em Curitiba. A seguir transcrevem-se as entrevistas concedidas por esses oficiais ao autor.
* * *
Pergunta: O que ocorreu no Brasil, no dia 31 de março de 1964? Na opinião do senhor foi uma revolução, um golpe, uma insurreição ou apenas uma intervenção legal do Exército, no cumprimento de sua missão constitucional? O senhor pode justificar?

General Negrão: O que ocorreu em 31 de março de 1964 foi um contragolpe, pois as Forças Armadas – atentas à sua missão constitucional de defesa das instituições democráticas – saíram dos quadros da legalidade, em um movimento cívico-militar, para abortar uma situação que se desenhava claramente como um golpe da esquerda mancomunada com a autoridade legal que se estava tornando ilegítima pelas atitudes tomadas. Ver o capítulo 1, "A marcha da insensatez", em meu livro Nos "porões" da ditadura [TORRES, 1998, p. 24-28].

Gal. Ítalo: Em 1964, o que ocorreu foi uma ação preventiva, com as características de um golpe de Estado.

Gal. Justo: Na minha opinião o que ocorreu foi uma contra-revolução. O que aconteceu, na verdade, foi uma intervenção das Forças Armadas com maciço apoio da sociedade civil, principalmente das mulheres e da Igreja, para evitar que a esquerda tomasse conta do poder. Como justificativa principal cito o fato de não ter havido uma preparação meticulosa e uma liderança única que coordenasse a ação dos diversos grupos que conspiravam contra o governo do sr. Goulart.


P.: Existem algumas teorias sobre as razões que levaram os militares a intervir. Dentre elas destacam-se: iminência de uma revolução socialista; caos econômico e social; desestruturação das Forças Armadas; quebra da hierarquia e da disciplina. Qual a opinião do senhor a respeito dessas teorias?

Gal. Negrão: Não são teorias, são razões baseadas em fatos documentados com depoimentos posteriores, inclusive de escritores comunistas, como Jacob Gorender em seu livro Combate nas trevas. Dessas razões, a mais forte e que justificou a quase unanimidade [militar], foi a tentativa de desestabilização das Forças Armadas pela quebra da hierarquia e da disciplina. Ver o capítulo "Porque Jango caiu" em Nos "porões" [idem, p. 30-36].

Gal. Ítalo: As razões que levaram ao golpe foram as decisões do governo João Goulart, incapaz de evitar certos acontecimentos que convenceram grande parte das Forças Armadas de que um golpe institucional estava sendo preparado para a implantação de uma república sindicalista – o que seria a preliminar da tomada do poder pelo Partido Comunista. O comportamento do Presidente, confraternizando com sargentos e marinheiros em atos de total indisciplina, revelava uma violenta quebra da hierarquia militar.

O episódio do Almirante Braga sendo carregado efusivamente, por marinheiros sublevados, sendo ele o Comandante dos Fuzileiros Navais, convenceu até os que repudiavam o movimento – pois nele só viam aspectos políticos –, de que alguma atitude devia ser tomada, para pôr um paradeiro na anarquia reinante.
Gal. Justo: Considero que todas as razões citadas contribuíram para a intervenção militar. No entanto, o motivo que levou a maioria dos militares a participarem do movimento de 31 de março de 1964 foi a quebra da hierarquia e da disciplina, aliada ao clamor popular.

P.: Quando começou, de fato, a revolução (golpe, insurreição, intervenção) de 1964? Houve planejamento e preparação – isso era discutido nos quartéis – ou apenas o alto escalão das Forças Armadas é que tinha conhecimento das ações?

Gal. Negrão: Ver o "Prólogo" de meu livro 1964 – uma revolução perdida [TORRES, 2002, p. 1-4]. Alguns setores começaram a conspirar muito antes, logo depois do sucesso do Movimento da Legalidade e do plebiscito de janeiro de 1963. O alto escalão das Forças Armadas era governista e assim aliado de Jango. Havia alguns generais entre os conspiradores, mas estavam em funções secundárias.

Gal. Ítalo: O movimento de 1964 teve antecedentes longínquos. Suas raízes estão em 1935, ano da Intentona Comunista que deixou marcas profundas de repulsa à ideologia em várias gerações do Exército. Atingiu, principalmente os cadetes da Escola Militar do Realengo dos anos de 1935, 1936 e 1937. A crueldade dos comunistas, assassinando companheiros militares, alguns até dormindo, como aconteceu na Escola de Aviação no Campo dos Afonsos no Rio de Janeiro [capital], atingiu o cerne daquela mocidade. Acrescente-se a isso a doutrinação realizada pelo Estado Novo, sob a ditadura de Getúlio Vargas.

Nunca houve uma convenção nacional para a preparação do movimento. Havia grupos em várias regiões que articulavam, mas nunca se chegando a conclusões sobre de que forma poderíamos iniciar o movimento. Muitas idéias surgiam, inclusive daqueles que achavam que o melhor era esperar uma decisão para ver como se comportaria a sociedade.

Como participante da FEB, acredito que a geração que deu os capitães para a campanha da Itália veio com um pensamento democrático muito acentuado. Isso influenciou os acontecimentos. Como Secretário de Segurança eu participava de reuniões com militares envolvidos no movimento, naturalmente com as devidas cautelas. Não eram muitos os mais comprometidos; acredito que o núcleo não passava de dez militares, entre tropa e Estado Maior. Participei de encontros com o General Cordeiro de Farias e o General Itiberê Gouveia do Amaral e alguns coronéis subscritores do famoso Manifesto dos Coronéis de 1954.

Gal. Justo: A preparação começou a intensificar-se após a renúncia de Jânio Quadros e a posse de João Goulart na Presidência da República. Pequenos grupos de civis e militares conspiravam em diversas regiões do país. Não percebi a existência de planejamentos e preparações centralizadas. Faziam-se alguns comentários sobre a situação política, mas não com intensidade e freqüência que pudessem prejudicar as atividades militares.

P.: O senhor foi apanhado de surpresa? Qual o nível de informações que possuía acerca dos acontecimentos daquela época?

Gal. Negrão: De certa forma, sim. Eu era o E-2 5 da 5ª RM/DI e tinha conhecimento da pregação esquerdista do General Crisanto e do alertamento, em sentido inverso, do General Dario em suas visitas às unidades [militares] contra as ações do governo. Ver meu relato em Meninos, eu "também" vi! [TORRES, 1999].

Gal. Ítalo: Eu, pessoalmente, fui surpreendido pelo início do movimento. Apesar dos preparativos, acreditava que as próximas eleições modificariam o quadro e não haveria necessidade de apelar para as armas. Isso porque as campanhas civis tinham como líderes pessoas de destaque como Carlos Lacerda e Magalhães Pinto.
As informações que nos chegaram vinham por intermédio de emissários, algumas desencontradas; entre esses emissários recebi o então Coronel João Batista de Figueiredo, depois Presidente da República.

 P.:Qual foi a mensagem do Gal. Figueiredo? 

Gal. Ítalo: Apresentou-me ele um panorama geral da situação do país e a adesão ao movimento.

Gal. Justo: Poucos militares foram apanhados inteiramente de surpresa. No dia 13 de março de 1964 foi realizado o comício da Praça da República, ao lado do Ministério da Guerra; no dia 25 de março ocorreu a rebelião dos marinheiros no Rio de Janeiro; no dia 30 de março, uma reunião de sargentos, no Automóvel Clube do Rio de Janeiro, com a participação do Presidente da República, ministros militares e conhecidos líderes comunistas. Espantados com o rápido desenrolar dos acontecimentos, com o crescimento das esquerdas, com a quebra da disciplina e empurrados pelo povo, a quase totalidade dos militares sentiu que havia chegado a hora de fazer alguma coisa para impedir a ruptura violenta da ordem e a implantação de um governo comunista no país.

P.: Havia confiança nos chefes militares? Houve adesão total ou ocorreram dissidências? Qual foi o tratamento dado aos dissidentes?

Gal. Negrão: Na 5ª RM houve praticamente unanimidade. No QG [quartel-general] só dois oficiais declaram-se contra e foram presos. O comandante e o sub-comandante do CPOR de Curitiba também se declararam e foram presos. Foram reformados em conseqüência do AI-1 [Ato Institucional n. 1]. Nesse particular, a atitude de Getúlio Vargas em 1930 foi mais inteligente, pois tentou atrair os que não apoiaram a revolução – e a maioria do Exército ficou nessa posição – e só com o Estado Novo [em 1937] aplicou punições aos dissidentes da época. Em 1964, não houve distinção entre os que não se solidarizaram com o movimento por convicção legalista e os que eram mancomunados com a baderna ou eram mesmo comunistas. Assim, houve alguns casos de injustiça nas punições.

Gal. Ítalo: Havia confiança em alguns altos chefes militares. Castello Branco, por exemplo, não conspirava, mas tínhamos certeza de que na hora decisiva estaria do nosso lado. A adesão não foi total no primeiro momento. No Rio Grande do Sul, por pouco não houve um choque de conseqüências imprevisíveis para o movimento. A atitude do General Pope Figueiredo permitiu ao General Ladário Teles, mandado pelo Presidente Goulart, que assumisse o Comando do IIIº Exército.

Após o movimento todos aqueles militares que, por atos ou palavras, tentaram impedir o movimento, foram cassados, com base no Ato Institucional n. 1. Posicionei-me desde o primeiro momento favorável à revolução, apesar de achar que poderia haver uma saída política para a crise.

Gal. Justo: Os principais chefes militares da revolução gozavam de grande prestígio junto à tropa. No Paraná a adesão foi quase total. Os poucos oficiais e sargentos que não concordavam com o movimento apresentaram-se no QG da 5ª Região Militar para ficarem presos. A maioria deles foi mandada de volta para casa. Os que continuaram presos foram tratados com camaradagem e de acordo com as normas regulamentares.

P.: Como era o clima nos quartéis? Havia indisciplina, ocorreram insubordinações, rebeliões ou motins?

Gal. Negrão: Não, em decorrência da confiança nos chefes. Os poucos que se dispunham a reagir ficaram sem uma liderança.

Gal. Ítalo: Nos quartéis, em alguns principalmente no Rio de Janeiro, o clima era tenso. Na maioria era de vigilância recíproca. A indisciplina, que eu saiba, foi somente em Brasília, com um motim de sargentos da Aeronáutica, que foi facilmente controlado.

Gal. Justo: Nos quartéis da 5ª Região Militar as atividades administrativas e de instrução da tropa corriam normalmente, com inteiro respeito às normas em vigor. A única organização militar que fugia a esse padrão era o antigo CPOR de Curitiba. Seu Comandante pertencia a um grupo de oficiais que apoiava inteiramente a política do Presidente da República. Em conseqüência, havia constantes debates políticos entre os oficiais que lá serviam e muita divergência de opiniões. Nenhum de seus integrantes, no entanto, chegou a pegar em armas para combater a revolução.

P.: O peso intelectual dos oficiais das Forças Armadas nas decisões políticas em 1964 era maior do que hoje? O senhor pode justificar?

Gal. Negrão: Não entendi bem a pergunta. O que se entende por "peso intelectual"? – Refiro-me ao poder de influenciar nas decisões políticas. – Em 1964 e mesmo em seus antecedentes longínquos, havia um grande envolvimento político dos militares, mas as intervenções eram temporárias e logo havia o retraimento dos militares até a próxima crise. A partir de 1964 e até o fim do governo Figueiredo, as decisões políticas, certas ou erradas, foram dos presidentes-generais. O Presidente Castello tinha uma correta percepção dos riscos desse longo envolvimento e tentou evitá-lo, mas foi obstado pelos radicais e pelos políticos fardados. Hoje isso não mais existe e a criação do Ministério da Defesa – idéia reformista que Castello não pôde concretizar – facilita isso e deixa bem claro quem são os responsáveis pelas dificuldades e desacertos atuais. O Exército voltou a ser o "grande mudo", embora os revanchistas ainda lhe atribuam responsabilidades pretéritas que não têm cabimento.

Gal. Ítalo: O peso intelectual dos oficiais do Exército era muito grande nas decisões políticas, pois muitos ocupavam cargos públicos e na legislatura. Hoje o peso é nenhum, pois estão voltados exclusivamente para a sua profissão. Não são nem ouvidos para as decisões importantes como naquela época.

Gal. Justo: Na minha opinião, sim. Naquela época os principais generais da ativa e da reserva remunerada pertenciam a uma geração que tivera participação significativa na vida política do país. Participaram da chamada "Revolta dos Tenentes" na década de 1920, do movimento que levou Getúlio Vargas ao poder em 1930 e integraram a Força Expedicionária Brasileira. Muitos já haviam exercido cargos de natureza política, inclusive como governadores de importantes estados da Federação. Hoje, devido a imposições regulamentares colocadas em vigor pela própria revolução, os militares estão afastados da política – o que é muito salutar.

P.: Havia crise social, política e econômica (desordens, desabastecimento, caos social) no Paraná antes de 31 de março de 1964? Havia, de fato, o risco de uma iminente e grave perturbação da ordem institucional?

Gal. Negrão: A situação no Paraná era reflexo da situação nacional, como visto nas perguntas 1 e 2. Aqui havia grande agitação nas áreas estudantil e sindical. Havia alguma inquietação no campo, de que a revolta dos posseiros de 1957 fôra um bom exemplo. O Governador Ney Braga era do PDC e contrário politicamente à situação nacional, mas havia em seu governo alguns esquerdistas – os "Ney-boys" – entre eles o vice-Governador Afonso Camargo Neto, Presidente regional do PDC, naquela época fazendo demagogia para agradar a esquerda.

Gal. Ítalo: No Paraná, sob o Governo Ney Braga, tivemos alguns problemas no que diz respeito à posse das terras devolutas. Tudo muito restrito e debelado com energia. Desordem não houve. Não havia risco de perturbação da ordem institucional.

Gal. Justo: Em março de 1964 o Governador do Paraná era o General Ney Braga. Ainda como Major, exercera o cargo de Chefe de Polícia do Estado e em seguida foi eleito Prefeito de Curitiba, oportunidade em que mostrou tratar-se de um político hábil, dinâmico e honesto. Como Governador, vinha atuando com austeridade, modernizando a administração do Paraná e fazendo importantes investimentos, principalmente em estradas, energia elétrica e saneamento básico. Possuía confortável maioria na Assembléia Legislativa e mantinha um relacionamento com as autoridades federais. De um modo geral, a perturbação da ordem, mantida sob controle no Paraná, era ocasionada pelas greves promovidas na área sindical, pela infiltração comunista no meio estudantil e pelas ameaças de uma reforma agrária feita à força.

P.: O senhor poderia descrever o panorama político no Paraná, no início da década de 1960, até 31 de março de 1964?

Gal. Negrão: Em parte respondido no quesito anterior. Como o PCB estava na clandestinidade, seus aderentes militavam em outros partidos, principalmente no PTB. Mas a agitação era feita principalmente nas chamadas "frentes" – hoje seriam as ONGs [organizações não-governamentais] – como demonstro no capítulo "Porque Jango caiu", já citado, e no início do capítulo 4 do outro livro, 1964 – uma revolução perdida [TORRES, 2002, p. 29-36].

Gal. Ítalo: O panorama político do Paraná era influenciado pelo impacto da vitória de Ney Braga quebrando uma hegemonia partidária que vinha desde 1946. O Governador enfrentou muitos problemas, principalmente na área administrativa. Sua tarefa foi muito pesada pelo caos que recebeu de seu antecessor. Como exemplo cito o movimento para criar o estado do Paranapanema, tendo Londrina como capital. Em parte esse movimento tinha razão, pois o Norte do Paraná não tinha ligação com a capital, a não ser por rodovia precária, como a Estrada do Cerne.

Havia os conflitos pela posse da terra – não do tipo MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-terra] – mas de capitalistas de São Paulo que conseguiam do governo concessões de grandes áreas de terras devolutas. Ao desalojarem os posseiros de boa-fé, surgiam os conflitos. No que diz respeito a transporte e energia, principalmente, a situação do estado era de dificuldade. Ney teve que criar órgãos importantes para poder agilizar a máquina administrativa.

Gal. Justo: Em março de 1964 eu era um Capitão recém-promovido e tinha a minha atenção voltada mais para os assuntos da área militar. Passados já quarenta anos, não tenho condições de falar com segurança sobre o panorama político e as atividades dos partidos políticos daquela época.

P.: Como era a atividade dos partidos políticos e sindicatos no Paraná até 31 de março de 1964? Após essa data, o que aconteceu?

Gal. Negrão: Tinham toda a liberdade de ação e de opinião. A partir de 31 de março de 1964, houve intervenção em alguns sindicatos, cassações de mandatos de parlamentares comprometidos com a subversão, mas os poderes constituídos continuaram seu funcionamento normal, tendo sido o Paraná um dos estados em que ainda houve eleição direta para Governador em 1965, sendo eleito o candidato governista Paulo Pimentel. A partir de outubro desse ano, com a edição do AI-2, houve a reorganização partidária, com dois partidos só. Para o desdobramento dos acontecimentos ver o capítulo 7 do livro 1964 – uma revolução perdida, "Sementes do AI-5" [TORRES, 2002, p. 47-58].

Gal. Ítalo: Os partidos políticos e os sindicatos tinham uma existência normal. Havia aqueles dominados pelos comunistas, como o dos bancários, que perturbavam um pouco, mas não criavam grandes problemas. Após 1964 houve intervenção em todos os sindicatos e foram nomeados interventores, a maioria militares da reserva remunerada do Exército.

Gal. Justo: Considero respondida na questão anterior.

P.: Como o senhor pode descrever os acontecimentos dos dias 31 de março e 1º de abril de 1964 no Paraná? Houve realmente uma ruptura total da ordem até então vigente?

Gal. Negrão: Após a reunião do Presidente com os sargentos no Automóvel Clube no Rio, sentia-se que algo aconteceria. O que se passou no Paraná procurei mostrar em meu livro de memórias (capítulos 25, 26 e 27) [TORRES, 1999, p. 79-88]. Não houve ruptura da ordem vigente; a Constituição continuou em vigor, os demais poderes continuaram funcionando: a ruptura foi parcial. O Congresso deu posse ao substituto imediato – o Presidente da Câmara de Deputados – até a eleição pelo próprio Congresso do novo Presidente.

Gal. Ítalo: Não houve ruptura da ordem vigente. O Governador Ney Braga manteve sua estrutura normal, tudo funcionando normalmente. Houve sim muito aplauso e manifestação de apoio ao movimento. Aqui no Paraná a transição do governo civil para o governo militar foi tranqüila, não houve resistência.

Gal. Justo: Os acontecimentos de 31 de março e 1º de abril de 1964 transcorreram sem maiores sobressaltos no Paraná. O General Dario Coelho, que respondia pelo Comando da 5ª Região Militar, apoiou o movimento desde as primeiras horas e contou com o apoio da quase totalidade da tropa. O Governador do Estado e as principais autoridades políticas também apoiaram a revolução e passaram a colaborar com os comandantes militares. A grande maioria da população mostrava-se aliviada com a queda do regime então existente e mostrava seu contentamento, publicamente. Os que eram contra o movimento não tiveram, portanto, condições de esboçar qualquer reação.

P.: Como a sociedade e a classe política paranaenses reagiram à revolução? Houve algum tipo de resistência civil?

Gal. Negrão: A reação da maioria foi de apoio, pois todos estavam preocupados com os rumos dos acontecimentos. Não houve reação civil. Pouco depois de empossado, o Presidente Castello esteve no Paraná e foi recebido com grandes demonstrações de apoio pela população, tendo desfilado a pé, acompanhado pelo Governador Ney Braga, pela Rua XV [de Novembro].

Gal. Ítalo: A sociedade civil no Paraná, por suas lideranças empresariais, vinha acompanhando com apreensão o que se passava no âmbito do governo federal. Não houve reação, nem resistência.

Gal. Justo: Eu considero respondida na questão anterior

P.: Ocorreram prisões? O senhor se lembra de pessoas influentes na sociedade e na política que foram presas, na deflagração do golpe?

Gal. Negrão: Ao que eu saiba não houve tais prisões. Como era natural, foram neutralizados aqueles elementos agitadores conhecidos.

Gal. Ítalo: Sim, houve prisões, todas determinadas pelo Exército. 

P.: E a Secretaria Estadual de Segurança? 

Gal. Ítalo: A Secretaria de Segurança, sob o meu comando, efetuava-as e entregava ao Exército. Das pessoas presas julgo as mais importantes o advogado Vieira Neto e o médico Jorge Karam. 

P.:Sob que alegação?

 Gal. Ítalo: A alegação era a de serem simpatizantes do movimento comunista e não concordarem com a revolução.

Gal. Justo: Que eu me recorde, ocorreram poucas prisões e deram-se mais na área sindical. Na área militar lembro-me da prisão do Comandante do CPOR, Coronel Barcelos, que foi submetido a inquérito, transferido para a reserva e em seguida posto em liberdade.

P.: Houve intervenções nos órgãos públicos, sindicatos etc., cassações e exonerações de ocupantes de cargos públicos no Paraná?

Gal. Negrão: Intervenções em sindicatos, sim. Em órgão estaduais desconheço. Em órgãos federais sim. Um órgão que teve sua direção modificada foi a Rede Ferroviária Paraná-Santa Catarina. Outros que estavam em mãos do PTB ou de pessoas envolvidas em agitação tiveram substituídas as direções. Sobre as cassações há muitas publicações; não tenho dados.

Gal. Ítalo: Como já disse, houve intervenção em todos os sindicatos. O mais visado foi o dos bancários, tendo em vista ser o mais influenciado e dominado pelos comunistas.

Gal. Justo: Houve intervenção na maioria dos órgãos públicos federais, institutos de aposentadoria e sindicatos. As autoridades mais ligadas ao governo anterior foram afastadas de seus cargos e alguns poucos foram cassados ou aposentados compulsoriamente.

P.: Houve luta armada no Paraná?

Gal. Negrão: Felizmente, não.

Gal. Ítalo: Não houve luta armada, na acepção da palavra, no Paraná. Não considero a incursão do Coronel Jeferson Cardim como sendo luta armada. Foi um episódio isolado, sendo que no primeiro enfrentamento com as forças legais ele rendeu-se.

Gal. Justo: Não houve luta armada no Paraná, salvo o caso isolado do Coronel Cardim no Sudoeste do Estado, região de Francisco Beltrão. Houve combate em que morreu o Sargento Argemiro de Camargo, das forças regulares.

P.: Houve adesão do governo do estado ao movimento militar?

Gal. Negrão: Sim. O Governador Ney Braga deixou isso registrado em suas memórias.

Gal. Ítalo: O governo Ney Braga aderiu totalmente ao movimento, cumprindo o seu compromisso assumido com os líderes da revolução.

Gal. Justo: Conforme já relatado, o governo do estado aderiu prontamente à revolução.

P.: Como se posicionou a Assembléia Legislativa frente à ruptura da ordem vigente?

Gal. Negrão: Com os naturais protestos dos deputados do PTB e de partidos aliados, aderiu à nova situação. Houve cassações e também não tenho dados.

Gal. Ítalo: A Assembléia Legislativa do Estado do Paraná aguardou com muita expectativa o desdobramento do movimento. Logo após sua eclosão, começaram a ocorrer as cassações de deputados, mesmo aqueles que não eram subversivos, pois eram da linha do governo deposto.

Gal. Justo: A grande maioria dos deputados estaduais concordou com o movimento e aceitou as modificações que ocorreram na área política. Os poucos que discordaram não tiveram capacidade de reagir.

P.: Nos municípios, como se posicionaram os prefeitos e vereadores? Aderiram à revolução ou houve resistência?

Gal. Negrão: Não tenho notícia de reações, a não ser as verbais.

Gal. Ítalo: Nos municípios houve adesão total. Nenhum se posicionando contra, pelo menos em um primeiro momento.

Gal. Justo: A exemplo da Assembléia Legislativa, a quase totalidade dos prefeitos e vereadores aderiu à revolução.

P.: Na opinião do senhor houve arbitrariedades, abuso de poder e descumprimento de direitos constitucionais por parte dos militares, no Paraná?

Gal. Negrão: Certas garantias – como o habeas corpus – foram mantidas até a edição do AI-5, quando foram suspensas para os crimes contra a segurança nacional. Um omelete não se faz sem quebrar os ovos. Após o AI-5 e tendo em vista o recurso ao terrorismo, à guerrilha, aos sequestros e à violência, tivemos uma guerra interna localizada, mas cruenta. Em uma situação dessa, imaginar que não haja desvios de conduta e arbitrariedades é uma ilusão. Todavia, a institucionalização dos alegados abusos, como a tortura e a eliminação sumária de dissidentes, é uma mentira montada pelos que desencadearam a violência e depois reclamaram de alguns de seus efeitos. Os processos dessa época eram julgados em sessões públicas pela Justiça Militar, com direito a ampla defesa e recurso ao Superior Tribunal Militar. Orientados por seus advogados e dada a dificuldade da prova testemunhal, todos os acusados declararam-se vítimas de tortura e que seus depoimentos, mesmo os voluntariamente feitos de próprio punho, foram obtidos sob coação. O problema é que, por culpa dos vencedores que acreditaram na sinceridade e validade da anistia e de início silenciaram, a história dos chamados "anos de chumbo" foi e ainda está sendo escrita pelos derrotados ou por escribas tendenciosos, com grande repercussão na mídia interessada em sensacionalismo lucrativo ou dominada por gente da esquerda.

Gal. Ítalo: Não houve arbitrariedade alguma. Hoje alegam isso pois está na moda receber indenizações pelo simples fato de terem sido inquiridos em Inquérito Policial-Militar. Havia uma normalidade constitucional, inclusive com a instituição dos atos institucionais. Os militares agiram sempre de acordo com as leis em vigor.
Gal. Justo: Não tive conhecimento de nenhum ato de abuso do poder e descumprimento de direitos constitucionais por parte dos militares. Aconteceram alguns atritos e reclamações a respeito de uma ou outra ação de busca e prisão.

P.: Como era o relacionamento dos militares com a classe política e a sociedade antes da revolução e imediatamente após?

Gal. Negrão: Em meu entender, nunca houve problemas, exceto com os que queriam implantar no país um regime comunista e com os corruptos. Na época do chamado milagre econômico, o Presidente Médici tinha níveis altíssimos de aprovação nas pesquisas e o próprio Lula sempre reconheceu que nunca o trabalhador brasileiro esteve tão bem como nessa época.

Gal. Ítalo: O relacionamento dos militares no Paraná, com a classe política, era muito bom. Após a revolução começaram a surgir ressentimentos setoriais, o que no meu entender era de se esperar, uma vez que nem todos conformaram-se com a situação.

Gal. Justo: O relacionamento, tanto com a classe política quanto com a sociedade, era muito bom antes e depois da revolução. O fato de o Governador do Estado ser militar e ter em seu secretariado alguns militares facilitava o relacionamento com a classe política. Naquela época a maioria dos militares que serviam em Curitiba ou eram paranaenses ou casados com mulheres paranaenses, o que facilitava o relacionamento com a sociedade civil.

P.: Com a posse do Marechal Castello Branco na Presidência da República houve modificações no quadro político paranaense?

Gal. Negrão: Não. Ele manteve a eleição programada e por ser o Governador Ney Braga amigo do Presidente, o Paraná passou a ser melhor atendido em suas reivindicações. A solução dada pelo Grupo Executivo de Terras do Sudoeste (GETSOP) para a questão do conflito de terras no Sudoeste é um exemplo.

Gal. Ítalo: A única modificação que houve foi que o Governador Ney Braga foi convocado para ser Ministro da Agricultura, assumindo em seu lugar o Secretário da Fazenda, Algacir Guimarães, eleito que fora pela Assembléia Legislativa.

Gal. Justo: Com a posse do Marechal Castello Branco na Presidência da República o Paraná fortaleceu-se politicamente. O Governador Ney Braga era muito amigo do Presidente e o estado ganhou o Ministério da Educação e vários cargos nos 1º e 2º escalões da administração federal.

P.: O senhor considera que a atitude de intervir, tomada pela cúpula das Forças Armadas, foi correta?

Gal. Negrão: Se a pergunta refere-se à derrubada do sr. João Goulart, sim. É o que tenho dito em todas as minhas obras.

Gal. Ítalo: Já se disse, e eu concordo, jamais em toda a sua história o Brasil precisou tanto de suas Forças Armadas, e em particular do Exército, como naqueles decisivos dias em que estava em jogo sua sobrevivência como nação democrática e cristã. Não tenho dúvidas de que a atitude das Forças Armadas foi correta.

Gal. Justo: Sim, se não tivesse havido a intervenção das Forças Armadas naquela oportunidade certamente haveria uma guerra civil, ou seria implantado o regime comunista no país.

P.: No momento dos acontecimentos o senhor aderiu de imediato à causa militar?

Gal. Negrão: Desde o momento em que me convenci de que o movimento era anti-comunista e destinado a restabelecer a disciplina e a hierarquia ameaçadas nas Forças Armadas, dei meu apoio e declarei que cumpriria as ordens do General Dario Coelho, rebelado contra o governo Jango.

Gal. Ítalo: Sem dúvida nenhuma.

Gal. Justo: Sim. A partir dos acontecimentos de março de 1964 (comício da Central do Brasil, rebelião dos marinheiros, reunião do Automóvel Clube etc.), passei a fazer parte do grupo de militares que propunham uma intervenção imediata das Forças Armadas.

P.: Qual era a opinião do senhor naquela época a respeito dos acontecimentos políticos que antecederam a revolução (renúncia de Jânio Quadros, parlamentarismo, posse de João Goulart etc.)?

Gal. Negrão: Não votei em Jânio Quadros, pois o sabia um farsante. Na crise da renúncia era aluno de uma escola militar, mas tinha quase certeza de que o sr. João Goulart, por incompetência, levaria o país a rumos perigosos – e isso era apenas uma suposição. Aceitei sua posse. Mantive meu compromisso de respeito à autoridade constituída até o momento em que me convenci de que o governo, a que devia lealdade, não a merecia por estar colocando-se progressivamente à margem da lei.

Gal. Ítalo: Inicialmente eu era pela aplicação da lei; infelizmente os acontecimentos tomaram outro rumo e aí o compromisso com a nação era mais importante.

Gal. Justo: A renúncia de Jânio Quadros pegou a população brasileira, inclusive seus auxiliares mais próximos, inteiramente desprevenidos. Os ministros militares não confiavam em João Goulart e consideravam-no despreparado para governar o país em uma situação política tão conturbada. Embora os acontecimentos que se seguiram possam-lhes dar plena razão, os ministros não conseguiram convencer a maioria dos políticos e dos militares. João Goulart acabou assumindo a Presidência da República em um regime parlamentarista. Posteriormente, mediante pressão política, principalmente dos sindicatos, conseguiu que fosse realizado um plebiscito para autorizar o retorno do regime presidencialista. Tais acontecimentos constituíram-se, certamente, em antecedentes que tiveram importante influência no desencadeamento da revolução de 31 de março de 1964.

P.: O senhor poderia fazer algumas considerações finais a respeito do movimento militar de 1964 no Paraná?

Gal. Negrão: É uma simplificação inadequada chamar o movimento de 1964 de "militar". Na realidade – e até a esquerda reconhece isso – as Forças Armadas foram arrastadas por apelo da sociedade, que pedia um "basta!" ao descalabro em que estávamos sendo mergulhados. Basta consultar o que publicava a imprensa nos dias que antecederam ao contra-golpe de 1964. Para o Paraná, especialmente, a revolução modernizadora em que o movimento transformou-se foi altamente benéfica. Nunca o Paraná teve tanta representatividade nos altos escalões da República e recebeu tantos benefícios. Estes não foram maiores porque, infelizmente, por motivos internos e externos, o esforço de modernização e desenvolvimento iniciado no governo Castello Branco sofreu solução de continuidade e mesmo as grandes reformas feitas por ele não persistiram ou não tiveram seguimento.

Gal. Ítalo: Repito que o Brasil nunca, na sua história, precisou tanto de suas Forças Armadas como naqueles dias de 1964. Estava em jogo a própria sobrevivência do Brasil como nação democrática e cristã, daí a razão de considerar correta a atitude dos chefes militares. Para o Paraná a revolução foi positiva, uma vez que o Governador era oriundo do meio militar e isso favoreceu o entendimento com o governo federal, trazendo muitos benefícios para o estado.

Gal. Justo: Durante os vinte anos em que os militares estiveram no poder foram cometidos muitos erros, principalmente na área política. Os benefícios que proporcionaram a toda a população brasileira foram, no entanto, muito maiores. Impediram que fosse implantado no Brasil, contra a vontade da maioria da população, o regime comunista. Nas décadas de 1960 e 1970 o país viveu um período de grande desenvolvimento, com aumento da renda per capita, do número de empregos e da realização de importantes obras de infra-estrutura; modernização e ampliação acelerada dos meios de comunicações; amplos benefícios sociais, tais como a criação do FGTS [Fundo de Garantia por Tempo de Serviço], do PIS-PASEP [Programa de Integração Social-Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público] e do BNH [Banco Nacional de Habitação]; modernização da administração pública, principalmente por meio do Decreto-Lei n. 200.

O excessivo número de intervenções em órgãos públicos e sindicatos eu acho que desgastou muito os militares; não que se tenham locupletado com o cargo, mas muitos não estavam preparados para aquilo. Houve também muita ingerência de comandantes de organizações militares em assuntos políticos sem que para isso estivessem preparados nem sequer autorizados. A opção pela luta armada não foi, como muitos querem pregar, uma forma de as esquerdas defenderem-se do endurecimento do regime pela edição do AI-5 e por outras medidas, pois muito antes dessas medidas já sofríamos atentados, como por exemplo o ataque ao Hospital Militar de São Paulo e outras ações inclusive psicológicas de ameaças de atentados e sequestros de familiares de militares. O endurecimento do regime foi uma medida necessária naquele momento pela situação que as Forças Armadas estavam vivendo e devido ao risco de implantação do terror por parte das esquerdas radicais.

http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-44782004000100014&script=sci_arttext

Vale apena ler e ver:

A repressão ao Movimento Estudantil no Paraná

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=_eRooIkZZ84

 http://www.unioeste.br/cursos/cascavel/pedagogia/eventos/2008/4/Artigo%2002.pdf


Os conflitos pela posse da terra no Sudoeste do Paraná










 
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