CRISTIANO MARIZ
Documentos bancĂ¡rios em poder da PolĂcia Federal, obtidos ontem pelo Estado, confirmam que o filho da ex-ministra Erenice Guerra recebeu propina de R$ 120 mil seis dias depois de a AgĂªncia Nacional de AviaĂ§Ă£o Civil (Anac) conceder permissĂ£o de voo Ă Master Top Linhas AĂ©reas (MTA).
Infraero. Israel também quis cobrar propina em corte de multa
Os papĂ©is mostram ainda que Israel Guerra e seus sĂ³cios tentaram cobrar propina numa negociaĂ§Ă£o para que a Infraero reduzisse, em fevereiro deste ano, uma multa de R$ 723 mil imposta Ă MTA por deixar um aviĂ£o parado na pista por mais de 30 dias. O valor da propina, nesse caso, era de R$ 50 mil.
A polĂcia recebeu a documentaĂ§Ă£o quinta-feira das mĂ£os do empresĂ¡rio FĂ¡bio Baracat, que representava a MTA em BrasĂlia. Pela primeira vez, documentos bancĂ¡rios comprovam o pagamento do lobby feito na Casa Civil. O escĂ¢ndalo derrubou Erenice Guerra da chefia da pasta.
O Estado teve acesso Ă integra das 16 pĂ¡ginas do depoimento prestado por Baracat e aos documentos que ele entregou Ă PF. O empresĂ¡rio disse que, num encontro com Erenice, em março deste ano, ela nĂ£o cobrou o pagamento dos serviços prestados pelo filho, mas deu um "conselho" aos "presentes": "Erenice Guerra disse aos presentes que todos os compromissos assumidos, sejam polĂticos, pessoais ou profissionais, devem ser cumpridos".
VĂ©spera de Natal. Um comprovante bancĂ¡rio mostra que, Ă s 9h17 de 24 de dezembro de 2009, Baracat fez uma transferĂªncia eletrĂ´nica de sua conta bancĂ¡ria, no valor de R$ 120 mil, para a conta da Capital Assessoria, empresa de Israel Guerra e de Vinicius Castro, entĂ£o assessor da Casa Civil. O pagamento foi feito seis dias depois de a Anac revogar, numa decisĂ£o emergencial, a puniĂ§Ă£o que proibia a MTA de operar por falta de documentos.
E-mails entregues Ă PF mostram que a MTA foi orientada pelos lobistas a procurar a direĂ§Ă£o da Anac, incluindo a sua presidente, Solange Vieira. Ela jĂ¡ negou qualquer irregularidade no episĂ³dio. Segundo a Anac, a MTA apresentou a documentaĂ§Ă£o necessĂ¡ria para reverter a puniĂ§Ă£o.
Segundo Baracat, dos R$ 120 mil depositados na vĂ©spera de Natal, R$ 100 mil foram pelo lobby na Anac. O restante era a mensalidade que pagava aos lobistas do PalĂ¡cio do Planalto desde outubro. O empresĂ¡rio contou que, no total, foram pagos, entre outubro e março, R$ 220 mil para a Capital - R$ 100 mil referentes ao episĂ³dio da Anac e R$ 120 mil divididos em seis parcelas mensais para as consultorias.
Os pagamentos eram feitos em dinheiro vivo e entregues em hotĂ©is, ou na conta corrente da empresa e de Vinicius Castro. Baracat entregou Ă PF, alĂ©m dos comprovantes de transferĂªncia, os recibos emitidos em março em nome da Capital Assessoria, com valores correspondentes a possĂveis pagamentos anteriores. O empresĂ¡rio anexou tambĂ©m procurações e e-mails internos confirmando que representava os interesses da MTA, desmentindo a versĂ£o da empresa de que ele nĂ£o tinha ligações profissionais com ela.
Os documentos revelam que, em fevereiro, a Capital se ofereceu para ajudar a MTA a sanear multa imposta pela Infraero por deixar um aviĂ£o na pista por mais de 30 dias. Segundo o empresĂ¡rio, no mesmo mĂªs a empresa "fez um pedido de isenĂ§Ă£o e encaminhou para o depoente. Que, em decorrĂªncia do serviço prestado pela Capital Assessoria houve a reduĂ§Ă£o de aproximadamente 30% da multa que seria cobrada pela Infraero e o parcelamento da mesma". A multa de R$ 723 mil foi reduzida para R$ 121 mil.
Ele afirma que o filho de Erenice e seus sĂ³cios cobraram R$ 50 mil pelo serviço "extra". "O depoente entendeu que se tratava de pagamento de propina", diz o relato dele Ă PF. Segundo Baracat, o ex-assessor Vinicius Castro, que pediu demissĂ£o do cargo hĂ¡ duas semanas, disse que o dinheiro era necessĂ¡rio porque eles "tinham se comprometido com pessoas na Infraero e precisavam honrar com tal compromisso". NĂ£o houve, segundo ele, menĂ§Ă£o a nomes de pessoas envolvidas. A propina, disse o empresĂ¡rio, nĂ£o foi paga e o episĂ³dio deu inĂcio ao rompimento entre eles.
O depoimento Ă© longo e durou mais de cinco horas. Baracat foi um dos personagens da queda de Erenice Guerra da chefia da Casa Civil. Ele revelou o lobby do filho dela, Israel, dentro do governo.