sábado, 17 de março de 2012

Rumo à Reforma Agrária

Frei Betto/
Adital

Caiu mais um ministro, o do Desenvolvimento Agrário. Nomeado o novo: Pepe Vargas (PT-RS), que foi prefeito de Caxias do Sul por dois mandatos e mantém boas relações com o MST.

A esperança é que a presidente Dilma Rousseff tenha dado o primeiro de três passos urgentes para o Brasil não ficar mal na foto do "concerto das nações”, como diria o Conselheiro Acácio. Os outros dois são o veto ao Código Florestal proposto pelo Senado e uma nova política ambiental e fundiária que prepare bem o país para acolher, em junho, a Rio+20.

A questão fundiária no Brasil é a nódoa maior da nação. Nunca tivemos reforma agrária. Ou melhor, uma única, cujo modelo o latifúndio insiste em preservar: quando a Coroa portuguesa dividiu nossas terras em capitanias hereditárias.

Desde 2008, o Brasil ultrapassou os EUA ao se tornar o campeão mundial de consumo de agrotóxicos. E, segundo a ONU, vem para o Brasil a maioria dos agrotóxicos proibidos em outros países. Aqui são utilizados para incrementar a produção de commodities.

Basta dizer que 50% desses "defensivos agrícolas” são aplicados na lavoura de soja, cuja produção é exportada como ração animal. E o mais grave: desde 1997 o governo concede desconto de 60% no ICMS dos agrotóxicos. E o SUS que aguente os efeitos... nos trabalhadores do campo e em todos nós que consumimos produtos envenenados.

Os agrotóxicos não apenas contaminam os alimentos. Também degradam o solo e prejudicam a biodiversidade. Afetam a qualidade do ar, da água e da terra. E tudo isso graças ao sinal verde dado por três ministérios, nos quais são analisados antes de chegarem ao mercado: Saúde, Meio Ambiente e Agricultura.

É uma falácia afirmar que os agrotóxicos contribuem para a segurança alimentar. O aumento do uso deles em nada fez decrescer a fome no mundo, como indicam as estatísticas.

A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) tenta manter o controle sobre a qualidade dos agrotóxicos e seus efeitos. Mas, quando são vetados, nem sempre consegue vencer as pressões da bancada ruralista sobre outros órgãos do governo e, especialmente, sobre o Judiciário.

A Cúpula Mundial do Meio Ambiente na África do Sul, em 2002, emitiu um documento em que afirma que a produção mundial de alimentos aumentou em volume e preço (devido ao uso de agrotóxicos e sementes transgênicas). À custa de devastação dos solos, contaminação e desperdício da água, destruição da biodiversidade, invasão de áreas ocupadas por comunidades tradicionais (indígenas, clãs, pequenos agricultores etc.). Fica patente, pois, que a chamada "revolução verde” fracassou.

Hoje, somos 7 bilhões de bocas no planeta. Em 2050, seremos 9 bilhões. Se medidas urgentes não forem tomadas, há de se agravar a sustentabilidade da produção agrícola.

conservação, alocação e manejo da água; proteger a biodiversidade; promover o uso sustentável das florestas; e ampliar as informações sobre os impactos das mudanças climáticas.

Quanto aos primeiro e terceiro itens, sobretudo, o Brasil marcha na contramão: cada vez mais se ampliam as áreas de produção extensiva para monocultivo, destruindo a biodiversidade, o que favorece a multiplicação de pragas. Como as pragas não encontram predadores naturais, o recurso é envenenar o solo e a água com agrotóxicos. E com frequência isso não dá resultado. No Ceará, uma grande plantação de abacaxi fracassou, malgrado o uso de 18 diferentes "defensivos agrícolas”.

Tomara que o ministro Pepe Vargas consiga estabelecer uma articulação interministerial para livrar o Brasil da condição de "casa da mãe Joana” das multinacionais da insustentabilidade e da degradação do nosso patrimônio ambiental. E acelere o assentamento das famílias sem-terra acampadas à beira de rodovias, bem como a expropriação, para efeito social, de terras ociosas e também daquelas que utilizam mão de obra escrava.

Governo é, por natureza, expressão da vontade popular. E a ela deve servir. O que significa manter interlocução permanente com os movimentos sociais interessados nas questões ambiental e fundiárias, irmãs siamesas que não podem ser jamais separadas.

Sistema educacional é um importante instrumento a perpetuar a desigualdade

Otaviano Helene

O Brasil chegou a ser, há não muito tempo atrás, o país com a pior distribuição de renda em todo o mundo. Embora essa situação tenha melhorado nos últimos anos, continuamos em uma posição muito ruim – o nono pior índice de Gini (1) entre 107 países relacionados pelo Banco Mundial – e estamos evoluindo muito lentamente. Em apenas cinco países os 10% mais pobres têm uma participação na renda nacional menor do que os 10% mais pobres no Brasil e em apenas dois países os 10% mais ricos abocanham uma fração da renda nacional maior do que no Brasil.

A renda não se concentra por um processo natural, como se nos quintais de alguns nascessem, por natureza, frondosas árvores de dinheiro e nos quintais de outros, raquíticos arbustos de moedinhas. A renda se concentra como conseqüência de políticas explícitas que incluem o próprio sistema econômico, a ausência ou não de reformas agrária e urbana democráticas, a repressão dos ou o diálogo com os movimentos sociais organizados, as alíquotas de impostos diretos e o combate ou não à sonegação, a existência ou não de impostos sobre o patrimônio, entre várias outras.

Há dois processos relacionados à educação que contribuem fortemente para a perenização da concentração de renda: a renda das pessoas depende fortemente da educação formal que receberam e a educação das crianças e jovens depende, também fortemente, de suas rendas familiares. A combinação desses dois fatores faz com que nossa política educacional seja um dos principais fatores de concentração de renda e de reprodução das desigualdades.

Um dos principais fatores responsáveis pela exclusão escolar é a renda. Por exemplo, a participação dos estudantes provenientes dos segmentos mais pobres da população cai significativamente ao longo das séries escolares e praticamente a totalidade das cerca de 30% das crianças que abandonam a escola antes do final do ensino fundamental tem origem nos segmentos mais desfavorecidos da população. Como a enorme maioria dessas crianças que deixam a escola prematuramente não freqüentou as classes de educação infantil, a educação formal oferecida a elas restringe-se aos poucos anos de escolaridade no ensino fundamental, em geral em escolas precárias, com uma permanência diária abaixo das quatro horas e com muitas "aulas vagas”. Resultado: os investimentos educacionais feitos em favor dessa terça parte das crianças, cujos valores anuais são próximos ao piso do Fundeb (2), não excederão, ao longo de toda a vida, alguns poucos milhares de reais.

No outro extremo, entre os mais ricos, a educação começa nos primeiros anos de vida e dura pelo menos duas décadas, com valores mensais de investimento que superam os mil reais, ou muito mais do que isso se forem incluídos investimentos com educação extra-escolar (cursos de línguas, atividades esportivas, aulas particulares etc.). Ao longo de toda a vida esses investimentos podem superar centenas de milhares de reais.

Portanto, as desigualdades na educação formal são enormes. E esses contingentes com enormes diferenças educacionais, ao deixarem a escola, conviverão em uma mesma sociedade. Ninguém pode ter dúvida do que acontecerá.

Em resumo, nossas terríveis desigualdades econômicas e sociais entram nas escolas pela porta da frente, com a conivência, apoio e subvenção explícita por parte das autoridades municipais, estaduais e federais, fazendo com que nosso sistema escolar trate de forma extremamente diferente os pobres e os ricos. E, evidentemente, com o apoio total das elites econômicas, para as quais as desigualdades não devem ser enfrentadas e superadas, mas, sim, os desiguais devem ser combatidos quando ameaçam incomodar.

O círculo vicioso rendaeducaçãorenda se fecha uma vez que a renda de uma pessoa depende fortemente de sua educação formal, tanto em termos quantitativos quanto qualitativos, coisa que salta aos olhos (3). Cada ano adicional de escolaridade de um trabalhador implica em um aumento de renda da ordem de 15%, em média. Além dessa dependência da renda com relação ao número de anos de estudo, há também uma dependência em face da qualidade da educação recebida e, novamente, esta também depende fortemente da renda familiar dos estudantes.

Portanto, nosso sistema educacional é um importante instrumento a perpetuar a desigualdade, garantindo que ainda permaneceremos por longo tempo entre os países mais desiguais do mundo.

Outro aspecto perverso da desigualdade do nosso sistema educacional é o "desperdício” de pessoas. Como a desigualdade exclui das escolas enormes contingentes populacionais e grande parte dos não excluídos apresenta graves deficiências, nossas possibilidades de desenvolvimento social, cultural e do sistema de produção de bens e serviços são gravemente comprometidas, uma vez que não podemos contar com a contribuição produtiva da maioria dos nossos jovens, por mais dedicados, brilhantes e interessados que pudessem vir a ser: eles já foram descartados.

Para construirmos um país realmente republicano, precisaríamos romper com essa situação e criar um sistema educacional onde todos, independentemente da origem social e econômica, sejam tratados de forma igualitária. Escolas com infra-estruturas adequadas, professores e educadores que sejam remunerados adequadamente e instrumentos de gratuidade ativa (4) que compensem os custos induzidos pela freqüência à escola são fundamentais.

E não há nenhuma limitação real e objetiva que nos impeça de construir uma escola igualitária e democrática: se excluímos crianças e jovens prematuramente das escolas e as condenamos a uma vida adulta com más remunerações, é uma opção política ditada pelas elites, que não abrirão mão, por bem, de nenhum de seus privilégios, por mais que eles possam ser danosos para a sociedade.

(1) O índice de Gini é um dos indicadores mais amplamente adotados para quantificar a distribuição de renda.

(2) O Fundeb, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, corresponde a um valor mínimo de investimento educacional da ordem de R$ 200 reais por mês e por estudante (valores de 2012). Estados cujos investimentos estão abaixo desse valor recebem uma complementação da União.

(3) Há exceções, obviamente, e algumas pessoas com pouca escolarização têm sucesso profissional e mesmo altas rendas. Entretanto, a regra seguida de forma majoritária é que a renda aumenta com o grau de escolarização. Por causa das poucas exceções, muitos, desatentamente, pensam que a regra inexiste ou é muito frágil; outros, às vezes por má fé, reproduzem e dão força a esse engano.

(4) Devemos lembrar que a renda per capita familiar de quase metade das crianças e adolescentes entre 0 e 17 anos, segundo dados de vários PNADs, é inferior a meio salário mínimo. Se considerarmos que grande parte da renda familiar é gasta com moradia, alimentação, energia elétrica e outras despesas inescapáveis, o que resta para as outras despesas é extremamente baixo. Assim, uma simples passagem de ônibus adicional por dia, um pequeno lanche ou qualquer outra despesa associada à freqüência à escola podem estar totalmente fora do alcance familiar. Nos segmentos mais favorecidos, muitas dessas despesas podem passar despercebidas, mas, para os segmentos mais desfavorecidos, elas são insuportavelmente altas.


DESACATO - ANTONIO CARLOS & JOCAFI

Demarcação de terras indígenas esbarra na Justiça


Renato Santana

Editor do jornal Porantim

Quem pensa que o gargalo das demarcações e homologações de terras indígenas no Brasil se reduz à morosidade do órgão indigenista estatal, a Fundação Nacional do Índio (Funai), engana-se.

Apenas no Supremo Tribunal Federal (STF), 15 processos envolvendo terras indígenas estão parados e, com isso, impedindo a continuidade do procedimento administrativo de demarcação.

Dentre estes 15 processos, 12 são referentes a territórios indígenas no Mato Grosso do Sul, que ano após ano lidera a lista de assassinatos e mortes de indígenas entre os estados brasileiros.

Listam-se mais a anulação de títulos imobiliários incidentes na Terra Indígenas Caramuru-Paraguassú, dos Pataxó Hã-Hã-Hãe, no sul da Bahia, outro processo envolvendo interesses indígenas de povos do Rio Grande do Sul e o terceiro sobre a Terra Indígena Marãiwatsédé, do povo Xavante, no Mato Grosso.

Por conta de tal realidade, a Articulação dos Povos Indígenas Brasileiros (Apib) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) protocolaram nos gabinetes dos ministros do STF pedido para que os processos sejam julgados.

Assinado por dezenas de lideranças indígenas de todo o país, o documento pede ainda que as decisões sejam favoráveis aos povos indígenas nos termos da Constituição Federal e das convenções e tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário – caso da Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

No geral, tais matérias são decisões liminares dadas pelo ministro relator, que suspendem os processos administrativos de demarcação, feitos pela Funai, ou até mesmo portarias do Ministério da Justiça declarando determinada terra como tradicionalmente ocupada.

Esquecimento

Questionar os relatórios da Funai é um direito dos donos de terras cujas propriedades incidem sobre territórios indígenas. Nos bastidores, não a de se negar o jogo político que infelizmente arma-se em tabuleiro sobre a Constituição Federal, transformando a sorte dos povos indígenas num lance de dados viciados.

Porém, nada justifica que após análise do pedido de liminar feita pelo ministro relator, ele não leve ao julgamento de seus pares o processo. O que acontece é simples e perverso: o ministro relator concede a liminar, paralisa o processo administrativo de demarcação e depois esquece o processo, que fica apenas sendo acrescido de episódios trágicos e cruzes dos indígenas assassinados à espera da Justiça kafkiana.

Um fato é inegável: não há prazos definidos para que se julguem tais matérias. Conforme a advogada Michael Mary Nolan, recentemente agraciada com o Prêmio Santo Dias de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo e há mais de três décadas dedicada aos povos indígenas, passou-se a discutir um prazo razoável para se julgar processos que se destacam por, entre outros fatores, vulnerabilidades sociais das partes envolvidas.

A discussão, de acordo com Michael, pauta-se pelos convênios internacionais dos quais o Brasil é signatário. O que será razoável ou não é impossível saber, mas no caso da demarcação das terras indígenas as violências periódicas mostram que nada menos que imediatamente é aceitável – sobretudo na atual conjuntura de avanço das fronteiras agrícolas e grandes empreendimentos sobre territórios indígenas.

Aos exemplos

Para se concentrar no Mato Grosso do Sul, nos últimos oito anos, como apresenta o Relatório de Violências do Cimi no estado, 250 indígenas da etnia Guarani Kaiowá foram assassinados entre 2003 e 2010. Todos, sem exceção, estavam envolvidos na luta pela terra. Em novembro do ano passado foi a vez do cacique Nísio Gomes, do tekoha Guaiviry.

A Terra Indígena Nhanderu Marangatu, por exemplo, está com liminar que suspendeu a homologação, assinada por Luiz Inácio Lula da Silva enquanto esteve na presidência da República, sem julgamento no STF. Dos nove mil hectares homologados, os Guarani Kaiowá vivem apenas em 100 hectares.

Marangatu é o tekoha de Dorvalino Rocha, assassinado em 2005, e de Marçal de Souza, morto em 1983 e cujo processo contra os assassinos prescreveu. A Terra Indígena Cachoeirinha, do povo Terena, é outra no Mato Grosso do Sul que aguarda decisão do STF. No ano passado, um ônibus escolar da comunidade foi atacado com coquetéis molotov. Uma indígena, mãe de quatro filhos, morreu.

Na Bahia, a Terra Indígena Caramuru-Paraguassú do povo Pataxó Hã-Hã-Hãe aguarda julgamento desde 2008, num processo que começa ainda nos anos 1980. De lá para cá foram 30 lideranças assassinadas. Galdino Pataxó Hã-Hã-Hãe foi queimado num ponto de ônibus em Brasília, na madrugada do dia 20 de abril de 1997, depois de um dia brigando pelo território de seu povo na ocasião do Dia do Índio. O compasso da espera aos indígenas, portanto, tem desenhado dor, sofrimento e mortes.

Insegurança jurídica

Michael define a situação como insegurança jurídica.

"A insegurança jurídica leva a violência. O lado mais poderoso fica com mais poder, se sente mais impune. Insegurança jurídica é um mal e quem aproveita é quem quer criar violência e impunidade”, define a advogada.

Para Michael, no entanto, os dois lados da história sofrem, pois a insegurança afeta tanto os índios quanto os proprietários de boa fé, que a qualquer momento podem perder tudo. "Os indígenas, claro, são os que acabam morrendo e vivendo em situação de extrema dificuldade, ainda mais com o poder político dos ocupantes de suas terras”, declara.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) acompanha a situação de processos com urgência social por intermédio do programa Justiça Plena. Hoje em dia, cerca de 200 processos estão sob o olhar atento dos juristas do CNJ.

De acordo com a assessoria de comunicação do conselho, quatro tratam da questão indígena. Todos estão concentrados no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), em São Paulo, e tratam da demarcação de terras indígenas Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul.

No caso da Terra Indígena Marãiwatsédé, em Mato Grosso, podemos ter a exata dimensão de como funciona a demarcação de terras no país: depois do contato, em 1957, os Xavante perderam suas terras, expulsos delas, em menos de dez anos. Há exatos 20 anos, depois de um exílio forçado, aguardam que a Justiça cumpra a Constituição no território – retomado à força pelos indígenas.

Será esse um prazo razoável?

Elis Regina faria 67 anos neste sábado; turnê de Maria Rita, livros e exposição "feita por fãs" relembram sua obra

  • A cantora Elis Regina (à esquerda) será homenageada pela filha, Maria Rita, em uma série de shows pelo Brasil

    A cantora Elis Regina (à esquerda) será homenageada pela filha, Maria Rita, em uma série de shows pelo Brasil

Se estivesse viva, Elis Regina completaria, neste sábado (17), 67 anos. A cantora eternizou as canções “Arrastão”, “Como Nossos Pais” e “O Bêbado e a Equilibrista” na história da música popular brasileira, antes de falecer, aos 37 anos, em 19 de janeiro de 1982.

Para celebrar sua obra e legado, Elis será homenageada em uma série de shows gratuitos, apresentados por sua filha, a cantora Maria Rita, além de uma exposição com material cedido por fãs e duas publicações: uma biografia organizada pelo jornalista Júlio Maria e o livro “Viva Elis", que será distribuído para bibliotecas e instituições educacionais e conta a trajetória de sua carreira.

Divulgação
Há muitos anos pensar na minha mãe me traz muitas emoções positivas. A morte dela nunca foi um motivo de revolta para mim, sempre encarei como um processo natural da vida

sobre a mãe, Elis Regina

Em conversa ao UOL, João Marcello Bôscoli, primogênito de Elis, falou sobre a iniciativa. "Quando eu era adolescente me doía pensar que a minha mãe poderia ser esquecida. Quando completei 40 anos, resolvi que iria preservar a memória da Elis", explicou João Marcello.

Os shows terão início no dia 24 de março em Porto Alegre, cidade onde nasceu Elis. No total serão cinco apresentações gratuitas que passarão ainda por São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Rio de Janeiro. "A Maria Rita está mergulhada há 40 dias nas canções de Elis. Ela e o quarteto dela selecionaram mais de 60 músicas e agora estão no processo de escolher as que farão parte do repertório do show", contou João Marcello. Nesta segunda (19), Maria Rita apresenta o espetáculo para uma plateia de convidados no Rio.

Quanto à exposição - que será inaugurada dia 14 de abril no Centro Cultural São Paulo - João Marcello disse que, além de gravações, haverá fotos, capas de discos, roupas usadas em shows e até ingressos doados por fãs. "Tivemos o apoio das emissoras que nos cederam imagens, além de muitos fãs terem entrado em contato comigo para mostrar gravações caseiras feitas com câmera super 8, por exemplo", citou o produtor, que acredita que os fãs de Elis tiveram "papel substancial" nos projetos.

Caso de Allen Guimarães, cujo projeto feito para uma universidade deu origem ao livro "Viva Elis": "O Allen entrevistou mais de 50 pessoas, entre eles parceiros de Elis como Ivan Lins, Gilberto Gil e Milton Nascimento", ressaltou João Marcello.

"Trajetória de Elis é atípica", diz João Marcello Boscôli

Para João Marcello, a trajetória de Elis, que morreu precocemente aos 37 anos, é "atípica": "A trajetória da Elis é incomum. Mesmo 30 anos depois de morta ainda há muito interesse por ela, não só pelos fãs, mas como pela própria imprensa. Isso não acontece, por exemplo posso citar casos de cantoras como Clara Nunes e Sylvia Telles que não ganharam tanta repercussão", comentou João Marcello.

"Gostaria que os herdeiros de outras grandes cantoras também tivessem ajuda de produtores e empresas para poderem elaborar projetos como esse da Elis. Nos Estados Unidos até hoje as pessoas cantam Frank Sinatra e Billie Holiday", comparou João Marcello que conta com apoio de uma marca de cosméticos.

Indagado sobre o furor que Elis ainda suscita em velhos e novos fãs, principalmente aos vídeos que somam milhares de acessos em canais de compartilhamentos, João Marcello agradeceu: “É um presente divino para mim” e completou: “Há muitos anos pensar na minha mãe me traz muitas emoções positivas. A morte dela nunca foi um motivo de revolta para mim, sempre encarei como um processo natural da vida”, frisou.

“Quando meu filho nasceu pensei no momento em que eu terei de apresentar a avó a ele, esse projeto talvez seja uma declaração de amor a Elis, uma maneira de me relacionar com a ausência dela, com essa ligação forte que ainda temos. Tem sido uma grande alegria”, finalizou João Marcello que é pai de Arthur, fruto do casamento com a apresentadora Eliana.

"Furacão Elis": 30 anos sem a "Pimentinha"

Foto 32 de 53 - "Em 1971, de volta ao trabalho depois do nascimento do primeiro filho, João Marcello". A imagem, retirada do álbum de família, faz parte da biografia "Furacão Elis", que é relançada pela editora LeYa com fotos e entrevistas inéditas. Os 30 anos da morte de Elis Regina, completados em 19 de janeiro de 2012, trazem ainda reedições de dois discos seus com material inédito, lançamento de caixa discográfica, especiais de TV e o esperado show de Maria Rita em homenagem à mãe Divulgação

"TURNÊ VIVA ELIS COM MARIA RITA"

Porto Alegre
Quando: 24 de março
Onde: Às 16h no Anfiteatro Pôr-do-Sol (Av. Edwaldo Pereira Paiva, s/n, Parque Maurício Sirotsky Sobrinho, Praia de Belas Hora)
Quanto: Entrada gratuita

Recife
Quando: 01 de Abril
Onde: Às 16h no Parque Dona Lindu (Praia de Boa Viagem, Boa Viagem)
Quanto: Entrada gratuita

Belo Horizonte
Quando: 08 de Abril
Onde: Às 16h no Parque das Mangabeiras (Rua Caraça, 900, Mangabeiras)
Quanto: Entrada gratuita

São Paulo
Quando: 22 de Abril
Onde: Às 11h no Auditório do Ibirapuera (Avenida Pedro Álvares Cabral, s/n., Moema)
Quanto: Entrada gratuita

Rio de Janeiro
Quando: 29 de Abril
Onde: Às 16 no Aterro do Flamengo (R. Buarque de Macedo, s/n.,Flamengo)
Quanto: Entrada gratuita

"EXPOSIÇÃO VIVA ELIS"

São Paulo
Quando: de 14 de Abril a 20 de Maio
Onde:Centro Cultural São Paulo (Rua Vergueiro, 1000, Liberdade)
Quanto: Entrada gratuita

Porto Alegre
Quando: de 10 de Junho a 15 de Julho
Onde: Usina do Gasometro (Av. Presidente João Goulart, 551, Centro)
Quanto: Entrada Gratuita

Recife
Quando: de 5 Agosto a 25 de Setembro
Onde: Parque Dona Lindu (Rua Setúbal, 1139-1189, Boa Viagem)
Quanto: Entrada Gratuita

Rio de Janeiro
Quando: de 10 de Outubro a 11 de Novembro
Onde: CCBB - Centro Cultural Banco do Brasil (Rua Primeiro de Março, 66, Centro)
Quanto: Entrada Gratuita

Belo Horizonte
Quando: de 27 de Novembro a 06 de janeiro de 2013 –
Onde: Palácio das Artes (Avenida Afonso Pena, 1537, Centro)
Quanto: Entrada Gratuita

"Águas de Março" faz 40 anos e ganha tributo


Uma homenagem póstuma a Aziz Ab’Saber: 'Mudanças no Código Florestal baseiam-se em desconhecimento entristecedor’

Professor emérito de geografia da USP, falecido hoje, esclareceu sua posição sobre as alterações no Código Florestal em artigo de julho de 2010

Aziz Ab’Saber

Em face do gigantismo do território e da situação real em que se encontram os seus macrobiomas – Amazônia Brasileira, Brasil Tropical Atlântico, Cerrados do Brasil Central, Planalto das Araucárias e Pradarias Mistas do Brasil Subtropical – e de seus numerosos mini-biomas, faixas de transição e relictos de ecossistemas, qualquer tentativa de mudança no “Código Florestal” tem de ser conduzida por pessoas competentes e bioeticamente sensíveis.

Pressionar por uma liberação ampla dos processos de desmatamento significa desconhecer a progressividade de cenários bióticos, a diferentes espaços de tempo futuro. Favorecendo de modo simplório e ignorante os desejos patrimoniais de classes sociais que só pensam em seus interesses pessoais, no contexto de um país dotado de grandes desigualdades sociais.

Cidadãos de classe social privilegiada, que nada entendem de previsão de impactos. Não têm qualquer ética com a natureza. Não buscam encontrar modelos técnico-científicos adequados para a recuperação de áreas degradadas, seja na Amazônia, seja no Brasil Tropical Atlântico ou alhures. Pessoas para as quais exigir a adoção de atividades agrárias “ecologicamente auto-sustentadas” é uma mania de cientistas irrealistas.

Por muitas razões, se houvesse um movimento para aprimorar o atual Código Florestal, teria que envolver o sentido mais amplo de um Código de Biodiversidades, levando em conta o complexo mosaico vegetacional de nosso território. Remetemos essa idéia para Brasília e recebemos resposta de que era boa, mas complexa e inoportuna (…). Entrementes, agora outras personalidades trabalham por mudanças estapafúrdias e arrasadoras no chamado Código Florestal.

Razão pela qual ousamos criticar aqueles que insistem em argumentos genéricos e perigosos para o futuro do país. Sendo necessário, mais do que nunca, evitar que gente de outras terras, sobretudo de países hegemônicos, venha a dizer que fica comprovado que o Brasil não tem competência para dirigir a Amazônia (…). Ou seja, os revisores do atual Código Florestal não teriam competência para dirigir o seu todo territorial do Brasil. Que tristeza, gente minha.

O primeiro grande erro dos que no momento lideram a revisão do Código Florestal brasileiro – a favor de classes sociais privilegiadas – diz respeito à chamada estadualização dos fatos ecológicos de seu território específico. Sem lembrar que as delicadíssimas questões referentes à progressividade do desmatamento exigem ações conjuntas dos órgãos federais específicos, em conjunto com órgãos estaduais similares, uma Polícia Federal rural e o Exército Brasileiro. Tudo conectado ainda com autoridades municipais, que têm muito a aprender com um Código novo que envolva todos os macrobiomas do país e os mini-biomas que os pontilham, com especial atenção para as faixas litorâneas, faixas de contato entre as áreas nucleares de cada domínio morfoclimático e fitogeográfico do território.

Para pessoas inteligentes, capazes de prever impactos, a diferentes tempos do futuro, fica claro que ao invés da “estadualização” é absolutamente necessário focar para o zoneamento físico e ecológico de todos os domínios de natureza do país. A saber, as duas principais faixas de Florestas Tropicais Brasileiras, a zona amazônica e a zona das matas atlânticas; o domínio dos cerrados, cerradões e campestres; a complexa região semi-árida dos sertões nordestinos; os planaltos de araucárias e as pradarias mistas do Rio Grande do Sul; além de nosso litoral e o Pantanal mato-grossense.

Seria preciso lembrar ao honrado relator Aldo Rabelo, que a meu ver é bastante neófito em matéria de questões ecológicas, espaciais e em futurologia – sendo que atualmente na Amazônia Brasileira predomina um verdadeiro exército paralelo de fazendeiros que em sua área de atuação têm mais força do que governadores e prefeitos. O que se viu em Marabá, com a passagem das tropas de fazendeiros, passando pela Avenida da Transamazônica, deveria ser conhecido pelos congressistas de Brasília e diferentes membros do Executivo. De cada uma das fazendas regionais passava um grupo de cinqüenta a sessenta camaradas, tendo a frente em cavalos nobres o dono da fazenda e sua esposa e filhos em cavalos lindos.

E os grupos iam passando separados entre si, por alguns minutos. E, alguém a pé, como se fosse um comandante, controlava a passagem da cavalgada dos fazendeiros. Ninguém da boa e importante cidade de Marabá saiu para observar a coluna amedrontadora dos fazendeiros. Somente dois bicicletistas meninos deixaram as bicicletas na beira da calçada olhando silentes a passagem das tropas. Nenhum jornal do Pará, ou alhures, noticiou a ocorrência amedrontadora. Alguns de nós não pudemos atravessar a ponte para participar de um evento cultural.

Será certamente, apoiados por fatos como esse, que alguns proprietários de terras amazônicas deram sua mensagem, nos termos de que “a propriedade é minha e eu faço com ela o que eu quiser, como quiser e quando quiser”? Mas ninguém esclarece como conquistaram seus imensos espaços inicialmente florestados. Sendo que, alguns outros, vivendo em diferentes áreas do centro-sul brasileiro, quando perguntados sobre como enriqueceram tanto, esclarecem que foi com os “seus negócios na Amazônia” (…). Ou seja, através de loteamentos ilegais, venda de glebas para incautos em locais de difícil acesso, os quais ao fim de um certo tempo são libertados para madeireiros contumazes.

E o fato mais infeliz é que ninguém procura novos conhecimentos para reutilizar terras degradadas. Ou exigir dos governantes tecnologias adequadas para revitalizar os solos que perderam nutrientes e argilas, tornando-se dominados por areias finas (siltização).

Entre os muitos aspectos caóticos, derivados de alguns argumentos dos revisores do Código, destaca-se a frase que diz que se deve proteger a vegetação até sete metros e meio do rio. Uma redução de um fato que por si já estava muito errado, porém agora está reduzido genericamente a quase nada em relação aos grandes rios do país. Imagine-se que para o rio Amazonas a exigência protetora fosse apenas sete metros, enquanto para a grande maioria dos ribeirões e córregos também fosse aplicada a mesma exigência. Trata-se de desconhecimento entristecedor sobre a ordem de grandeza das redes hidrográficas do território intertropical brasileiro. Na linguagem amazônica tradicional, o próprio povo já reconheceu fatos referentes à tipologia dos rios regionais.

Para eles, ali existem, em ordem crescente: igarapés, riozinhos, rios e parás. Uma última divisão lógica e pragmática, que é aceita por todos os que conhecem a realidade da rede fluvial amazônica.

Por desconhecer tais fatos os relatores da revisão aplicam o espaço de sete metros da beira de todos os cursos d’água fluviais sem mesmo ter ido lá para conhecer o fantástico mosaico de rios do território regional.

Mas o pior é que as novas exigências do Código Florestal proposto têm um caráter de liberação excessiva e abusiva. Fala-se em sete metros e meio das florestas beiradeiras (ripário-biomas) e depois em preservação da vegetação de eventuais e distantes cimeiras. Não podendo imaginar quanto espaço fica liberado para qualquer tipo de ocupação do espaço. Lamentável em termos de planejamento regional, de espaços rurais e silvestres. Lamentável em termos de generalizações forçadas por grupos de interesse (ruralistas).

Já se poderia prever que um dia os interessados em terras amazônicas iriam pressionar de novo pela modificação do percentual a ser preservado em cada uma das propriedades de terras na Amazônia. O argumento simplista merece uma crítica decisiva e radical. Para eles, se em regiões do centro-sul brasileiro a taxa de proteção interna da vegetação florestal é de 20%, por que na Amazônia a lei exige 80%? Mas ninguém tem a coragem de analisar o que aconteceu nos espaços ecológicos de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Minas Gerais com o percentual de 20%. Nos planaltos interiores de São Paulo a somatória dos desmatamentos atingiu cenários de generalizada derruição.

Nessas importantes áreas, dominadas por florestas e redutos de cerrados e campestres, somente o tombamento integrado da Serra do Mar, envolvendo as matas atlânticas, os solos e as aguadas da notável escarpa foi capaz de resguardar os ecossistemas orográficos da acidentada região. O restante, nos “mares de morros”, colinas e várzeas do Médio Paraíba e do Planalto Paulistano, e pró-parte da Serra da Mantiqueira, sofreram uma derruição deplorável. É o que alguém no Brasil – falando de gente inteligente e bioética – não quer que se repita na Amazônia brasileira, em um espaço de 4.200.000 km².

Os relatores do Código Florestal falam que as áreas muito desmatadas e degradadas poderiam ficar sujeitas a “(re)florestamento” por espécies homogêneas pensando em eucalipto e pinus. Uma prova de sua grande ignorância, pois não sabem a menor diferença entre reflorestamento e florestamento. Esse último, pretendido por eles, é um fato exclusivamente de interesse econômico empresarial, que infelizmente não pretende preservar biodiversidades. Sendo que eles procuram desconhecer que para áreas muito degradadas foi feito um plano de (re)organização dos espaços remanescentes, sob o enfoque de revigorar a economia de pequenos e médios proprietários: o Projeto FLORAM.

Os eucaliptólogos perdem sentido ético quando alugam espaços por trinta anos de incautos proprietários, preferindo áreas dotadas ainda de solos tropicais férteis, do tipo dos oxissolos, e evitando as áreas degradadas de morros pelados reduzidas a trilhas de pisoteio, hipsométricas, semelhantes ao protótipo existente no Planalto do Alto Paraíba, em São Paulo. Isso ao arrendar terras de bisonhos proprietários, para uso em 30 anos, e sabendo que os donos da terra podem morrer quando se completar o prazo. Fato que cria um grande problema judicial para os herdeiros, sendo que ao fim de uma negociação as empresas cortam todas as árvores de eucaliptos ou pinus, deixando miríades de troncos no chão do espaço terrestre. Um cenário que impede a posterior reutilização das terras para atividades agrárias. Tudo isso deveria ser conhecido por aqueles que defendem ferozmente um Código Florestal liberalizante.

Por todas as razões somos obrigados a criticar a persistente e repetitiva argumentação do deputado Aldo Rebelo, que conhecemos há muito tempo e de quem sempre esperávamos o melhor. No momento somos obrigados a lembrar a ele que cada um de nós tem de pensar na sua biografia e, sendo político, tem de honrar a história de seus partidos. Principalmente em relação aos partidos que se dizem de esquerda e jamais poderiam fazer projetos totalmente dirigidos para os interesses pessoais de latifundiários.

Insistimos que em qualquer revisão do Código Florestal vigente deve-se enfocar as diretrizes através das grandes regiões naturais do Brasil, sobretudo domínios de natureza muito diferentes entre si, tais como a Amazônia e suas extensíssimas florestas tropicais, e o Nordeste Seco, com seus diferentes tipos de caatingas. Trata-se de duas regiões opósitas em relação à fisionomia e à ecologia, assim como em face das suas condições sócio-ambientais. Ao tomar partido pelos grandes domínios administrados técnica e cientificamente por órgãos do Executivo federal, teríamos de conectar instituições específicas do governo brasileiro com instituições estaduais similares. Existem regiões como a Amazônia, que envolve conexões com nove estados do Norte brasileiro. Em relação ao Brasil Tropical Atlântico os órgãos do Governo Federal – IBAMA, IPHAN, FUNAI e INCRA – teriam que manter conexões com os diversos setores similares dos governos estaduais de norte a sul do Brasil. E assim por diante.

Enquanto o mundo inteiro repugna para a diminuição radical de emissão de CO2, o projeto de reforma proposto na Câmara Federal de revisão do Código Florestal defende um processo que significará uma onda de desmatamento e emissões incontroláveis de gás carbônico, fato observado por muitos críticos em diversos trabalhos e entrevistas.

Parece ser muito difícil para pessoas não iniciadas em cenários cartográficos perceber os efeitos de um desmatamento na Amazônia de até 80% das propriedades rurais silvestres.

Em qualquer espaço do território amazônico que vêm sendo estabelecidas glebas com desmate de até 80% haverá um mosaico caótico de áreas desmatadas e faixas de inter-propriedades estreitas e mal preservadas. Nesse caso, as bordas dos restos de florestas, inter-glebas, ficarão à mercê de corte de árvores dotadas de madeiras nobres. E, além disso, a biodiversidade animal certamente será profundamente afetada.

Seria necessário que os pretensos reformuladores do Código Florestal lançassem sobre o papel os limites de glebas de 500 a milhares de quilômetros quadrados, e dentro de cada parcela das glebas colocassem indicações de 20% correspondentes às florestas ditas preservadas. E, observando o resultado desse mapeamento simulado, poderiam perceber que o caminho da devastação lenta e progressiva iria criar alguns quadros de devastação similares ao que já aconteceu nos confins das longas estradas e seus ramais, em áreas de quarteirões implantados para venda de lotes de 50 a 100 hectares, onde o arrasamento de florestas no interior de cada quarteirão foi total e inconseqüente.

Bancos “verdes” financiam desmatamento

Sérgio da Luz Belsito*

A última edição da revista Por Sinal, do Sindicato dos Funcionários do Banco Central, revela em reportagem que os maiores bancos privados que atuam no Brasil nem sempre são transparentes no compromisso com a sustentabilidade ambiental. Quando se trata de liberar créditos vultosos, os bancos fecham os olhos para madeireiras ou para finalidades de forte impacto ambiental. A conclusão é extraída de uma pesquisa do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (GVCes).

Outro trabalho apurado pela revista, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), destaca que a preocupação com a saúde do planeta é uma questão mais de propaganda para as instituições financeiras do que um compromisso moral.

O paradoxo chegou ao Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), que definiu novas normas para estimular as empresas a adotarem práticas sustentáveis verdadeiras por meio da publicidade consciente. O objetivo é reduzir o espaço para a banalização da sustentabilidade e impedir que o tema possa confundir os consumidores.

Além de condenar todo e qualquer anúncio que estimule o desrespeito ao meio ambiente, o Código recomenda que a propaganda que cite a sustentabilidade contenha apenas informações ambientais passíveis de verificação e comprovação.

Apesar das novas regras do Conar para coibir o greenwashing, em que o discurso da sustentabilidade não tem correspondência em práticas sustentáveis, não há sinais de mudança nos comerciais ou nos portais dos bancos na internet.

*Presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central

Concurso do Senado clonou gabaritos das provas

Provas para consultor do Senado, um cargo de R$ 24 mil, têm exatamente a mesma sequência de respostas; questões gerais para o cargo têm respostas idênticas e conhecimentos específicos não diferenciam segundo tipo de prova

Maria Silva do Prado

Coincidência? O gabarito para as provas de consultor legislativo do Senado é idêntico em 5o das suas 80 questões - Maria Silva do Prado

Não importa se a prova era de português, direito constitucional e administrativo, raciocínio lógico ou inglês. Não importa se o candidato buscava ser consultor legislativo na área de agricultura ou de transportes. Qualquer que fosse a hipótese, duas coisas eram certas no concurso do Senado, realizado no último domingo (11). A primeira: quem fosse aprovado, passaria a ganhar um salário de quase R$ 24 mil. A segunda: a resposta certa para a primeira pergunta de qualquer uma das provas citadas acima, para qualquer um dos cargos, era letra “D”. Da mesma forma, a resposta em todos os casos para a segunda pergunta era letra “B”. E a coincidência seguia para 50 das 80 questões de todas as provas em todos os cargos de consultor legislativo. Em todas, a resposta para a questão de número 50 também era a mesma: letra “B”. Somente a partir daí, quando as provas deixam de cobrar um conteúdo geral e passam a cobrar conteúdo específico para cada área, é que os gabaritos mudam. Assim, se alguém possuísse o gabarito de qualquer uma das provas, poderia se habilitar a qualquer cargo, e acertar mais da metade da prova, porque, independentemente do conteúdo, a resposta era exatamente a mesma.

É mais um grave item na sequência de problemas ocorridos com as provas do concurso do Senado desde o último domingo. Já no dia da prova, a Fundação Getúlio Vargas (FGV), responsável pelo concurso, teve que cancelar as seleções para três cargos. Depois, descobriu-se que várias das questões da prova foram literalmente copiadas de outros concurso. Agora, oCongresso em Foco/SOS Concurseiro descobre mais um escândalo, provavelmente o maior deles: para as 50 questões de conhecimentos não específicos cobrados nas provas de consultor legislativo, o gabarito é exatamente o mesmo

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O posto mais cobiçado do Senado, de consultor legislativo, oferece nove vagas imediatas e formação de cadastro de reserva e remuneração inicial de R$ 23,8 mil. Cada um dos 8.607 inscritos desembolsou R$ 200 para participar da seleção, o que rendeu R$ 1,7 milhões de arrecadação para a organizadora.

Gabaritos com a mesma sequência de respostas para todas as questões, conforme gabarito oficial preliminar da FGV

Gabaritos com a mesma sequência de respostas para as questões de conhecimento não específico e diferentes para disciplinas específicas, conforme gabarito oficial preliminar da FGV

Conforme apuração do SOS Concurseiro/Congresso em Foco, as respostas às questões aplicadas do concurso, divulgadas na última quarta-feira, permitiam que qualquer candidato respondesse igualmente às perguntas de português, conhecimentos gerais, direito constitucional e administrativo, raciocínio lógico e inglês. Na sequência final da prova, haveria 30 questões de conhecimento específico. O mínimo para aprovação na área era acertar 18 das 30 questões. Ou seja: alguém que tivesse o gabarito e, graças a ele, acertasse todas as questões de conhecimentos gerais, só precisaria estudar para acertar 18 das 30 questões de conhecimento específico.

Não é a primeira vez que há problemas com a seleção dos futuros consultores. Como divulgou oSOS Concurseiro/Congresso em Foco em dezembro, o edital divulgado às vésperas do Natal continha conteúdo programático clonado do processo seletivo para o mesmo cargo realizado pelo Cespe em 2001. Na primeira semana de janeiro foi divulgado edital retificador (veja o que mudou no concurso do Senado).

Imoral

Na avaliação do professor de Direito Administrativo, Washigton Barbosa, não há ilegalidade em oferecer uma mesma prova a todos e não há obrigatoriedade de oferecer vários tipos de avaliações, a não ser que isso esteja previsto no contrato entre o órgão e a banca. “Pelo contrário, é esperado que exista isonomia na avaliação”. Porém, ele considera que oferecer quatro tipos de provas iguais é imoral. “Atitudes como esta facilitam a cola dentro da sala de prova e tornam o concurso vulnerável”.

Barbosa critica a simplificação do processo seletivo. “O que a FGV fez foi criar formas de reduzir o custo na prova: fazer um só tipo de prova com cores diferente é mais barato do que imprimir vários tipos”, exemplifica. Outro fator que considera grave é o que chamou de uma maneira de “enganar o concurseiro” ao dispor de cores diferentes identificando o tipo de prova enquanto, na realidade, todos faziam as mesmas questões, na mesma ordem.

Outras irregularidades

Desde domingo, dia das provas, os candidatos relatam falta de organização e de segurança nos locais de prova, envelopes com cadernos de questões com lacres rompidos, falta de páginas, cadernos trocados, telefones celulares tocando durante a avaliação e erros de português nos enunciados. Parte das reclamações se transformaram em boletins de ocorrência na 21ª Delegacia da Polícia de Brasília e foram parar na Polícia Federal, que garantiu investigar. Com a anulação das provas para os cargos de analistas legislativos nas áreas de enfermagem, análise de sistemas e análise de suporte de sistemas. Ao todo são cerca de 10,5 mil candidatos prejudicados diretamente que disputam 15 vagas.

Processos seletivos de, pelo menos, mais dois cargos também estão “contaminadas” por problemas. Conforme divulgou o Correio Braziliense, na edição da última sexta-feira, duas questões do cargo de analista da área de fisioterapia são idênticas às aplicadas no concurso da Prefeitura de Balnerário Camboriú, em 2008, e da Eletronorte, em 2006, organizadas, respectivamente, pelas empresas Fepese e NCE/RJ. E outras duas perguntas para médico urologista foram clonadas do caderno de questões da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, aplicadas em 2010.

O advogado especialista em concursos, José Vânio Sena, a FGV ignorou o ineditismo. “Quando se contrata uma banca está implícito ao contratante que as questões serão inéditas”, explica. Ele detalha que as atitudes que estão sendo exposta pela imprensa contra a seleção devem ser levadas ao conhecimento do Ministério Público. “Todos os candidatos que se sentirem prejudicados devem levar o caso para o Ministério Público Federal”.

Ao longo da semana, mais denúncias chegaram ao conhecimento da Polícia Federal, e o Ministério Público Federal também decidiu investigar: vai avaliar se há irregularidades na contratação da banca por dispensa de licitação e a inscrição e depois expulsão do processo seletivo da servidora que integrava a comissão organizadora interna. (CF)

 
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