segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Michel Temer, o vice que virou problema

Sylvio Costa/Congresso em Foco

Dizer que o PMDB e sua notória voracidade por cargos, verbas e outros nacos de poder são neste momento o maior problema político no caminho de Dilma Rousseff é contar parte da história. Para ser preciso, é o presidente nacional do PMDB e vice-presidente da República eleito, Michel Temer, a grande encrenca que Dilma tem enfrentado nas últimas semanas.


Como aliado, Temer é uma graça. Sem ouvir antes Dilma, assumiu com policiais, parlamentares e outras categorias o compromisso de usar seus últimos momentos de presidente da Câmara dos Deputados para aprovar aumentos salariais bilionários, que podem criar um grave problema econômico interno numa conjuntura em que a realidade externa – de recessão e pressão cambial – já é desfavorável. Mostra disposição para brigar se o PMDB, segunda bancada da Câmara, não ficar com a presidência da Casa. E não para de defender, às vezes ostensivamente, posições – leia-se: cargos e orçamentos – para o seu partido, como a manutenção dos seis ministérios já ocupados pelo PMDB (tese descartada por Dilma) ou a indicação do braço direito, Moreira Franco, para o primeiro escalão. Com mais discrição, se articula para influenciar até as escolhas de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e do novo procurador-geral da República (o mandato do atual, Roberto Gurgel, acaba em julho de 2011).

Mais do que nunca, Temer encarna a figura de dirigente máximo do seu partido, cargo que exerce com gosto desde setembro de 2001. São quase dez anos no controle de uma das principais máquinas partidárias do país, e ele parece determinado a mantê-lo em suas mãos. Mais que isso. Dá demonstrações de que chega ao governo com a pretensão de ampliar tanto o seu poder pessoal quanto o do PMDB. Emitiu o primeiro sinal nesse sentido, em almoço em Brasília, realizado ainda na campanha eleitoral. “Estamos aqui partilhando este pão, assim como partilhamos este governo e estaremos no futuro partilhando o governo com a presidente Dilma", proclamou.

Soube-se depois, graças à colunista Mônica Bergamo, que o então candidato a vice já engatilhava um plano B naqueles dias em que saudava as delícias do pão petista. O ex-governador do Rio Moreira Franco (de novo ele!) negociava à época uma aproximação com Gilberto Kassab (DEM) no estilo Bombril, ou seja, com mil e uma utilidades. No mínimo, estaria estabelecida uma ponte para composição com José Serra na hipótese de vitória tucana contra Dilma. No máximo, as conversas poderiam resultar em fusão do partido do prefeito paulistano com o PMDB. Tratava-se, em qualquer circunstância, de construir alianças para aumentar o cacife do partido na partilha da administração federal.

Ambos os cenários (Serra presidente ou a fusão PMDB/DEM) estão descartados, no primeiro caso possivelmente para sempre, mas o namoro com Kassab prossegue em São Paulo, assim como o desejo de se cacifar para vender mais caro o apoio a Dilma. É nesse contexto que deve ser compreendida a ameaça de formação de um bloco na Câmara juntando os peemedebistas a quatro notáveis insígnias da devoção ao interesse público, o PR de Valdemar Costa Neto, o PTB de Roberto Jefferson, o PP de Paulo Maluf e o PSC de Joaquim Roriz.

O grupo reúne, por coincidência, os partidos que apresentaram nas últimas eleições os mais altos índices de candidatos enrolados. Nenhuma novidade para o decadente PMDB de hoje, uma organização que em nada lembra a agremiação que no passado simbolizou a defesa da democracia e a luta contra o arbítrio. Esse PMDB em que Temer é rei, e no qual políticos de boa reputação como os senadores Pedro Simon (RS) e Jarbas Vasconcelos (PE) ficaram em minoria, é o campeão em número de parlamentares processados no Supremo.

Temer é doutor em Direito e constitucionalista, disciplina sobre a qual lecionou e escreveu vários livros. Sabe perfeitamente o que diz a Constituição sobre as atribuições do vice-presidente da República. O seu papel se restringe a substituir o presidente, nos casos de ausência deste, e a participar de órgãos consultivos ou realizar missões especiais, quando convocado pelo chefe do Executivo. Constitucionalmente, portanto, cabe a Dilma, e só a ela, decidir sobre nomeações.

Por que então, sabendo disso, Michel Temer cria tantos problemas? Uma razão provável é que acredite que tenha chegado a sua grande chance. Com 70 anos, um currículo vistoso e um patrimônio que apresentou excepcional crescimento nos últimos anos, Temer quer mais. E se tornar vice-presidente, acumulando o comando de um partido importante, equivale a um bilhete premiado para alguém que, como ele, fez carreira política em razão da reconhecida habilidade nos bastidores e não do poder de fogo eleitoral. Assumiu como suplente dois dos seis mandatos que desempenhou como deputado federal por Sâo Paulo. Nas eleições de 2006, em que apoiou Geraldo Alckmin (PSDB) contra Lula (PT), elegeu-se com dificuldades. Votação boa mesmo teve em 1998 e em 2002, quando recebeu, respectivamente, 206.154 e 252.229 votos. Foi bastante ajudado pela proximidade com a cúpula do PSDB e do governo Fernando Henrique, do qual foi um dos principais pilares no Congresso durante oito anos. Foi naqueles tempos que ganhou do então senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) o apelido de “mordomo de filme de terror”.

É um achado. Combinam-se nele o semblante inflexível, e pouco dado a risos; a oratória correta, mas que não empolga; e a eventual condição de suspeito. Temer, definitivamente, não é bom de imagem. Por isso, os marqueteiros de Dilma trataram de escondê-lo ao longo da maior parte da campanha eleitoral. Durante o panetonegate, veio à tona vídeo em que o empresário Alcir Collaço o acusava de receber R$ 100 mil por mês do mensalão do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda (o que o vice nega). Temer também foi uma das mais reluzentes estrelas da farra das passagens aéreas, revelada pelo Congresso em Foco. Junto com a família, fez turismo na Bahia com passagens pagas pela Câmara. Em nota, argumentou que “o crédito era do parlamentar”, incorrendo em lamentável confusão entre o público e o privado. Se a verba era pública, não podia ser do parlamentar. E a ilegalidade do procedimento, desde o primeiro instante atestada por diversas fontes jurídicas procuradas pelo site, ficou patente na decisão do Tribunal de Contas da União.

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