quinta-feira, 3 de maio de 2012

O torturador delegado Calandra (capitão Ubirajara) foi citado pelo torturador arrependido Cláudio Guerra

Cláudio Guerra cita o delegado Calandra:

“O delegado Fleury tinha de morrer. Foi uma decisão unânime de nossa comunidade, em São Paulo, numa votação feita em local público, o restaurante Baby Beef”, afirma Cláudio Guerra.
Além dele, segundo conta, estavam sentados à mesa e participaram da votação:

 O ex-delegado dá os nomes dos comandantes da operação, “os mesmos de sempre”:
O coronel do Exército Ênio Pimentel da Silveira (conhecido como “Doutor Ney”); o coronel-aviador Juarez de Deus Gomes da Silva (Divisão de Segurança e Informações do Ministério da Justiça); o delegado da Polícia Civil de São Paulo Aparecido Laertes Calandra; o coronel de Exército Freddie Perdigão (Serviço Nacional de Informações); o comandante Antônio Vieira (Cenimar); e o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra (comandante do Departamento de Operações de Informações do 2º Exército – DOI-Codi), que abriu a reunião.
“Fleury tinha se tornado um homem rico desviando dinheiro dos empresários que pagavam para sustentar as ações clandestinas do regime militar. Não obedecia mais a ninguém, agindo por conta própria. E exorbitava. (...) Nessa época, o hábito de cheirar cocaína também já fazia parte de sua vida. Cansei de ver.”

Dossiê do Aparecido Laertes Calandra - capitão Ubirajara:
O Grupo Tortura Nunca Mais/RJ pesquisou em diversas fontes e nos 12 volumes do Projeto Brasil Nunca Mais coordenado pela arquidiocese de São Paulo e constatou o nome do capitão Ubirajara, cujo nome verdadeiro é o Aparecido Laertes Calandra, denunciado pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos políticos e várias entidades de direitos humanos como torturador e membro do aparato de repressão, em São Paulo.

É importante enfatizar que o Projeto Brasil Nunca Mais é a microfilmagem de todos os processos de presos políticos no período de 1964 a 1978, que se encontram no Superior Tribunal Militar em Brasília. Trata-se, portanto, de documentação oficial que não pode ser rotulada de facciosa.

O nome do Capitão Ubirajara, cuja identidade verdadeira, Aparecido Laertes Calandra, foi revelada no início dos anos 80, quando foram abertos os arquivos do DOPS/SP, aparece à pág. 55 Tomo II volume 3 “Os Funcionários” do Projeto BNM, na lista de “Elementos Envolvidos Diretamente em Torturas”, como Investigador da Polícia no DEIC-SP, em 1968.
 Denuncia sua atuação em torturas: Edson Vieira, 24 anos, militar, em 1968. Seu depoimento consta à pág 797, Tomo V, vol 1 “As Torturas” do Projeto BNM:

“(...) que veio a saber que Pierino Gargano, que a mulher desse tinha sido vítima de estupro, por parte do investigador Ubirajara, mandado pelo Delegado Ernesto Milton Dias e Delegado Fleury; que, há cerca de duas semanas, antes dessa audiência, o investigador Ubirajara esteve no Recolhimento Tiradentes onde, diante da cela em que se acha o interrogado, na presença desse e de Tinoco , Aladino, Sgt. Cláudio, Fernando, declarou que desejava desculpar-se a Pierino, por ter praticado aquele ato, mas, não sabia como faze-lo, ocasião em que mencionou como mandante aqueles dois delegados; que a vítima daquele crime foi a companheira de Pierino, que, na ocasião, estava grávida de quatro meses; que ela foi submetida a tal crime (...)” 

Também denuncia o Capitão Ubirajara, Pierino Gargano, mecânico, 21 anos, em 1968 em seu depoimento, que se encontra à pág. 528, do Tomo V, vol. 3 “As Torturas” do Projeto BNM:

“(...) que, apesar de inocente, e de não saber da participação de qualquer dos acusados, naquele ato, teve de confessar e apontar outras pessoas porque estava fisicamente coagido pela Polícia e, ameaças pairavam sobre sua própria família; que, durante as investigações policiais, o depoente, seu pai, sua irmã e sua noiva, foram seviciados, tendo sua noiva revelado ao depoente que tinha sido vítima de estupro, por parte dos investigadores Ubirajara e Gaúcho que, para tanto, se valeram da função pública de que estavam investidos (...)”
Tais declarações fazem parte do Processo nº 57/68, Apelação ao STM nº 38 081, recurso ao STF nº 1 160, da 2ª Auditoria, 2ª RM/CJM constando de 5 volumes e 5 apensos. Tais informações encontram-se à pág. 52 do Tomo II vol. 1 “A Pesquisa BNM”. Esse processo é contra a quadrilha de Aladino Felix, também conhecido como “Sábado Dinotus”, responsável por inúmeros assaltos e atentados terroristas executados em São Paulo em 1968. O líder da quadrilha tinha como motivação um misto de fanatismo religioso, alegando elos com outros planetas e confusas ligações políticas com áreas das Forças Armadas possivelmente de ultra-direita. (Informações à pág 152 do Tomo II vol. 1 “A Pesquisa BNM”).
Encontramos o nome de Aparecido Laerte Calandra na lista de “Membros de Órgão de Repressão”, citado duas vezes: como delegado em 03/75, em São Paulo e, em 09/75, também como delegado, no Paraná. Essa denúncia está contida no Processo 189/75, com Apelação ao STM nº 41 923, da 3ª Aud. 2ª RM/CJM, constando de 6 volumes (informações à pág. 66 do Tomo II vol. 1 “A Pesquisa BNM”. Nesse processo os réus são acusados de pertencerem ao PCB em São Paulo, compondo organismos de direção e várias bases, inclusive uma de advogados. Apuram-se várias reuniões clandestinas, arrecadação financeira, distribuição de “Voz Operária”, apoio a candidatos do MDB em 1972 e 1974, etc. No decorrer do inquérito foi morto o operário Manoel Fiel Filho, por “suicídio”, na versão dos autos (informações à pág. 222 do Tomo II vol. 1 “A pesquisa BNM”)

Segundo depoimentos prestados pelos ex-presos políticos Maria Amélia Almeida Teles e César Augusto Teles, na Auditoria Militar e do ex-preso político José Auri Pinheiro, na Polícia Federal do Ceará, o delegado Aparecido Laerte Calandra foi um dos torturadores e responsável pelo assassinato do dirigente do Partido Comunista do Brasil, Carlos Nicolau Danielli, no DOI-CODI/SP, em dezembro de 1972 (informações contidas à pág. 142 do Dossiê de Mortos e Desaparecidos Políticos a Partir de 1964 (Grupo Tortura Nunca Mais/RJ e Pe, Comissão de familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos e Instituto de Estudos da Violência do Estado)

Ainda segundo o Dossiê dos Mortos e Desaparecidos Políticos, o delegado Aparecido Laerte Calandra, o investigador Pedro Maria Grancieri, o capitão Dalmo Lúcio Muniz Cirillo e o major Carlos Alberto Brilhante Ustra, foram os torturadores e assassinos do dirigente do Movimento de Libertação Popular (MOLIPO) Hiroaki Torigoi, no DOI-CODI/SP, em janeiro de 1972 (informações à pág. 154).

O nome do Capitão Ubirajara também é associado ao episódio que resultou na morte do jornalista Vladimir Herzog nas dependências do DOI-CODI/SP, em outubro de 1975. O IPM (Inquérito Policial Militar) que concluiu que Herzog havia se enforcado na grade da cela não ouviu Calandra, apontado nos laudos como o autor do pedido de perícia.

No mesmo mês de outubro de 75 em que Herzog morreu, o codinome Capitão Ubirajara já aparecia na lista de 233 torturadores do relatório produzido no Presídio da Justiça Militar Federal e encaminhado ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Entre os presos políticos que assinam o documento está José Genoino, atual presidente do PT.
O Capitão Ubirajara é o número 84 da lista. Os presos não sabiam sua identidade completa na época. Isso só aconteceu anos depois, quando Calandra foi trabalhar com senador Romeu Tuma (PFL-SP) na Superintendência da Polícia Federal em São Paulo, em 83. Coube a ele cuidar dos arquivos da polícia política paulista transferidos para a PF pouco antes de o então governador Franco Montoro extinguir o Dops. Sob seus cuidados, parte das informações dos arquivos desapareceu.

Em janeiro de 1995 foi indicado para a Chefia do DETRAN/SP, ao tomar conhecimento das denúncias, o então Secretário Estadual de Justiça de SP, advogado Belisário dos Santos, imediatamente afastou o delegado Aparecido Laerte Calandra do cargo.

Em abril de 2003, o delegado Calandra foi nomeado pelo governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB) para o Comando do Departamento de Inteligência do Departamento Estadual de Investigações sobre Narcóticos da Polícia Civil de São Paulo. No organograma da segurança pública do Estado, o departamento de Calandra está subordinado ao gabinete do delegado-geral da Polícia Civil, Marco Antonio Desgualdo, subordinado, por sua vez, ao secretário de Segurança, Saulo de Castro Abreu Filho, ambos indicados pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB). No prédio do bairro da Luz, uma das atribuições de Calandra é cuidar da escuta telefônica.

No organograma da segurança pública do Estado, o departamento de Calandra está subordinado ao gabinete do delegado-geral da Polícia Civil, Marco Antonio Desgualdo, subordinado, por sua vez, ao secretário de Segurança, Saulo de Castro Abreu Filho, ambos indicados pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB). No prédio do bairro da Luz, uma das atribuições de Calandra é cuidar da escuta telefônica.

O Secretário Nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda (PT/MG), ex-preso político, se lembra do Capitão Ubirajara das passagens pelo DOI-Codi. "Calandra teve um papel importante, não era do segundo time, estava na linha de frente da repressão. Era um militante da tortura, não um cumpridor de ordens", disse Miranda (Jornal Folha de São Paulo, 13/04/03).

Diante do exposto, fica claramente evidenciada e comprovada a participação de Aparecido Laerte Calandra em crimes de Lesa Humanidade, crimes que até hoje continuam impunes, que ferem, mancham e envergonham a nação brasileira.

Grupo Tortura Nunca Mais

Rio de Janeiro, 16 de abril de 2003


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