segunda-feira, 13 de junho de 2011

Presídios federais de segurança máxima já recebem até ladrão de bicicleta

Criadas para receber detentos de alta periculosidade em caráter excepcional, as penitenciárias federais têm virado "solução improvisada" para abrigar presos comuns na tentativa de desafogar os caóticos presídios estaduais.

Fábio Motta/AE - 29-01-08
Fábio Motta/AE - 29-01-08
Catanduvas. Preocupados com o desvio de função, autoridades carcerárias criaram grupo de discussão

Autoridades que lidam com o sistema carcerário estão preocupadas com esse desvio de função, já que presos que cometeram crimes considerados menos graves estão recebendo o mesmo tratamento conferido a chefes do crime organizado - e podem ser cooptados por eles. A questão tem sido tratada por um grupo de trabalho formado por representantes da Defensoria Pública da União (DPU) e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen).

Um dos principais temores é de que haja aliciamento de presos comuns pelo crime organizado, sob forma de pagamento de advogados e viagem de parentes para visitas às penitenciárias. Hoje, 463 detentos estão nas quatro penitenciárias federais existentes - Catanduvas (PR), Campo Grande (MS), Porto Velho (RO) e Mossoró (RN).

"A partir do momento em que não se faz uma seleção por perfil, é evidente que, ao colocar uma pessoa sem periculosidade com outras, ela vai aderir a um grupo dominante, mais forte", diz o juiz corregedor do presídio de Mossoró, Mário Jambo.

Durante as férias do juiz federal, em fevereiro, um grupo de seis presos acabou transferido para a penitenciária, entre eles o traficante Fernandinho Beira-Mar. Jambo recorreu da decisão, mas o Tribunal Regional Federal da 5.ª Região, no Recife, manteve Beira-Mar em Mossoró.

Segundo o juiz corregedor, que considera precárias as condições de segurança na penitenciária, um caso emblemático foi o de um rapaz de 20 anos condenado por furto de bicicleta, que acabou enviado a Mossoró, mas já saiu do presídio. "Está havendo um desvio da finalidade, até para socorrer o sistema penitenciário estadual, que sofre com excesso de lotação", diz o defensor público César Gomes, que presta assistência jurídica a presos de Catanduvas.

Autoridades ouvidas pelo Estado não souberam precisar quantos presos sem perfil estariam hoje nas penitenciárias federais, mas acreditam que, em algumas delas, a porcentagem pode chegar a 50%. Jambo disse que no início do ano mandou de volta a Rondônia cerca de 50 presos comuns que estavam na penitenciária de Mossoró.

"Não é apenas o fato de ser perigoso que justifica envio a presídio federal. O preso deve trazer risco extremamente elevado que justifique isso, já que se trata de um regime de exceção", diz o defensor público Filippe Augusto dos Santos, de Mossoró. "A sociedade quer se livrar dessas pessoas. A questão é que elas continuam sendo pessoas e um dia vão voltar ao nosso convívio. Temos de nos preocupar em dar tratamento jurídico correto e garantir a oportunidade de melhorar."

Condições. A Lei 11.671, de 2008, determina que estabelecimentos penais federais de segurança máxima recebam "aqueles cuja medida se justifique no interesse da segurança pública ou do próprio preso".

Entre as condições para a inclusão nas penitenciárias estão o desempenho de função de liderança ou "participação relevante" em organização criminosa e atuação em fugas e quadrilhas.

A legislação fixa prazo de 360 dias para a permanência, que pode ser renovável "excepcionalmente". O Estado apurou que há casos de presos há cinco anos em penitenciárias federais. É comum haver nos pedidos de transferência alegações de que detentos participaram de rebeliões ou tentativas de fuga, mas defensores alegam que muitas vezes faltam provas consistentes.

"Essa questão de ter ou não perfil é subjetiva. A maioria dos presos em Porto Velho é acusada de roubo, sequestro e extorsão, mas para a defesa em muitos casos não há prova da alta periculosidade deles", diz o defensor público Antônio Porto Alegre. (AE)



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