segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Julgamento de morte de índio frustra Cimi




O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), divulgou ontem nota manifestando indignação e preocupação com o resultado do julgamento de três dos acusados pela morte do cacique Marcos Veron, ocorrido em 2003, em Mato Grosso do Sul. Por decisão do tribunal do júri, na 1.ª Vara Federal Criminal de São Paulo, eles foram absolvidos da acusação de homicídio.

O júri aceitou, porém, parte das acusações feitas pelo Ministério Público Federal - o que levou à condenação de cada um dos acusados a 12 anos e 3 meses de prisão, por sequestro, tortura e formação de quadrilha. Por terem recebido habeas corpus preventivo do Supremo Tribunal Federal (STF), eles poderão recorrer da sentença em liberdade.

O julgamento, encerrado na noite de sexta-feira, em São Paulo, durou cinco dias. Ao se manifestar, a regional do Cimi em Mato Grosso do Sul disse: "A decisão que acolheu parcialmente as alegações do MPF, mas que não reconheceu a prática do crime de homicídio praticado contra o cacique e da tentativa de homicídio contra seus familiares, e o fato dos acusados poderem recorrer da sentença em liberdade, traz relevante indignação e preocupação desta entidade pela impunidade do fato e as consequências deste precedente".

O Cimi também diz que vai brigar pela reforma da sentença. Na avaliação da entidade, trata-se de um caso emblemático. "Que este julgamento signifique, ao menos, o início de uma fase de responsabilização e condenação dos culpados pelos vários outros assassinatos de lideranças indígenas em Mato Grosso do Sul."

O crime ocorreu no município de Juti. Os índios guaranis haviam ocupado uma fazenda, alegando que se tratava de terra indígena. Em seguida, foram ameaçados e espancados por quatro homens armados. O cacique, de 72 anos, morreu em decorrência do espancamento.

Um dos acusados está foragido. O dono da fazenda e outros 23 acusados ainda aguardam julgamento. O caso deveria ter sido julgado na região de Dourados, mas foi transferido para São Paulo, por solicitação do MPF, que alegou a impossibilidade de isenção dos jurados locais.

Surpresa. O procurador Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, que atuou no julgamento, considera o resultado parcialmente satisfatório. "Ao condenar os três por tortura, sequestro e quadrilha armada, o júri deixou claro que o direito do índio não pode mais ser desrespeitado impunemente. Ficamos surpresos, porém, com o fato de não terem sido condenados por homicídio."

Santos deve recorrer, pedindo agravamento das penas, que considerou brandas. Do lado dos réus, o advogado Alexandre de Sá Domingues, que defendeu a tese, vitoriosa, da inexistência de provas para condenação por homicídio, também vai recorrer, pedindo o abrandamento das penas.

Fonte: AE


ENTREVISTA COM A FILHA DO CACIQUE ASSASSINADO

Clique na imagem e assista ao vídeo que retrata de forma emocionante o assassinato de Verón:




HISTÓRICO:

O caso Verón
11/05/2010 at 12:05 (Hermano de Melo)
Hermano de Melo*

O fato aconteceu na passagem do dia 12 para o dia 13 de janeiro de 2003, no acampamento indígena Takuara, localizado na fazenda Brasília do Sul, em Juti, sul de Mato Grosso do Sul, de propriedade do senhor Jacintho Honório Silva Filho. Quatro homens armados e empregados da fazenda – Estevão Romero, Carlos Roberto dos Santos, Jorge Cristaldo Insabralde e Nivaldo Alves Oliveira (foragido) – foram responsabilizados pelo crime, mas o proprietário, suspeito de ser o mandante, foi apenas indiciado. Segundo consta, eles ameaçaram, espancaram e atiraram nos líderes indígenas, incluindo Marcos Verón, que na época tinha 72 anos e morreu de traumatismo craniano. (Thiago Gomes/Correio do Estado, 03, 05,08/05/2010).

“Eles chegaram às 3 horas da madrugada de terça-feira, já atirando. Todo mundo correu para o meio do mato, a beira do rio, menos um filho meu de 11 anos, eu, meu pai e minha irmã, que estava grávida de seis meses. Tiraram a gente do barraco, puseram eu e meu e meu pai de joelhos e começaram a espancar nós dois, com chutes, coronhadas de espingarda e revólver. Aí me amarraram e queriam botar fogo em mim com gasolina. Fizeram um fogo e eu fiquei de lado, ardendo, tanto que depois no hospital o doutor disse que eu tava com queimadura de 2º e 3º graus. Meu pai continuou amarrado, e eles batendo o tempo todo com chutes e coronhadas. Aí chegaram outros com mais duas mulheres e duas crianças e começaram a espancar todo mundo. Nas crianças eles batiam de cinto. Aí puseram a gente numa caminhonete e levaram para beira de uma estrada. Bateram tanto na gente que eu desmaiei (…) Meu pai tava do lado, todo machucado, cheio de sangue. Consegui pegar uma carona até uma parte da estrada. Aí levei meu pai num carro da aldeia até o hospital de Dourados, mas ele já chegou praticamente morto. Só depois, na Polícia Federal, foi que avisaram que meu pai tinha morrido”. (Depoimento de LadioVerón Cavalheiro que na época tinha 37 anos, e conta como foi a morte do pai, Marcos Verón, na madrugada do dia 12 para o dia 13 de Janeiro de 2003) (Marta Ferreira/Campo Grande News, 19/04/2010).


MPF/MS: Julgamento histórico de morte de indígena acontece dia 21 em São Paulo

É a primeira vez que acusados pela morte de um indígena em Mato Grosso do Sul vão para o banco dos réus.

O julgamento dos três acusados pelo assassinato do cacique guarani-kaiowá Marcos Veron, ocorrido em janeiro de 2003 em Juti, no interior de Mato Grosso do Sul, acontece na próxima segunda (21), em São Paulo. A pedido do Ministério Público Federal (MPF), o Tribunal do Júri foi transferido de MS para SP para garantir a imparcialidade dos jurados e evitar que a decisão sofra influência social e econômica dos envolvidos no crime.

Pelo MPF, participam do julgamento, no Fórum Jarbas Nobre, na capital paulista, os procuradores da República Marco Antônio Delfino de Almeida, de Dourados, Rodrigo de Grandis e Marta Pinheiro de Oliveira Sena, de São Paulo, além do procurador regional da República Luiz Carlos dos Santos Gonçalves.

O julgamento é considerado histórico pois é a primeira vez que acusados pela morte de um indígena em Mato Grosso do Sul vão para o banco dos réus. Estevão Romero, Carlos Roberto dos Santos e Jorge Cristaldo Insabralde são acusados de homicídio duplamente qualificado por motivo torpe e meio cruel, tortura, seis tentativas qualificadas de homicídio, seis crimes de sequestro, fraude processual e formação de quadrilha. Outras 24 pessoas foram denunciadas por envolvimento no crime.

O júri foi suspenso em maio do ano passado, depois que o MPF abandonou o plenário, em protesto contra a decisão da juíza Paula Mantovani Avelino, da 1ª Vara Federal (SP), que iria designar intérprete apenas para os índios que não falam português. Para o MPF, o fato de um indígena compreender o que é perguntado não significa domínio completo do idioma e do universo simbólico que ele representa. Além disso, a ordem para que os índios falem apenas Português, sem auxílio de intérprete, viola convenções internacionais e a Constituição Federal.

Entenda o caso

Acampados na Fazenda Brasília do Sul, em Juti, região sul do estado, na área reivindicada por eles como Tekohá Takuara, os kaiowá sofreram ataques nos dias 12 e 13 de janeiro de 2003, de um grupo de trinta a quarenta homens armados que foram contratados para agredi-los e expulsá-los daquelas terras.

No dia 12, um veículo dos indígenas com 2 mulheres, um rapaz de 14 anos e 3 crianças de 6, 7 e 11 anos foi perseguido por 8 km, sob tiros.

Na madrugada do dia 13, os agressores atacaram o acampamento a tiros. Sete índios foram sequestrados, amarrados na carroceria de uma camionete e levados para local distante da fazenda, onde passaram por sessão de tortura. Um dos filhos de Veron, Ládio, quase foi queimado vivo. A filha dele, Geisabel, grávida de sete meses, foi arrastada pelos cabelos e espancada. Marcos Veron, à época com 73 anos, foi agredido com socos, pontapés e coronhadas de espingarda na cabeça. Ele morreu por traumatismo craniano.

Transferência do júri

Entre os motivos levantados pelo MPF para pedir a transferência do Tribunal do Júri de Dourados (MS) para a capital paulista estão o poder econômico e a influência social do proprietário da fazenda, Jacinto Honório da Silva Filho. Ele teria negociado com dois índios a mudança de seus depoimentos. Eles assinaram um documento em 2004 mudando a versão que deram ao crime, no dia seguinte ao assassinato, inocentando os seguranças contratados pelo fazendeiro. O fazendeiro teria tentado, inclusive, comprar o depoimento do filho do cacique assassinado, oferecendo-lhe bens materiais em troca da assinatura de um termo de depoimento já redigido.

O MPF citou as manifestações de juiz estadual contra os indígenas e contra o procurador da República do caso. Manifestações na Assembléia Legislativa sul-mato-grossense, condenando os acampamentos indígenas e relativizando a morte das lideranças, bem como opiniões desfavoráveis aos índios em diversos jornais do estado também foram juntadas ao processo, para mostrar que um júri federal realizado em qualquer subseção judiciária do estado teria viés contrário aos índios.

Este foi o terceiro caso de desaforamento interestadual do Brasil. Os dois primeiros ocorreram no julgamento do ex-deputado federal Hildebrando Pascoal. Dois de seus júris federais foram transferidos de Rio Branco (AC) para Brasília.

Referência processual na Justiça Federal de São Paulo -

nº 2003.60.02.000374-2.

Assessoria de Comunicação Social
Procuradoria da República em Mato Grosso do Sul

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