sábado, 6 de novembro de 2010

AS DORES DA TRANSIÇÃO


Fábio Campana/Revista Idéias

No dia 1º de janeiro a trupe do PMDB deixará o governo do Paraná e a contragosto o entregará a Beto Richa, tucano eleito em 3 de outubro para governar pelos próximos quatro anos. A equipe de transição criada por Richa concluirá o seu relatório sobre a situação do Estado até 15 de novembro.


Com quantas decepções se faz uma transição? As expectativas do futuro governador não são boas. Por isso mesmo Richa estabeleceu esse prazo curtíssimo para a conclusão do diagnóstico.

“Não podemos perder tempo. Vamos começar a trabalhar desde o primeiro momento e, para isso, precisamos ter em mãos, o quanto antes, esse diagnóstico”, diz Richa.

Na verdade, Beto Richa quer ter uma visão completa do Estado antes de a Assembleia Legislativa começar a discutir o orçamento de 2011. O projeto foi encaminhado no início da semana passada aos deputados, e o relator do Orçamento do Estado para 2011, deputado Nereu Moura, do PMDB, foi logo avisando que há pouca margem para novos investimentos na previsão que beira os R$ 26 bilhões.

A equipe de transição de Beto orienta os deputados aliados a barrar, em plenário, projetos que possam sobrecarregar o orçamento do próximo ano. Porém, a bancada de apoio a Beto Richa é absoluta minoria na Casa e, dificilmente, sem acordo, haverá possibilidades de emperrar os projetos.

O líder do governo na Assembleia Legislativa, Caito Quintana, do PMDB, disse que há projetos que já têm previsão orçamentária e que não comprometerão as finanças futuras. É o caso da regulamentação da Defensoria Pública. “A mensagem apenas regulamenta uma situação. Foi uma proposta aprovada por unanimidade. Ao novo governo caberá decidir em que prazo executar a proposta. Não há uma imposição de tempo”, afirmou Quintana.

Há outros projetos que o governo nem faz questão de votar este ano. Como a mensagem que cria a Secretaria da Mulher, que somente poderá ser preenchida pelo próximo governador. “Há projetos de suplementação de verbas em algumas áreas, que serão executados com recursos do orçamento em vigor”, citou o líder do governo.

E há a gastança no fim de feira. Todos os dias chegam informações no bunker de Beto Richa sobre novos gatos absolutamente desnecessários, com a compra de computadores para a Sanepar e para a Celepar, como o pagamento de precatório, inclusive no porto de Paranaguá.

FIM DE FEIRA

A preocupação é grande. As notícias correm e dão conta de que o fim de feira deste governo de Orlando Pessuti se faz com prodigalidades nos gastos públicos que podem deixar o governo entrante de Beto Richa em péssima situação.

Por conta disso, o deputado Ney Leprevost está fazendo uma série de pedidos de informação sobre possíveis gastos deste fim de Governo. Esta semana foi aprovado em plenário seu questionamento sobre precatórios.

Agora, Leprevost quer saber se procede a informação de que o Governo do Estado, através da Celepar, estaria iniciando o processo de compra de 40 milhões em equipamentos. Semana passada, Ney Leprevost protocolou este pedido de informações na Assembleia Legislativa.

“Não é possível que o Governo que está terminando fique criando gastos que o novo Governo terá que pagar. Qualquer tentativa de sangria dos cofres públicos deve ser estancada imediatamente”, afirma Leprevost.

Pois, pois, agora é esperar para ver como ficam as contas públicas depois que o PMDB deixar definitivamente o poder. Pelas preliminares, será um desastre. Aliás, sempre foi nesses oito anos que já vão longe.

Os compromissos assumidos durante a campanha eleitoral pelo governador eleito do Paraná, Beto Richa (PSDB), consumirão 9% do orçamento que o Estado deve ter em 2011. Com o orçamento estadual apertado para o início de seu mandato, Beto vai ter trabalho para incluir recursos para os novos investimentos, na casa dos R$ 2,34 bilhões. A equipe de transição do governador eleito aguarda até 15 de novembro para receber o diagnóstico da situação financeira do Estado. Até lá, pouco se fala sobre garantias dos investimentos. Os envolvidos na transição preferem esperar e ter informações concretas da situação atual. Mas é possível ter uma estimativa do que vai precisar ser investido a mais, pelo menos nos principais pontos levantados durante a campanha e que serão novidades no Estado.

CAIXA BAIXA

Beto Richa terá dificuldades para cumprir promessas de campanha, pelo menos no início do mandato. Segundo o relator Nereu Moura, será necessário o corte de gastos no início da nova administração. Moura explica que a arrecadação do Estado em 2010 tem sido menor do que o previsto. Além disso, uma série de novas despesas e aumento de gastos estão programados para o ano que vem, com impacto direto nas contas públicas.

O relator lembra que só o aumento do repasse para o Tribunal de Justiça e o Ministério Público vai custar R$ 300 milhões a mais no ano que vem ao Estado. Outros R$ 600 milhões serão necessários para implementar os aumentos de salário de policiais, e mais R$ 169 milhões para os fiscais da Receita Estadual. “Ele (Richa) vai ter que tomar medidas amargas no início. Corre o risco até de chegar a maio e não ter como pagar o reajuste do funcionalismo”, prevê o peemedebista, lembrando que o governador prometeu, na campanha, contratar cinco mil novos policiais, e aumentar em 26% os salários dos professores estaduais.

O governador Orlando Pessuti procura minimizar a crise. Ele jura que o seu governo vai chegar ao fim de dezembro sem pendências financeiras. “O governante que entra terá a certeza e a segurança que vai receber o Paraná com as suas contas em ordem e os seus compromissos devidamente ajustados”, afirmou.

Pessuti explicou que as arrecadações de 2009 e 2010 foram abaixo do previsto, atrasando o que havia sido planejado em obras e reajustes salariais. “O último ano ficou sobrecarregado. A situação é apertada, mas vamos terminar o ano pagando os salários e deixaremos também em dia os nossos fornecedores e os empreiteiros que executam as obras”, disse.

Pessuti também respondeu às recentes críticas do ex-governador Roberto Requião. O governador lembrou que foi companheiro político de Requião por 27 anos, mas que, infelizmente, o ex-governador “tem histórico de trair aliados”.

“Em 1985, o José Richa se licenciou para ajudá-lo a ser eleito e, depois, foi apunhalado pelo Roberto Requião. Em 1990, o Alvaro Dias permaneceu no governo para eleger o Roberto Requião e, depois, teve nele um dos seus principais adversários. Mário Pereira (vice de Requião) nem sequer assumiu o governo em substituição a ele em 94 e já se transformou em inimigo. Assim foi com todos aqueles que o sucederam”, citou Pessuti.

EXIGÊNCIAS ALTAS

Sem informações oficiais é difícil prever o impacto do reajuste de 26% aos professores prometido por Beto “como primeiro ato de governo à categoria”, em discurso ao Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná (APP-Sindicato). Segundo a APP-Sindicato, embora o salário inicial de um professor que ingressa na rede pública seja de R$ 1.560 por 40 horas trabalhadas, o salário médio da categoria, que tem cerca de 65 mil profissionais, é de R$ 2.000. Tendo-se esse valor como base, o salário passaria a R$ 2.520, um impacto de mais R$ 439 milhões anuais.

Embora o futuro secretário estadual da Educação e vice-governador eleito, Flávio Arns, ainda não tenha o cálculo de quanto deve custar implantar a educação integral em 500 escolas em municípios com menor IDH, dois exemplos podem servir de referência. A Secretaria de Educação de Pernambuco tem, por escola, um custo de insumos (pessoal, alimentação, material de limpeza e outros) de R$ 2,47 milhões, o que no Paraná daria um total de R$ 1,23 bilhão, sem contar equipamentos e mobiliários. Outro tucano, candidato ao governo pelo Ceará, Marcos Cals, tinha proposta semelhante à de Beto e estimava R$ 250 milhões para 100 escolas.

A contratação de 5 mil policiais, que deve ocorrer de forma gradual, incrementa o orçamento em R$ 150 milhões ao ano, somente com o salário inicial pago a esses profissionais. Com o recente reajuste aprovado à categoria, um policial em início de carreira (soldado de primeira classe) vai receber R$ 2.289,57. Se o profissional tiver curso superior, o salário inicial sem adicional de tempo de serviço será de R$ 2.564,57. Contando com o 13º salário, o total fica em R$ 148.822.050, sem colocar na conta os recursos com os quais se deve capacitar os profissionais.

Uma mudança da gestão atual defendida por Beto Richa é que o Estado passe a cumprir a lei e invista 12% do orçamento na saúde. Desde que a emenda 29 foi aprovada, o Paraná jamais destinou o mínimo de 12% dos recursos próprios para a área, justificando que gastos com saneamento e programas sociais também entram na conta. Cálculos do Ministério Público do Paraná mostram que todo ano falta investir cerca de R$ 400 milhões na saúde, montante que Beto vai ter que incluir para cumprir o que prometeu.

Para o sistema de resgate aéreo prometido por Beto, dois helicópteros devem ser comprados, ao custo de R$ 12 milhões, já equipados para o serviço. Fora o custo de manutenção e hora voo de R$ 3 milhões ao ano para que os helicópteros funcionem quando necessário, em situações de urgência e emergência. Estão também previstos 22 novos Centros de Especialidades Médicas, em áreas onde há mais filas para consultas, como cardiologia, neurologia e oftalmologia. Em Minas Gerais, no ano passado, um novo centro custou R$ 5 milhões. Se a base for semelhante no Paraná, são mais R$ 110 milhões.

ROMBO NA PREVIDÊNCIA

Uma das informações mais desesperadoras recebidas por Beto Richa consta do Relatório da 1ª Inspetoria de Contas. Ele aponta nada mais, nada menos, que um passivo de R$ 3,2 bilhões na Paranaprevidência.

Estudo, elaborado pela 1ª Inspetoria de Controle Externo do Tribunal de Contas, recomenda ao governo estadual e à Paranaprevidência o cumprimento da norma relativa à amortização das contribuições financiadas; revisão do plano de custeio e elaboração de um plano de amortização do passivo referente às contribuições com outros ativos.

O Fundo Previdenciário dos servidores estaduais do Paraná necessita de medidas administrativas e financeiras que corrijam desequilíbrios e revertam passivo que, em 30 de junho último, chegou a R$ 3,204 bilhões.

A orientação consta de relatório elaborado pela 1ª Inspetoria de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR). O documento será encaminhado à Paranaprevidência, administradora do Fundo e às equipes de transição do atual e do futuro governo estadual.

Ao final do texto, são apontadas três recomendações ao governo estadual e à Paranaprevidência: cumprimento da norma relativa à amortização das contribuições financiadas; revisão do plano de custeio e elaboração de um plano de amortização do passivo referente às contribuições com outros ativos.

Os estudos que deram origem ao relatório, assinado pelos servidores Augustinho Chezanoski, Francisco da Rocha Santos, Marcelo Evandro Johnsson, Mário Vítor dos Santos e Valter Luiz Demenech, tiveram a supervisão do inspetor Agileu Carlos Bittencourt, titular da 1ª ICE, sob o comando do conselheiro Nestor Baptista.

Do passivo de R$ 3,204 bilhões, R$ 2,174 bilhões – ou 68% do total – correspondem a “contribuições com outros ativos”. O termo designa a diferença entre as contribuições – estatais e funcionais – e o valor repassado pelo governo, em dinheiro, à Paranaprevidência.

Entre maio de 1999 e abril de 2000, os repasses em dinheiro não foram integralmente atendidos. A legislação permite que, havendo insuficiência de recursos em espécie, as transferências sejam feitas em outros ativos. O governo do Estado, no entanto, realizou esta operação uma única vez, em maio de 2000, com o repasse dos créditos referentes aos royalties de Itaipu.

Outro problema detectado pela equipe técnica do Tribunal de Contas diz respeito à rubrica “contribuições com financiamento”, que corresponde à diferença entre o montante que o Estado do Paraná deveria repassar, em dinheiro, ao Fundo Previdenciário, e os valores efetivamente repassados. Em primeiro lugar, tal financiamento não tem autorização legal. De acordo com o relatório, tampouco existe ato administrativo que formalize o procedimento.

DÉFICIT TÉCNICO

A inadimplência do governo estadual implica em perdas na outra ponta: caso os repasses mensais tivessem sido integralmente realizados e os recursos aplicados a taxas equivalentes ao histórico de rentabilidade do Fundo – 310%, em média, entre janeiro de 2001 e junho de 2010 – as reservas para pagamento de aposentadorias e pensões teriam acréscimo de R$ 161,2 milhões. A diferença, explicam os técnicos, “representa um montante decorrente de aplicações não realizadas, constituindo, salvo melhor juízo, uma perda para a Paranaprevidência”.

Ao final, o relatório do TCE constata que os recursos do Fundo são insuficientes para cobrir os compromissos do plano de custeio previdenciário. É o chamado “déficit técnico”, que surge quando o ativo líquido – recursos financeiros e imóveis menos despesas com benefícios – é menor que a chamada “reserva matemática” – valor determinado por cálculo atuarial para a manutenção do equilíbrio do Fundo. Pois em 2009, o déficit técnico atingiu a marca dos R$ 772 milhões.

Auditoria realizada nos números da Paranaprevidência, quando da elaboração do parecer prévio sobre as contas do Poder Executivo estadual relativas ao ano de 2009, já havia constatado problemas no Fundo Previdenciário. De acordo com o conselheiro Fernando Augusto Guimarães, relator das Contas do Governador – 2009 e presidente interino do TCE, o relatório da 1ª ICE “é extremamente relevante”.

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