terça-feira, 25 de outubro de 2011

Emendas parlamentares “importadas” por Londrina são alvo de suspeita

Mil quilômetros separam o Rio de Janeiro de Londrina, distância que não impediu dois ex-deputados federais fluminenses de destinar R$ 18,5 milhões em emendas ao orçamento da União de 2011 para a cidade paranaense. Na versão oficial, a indicação nasceu apenas da camaradagem entre o atual prefeito de Londrina, Barbosa Neto (PDT), e os ex-parlamentares Leo Vivas (PRB) e Vinícius Carvalho (PTdoB). O acordo em torno da “importação” dos recursos, porém, envolve suspeita de pagamento de propina de R$ 925 mil e está sob investigação do Ministério Público Federal (MPF).

Vivas e Carvalho, que não tentaram se reeleger no ano passado e estão sem mandato, foram os únicos congressistas de fora do Paraná a sugerir emendas individuais para o estado nos últimos quatro anos. O valor pedido por eles é quatro vezes superior ao total de emendas propostas por sete deputados paranaenses no mesmo perío­­do (2008-2011) para outros estados, conforme mostrou ontem a Gazeta do Povo.

Do total de R$ 13 milhões a que cada um dos dois fluminenses tinha direito de sugerir ao orçamento de 2011, Vivas alocou 96% (R$ 12,5 milhões) para Londrina e Carvalho 46% (R$ 6 milhões). A verba foi destinada para a saúde e para o recapeamento de ruas.

De acordo com a assessoria de imprensa da prefeitura de Londrina, a negociação sobre as emendas foi feita entre Barbosa Neto e Carvalho. A relação entre os dois teria surgido quando eles trabalharam juntos na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara. Antes de assumir a prefeitura, em 2009, Barbosa também era deputado federal.

A informação sobre a “amizade” entre Barbosa Neto e Carvalho foi confirmada por Vivas. Ele disse que, em princípio, não faria qualquer emenda individual no ano passado. Acabou sendo convencido por Carvalho a prestar “um favor” para um amigo (Barbosa Neto) que precisava de “ajuda”. Pelas regras de elaboração do orçamento da União, não há qualquer impedimento ou ilegalidade no fato de o representante de um estado alocar recursos de emendas para outro. O ex-deputado disse ainda que não aposta na liberação de recursos.

Os dois ex-deputados fluminenses exerceram apenas um mandato na Câmara (2007-2011) e não mo­­ram mais no Rio. Leo Vivas e Vi­­­nícius Carvalho são ligados à Igreja Universal do Reino de Deus. O primeiro foi bispo e o outro é pastor.

Vivas disse que não concorreu à reeleição e que se mudou para Brasília para cumprir “um projeto estabelecido pelo partido [o PRB]”. Carvalho hoje mora em Belo Ho­­­rizonte. Embora tenha sido eleito pelo PTdoB, agora é do PRB, partido ligado à Universal. “Havia um descontentamento muito grande com o trabalho dele [Carvalho]”, disse o presidente do PTdoB no Rio, Vinícius Cordeiro. Das 25 emendas de Carvalho no orçamento de 2011, apenas uma era para o Rio, no valor de R$ 150 mil.

A reportagem entrou em contato com a assessoria nacional do PRB para localizar e entrevistar Carvalho, mas ele não foi encontrado. Também deixou recado em um número de telefone que, segundo a assessoria, seria do ex-deputado e em duas contas de e-mail, mas não obteve resposta.


MPF investiga propina para incluir verba no orçamento

Na contramão da versão de que a destinação das emendas dos ex-deputados do Rio de Janeiro para Londrina tenha ocorrido devido ao coleguismo com o prefeito Barbosa Neto , o Ministério Público Federal (MPF) investiga a denúncia de que havia na verdade um esquema de pagamento de propina para a obtenção dos recursos federais.

O ex-chefe de gabinete da prefeitura Fábio Góes foi denunciado por ter supostamente recolhido dinheiro com empresários de Londrina para pagar propina para pelo menos um dos dois ex-deputados fluminenses (Leo Vivas), em troca das emendas. O caso chegou ao MPF após um depoimento prestado em maio pelo empresário Wilson Vieira ao Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público Estadual (MP).

Na prática, a apuração do MPF é um desdobramento da Operação Antissepsia, na qual o Gaeco tratou de desvios na área de saúde em Londrina. No depoimento, Vieira afirma que teriam sido repassados R$ 925 mil, em duas vezes, a um homem conhecido como JB, que seria assessor de Leo Vivas.

Os repasses, segundo o depoimento do empresário, foram feitos em duas ocasiões, em dezembro de 2010. As emendas foram apresentadas em 25 de novembro.

Vieira diz ter acompanhado Góes em uma das entregas e que, numa segunda vez, repassou dinheiro sozinho, atendendo a orientação do ex-chefe de gabinete. O empresário também diz ter dado um cheque de R$ 70 mil, em nome da sua empresa. Quanto à entrega do dinheiro, Vieira narra que a fez a “um homem que se identificou como JB e apresentou-se como assessor de deputado”. A segunda entrega aconteceu cerca de dez dias depois da primeira.

Vieira prestou um novo depoimento, dessa vez ao MPF, e confirmou apenas parte do que havia dito ao Gaeco. Disse que foi procurado por Góes no começo de dezembro e que o ex-chefe de gabinete do prefeito pediu um cheque de R$ 40 mil. O cheque da sua empresa foi depositado na conta de Bruno Valverde, da ONG Instituto Atlântico, mas voltou por falta de fundos. Valverde, por sua vez, teria repassado R$ 20 mil em dinheiro para Góes.

Segundo Vieira, Góes disse que o dinheiro “estava sendo angariado junto a empresários de Londrina” e seria “dado em garantia de um empréstimo para fins de cobrir despesas de hospedagem e outras, como transporte e alimentação para a assessoria de parlamentar que estava em Londrina [a assessoria] para viabilizar emendas ao orçamento da União”.

Ao MPF, Vieira justificou o recuo em relação a alguns pontos do depoimento prestado ao Gaeco [como no caso do valor do cheque, que na primeira declaração era de R$ 70 mil e na segunda, caiu para R$ 40 mil] porque ele disse estar “coagido a prestar as declarações”, porque em maio ficou das 8h30 às 19h30 no Gaeco e “a partir de certa hora” disse que “pusessem o que quisessem no papel que assinaria”. Ele disse ainda ter lido o depoimento sem assinar, embora estivesse acompanhado da advogada Ana Paula Delgado de Souza Barroso. Vieira admitiu que, no primeiro depoimento, o promotor Cláudio Esteves insistiu para que ele chamasse um advogado – o que ocorreu. (GP)



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