terça-feira, 28 de agosto de 2012

É definitiva a perda do mandato de Derosso, Maria Goretti permanece com o mandato. Documento na íntegra:


A Justiça garante o mandato a vereadora Maria Goretti

ACÓRDÃO Nº43933

PETIÇÃO N.º 397-89.2012.6.16.0000
PROCEDÊNCIA            : CURITIBA– PARANÁ
REQUERENTE             : MARIA GORESTTI DAVID LOPES
Advogado                      : Leandro Souza Rosa
REQUERIDO                : JOÃO CLÁUDIO DEROSSO
Advogado                      : Antonio Augusto Lopes Figueiredo Bastos e Outros
RELATOR                   : DR. LUCIANO CARRASCO


EMENTA – PETIÇÃO – INFIDELIDADE PARTIDÁRIA – RESOLUÇÃO TSE Nº 22.610/2007 – JUSTA CAUSA NÃO DEMONSTRADA.
1.                           O pedido de desfiliação do réu é causa suficiente para justificar o pedido de perda de mandato, por se tratar de ato unilateral do interessado.
2.                           É ônus do réu demonstrar a justa causa para desfiliação – discriminação pessoal não demonstrada.
3.                           Condições subjetivas, tais como descontentamento, notícias de imprensa e falta de apoio quando preciso, não se constituem justa causa que justifique a desfiliação partidária. Justa causa não evidenciada.
4.                           Pedido julgado procedente.


Vistos, relatados e discutidos os autos acima citados, ACORDAM os Juízes integrantes do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná, por unanimidade de votos, em julgar procedente o pedido e decretar a perda do mandato eletivo do réu JOÃO CLAUDIO DEROSSO, nos termos do voto do Relator, que integra esta decisão.
Curitiba, 28 de agosto de 2012


ROGÉRIO COELHO
Presidente, em exercício




LUCIANO CARRASCO
Relator





ADRIANA A. STOROZ M. SANTOS
Procuradora Regional Eleitoral
PETIÇÃO N.º 397-89.2012.6.16.0000

I – RELATÓRIO

 

Trata-se de requerimento formulado por MARIA GORETTI DAVID LOPES contra JOÃO CLÁUDIO DEROSSO, em razão de desfiliação ocorrida no dia 07/05/2012 e que tal desfiliação teria ocorrido sem justa causa.
Diz, em apertada síntese, que (a) é a atual primeira suplente do PSDB; (b) o réu renegou tudo aquilo que o PSDB e seus filiados fizeram por ele e que não há qualquer hipótese regulamentar que autorize sua saída do Partido; (c) na carta de desfiliação o réu não mencionou o motivo de sua saída, apenas requerendo sua desfiliação; (d) não existe justa causa para autorizar a saída do réu e o mandato pertence ao partido. Fez pedido de antecipação de tutela para o imediato afastamento do réu do cargo de vereador e posse da autora em referido cargo. Juntou documentos às fls.24/104. Arrolou testemunhas.
Deferi a antecipação dos efeitos da tutela para decretar a perda do cargo de vereador exercido pelo réu João Carlos Derosso, junto à Câmara Municipal de Curitiba (fls.106/111).
JOÃO CLAUDIO apresentou defesa (fls.122/141) sustentando que (a) em momento algum comunicou sua intenção de desligamento do PSDB à Justiça Eleitoral; (b) o partido não comunicou ao Tribunal Regional Eleitoral sobre a desfiliação do réu; (c) juntou Certidão do TSE sobre a situação de sua filiação partidária afirmando que por meio desta certidão encontra-se ainda filiado ao PSDB e, dessa forma, não pode a autora pretender a perda de seu cargo eletivo, devendo ser extinto o processo, sem resolução do mérito, diante da impossibilidade jurídica. Argumenta também a falta de documento essencial.
No mérito argumenta que suportou enormes discriminações dentro do partido e houve por bem entregar carta pedindo seu desligamento. Pediu reconsideração da decisão monocrática. Arrolou testemunhas e juntou documentos às fls.142/159.
Analisei a manifestação do réu, mas indeferi o pedido de revogação da liminar de antecipação de tutela (fls.162/166).
A autora postulou pela manutenção da decisão que concedeu a antecipação de tutela (fls.173/198) e juntou declaração do presidente estadual do PSDB.
Foi deferido pedido do réu para que este Tribunal, por meio da Corregedoria, informe sobre a existência de filiação do réu. Informações que foram feitas por meio das certidões de fls.210/213.
Houve manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral pelo prosseguimento do feito.
Foram produzidas as provas e, em seguida as partes apresentaram alegações finais.
A Procuradoria Regional Eleitoral opinou pela procedência do pedido e conseqüente decretação de perda de mandado eletivo do vereador.
É o relatório.

II – VOTO

A matéria invocada em preliminar confunde-se com o mérito da demanda, razão pela qual aprecio tudo em conjunto, com os destaques necessários.
Para configurar a justa causa a que se refere o art. 1º, § 1º, inciso IV, da Resolução TSE n.º 22.610/2007 – grave discriminação pessoal, o filiado deve demonstrar, de forma cabal, que a desfiliação ocorreu de fato em razão de grave discriminação pessoal por parte do partido político, não podendo ser invocada se não houver realmente um tratamento diferenciado, desigual, injusto, distinto do tratamento dispensado aos demais integrantes do partido.
Analisando a expressão grave descriminação pessoal, José Jairo Gomes assinala que:

“O que deve se entender por isso? O que é grave para uns pode não ser para outros. O padrão de normalidade (assim como o de moralidade) varia entre as pessoas, no tempo e no espaço; até mesmo o clima e a geografia podem definir diferentes padrões de comportamento e de julgamento. Não se pode negar o alto grau de subjetivismo subjacente a essa cláusula. De qualquer sorte, na medida do possível, o órgão judicial não poderá afastar-se de parâmetros objetivos ao apreciar o conflito que lhe for submetido. O conceito em foco só poderá ser determinado, isto é, concretizado, à vista do caso prático e de suas circunstâncias. Nesse contexto, há que se encarecer os princípios da tolerância e da convivência harmônica, de sorte que meras idiossincrasias não poderão ser havidas como grave discriminação pessoal. Somente fatos objetivos, sérios, repudiados severamente pela consciência jurídico-moral poderão ser assim considerados.” (destaquei).(in Direito Eleitoral, Del Rey, 2008, p. 81/82).”

Na espécie, pelos motivos alinhados na inicial se antevê, claramente, a subsunção do fato à norma, na medida em que no documento de desfiliação (f. 84) se tem, tão somente, pedido de desfiliação para o PSDB.
É o que basta para justificar a perda de mandato: o réu não invocou em nenhuma linha os motivos indicados na resolução para justificar sua desfiliação.
Negar a validade daquele informe famélico indicado por ocasião da desfiliação é o mesmo que negar o direito do partido – obrigando-o a sempre investigar na esfera judicial a motivação do membro do partido, implicando em grave distorção do próprio sistema, uma vez que me parece incogitável que alguém possa obter para si – e exercer como coisa sua – um mandato eletivo que se configura essencialmente como uma função política e pública, de todo avessa e inconciliável com pretensão de cunho privado. (Consulta 1423/DF, citado por José Jairo Gomes, Direito Eleitoral, Ed. Atlas, 7ª ed., pág. 90); isto é, sem prestar qualquer esclarecimento a respeito.
O argumento de que ainda está filiado, com a devida vênia de todas as vênias possíveis, não vinga, margeando a má-fé pela própria torpeza.
Com efeito, não se pode impor ônus ao Partido pela desídia do réu. Ele era quem deveria fazer as comunicações. Como referido na doutrina de Rodrigo López Zilio (Direito Eleitoral, Verbo Jurídico Editora, 3ª Ed., p. 129) “É ônus exclusivo – e intransferível – do filiado de proceder à dupla comunicação do ato de desfiliação.”. E mais, tal fato é contraditório com o pedido de desfiliação feito pelo réu (fl.84).
Bem por isso, o pedido de desfiliação é ato unilateral, não existindo hipótese plausível para que o partido negasse tal solicitação; afinal ninguém é obrigado a manter-se filiado a qualquer agremiação política.
E esta manifestação de vontade foi ratificada pela resposta oferecida, onde se vê cópia de pedido de retratação protocolado em 04 de julho de 2012 ao Diretório Estadual, assinado pelo próprio réu, afirmando que pediu a desfiliação (por perseguição da mídia e pela discriminação sofrida dentro do partido) e que não tem interesse em deixar o PSDB (f.159).
Este fato trazido na resposta além de consagrar o direito da requerente sepulta definitivamente a tese de que o réu mantém-se filiado ao PSDB e, por isso, o pedido não poderia ir à frente.
Na medida em que pediu a desfiliação, é ônus do réu informar ao partido e à justiça eleitoral – o que não fora afirmado na resposta, ou seja, de que o réu tenha cumprido com sua obrigação. Dizer, depois, que está filiado e, por isso, não caberia o pedido, é louvar-se da própria torpeza, que o direito não tolera.
Não se trata aqui daquelas questões discutidas às bateladas sobre dupla filiação, eis que isto não houve; cuida-se, isto sim, de deliberação que deve ser vista sob outro ângulo, o da desfiliação propriamente dita.
O réu disse que permanece filiado ao PSDB, conforme certidão do TSE emitida via internet. Contudo há certidão do TRE, através de sua ilustrada Corregedoria, em sentido exatamente oposto.
Isto porque nesta consulta realizada junto ao sistema Elo do TSE que o próprio eleitor informou sua desfiliação, o que não consta dos registros do TSE, via internet, na medida em que o sistema não se encontra disponível para novos registros em razão do calendário eleitoral.
Não me parece palatável existir legitimidade neste tipo de procedimento, até porque o Partido e os suplentes não podem ficar a mercê da oscilação de vontade do filiado.
Logo, a alegação de não houve pedido de desfiliação por parte do réu não tem fundamento.
Quanto ao outro argumento – discriminação pessoal – e que poderia ensejar dúvida, é de observar que notícias de colunas políticas não servem para, por si só, dizer existir grave discriminação. Não se apresentou nem mesmo o pedido de expulsão informado nas notícias, não se falando em expulsão porque o processo, ao que se tem, não foi deflagrado pelo pedido de desfiliação.
Também, por significativo, o réu não utilizou da ação declaratória para justa causa a fim de demonstrar eventual perseguição.
Não se olvide que não se fez alusão a procedimento administrativo aberto pelo partido para expulsão do vereador ou mesmo de perseguições partidárias, ou mesmo a qualquer manejo de ação declaratória de justa causa, máxime considerando a redação do § 3º do artigo 15 do Estatuto Partidário que prevê, expressamente, a perda de mandato para quem se desligue do partido.
Existindo esta imposição estatutária, não poderia o réu, vereador, simplesmente se desligar do partido sem sofrer a sequela respectiva; e como não justificou a saída, arca agora com as consequências de seu comportamento.
Da mesma forma, as provas que foram produzidas não são suficientes a demonstrar que houve grave discriminação contra a pessoa de João Claudio Derosso. O que se vê, ao revés, é que os motivos que levaram o réu a deixar os quadros partidários eram motivos de ordem pessoal e não por perseguição partidária.
Realmente, Michele Caputo Neto quando questionado se o PSDB iniciou processo disciplinar para apuração de alguma falta de Derosso, respondeu: “Não, não porque pelo que me disseram nessa reunião ele... foi abortada qualquer tipo de discussão por conta dessa manifestação pessoal.” Mais a frente a testemunha responde se existiria a possibilidade do partido expulsar o réu: Eu acho que a exposição na mídia na questão do envolvimento do vereador Derosso propiciou que muitos filiados e muita gente discutisse essa situação. Eu não participei de nenhuma reunião que discutiu. No diretório municipal isso não aconteceu. Sou membro da comissão provisória; não tivemos nenhuma convocação para discutir essa questão. Agora, se o senhor quer a minha impressão, tá? É a que a repercussão na mídia gera desfiliados e todas as coisas. Mas aí é impressão.”.
A outra testemunha, Valdir Rossoni, que é presidente do PSDB no Estado e quem recebeu a carta de desfiliação do réu, declarou: “Eu era, eu sou presidente do PSDB no Estado. Em virtude, do ocorrido, das notícias das questões que ocorreram na Câmara Municipal o partido vinha se sentido desconfortável porque nós achávamos, porque nós não queremos fazer pré-julgamento, mas também achávamos que o partido não deveria responder por um ato isolado de uma pessoa ilustre do partido. Então, foi convocado uma reunião (sic) do diretório estadual e do diretório municipal aonde nós iniciamos um processo, nós iríamos iniciar um processo de discussão sobre a situação do então vereador Derosso e qual que seriam as medidas que poderiam ser tomadas pelo partido. Quando nós iniciamos a discussão, era lá por volta das, lembro bem o horário, dezenove horas, quando nós estávamos ouvindo os membros do diretório, nós recebemos uma carta manuscrita do vereador Derosso aonde ele pedia o seu afastamento do partido. Ao receber aquela carta manuscrita, nós interrompemos a reunião, até porque a reunião não tinha mais validade - discutir algo que não tinha mais.”.
Ao ser perguntado se a carta de desfiliação continha alguma justificativa, Valdir Rossoni, respondeu: “Não, não, não, não. Apenas dizia que se afastava do partido, manuscrita.”
Cumpre ter presente, ainda, que das três testemunhas arroladas pelo réu – Fernando Guighone, Paulo Frote e Carlos Alberto Richa – nenhuma delas compareceu à audiência, ônus do réu, e houve sua dispensa expressa, caindo por terra qualquer possibilidade de Derosso fazer prova do que se alegou.
Pelos depoimentos é possível afirmar que houve divergências entre os integrantes do Partido, mas prova de grave discriminação não há.
Como bem apontou a Procuradoria Regional Eleitoral, “No presente caso, a requerente, na propositura da inicial, trouxe aos autos documento contendo informações acerca da desfiliação do primeiro requerido junto ao partido pelo qual fora eleito (fl.82), no qual consta a data de seu protocolo (07/05/2012), demonstrando a tempestividade no ajuizamento da presente demanda. (...) No mérito, embora as várias alegações presentes nos autos, verifica-se que o requerido não logrou êxito em comprovar a existência de justa causa para a sua desfiliação partidária, motivo pelo qual a pretensão da requerente deverá ser acolhida.”
Em hipótese bastante semelhante ao presente este Tribunal Regional, em voto de lavra do Juiz João Pedro Gebran Neto, Requerimento nº 614 (acórdão nº 32.739), decidiu:

“... há de ser fato grave, que cause impacto ou repercussão de tal ordem que justifique a mudança de partido, em face de absoluta falta de compatibilidade entre o eleito e o partido que integra. Não pode ser qualquer contra-tempo ou dissabor, também contrariedade em relação à conjuntura partidária. O espaço político é plural, tanto na disputa eleitoral quanto no âmbito interno dos diferentes partidos. O espaço político é locus de debates, divergências, alianças e disputas, consensos e dissensos, equivale dizer, quando algum eleitor filia-se a determinado partido político deve saber adrendemente seu ideário no cenário local, regional e nacional, bem como dos espaços políticos existentes. Somente fatos que revelem gravidade podem ser invocados como justa causa para desfiliação.
Além disso, há que ser uma discriminação pessoal, e não uma diretriz geral do partido, que atinja pessoas indeterminadas. A discriminação deve dirigir-se diretamente contra certa pessoa, certo membro do partido, sob pena de não poder ser invocada, com fundamento no inciso IV, do parágrafo primeiro, do artigo primeiro, da resolução. Tratando-se de ato (norma ou orientação) geral, talvez possa a justa causa fundar-se em outro inciso, não na discriminação pessoal.
Por fim, o fato grave e pessoal deve se configurar numa discriminação, equivale dizer, num tratamento desigual e injusto, distinto do tratamento dado aos demais integrantes do partido.”

E esta Corte, ao apreciar a Petição 866-72, julgada em 23/01/2012 de minha relatoria, assentou:

Petição – Infidelidade Partidária – Perda de Cargo Eletivo – Vereador – Resolução TSE n. 22.610 – Justa Causa não demonstrada.
Condições subjetivas, tais como descontentamento, não cumprimento de promessa de renovação dentro do Partido e falta de apoio quando preciso, não é causa que justifique a desfiliação partidária. Pedido julgado procedente.

Sendo assim, não havendo a comprovação de motivo relevante que possa justificar a desfiliação partidária, para os fins da Resolução TSE nº 22.610/07, é de ser decretada a perda do mandato do réu, com sua devolução ao partido requerente.
Forte em tais razões, julgo procedente o pedido formulado por MARIA GORETTI DAVID LOPES para decretar a perda do cargo de vereador exercido pelo réu JOÃO CLÁUDIO DEROSSO, junto à Câmara Municipal de Curitiba, dando ciência ao Presidente da Câmara de Vereadores, tornando definitiva a liminar concedida e confirmando a posse da requerente, no moldes do art. 10 da Resolução TSE nº 22.610/2007.
Curitiba, 28 de agosto de 2012

LUCIANO CARRASCO
Relator

0 comentários :

Postar um comentário

 
Design by Free WordPress Themes | Bloggerized by Lasantha - Premium Blogger Themes | belt buckles