quarta-feira, 18 de abril de 2012

Neonazistas continuam agindo em Curitiba: Oil Man e a intolerância


Oil Man é uma figura carimbadíssima, e já folclórica, de Curitiba. Trata-se de um sujeito com 1,90 de altura, quase 100 km de massa, que gosta de desfilar pelas ruas da cidade pedalando sua bicicleta pneu-balão e usando apenas uma sunga minúscula, um longo cabelo amarrado no estilo rabo de cavalo e o corpo de quarenta e poucos anos besuntado de óleo – filtro solar fator de proteção 2, na verdade. E dos mais baratos, como o próprio faz questão de explicar, porque o mar não está para peixe.
Gostava de desfilar. Porque, na extensa galeria de barbaridades que surpreendem mesmo os idosos, descobriu-se que Nelson Rabelo foi ameaçado de morte apenas por fazer o que faz. Por esta razão, o pacato grandalhão decidiu suspender seu saudável hábito, mesmo tendo ganho recentemente a companhia de outro maluco beleza da geração saúde. Virou história, ao menos por enquanto.

É verdade que o Oil Man não é figura das mais simpáticas, tanto quanto incomum. Arredio à mídia, Nelson não costumava cumprimentar ninguém nas suas andanças e nem era de falar muito, como se viu durante sua surpreendente entrevista a Jô Soares, quando se tornou conhecido do Brasil mesmo dispensando o lançamento de largos sorrisos à audiência.

O fato é que nada justifica ameaças a um homem do bem. Que, aliás, cumpre, no mínimo, o importante papel de divulgar o uso sistemático de um meio de transporte que deveria merecer mais atenção dos grandes centros urbanos – sobretudo Curitiba, a cidade que gosta de ser chamada mundo afora de “capital ecológica” e “de Primeiro Mundo”, ainda que o município não seja muito diferente de outro qualquer do seu tamanho, a não ser pela existência de alguns aparatos urbanos que funcionam de verdade.

As ameaças a Oil Man merecem referência porque guardam relação direta com o mesmo fenômeno denunciado pelo texto brilhante da jornalista Clara Roman, veiculado aqui mesmo na Carta Capital, no dia 4, com o título “A onda Bolsonaro e o despertar do neonazismo”. Clara denunciou o crescimento do ódio racial e de setores profundamente reacionários na sociedade brasileira, dos quais o mais contundente são os seguidores do espírito doentio de Adolf Hitler.

A intolerância que levou os nazistas a patrocinarem um genocídio sem precedentes, especialmente contra os judeus, não é exatamente a mesma que leva ao surgimento de um Jair Bolsonaro da vida ou dos cretinos (perdão, mas eles merecem o adjetivo) que ameaçam Oil Man. Mas é intolerância, de qualquer forma.

E que atinge gente de bem. Gente comum. Ou quase, como eu e você. Gente que não se distingue de ninguém pela cor da pele, pela raça, pela religião ou qualquer outra coisa que inspira nazistas, fascistas e outros gêneros de anormais, mas somente – como no caso em análise – pela sua opção de vida. Problema gravíssimo porque significa, em bom português, que ninguém está livre desta gentalha. Basta desagradar suas convicções – se é que têm alguma – para entrar na sua alça de mira.

Oil Man está longe de ser o único alvo desta gangue. Da mesma estirpe são os que ateiam fogo em mendigos nas ruas. Os que agridem cidadãos supostamente homossexuais. Os que matam torcedores de futebol dos times adversários. Os que humilharam a agora celebridade midiática Geisy Arruda nos corredores da Uniban. E até, pasmem, os que acham errado mulheres exporem seus seios para amamentar os próprios filhos em praça pública.

A continuar este cenário de guerrilha urbana movida pela ignorância, pela violência, pelo preconceito e pela burrice, cidadãos serão agredidos no shopping center apenas porque preferem usar chinelos de dedo no verão – e não sandálias. Ou porque insistem em pintar os cabelos na cor caju a deixar os grisalhos tomarem conta das suas madeixas. Seria o predomínio da violência, do autoritarismo e do patrulhamento ideológico, quase como na Inglaterra reacionária e ficcional do filme “V de Vingança”, em que a única voz contrária pertencia ao personagem-título do longa.

Este gênero de crime precisa ser combatido com extremo rigor por meio de um conjunto de ações jurídicas, educacionais e policiais porque, a exemplo de outras mazelas sociais, tende a crescer se não for cortado pela raiz. Posição que se alinha à de Hanna Arendt quando sustenta que poder e violência contrapõem-se (um está presente de forma plena quando o outro está ausente) e estão intimamente ligados ao universo da Educação, razão pela qual o Estado tem papel crucial no enfrentamento deste problema.

É exatamente nisto, aliás, que reside o problema. Salvo raríssimas exceções, os agentes do Estado aos quais compete enfrentar a violência têm se revelado absolutamente incompetentes e irresponsáveis na tarefa. Por falta de planejamento estratégico, de seriedade, de estrutura e de competência têm permitido que a violência evolua, nas suas mais variadas formas, como as que citamos. Não se iluda: as UPPs são soluções apenas paliativas ao problema.

Erro no enfrentamento da violência, porém, não é prerrogativa do Executivo. Longe disso. Com grande e absurda frequência, o Judiciário se recusa a ser um instrumento inibidor da criminalidade. Aos magistrados compete o papel de serem rigorosos na aplicação de penas a bandidos de todos os calibres.

Ao invés disso, porém, muitos senhores de toga prefere se escorar no princípio da ampla defesa, no legalismo e nas garantias individuais proporcionadas pela Constituição Federal de 1988 e pela legislação penal para inocentar, como ocorrido na decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) de manter a absolvição de um homem acusado de praticar estupro contra três meninas com 12 anos sob o argumento de que elas já eram prostitutas quando o ato foi cometido.

Querendo ser legal em respeito às garantias individuais, o Estado acaba sendo injusto – e prejudica a maioria. Oferece, com isto, um péssimo exemplo de como os doutos magistrados não devem agir.

Todo mundo tem o direito de não gostar de figuras como Oil Man ou de quem quer que seja. É assim em qualquer Nação democrática do planeta que usufrui as maravilhas da liberdade civil. Mas apenas isso. Jamais perseguir, agredir e humilhar cidadãos, como se fez e continua se fazendo em relação a Nelson Rabelo e a tantos cidadãos vítimas da violência. Tampouco o Estado pode se omitir, como tem feito, na solução do problema. Evitar que barbaridades como estas continuem ocorrendo é um desafio, gravíssimo, que temos de superar. (CC)

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