segunda-feira, 8 de agosto de 2011

A ciranda da corrupção

Usando um pouco a criatividade, imagine uma roda com membros do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário. De mãos dadas, eles cantam e giram em círculo, sem sair do lugar. No repertório, nada de cantigas infantis. Os temas repetidos à exaustão são escândalos, corrupção e superfaturamento. A alegoria é um retrato de Brasília atualmente. A crise no governo federal, que começou na Casa Civil e foi para o Ministério dos Transportes e da Agricultura, paralisou mais uma vez as grandes discussões sobre o desenvolvimento do país. Segundo especialistas, isso não é culpa apenas do Planalto, mas também da oposição, dos parlamentares e da Justiça brasileira.


Desde que veio à tona o enriquecimento de Antonio Palocci, em 15 de maio, o governo federal sofreu uma série de denúncias. O braço direito da presidente Dilma Rousseff caiu apenas em 7 de junho. O ministro dos Trans­portes, Alfredo Nasci­mento, caiu no dia 6 de julho. Na semana passada, foi Nelson Jobim quem deixou a Defesa, mas não por irregularidades.

Enquanto isso, nada de discutir reformas e outros temas relevantes para o médio e longo prazos. Para Clau­dio Abramo, diretor-executivo da Trans­parência Brasil, a discussão sobre desenvolvimento nunca foi de interesse da classe política. “Ninguém discute nada e a mediocridade gera mais mediocridade”, diz. Para ele, a obrigação recai principalmente sobre Dilma Rousseff. “É a principal responsabilidade da Pre­sidência da República: colocar em prática as políticas públicas do país. Ela não está aí para administrar obras.”

A lógica pública

Na avaliação do filósofo José Antônio Moroni, do Instituto de Estudos Socioeconomicos (Inesc), a corrupção opera como uma engrenagem. “Não importa quem esteja no poder nem qual o partido. É uma lógica de funcionamento da coisa pública que é tomada por interesses privados ou políticos-partidários”, diz ele, que é membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES) do governo federal, o “Conselhão”.

Roberto Romano, professor de Ética da Unicamp, diz que o problema envolve todos os poderes da República. No Judiciário, por exemplo, há falta de agilidade e eficácia. “Ele só age quando é acionado, não se pensa como poder. E quando é pressionado, toma atitudes desencontradas.” Exemplo disso, segundo o professor, é quando os juízes cassam os governantes eleitos e acabam colocando o candidato que ficou em segundo lugar no cargo. “É uma usurpação do poder soberano do eleitor.”

Para ele, a “faxina” que a presidente Dilma está fazendo não depende apenas dela para prosperar, mas de todo um conjunto de forças políticas. Romano afirma ainda que a oposição precisa cobrar o Executivo, mas fica apenas na superficialidade.

A opinião do historiador Marco Antônio Villa, professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), é semelhante. “A oposição age exatamente da mesma forma que os partidos do governo. A grande parte da base está lá para fazer caixa, não para discutir o futuro do Brasil. O Congresso Nacional, que deveria ser o fórum dessas discussões, fica paralisado”, afirma. Segundo ele, a oposição poderia elevar o tom do debate, mas há uma opção pelo caminho mais fácil.

Para tentar interromper o círculo vicioso da corrupção, os especialistas ouvidos pela reportagem dizem que são necessárias mudanças na legislação, uma ação mais efetiva do Judiciário e a descentralização do poder e dos recursos na mão do governo federal.

O historiador Marco Antonio Villa, professor do Departamento de Ciências Sociais da Univer­sidade Federal de São Carlos, avalia que o principal problema está no Poder Judiciário. “Esta é a chave do problema, a impunidade. A Justiça tem a faca e o queijo na mão, tem como punir, mas não faz.” Para ele, este é o pior dos Poderes da República. “O Exe­cutivo e o Legislativo sofrem muita vigilância da imprensa, acabam sendo mais transparentes. Mas o Judiciário ameaça aqueles que querem colocar o dedo na ferida.”

Crime hediondo

O filósofo José Antônio Moroni, do Instituto de Estudos Socioeco­nomicos, propõe que a corrupção fique caracterizada como crime hediondo. Ele sugere ainda a responsabilização da pessoa jurídica envolvida em processos de corrupção. “Temos de um lado o corrupto, mas do outro há o corruptor, que nunca é falado, nunca é condenado.” Outro caminho, opina ele, é mudar o sistema de financiamento de campanhas eleitorais. “Hoje ganha a eleição quem tem mais dinheiro, precisamos ter uma igualdade de recursos”, diz.

Como os municípios dependem muito da União, os parlamentares atuam como intermediários, ou “corretores”, afirma Roberto Romano, da Unicamp. Para ele, a supercentralização amplia a rede burocrática que, por sua vez, produz novos canais, novas funções, novos escritórios e novas estruturas. “É justamente nesses campos que surge a corrupção. Sem a concentração de impostos não seriam necessários políticos atuando como ‘corretores’. Ou, pelo menos, a ‘taxa’ que eles cobram pelo serviço diminuiria muito”, diz. (GP)

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