sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Governo estimula a farra dos rentistas internacionais e depois reclama de “guerra cambial”


Por Rodrigo Ávila, economista

O governo brasileiro está preocupado com a chamada “guerra cambial”, ou seja, a desvalorização de moedas por parte de governos como os EUA e China. Isto dificulta as exportações brasileiras e barateia as importações, gerando grande rombo nas contas externas e destruição da indústria nacional. Como consequência, o setor que mais tem gerado empregos atualmente é o de serviços, e não o industrial.

Na última semana, o FED (Banco Central Norte-americano) decidiu injetar mais US$ 600 bilhões na economia, o que gerará mais desvalorização da moeda americana.
Porém, a grande desvalorização do dólar frente ao real tem sido, na verdade, estimulada pelo governo nos últimos anos, por meio do estabelecimento das maiores taxas de juros do mundo, que atrai dólares do mundo inteiro. Em 2006, o atual governo isentou de imposto de renda os ganhos dos estrangeiros com a dívida interna. Agora, assustado com o enorme fluxo estrangeiro, tenta tributá-lo com o IOF.

Além dos juros, os investidores também ganham com a desvalorização do dólar. Isto porque, quando o dólar cai, eles podem remeter a seus países de origem mais dólares do que trouxeram originalmente, visto que o dólar se desvalorizou frente ao Real. Este lucro adicional também é obtido por bancos brasileiros que tomam empréstimos lá fora a juros baixos para aplicar em títulos da dívida brasileira.

E quem banca este ganho? O Banco Central, que compra os dólares dos investidores e fica com o “mico”, ou seja, o dólar, que tem se desvalorizado. Por outro lado, o BC acumula uma montanha de reservas internacionais em dólares e as aplica principalmente em títulos da dívida dos EUA, que não rendem quase nada, e ainda financiam as políticas estadunidenses. Esta política gerou um prejuízo gigantesco ao Banco Central em 2009: R$ 147 bilhões, que segundo a chamada “Lei de Responsabilidade Fiscal”, tiveram de ser cobertos pelo Tesouro.

Se, por um lado, o BC diz que as compras de dólares são necessárias para se tentar evitar mais desvalorização do dólar, por outro lado analistas do próprio mercado financeiro reconhecem que esta política estimula ainda mais os investidores a trazerem dólares para o Brasil, pois têm a certeza de que o BC irá comprá-los, coisa que ninguém mais quer.

Dívida pública

Agora, boa parte destes R$ 600 bilhões injetados na economia americana virão para o Brasil, para ganhar com a dívida interna, e serão comprados pelo Banco Central, que novamente fará tudo que os EUA mais desejam: comprar mais títulos da dívida dos EUA, financiando as políticas estadunidenses, como o salvamento de bancos falidos.

Para acabar com esta farra dos rentistas e combater de verdade a “guerra cambial”, é necessário reduzir significativamente as taxas de juros, controlar os fluxos de capitais – impedindo que os especuladores internacionais venham aqui para lucrar às custas do povo – e, principalmente, auditar a dívida pública, repleta de graves indícios de ilegalidades, conforme mostraram as investigações da recente CPI da Dívida na Câmara dos Deputados.




O ajuste fiscal continua

Em sua primeira semana como presidente eleita, Dilma Rousseff se manifestou sobre medidas a serem tomadas na esfera econômica de seu futuro governo. Já no primeiro discurso após a divulgação dos resultados eleitorais, Dilma garantiu aos rentistas, “acima de tudo”, o “compromisso com a estabilidade da economia e das regras econômicas, dos contratos firmados”. A proposta orçamentária para 2011, encaminhada pelo próprio governo Lula ao Congresso, em agosto, garante metade do orçamento para juros, amortizações e refinanciamento da dívida pública.

Segundo Dilma, o superávit primário deve ser mantido em 3,3% do PIB nos quatro anos de seu governo, de forma a permitir a redução da dívida pública. A idéia seria permitir que a taxa de juros real caia para 2% ao ano, sob a justificativa de que, com medidas de “austeridade fiscal”, a inflação seria contida e o mercado se convenceria do compromisso do governo com o pagamento da dívida.

Porém, o país pratica altíssimos superávits primários há mais de uma década e continuamos a praticar a maior taxa de juros do mundo.

Tudo indica, portanto, que os rentistas seguirão atendidos em suas demandas, enquanto a população seguirá sofrendo com o ajuste fiscal. Neste sentido, uma das medidas que pode ser implementada pelo governo Dilma é o Projeto de Lei Complementar 549/2009, originário do Senado, que congela o salário dos servidores por 10 anos. O PLP limita o crescimento do gasto com pessoal à inflação mais 2,5% ao ano (ou o crescimento do PIB, o que for menor), o que mal cobre o crescimento vegetativo da folha, e impede a necessária expansão dos serviços públicos no país.

Apesar deste PLP já ter sido rejeitado por unanimidade em maio deste ano na Comissão de Trabalho da Câmara, ele segue a sua tramitação, e ainda pode ser aprovado em Plenário.


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