Qual a quantidade de gás carbônico que o Atlântico Sul pode absorver e quanto pode suportar de aumento de acidez sem que isso afete o meio ambiente marinho? Qual a influência do aquecimento de suas águas em eventos climáticos extremos, como secas na Amazônia ou furacões na costa dos Estados Unidos? A bordo do navio oceanográfico Alpha Crucis, adquirido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) para o Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo, pesquisadores vão lançar sensores em águas profundas, instalar boias em vários pontos ao largo do litoral e monitorar correntes de circulação de águas quentes e frias, buscando respostas para ajudar o Brasil a identificar com mais rigor qual o papel que suas matas e águas desempenham no equilíbrio climático do planeta.
O Brasil não tinha uma embarcação oceanográfica civil desde 2008, quando o navio Professor W. Besnard pegou fogo e saiu de operação. O Alpha Crucis, adquirido da Universidade do Havaí e reformado por US$ 11 milhões, tem capacidade para 20 pessoas, 972 toneladas e autonomia de navegação por 40 dias. O barco oceanográfico Alpha Delfini, primeiro inteiramente construído no Brasil, também faz parte do projeto, com 25 metros de comprimento e autonomia de 10 a 15 dias. Construído num estaleiro de Fortaleza, ele estará em condições de navegação a partir de julho.
A previsão é que o Alpha Crucis atraque no Porto de Santos no próximo dia 10. A partir de então, começam a ser instalados os equipamentos adequados a cada uma das pesquisas. O navio já conta com perfiladores acústicos de corrente e sistemas de mapeamento de subsuperfície e de fundo - um deles conhecido como ecossonda multifeixe. Com eles é possível estudar as camadas abaixo do fundo do mar e sistemas acústicos de mensuração de cardumes, por exemplo. A embarcação é dotada ainda de sistema de posicionamento dinâmico, o que faz com que sua posição no mesmo ponto do oceano seja contínua e automaticamente corrigida, de forma a aumentar a qualidade e a precisão dos dados.
Muitas das informações geradas a bordo do Alpha Crucis vão alimentar o supercomputador Tupã, comprado em parceria com o Ministério da Ciência e Tecnologia, cuja performance, medida em teraflops (trilhões de operações flutuantes por segundo), processa informações para a construção do Modelo Brasileiro do Sistema Climático Global, previsto para 2013.
A navegação de estreia, destinada à medição de gás carbônico, está prevista para o início do segundo semestre, assim como a instalação da primeira das boias de monitoramento do oceano, a ser lançada ao largo de Santa Catarina, local de formação do furacão Catarina, em 2004. O terceiro projeto, de monitoramento das correntes de circulação das águas, será uma parceria com pesquisadores franceses.
“A negociação mundial em torno do controle da mudança climática exige muito conhecimento. O Brasil precisa gerar informação para decidir o que fazer e como se posicionar nesta discussão”, explica Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp.
Medir os impactos das mudanças climáticas é essencial também para o desenvolvimento do estado de São Paulo. Estudos indicam que o aquecimento global pode provocar uma alteração profunda no mapa agrícola do país, influenciando a longo prazo inclusive a área de plantio de cana-de-açúcar. Os estudos de clima fazem parte do tripé estratégico da Fapesp, cujos investimentos contemplam ainda o mapeamento da biodiversidade e o desenvolvimento de bioenergia. Apenas nas pesquisas climáticas, a Fapesp já investiu, desde 2009, cerca de R$ 65 milhões.
A importância do Alpha Crucis, porém, não se limita ao mérito dos estudos que irá viabilizar. O navio se insere num modelo de fomento a pesquisas, adotado pela Fapesp, que tem se mostrado altamente eficiente: o compartilhamento de equipamentos de alto custo e alto desempenho. Baseado no Programa Equipamentos Multiusuários (EMU), o modelo permite que o uso seja maximizado por meio do agendamento on-line. Pesquisadores de várias instituições podem localizar os equipamentos no estado e agendar a utilização. São 251 instrumentos disponíveis, por meio do EMU, em laboratórios de pesquisa de São Paulo para pesquisadores do Brasil e de outros países da América Latina.
Outra estratégia da Fapesp para estimular a produção científica brasileira e o impacto dela em nível mundial tem sido apoiar projetos de pesquisa em parceria com instituições estrangeiras de primeira linha. De 2005 a 2011, mais de 240 projetos deste tipo já foram financiados pela entidade. A Fapesp recebe 1% das receitas tributárias do estado de São Paulo. Este ano, seu orçamento alcança quase R$ 1 bilhão. Em número de artigos científicos publicados, a Fapesp corresponde a 52% da produção nacional. (AG)
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