Existe uma correlação entre a capacidade financeira de uma cidade e a forma como ela lida com os rejeitos. “O descarte inadequado é a realidade da maioria dos municípios brasileiros. Além da capacidade de investimento, a falta de profissionais especializados, como engenheiros ambientais e químicos, contribui para um cenário de agressão ao meio ambiente”, ressalta o engenheiro ambiental Altair Rosa, professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). O aterro sanitário tem o terreno preparado para receber lixo. O solo é impermeabilizado para que o chorume (líquido resultante da decomposição dos resíduos orgânicos) não entre em contato com rios e cursos de água, os gases de decomposição são reaproveitados e um acompanhamento profissional constante avalia a vida útil do espaço. Ao contrário do lixão, que não conta com qualquer preparo ou supervisão.
Para as cidades do interior, entretanto, o problema do lixo começa ainda antes, na coleta. Apesar de a taxa de cobertura atingir 90% do total de municípios em 2009, com penetração de 98% nos centros urbanos, as zonas rurais ainda claudicavam nos 33% de atendimento.
Reciclagem
O estudo mostra que o reaproveitamento de materiais recicláveis avança com força no Brasil, uma velocidade adquirida principalmente porque a taxa de reciclagem ainda é baixa no país. Entre 2000 e 2008, a separação e tratamento desses materiais cresceu 120%, mas ainda não ultrapassava 18% dos municípios brasileiros. “Existe um grande nicho de mercado para este trabalho e os catadores prestam uma colaboração enorme. Mas a maioria das embalagens ainda acaba no aterro comum. São milhões de reais que, literalmente, acabam indo para o lixo”, lamenta Altair.
Com isso, os catadores seguem tendo uma renda de subsistência. De acordo com o estudo do Ipea, o ganho médio desses trabalhadores varia entre R$ 420 e R$ 520 mensais – abaixo do salário mínimo. Apenas 10% deles participa de alguma organização ou cooperativa formal, o que torna a coleta e a destinação menos eficientes. Consequentemente, a participação da coleta seletiva formal no processo de reciclagem alcança, no máximo, 18% – porcentagem obtida na gestão do plástico. Em metais, é de apenas 0,7%.
“A resistência é grande. O catador não quer perder a sua liberdade de horários e forma como trabalha”, avalia Sueli Cruz, pedagoga com especialização em educação ambiental e experiência em projetos de coleta seletiva. Ela acredita que o valor inferior ao salário mínimo seja pago apenas a catadores submetidos a um atravessador, que empresta o carrinho e paga um valor inferior pelo produto.
Curitiba 20 anos depois do Lixo que não é Lixo
A partir de 1989, uma campanha com jingle grudento e mascotes engraçadinhos (a Família Folha) despertou a atenção e o senso de cidadania curitibano para a importância da coleta seletiva do lixo. Mais de 20 anos depois do Lixo que Não é Lixo, que ainda existe e de vez em quando ganha uma nova campanha publicitária, Curitiba planeja os próximos passos da gestão de resíduos. Ao longo dos últimos sete anos, a produção de lixo cresceu 28% na capital paranaense. E, apesar do investimento em reciclagem, a cidade consegue reaproveitar somente 22% de tudo o que é gerado. “Estamos conseguindo acompanhar esse desafio, em quantidade e qualidade, fazendo com que o tratamento do lixo gere inclusão social”, afirma Marilza Dias, secretária municipal do Meio Ambiente.
Desde 2007, a cidade vem criando parques para recepção de recicláveis abrigados sob o programa EcoCidadão. Neles, os carrinheiros podem trabalhar o lixo recolhido, selecionando, prensando e vendendo o material sem a necessidade de levá-los para casa. São 13 pontos já instalados.
Usina de reciclagem
A prefeitura também aposta na instalação do Sistema Integrado de Processamento e Aproveitamento de Resíduos (Sipar), um consórcio intermunicipal (Curitiba e outros 19 municípios da região metropolitana) para aumentar o aproveitamento dos materiais para até 85%, tanto recicláveis quanto orgânicos. Uma licitação chegou a ser feita, mas disputas judiciais entre as empresas interessadas interrompeu o processo.
O engenheiro ambiental Altair Rosa acredita que Curitiba permaneça como exemplo de gestão de resíduos, mas aponta a falta de fôlego em alguns programas. “A questão da reciclagem ficou esquecida por um tempo, sem campanhas, e acabou saindo um pouco da memória das pessoas”, diz. (GP)

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