terça-feira, 16 de novembro de 2010

CRÉDITO FÁCIL= CRÉDITO CARO: 40% da classe D fecha o mês no vermelho


AGP

Assediada pelo comércio e pelos bancos, a classe D é considerada, junto com a classe mé dia, a nova estrela do consumo e tem ido às compras com apetite. Mas a população de baixa ren da, mesmo com o aumento da massa salarial, ainda tem di ficuldade para fechar no azul suas contas. Levantamento da Paraná Pesquisas em todo o estado, realizado a pedido da Gazeta do Povo, mostra que 40% das pessoas das classes D e E não con seguem ou eventualmente têm dificuldade para pagar to das as suas contas no fim do mês.

O volume é superior à média das demais faixas de renda. Entre os mais ricos, das classes A e B, apenas 22% têm esse tipo de problema. Na classe C, o porcentual é de 32%. Entre os mais po bres, o porcentual dos que admi tem que nunca conseguem fechar a conta no fim do mês soma 19%, mais de duas vezes o índice dos mais ricos (8%).

Mudança de perfil

Novos hábitos mudam orçamento

Para o economista Cid Cordeiro, do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no Paraná, o fato de as classes D e E terem se beneficiado do aumento da renda nos últimos anos não implica que elas darão conta das suas necessidades. “Há ainda muitas carências nessa faixa de renda. Essas famílias estão incorporando novos hábitos de consumo e novos gastos”, afirma. Segundo ele, é preciso lembrar que, à medida que a renda aumenta, surgem novas necessidades. O aumento da renda tem reflexo na aquisição de novos bens e serviços. “Por isso que ao longo dos anos as famílias, mesmo com o crescimento da renda, têm um comprometimento maior do orçamento doméstico”, afirma.

Os novos hábitos vão desde o uso do celular e da internet de banda larga até a compra de bens de maior valor, como a tevê de plasma e o carro seminovo, passando pelas idas ao cabeleireiro, pelo cinema e pelo passeio nos shoppings no fim de semana. Apesar de “pendurada”, a classe D não demonstra tendência de aumentar a inadimplência, segundo Cordeiro. “Tudo indica que a renda vai continuar a crescer, a oferta do crédito continuará grande e os juros reais vão cair, o que alivia esse tipo de risco”.

“Eu posso” é lema da baixa renda

As classes de menor poder aquisitivo são as que mais se be neficiaram, nos últimos anos, do aumento real do salário mínimo. Desde 2003, o reajuste real – já descontada a inflação – soma 53%. Mas, se de um lado a renda cresceu, de outro o crédito e os juros mais baixos têm funcionado como passaporte para as compras e o endividamento, segundo Murilo Hidalgo Lopes de Oliveira, coordenador da Paraná Pesquisas. “A classe D vem se endividando mais, o que sobrecarrega o orçamento no fim do mês. Como a renda é me nor, qualquer gasto extra desequilibra o orçamento”, afirma.

Fiado

Um outro estudo, realizado pelo instituto Data Popular, mostra que a população emergente acaba apelando, no fim do mês, para a velha prática de comprar fiado. De acordo com o levantamento, 45% da classe D colocou a compra na caderneta do comerciante ou do prestador de serviço no último mês, contra 6% das classes A e B.

O técnico em enfermagem Danilo da Silva Nogueira, 24 anos, nem sempre consegue pagar as contas em dia. No mês passado, “sobraram” as contas da faculdade de Enfermagem e o cartão de crédito. “Em um mês a gente paga uma conta, em outro paga outra, vamos dando um jeito nas coisas”, diz. Com uma renda de R$ 720, Danilo Nogueira divide as despesas de casa com o amigo Adriano Alessi, também técnico em enfermagem, que tem uma renda de R$ 900. Economizar, nem pensar, pelo menos por enquanto. “Não tem como ter uma reserva. O principal é terminar a faculdade, o restante a gente vai vendo com o tempo”, diz. Além da faculdade de Nogueira, a prestação do carro, um Fiesta 2006, consome outra parte da renda. O carro foi comprado em 60 vezes. O sonho é se formar para poder ganhar mais e comprar um imóvel.

Informalidade

Embora todas as classes sociais sejam afetadas, em maior ou menor grau, pela inadimplência, alguns fatores tornam a situação da classe D mais complicada. “A diferença é que os mais pobres não têm poupança”, afirma Renato Meirelles, sócio-diretor do Data Popular. De acordo com ele, o aperto no fim do mês é reflexo de dois fatores. Primeiro, a renda dessa faixa da população ainda é muito baixa. Segundo, que entre os mais pobres é comum parte da renda vir do trabalho informal. “O volume de pessoas que não têm carteira assinada é maior entre as classes D e E, que complementam a renda com bicos e trabalhos temporários. E esse tipo de atividade têm grande oscilação”, afirma Meirelles.

As contas de água, luz e telefone são as principais despesas para essa faixa da população. O aluguel e a alimentação vêm em segundo e terceiro lugar. “A percepção geral é de que as despesas como luz e telefone são mais altas porque esses custos não são fixos. As famílias estão comprando mais eletrodomésticos, mais telefones e estão acessando a internet, e com isso as contas de energia e de telefone também crescem”, afirma Oliveira, da Paraná Pesquisas.

Educação

Um dado que chama a atenção é que entre os mais pobres o número de famílias que dizem que gastam muito com educação é menor do que nas classes A e B. Famílias que estão no topo da pirâmide gastam mais em escolas e cursos particulares, o que faz com que esse tipo de gasto seja o principal para 11,39% dos entrevistados dessa faixa de renda. Entre os de menor renda, apenas 5,16% disseram que esse é o principal gasto. Na hora de comprar, a classe D prefere parcelar as suas compras no cartão da loja e no carnê.



Classe D muda a cara do mercado

G1

Com R$ 381,2 bilhões para gastar no ano, só atrás da cifra da classe C, que deve torrar R$ 427,6 bilhões até dezembro, as famílias brasileiras com renda entre R$ 768 e R$ 1.114 deixaram de ser personagens secundários no universo do consumo.

Maior que o montante disponível para compras na classe A (R$ 216,1 bilhões) e na classe B (R$ 329,5 bilhões), a grana da classe D, formada por 64 milhões de pessoas, passou a ser cobiçada por empresas de segmentos diversos, de companhias aéreas a colégios, de planos de saúde a fabricantes de PCs.

Empresários que não flertam com a base da pirâmide social devem rever seus conceitos, alertam especialistas. Os emergentes, apostam, irão liderar o desenvolvimento dos negócios e da economia brasileira no futuro bem próximo.

- A classe D já é a segunda do país em massa de renda. E assumiu a liderança na intenção de compras de bens como carros, geladeiras, desktops, entre outros - afirma Renato Meirelles, sócio-diretor da Data Popular, instituto de pesquisa pioneiro no estudo do mercado de baixa renda no Brasil.

Segundo ele, em 2010, esta parcela da população será responsável por 33% das aquisições de computadores, 24% das compras de automóveis, 40% das geladeiras, mesma porcentagem de motos e quase 17% das viagens de avião.

- Além disso, 25% do total de novos alunos em escola particular pertencem a esta classe social.

Fenômeno

O fenômeno popular, conforme aponta, é resultado de uma transformação no país. Com mais emprego, renda - só o aumento do salário mínimo colocou R$ 27 bilhões a mais no bolso das famílias da classe D -, acesso ao crédito e a prazos esticados de financiamento, nos últimos três anos, quase 20 milhões de brasileiros deixaram a linha da pobreza e passaram a integrar a camada emergente.

- Tudo isso fez com que esta classe, de maior mobilidade do país e principal impactada pelos projetos de distribuição de renda, conquistasse um enorme poder de consumo.

Fatores e cifras combinados, não é exagero dizer que a classe da quarta letra do alfabeto seja a nova "galinha dos ovos de ouro".

- Quem pensa em investir em novos serviços voltados para a classe B está errado. O consumidor com mais poder aquisitivo é complicado, pois quer produto de classe A com preço de classe D. O novo foco deve ser a baixa renda - comenta a consultora Patrícia Santos, graduada em Marketing pela ESPM e pós-graduada em Administração pela FGV (Fundação Getúlio Vargas).

Segundo ela, famílias com renda de até R$ 1.114 formam um público consumista, que não hesita na hora de comprar um produto mais caro e de qualidade, já que pode quitá-lo em "suaves" prestações.

- Até há pouco tempo, esta turma não tinha poder de compra ou acesso a financiamentos. Cartão de crédito, por exemplo, era coisa para rico. Hoje, está em todas as bolsas. Então, no momento de levar uma TV nova para a estante, este consumidor não acha R$ 1.800 um preço exorbitante, uma vez que pode pagar dez parcelas de R$ 180, uma quantia que não compromete o orçamento.



Resistir ao impulso de se endividar é possível, mas exige disciplina

Vinicius Albuquerque, do R7

Consumidor precisa ter autocrítica para que endividamento não se torne armadilha


Chega um ponto em que a pessoa vai ao banco, vê o saldo e leva um susto: está no limite do cheque especial. Ou então, tenta pagar uma conta com o cartão no supermercado e não consegue porque esgotou o crédito. E muitas vezes nem se lembra do que comprou. O pior é que para controlar esse impulso de gastar é preciso ter muita disciplina, segundo especialistas ouvidos pelo R7.

A psicanalista e representante no Brasil da Iarep (Associação Internacional para Pesquisa em Psicologia Econômica, na sigla em inglês), Vera Rita de Mello Ferreira, diz que as pessoas vivem perto do limite de endividamento porque “não querem se dar conta" dele.

- Elas pensam nas prestações que cabem no orçamento, e isso prossegue até que se deem conta de que estão encrencadas. Todo mundo tem que ter o celular da moda, o sapato do momento. O crédito promete isso, e como é difícil para o indivíduo se manter isolado, qualquer coisa que se prometa vai encontrar um público que a queira.

Para a professora, o estilo de vida “menos é mais” não exerce um apelo por si só porque “gostamos do que não tem limites, gostamos da fartura”. Ela diz que, do ponto de vista da psicanálise, “todo mundo sente uma atração pelo que não tem e por se arriscar nos limites: ninguém gosta de ter limites para o próprio vigor, a própria saúde, beleza, e aí tentamos compensar isso com as compras".

Ela lembra que o importante no momento é debater se o objetivo das classes C e D é mesmo o de consumir mais e acrescenta que resistir ao impulso para gastar não é impossível: com outras fontes de satisfação que não apenas as compras é mais fácil evitar gastos compulsivos.

Vontade de gastar

Na última semana, a CNC (Confederação Nacional do Comércio) divulgou uma pesquisa na qual mostra que a intenção de consumo das famílias brasileiras cresceu 0,6% neste mês, marcando o quinto avanço seguido; e que essa disposição para gastar é maior entre as famílias mais pobres (alta de 0,8% em setembro).

O crescimento forte da renda nos últimos meses, a grande oferta de crédito e a moderação nas taxas de juros fazem com que as pessoas consumam mais, segundo o economista da CNC Bruno Fernandes.

O estudo revela que 59,2% das famílias brasileiras estão endividadas, e a média no terceiro trimestre foi de 58,7%, superior à do segundo trimestre, que foi de 56,9%. O cartão de crédito é o grande vilão: 71,5% das famílias que não conseguem pagar suas contas têm aí seu maior problema. Outras formas de dívidas são os carnês (24,6%) e o crédito pessoal (10,7%). Apesar do alto índice de endividamento, segundo a pesquisa, apenas 9% das famílias não conseguirão pagar as dívidas e ficarão inadimplentes.

Como não cair na armadilha do consumo

Para o professor de finanças da FEA-USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade) Luiz Jurandir, só a autocrítica do consumidor é que pode fazer com que esse endividamento não se torne uma armadilha. Antes de gastar, o consumidor precisa avaliar que necessidade ele tem de um determinado produto.

Ele lembra o efeito da indução sobre o consumidor: as empresas precisam induzir a pessoa a fazer compras, já que esse é o mecanismo segundo o qual a economia funciona.

- A grande massa age induzida por mecanismos montados para fazer a economia funcionar. Mas, para a vida do indivíduo, essa ação [de comprar] tem de vir antecedida por uma análise crítica, ele tem de se perguntar se isso tem sentido na realidade orçamentária dele.

O professor diz que não dá para esperar paternalização por parte das empresas - cujo papel é vender, e não zelar pelo orçamento doméstico das pessoas. O consumidor é que precisa ter autocrítica.

- A resposta disciplinadora é interior, tem de vir de cada um, e não do outro - ou seja, de quem quer vender.

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