sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Métodos da Comissão da Verdade dificultam monitoramento

Relatório realizado por três pesquisadoras do Instituto de Estudos da Religião (Iser) afirma que, sem dispor de uma metodologia clara, nem de mecanismos de participação da sociedade civil, trabalho se torna ainda mais difícil


Investigar e esclarecer violações, desaparecimentos, mortes e torturas ocorridas em períodos ditatoriais não é uma tarefa fácil. Sem dispor de uma metodologia clara, nem de mecanismos de participação da sociedade civil, essa missão se torna ainda mais difícil. É o que aponta relatório realizado por três pesquisadoras do Instituto de Estudos daReligião (Iser) que monitoram os passos da Comissão Nacional da Verdade (CNV) desde a sua aprovação no Congresso Nacional.
“Para a Comissão da Verdade ter seu resultado reconhecido de uma forma ampla, temos que partir de um processo em que a sociedade esteja presente e legitimando todas as suas etapas. Não é somente ao final, dependendo do teor do relatório, que o processo deve ser avaliado como positivo ou negativo. Todas as etapas devem ser avaliadas. A sociedade tem o direito de acompanhar e estar ativamente integrada”, explica a cientista social Moniza Rizzini, mestranda em Direito na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Baseado nos trabalhos dos seis primeiros meses da comissão, de maio a novembro de 2012, as pesquisadoras brasileiras Fernanda Ferreira Pradal e Moniza Rizzini e a britânica Amy Westhrop divulgaram o primeiro relatório e já o disponibilizaram na página do instituto (www.iser.com.br). “Nessa ação de monitoramento, tentamos provocar reflexões mais profundas e chamar diferentes atores para que estas discussões sejam mais frutíferas”, ressalta Fernanda, mestranda em Direito na Pontifícia Universidade Católica (PUC/RJ). 
Esse tipo de monitoramento realizado pelo Iser já foi realizado por organizações não governamentais em outras comissões, como foi o caso da África do Sul. Para compor o relatório, elas participam de reuniões e audiências públicas, enviam ofícios solicitando dados, acompanham publicações oficiais e notícias veiculadas na mídia. O grupo tem atuado não só como observador de pesquisa, mas também como ator político com o envio de demandas solicitando audiências e enviando críticas detalhadas do que poderia ser aprimorado. “Essa falta de estruturação, de sistematicidade, de planejamento, enxergamos como uma certa debilidade do processo democrático que teria um potencial muito maior se esses elementos existissem”, defende Fernanda.
Ausência
Um dos pontos destacados pelo relatório é a ausência de divulgação sistemática dos trabalhos da CNV, algo que poderia ser aprimorado para viabilizar uma mobilização mais intensa da sociedade. A publicação de relatórios parciais seria o caminho adequado, porém essa prestação de contas tem acontecido apenas por meio de notícias no site que são replicadas nas redes sociais Facebook e Twitter. “Essa prestação de contas com notícias é vaga em vários sentidos e essa é a transparência que tem se delineado”, aponta Moniza. Segundo o relatório, não é possível identificar nem mesmo quantas pessoas foram ouvidas pelos comissionados até agora, tampouco todos os assuntos abordados nas oitivas. 
O relatório também sugere que previsões metodológicas mais precisas contribuiriam para o fortalecimento da CNV. “A ausência de uma metodologia tem como impacto a impossibilidade da sociedade civil construir mecanismos de monitoramento. Tentamos ser bastante cuidadosas com essa crítica, não queremos de forma alguma rechaçar o trabalho da CNV, sabemos que os comissionados não tiveram momento para se preparar, mas essa conduta prejudica o trabalho de monitoramento pois não informa as fases do processo e o que consta no planejamento”, ponderou Moniza.
Desde que foram nomeados, os comissionados já começaram a participar de atividades de oitivas de pessoas que estavam se destacando na mídia. Inclusive uma das hipóteses do relatório aponta que matérias jornalísticas desempenham papel importante na orientação dos trabalhos já que algumas oitivas podem ter sido fortemente definidas por reportagens prévias em grandes jornais. Um indício disto é que a segunda pessoa a dar testemunho foi o delegado Cláudio Guerra que figurou em algumas reportagens após lançamento do livroMemórias de uma Guerra Suja. (BF)

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