domingo, 14 de outubro de 2012

EU A CEU, A DITADURA E AS LUTAS SOCIAIS - I


Vindo de S. Paulo e chegando a Curitiba no final de Agosto de 1978, ao desembarcar na rodoviária de pronto tive de enfrentar uma garoa fria. Com pouco dinheiro no bolso não tinha condições de pagar um taxi. Pedi informações sobre o caminho para chegar ao Passeio Público, ponto de referência que me deram para chegar a CEU, que soberana reinava encravada no meio da maior área verde central. Era 5;30 da manhã, enfrentando a intempérie comecei  o que era para ser uma curta caminhada, haviam me dito que não passava de dez quadras, “logo ali”. Depois de caminhar poucas centenas de metros a minha roupa já estava encharcada e a cada passo a mochila pesava cada vez mais. A garoa fria penetrava na alma, tremia de frio.

Ao avistar o Passeio Público depois da “longa” caminhada pela Mariano Torres a alegria tomou conta de mim pela certeza de que estava perto do destino. Sonhava acordado com uma bela xícara de café quente. Pegando a rua Luis Leão contornei o parque, sendo que neste trajeto menor fui assombrado pelos terríveis gritos e fortes pancadas nas grades dadas por algum bicho enclausurado naquele recinto público. Pensei com os meus botões: Será que ele está tão irritado com este clima como eu estou? Clima filha da puta, que fazia a garoa paulistana virar coisa pequena!

No fim da pequena curva lá estava a imponente CEU. Tinha dois contatos na Casa, o meu primo Pedro e o meu amigo Batistão, velho amigo da infância e adolescência na minha querida Tupã. Dirigi-me a portaria e fui muito bem atendido pelo porteiro “Gabriela”, apelido estranho pelo qual um morador ao qual ele atendia antes de mim o chamou, e perguntei sobre os dois. Era muito cedo e eles ainda estavam dormindo, era um domingo, achei uma sacanagem os acordar.  Com a autorização do porteiro fui ao banheiro ao lado da portaria e vesti uma roupa seca, quente. Voltando a portaria perguntei sobre como poderia tomar um café e ele me encaminhou para o refeitório. Tomei uma generosa xícara de café com leite e comi dois pães com geleia e margarina, na situação que estava foi um verdadeiro banquete.

Voltando portaria lá estava outro porteiro, se não me engano era o Sabugaro. Perguntando a ele como poderia arrumar um canto para descansar ele me encaminhou a “sala dos outros”, um enorme quarto repleto de beliches. O local fedia a mofo, o que de cara atacou a minha renite. Resolvi esperar acordado na sala de recepção, desisti da ideia de dormir um pouco.  Acabei cochilando sentado em uma das poltronas, ao despertar já passava das dez. Acordei com uma tremenda dor no pescoço. A Casa já estava toda agitada, cheia de vida. Levantei e fui ao banheiro tirar o gosto de cabo de guarda chuva da boca e me dirigi novamente à portaria. O Batista havia saído e o meu primo Pedro ainda estava no quarto, para lá me dirigi e fui carinhosamente muito bem recebido por ele. Conversamos até a hora do almoço e descemos para almoçar. No refeitório me senti em um “internato anárquico”, o enorme salão estava lotado e o ruído era ensurdecedor, um borburinho de risadas e vozes desencontradas,  misturados com o som metálico dos garfos e facas se chocando contra as bandejas.

Elogiei a comida e os da mesa disseram que não era para me acostumar, pois durante a semana não era assim. A CEU passava por uma séria crise causada pela má gestão dos recursos. A diretoria anterior havia desperdiçado muito dinheiro fazendo banquetes em homenagem aos políticos ligados à ditadura.

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