quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Ministério Público quer impedir construção de hidrelétricas no Pantanal


Os ministérios públicos Federal (MPF) e Estadual (MPE) de Mato Grosso do Sul querem suspender a construção de hidrelétricas no Pantanal até que sejam realizados estudos sobre o impacto das obras na região. Segundo o MPF, atualmente existem 126 empreendimentos instalados ou em vias de instalação e 23 estudos de inventário em análise no Pantanal.
A suspensão das obras foi pedida em uma ação civil pública na 1ª Vara Federal de Coxim (MS) contra a União, os estados de Mato Grosso do Sul e de Mato Grosso, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul).
O Ministério Público quer condicionar os futuros licenciamentos ambientais à Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) e, para os empreendimentos que já estão em funcionamento, o MP quer que a renovação das Licenças de Operação considerem expressamente as novas exigências decorrentes da AAE.
Na ação judicial, o Ministério Público reforça que os diversos empreendimentos hidrelétricos representam prejuízos desconhecidos e sem medida, “o que por si só seria motivo suficiente para arguir a necessidade de suspensão dessas atividades”. “Admitir a continuidade da expansão do setor elétrico na bacia na qual está inserido o Pantanal, sem o adequado estudo de impactos cumulativos de empreendimentos hidrelétricos, é ato contrário à lei e à Constituição, capaz de ferir de morte um dos biomas mais notáveis do mundo”, alerta o MP. (AB)

Pantanal na berlinda

No Pantanal, onde a dinâmica da água dita o ritmo de vida de milhares de pessoas, a pesca, a agricultura familiar, a criação de gado e até o turismo pesqueiro estão ameaçados pela instalação de 116 pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) na Bacia do Alto Paraguai – principal responsável pelo regime de inundações periódicas que fazem da região um Patrimônio da Humanidade.

O alerta é da bióloga Débora Calheiros, pesquisadora da Embrapa Pantanal. “Desmatamento e criação de gado de forma equivocada são problemas possíveis de minimizar. Os impactos das pequenas centrais não são.”

Por trás da construção dessas PCHs está o interesse de grupos empresariais de segmentos como a agricultura mecanizada. As barragens impedem que os peixes subam os rios e que os nutrientes da água fluam de um local para outro. Ou seja: prejudicam tanto a desova quanto a alimentação dos peixes. Além disso, a liberação de sedimentos das barragens pode assorear os rios.

Segundo Débora, outro agravante é o fato de 70% das PCHs estarem previstas para o mesmo local: a região norte da Bacia do Alto Paraguai.

Das 116 previstas, já existem 29 em operação. O restante está em fase de construção, licenciamento ou estudo. “Os projetos estão sendo licenciados separadamente, ao invés de se realizar uma avaliação ambiental integrada, que dá conta dos impactos das obras para toda a bacia”, afirma a bióloga, ressaltando que o excesso de PCHs pode modificar o pulso de inundação natural da região.

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao Ministério de Minas e Energia, é a responsável pela realização da avaliação integrada. No entanto, o estudo ainda não foi realizado mesmo com as obras em andamento.  O presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, afirmou que a empresa iniciará este ano o levantamento.

“Às vezes, no mesmo rio, há duas, três PCHs projetadas”, explica Débora. Um bom exemplo é o Rio Coxim, que banha a cidade de mesmo nome, no Mato Grosso do Sul, a um passo da planície pantaneira. Só ali estão previstas três barragens. Já no município de São Gabriel do Oeste, a poucos quilômetros de Coxim, já existe uma em operação: a PCH Ponte Alta.

“No ano passado, a liberação dos sedimentos de Ponte Alta provocou a morte de milhares de peixes. Os
ribeirinhos ficaram muito preocupados”, diz Nilo Peçanha Coelho Filho, do Consórcio Intermunicipal para o Desenvolvimento Sustentável da Bacia do Rio Taquari (Cointa).

Segundo ele, cerca de 5 mil pessoas vivem do turismo ligado à pesca em Coxim. “Todo mundo vai sofrer as consequências das barragens”, prevê.

Pesadelo

O impasse que cerca a instalação de PCHs no Pantanal não é privilégio daquela região. Em Roraima, índios que habitam a polêmica reserva Raposa Serra do Sol protestaram recentemente contra a instalação de pequenas centrais hidrelétricas em suas terras. Em São Paulo, na bacia Sorocaba-Médio Tietê, há previsão de instalação de duas PCHs, nos municípios de Itu e Cabreúva. O projeto está tirando o sono de ambientalistas e até de políticos locais.

“É uma questão de escolha: se quisermos preservar a o potencial pesqueiro e paisagístico do Pantanal, não podemos instalar 116 hidrelétricas indiscriminadamente. Agora, se a escolha for pelo fornecimento de energia, a sociedade deve saber o preço dessa opção”, conclui Débora, acrescentando que a mesma lógica se aplica também a outras regiões ameaçadas por essas barragens.

O temor da pesquisadora sobre a situação que se desenha no Pantanal também está presente no  depoimento de Osmar Nunes de Souza, de 49 anos, pescador desde os nove. Conhecido como Pelé, ele
é morador dos arredores de Coxim. “O rio tem vida igual a gente. Se você mexe de um lado, ele corre pro outro. Ele não vai mais andar solto como anda hoje, vai ter muita água presa, e a gente tem medo de
assorear muito e não ter mais como transitar, nem pescar.”


O problema é que o assoreamento já é uma ameaça para a região, sobretudo para a planície. “A planície pantaneira é um ‘fundo de prato’. Nas beiradas - o planalto - estão os rios que nascem e desembocam na região”, explica didaticamente a pesquisadora Emiko Rezende, da Embrapa Pantanal.

Ela trabalha há anos com a bacia do rio Taquari, também um afluente do Paraguai. “O assoreamento do Taquari é um processo antigo e, até certo ponto, natural. Mas a intervenção humana está acelerando o processo, e algo que aconteceria em 30 anos agora acontece em cinco.”

Resultado: o leito do rio subiu muito e algumas áreas da planície pantaneira não secam mais. “Isso impossibilita culturas como banana, laranja e arroz”, afirma Emiko. Ela explica ainda que o assoreamento reduz os estoques pesqueiros.

“Se a área não seca, não cresce a vegetação terrestre que, na época da inundação, vira comida para os peixes”.

Caseira de um rancho à beira do rio Coxim, Maria Aparecida de Moraes, de 62 anos, critica a construção de hidrelétricas. “Isso aqui é a nossa história. É o rio que a gente vive.” Para ela, represar o rio significa perder seu emprego e impedir que seus filhos continuem vivendo da pesca.

“O pior é que a maioria das pessoas só vai sentir e perceber o impacto daqui uns 10 anos e aí já vai ser tarde demais”, diz Nilo Peçanha, do Cointa.

Pelé
O temor da pesquisadora sobre a situação que se desenha no Pantanal também está presente no depoimento de Osmar Nunes de Souza, de 49 anos, pescador desde os nove. Conhecido como Pelé, ele é morador dos arredores de Coxim. “O rio tem vida igual a gente. Se você mexe de um lado, ele corre pro outro. Ele não vai mais andar solto como anda hoje, vai ter muita água presa, e a gente tem medo de assorear muito e não ter mais como transitar, nem pescar.”
O problema é que o assoreamento já é uma ameaça para a região, sobretudo para a planície. “A planície pantaneira é um ‘fundo de prato’. Nas beiradas - o planalto - estão os rios que nascem e desembocam na região”, explica didaticamente a pesquisadora Emiko Rezende, da Embrapa Pantanal.
Ela trabalha há anos com a bacia do rio Taquari, também um afluente do Paraguai. “O assoreamento do Taquari é um processo antigo e, até certo ponto, natural. Mas a intervenção humana está acelerando o processo, e algo que aconteceria em 30 anos agora acontece em cinco.”
Resultado: o leito do rio subiu muito e algumas áreas da planície pantaneira não secam mais. “Isso impossibilita culturas como banana, laranja e arroz”, afirma Emiko. Ela explica ainda que o assoreamento reduz os estoques pesqueiros. “Se a área não seca, não cresce a vegetação terrestre que, na época da inundação, vira comida para os peixes”.
Caseira de um rancho à beira do rio Coxim, Maria Aparecida de Moraes, de 62 anos, critica a construção de hidrelétricas. “Isso aqui é a nossa história. É o rio que a gente vive.” Para ela, represar o rio significa perder seu emprego e impedir que seus filhos continuem vivendo da pesca.
“O pior é que a maioria das pessoas só vai sentir e perceber o impacto daqui uns 10 anos e aí já vai ser tarde demais”, diz Nilo Peçanha, do Cointa. (AE)

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