segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Maria de Lourdes Romanzini Pires Cerveira: CARTA ABERTA À PRESIDENTE DA REPÚBLICA DO BRASIL DILMA ROUSSEFF

Exª Srª Presidente,

Sou Maria de Lourdes Romanzini Pires Cerveira, ex-presa política em 1970 no DOI-CODI da Rua Barão de Mesquita- RJ, juntamente com meu marido, Joaquim Pires Cerveira e meus dois filhos (17 e 11 anos) onde permanecemos até o sequestro do Embaixador alemão, que libertou meu marido e mais 39 companheiros, banidos para Argélia. Fui colocada em liberdade uns dias após, porém não pude me encontrar com meu marido no exílio porque estava indiciada num processo da VPR e minha liberdade era relativa. Tinha que me apresentar com meus filhos (um deles fez 18 anos naquele cárcere dos horrores) à 2ª Secção do Exército, no Antigo Ministério da Guerra no RJ, duas vezes por semana, para provar que não tinha fugido.


A razão de minha carta deve-se as ameaças que novamente pairam sobre a minha família já tão dilacerada, por uma vida de perseguição e dor. Não falo por mim que venho recebendo também ameaças por telefone. Mas, tenho 80 anos. Peço pela segurança de meus filhos e netos, principalmente por minha filha Neusah Cerveira, a única que pode acompanhar o pai ao exílio. A senhora certamente não ignora que meu marido, Joaquim foi sequestrado em dezembro de 1973 pela operação condor na Argentina, onde depois de brutal suplício foi assassinado na madrugada do dia 14 de janeiro de 1974. Nossa vida, como de tantos outros familiares passou a ser de buscas pelos restos mortais de meu marido e por justiça. Neusah, por ter acompanhado o pai ao exílio, onde permaneceu no Chile com o pai até uns dias antes do golpe, por ter sido testemunha de muitos fatos, permaneceu algum tempo na ilegalidade. Posteriormente, foi incansável, sempre ao meu lado nas buscas pelo esclarecimento dos fatos e autores dos crime de lesa humanidade cometido a seu pai e por extensão a nossa família.


Com o passar dos anos, como as perseguições à nossa família não terminassem, Neusah decidiu se retirar por uns tempos para uma cidade do Nordeste, para se dedicar exclusivamente ao seu aprimoramento acadêmico, tornar-se pesquisadora, e prosseguir sua busca pela verdade e pela justiça amparada pelo ambiente acadêmico.
Efetivamente concluiu uma pesquisa defendida e aprovada (com indicação para publicação) na Universidade de São Paulo com o título: MEMÓRIA DA DOR – A Operação Condor no Brasil. 1984/1973 que se encontra no prelo, pronta para ser publicada desde 2008 (LCTE-Editora).


Minha filha não publicou seu livro, porque sofreu dois atentados (o primeiro no RJ, onde a delegacia do Leblon investiga até hoje, quando foi torturada (ainda tem as marcas)). O segundo no RN com minha neta, então com sete anos. Sequestro em que houve envolvimento da polícia civil do estado. Por essa época, Neusah, já fora aprovada em concurso público para professora do ensino médio no RN. Além disso, uma casa de minha propriedade no RN, na qual Neusah escreveu e guardou seu material e computadores de Pesquisa, foi vandalizada, o material levado, as paredes pixadas com ofensas contra meu marido morto. Além de terem levado também minhas lembranças com meu marido, entre outros ultrajes cometidos contra a memória de nossa família guardados nessa casa. Nunca isso foi esclarecido pela polícia do RN. Neusah se encontrava no RJ comigo, pois eu estava adoentada. Viajamos para lá, onde decidi vender a casa pela metade da metade do seu valor, quando vi aquilo.


Neusah tinha sua própria casa, já que tinha mais dois empregos e sempre foi muito independente.
Minha filha nunca desistiu de suas pesquisas para encontrar o pai e demais companheiros e fazer-lhes justiça. Também se tornou uma incansável batalhadora pelos Direitos Humanos em qualquer lugar do mundo onde fossem violados. Festejou a Comissão da Verdade e se colocou a disposição de colaborar com documentos e das formas em que sentissem que era necessária.
Minha filha faz muitos anos é porta voz oficial de nossa pequena família.


Depois das últimas eleições no RN, onde houve uma mudança das forças no comando (o Partido Democratas, assumiu o executivo) que quase coincidiu com a Instauração da Comissão da Verdade, onde Neusah compareceu como convidada, representando nossa família, vimos sua segurança ser novamente violentamente ameaçada. Especificamente, depois do encontro como Ministro da Justiça em Maio desse ano. Começou a receber telefonemas ameaçadores, a ponto de ter retirado o aparelho, para que sua filha não tivesse que escutar aquilo tudo (minha neta é bastante traumatizada, pelo sequestro que viveu com a mãe). As ameaças se estenderam pela internet e com apedrejamento da casa. (No telhado, acredito que se a polícia tivesse cumprido seu papel e feito uma perícia, ainda encontrariam pedras e outros objetos, que quebraram telhas e mais telhas) Concertou a cerca elétrica 10 vezes, desde 1º de março de 2012. Seu carro era seguido por motos. O muro esburacado, o lixo remexido, ameaças pelo celular. Fotografada em Shoppings e restaurantes, sempre com a filha. Começou a se isolar dos amigos e recusar convites para congressos. Chamava a PM, que só lhe aconselhava a deixar o RN, porque era uma mulher sozinha com uma filha. Minha filha é bastante parecida com o pai, durante a fundação do GTNM (original) do qual fomos membros da fundação era chamada, pelo Coronel Morais que perdeu uma filha para a ditadura de: “Cerveirinha” (ele conheceu meu marido no Exército) por ter herdado dele, extremo otimismo, determinação e bondade... além de uma infinita fé no ser humano.


Como dizia, as coisas pioraram, pedíamos para Neusah deixar o RN, mas pela sua imensa independência, não aceitava abandonar os empregos e nem simular uma doença para obter uma licença.


Sempre viveu modestamente, por escolha própria, organizada com suas contas. Adotou crianças que ninguém queria, embora já fosse mãe biológica e pudesse continuar a ser.


Amigos que reconheciam e reconhecem sua competência, tentaram ajudá-la a entrar numa Universidade Pública no sul ou sudeste. Era sempre recusada porque teimava em não abrir mão de suas convicções e objetivos humanistas.


Até que no dia 18 de julho sofreu um grave atentado em Natal, prestou queixa na 1 dp de Parnamirim, fazendo um BO. Resultou inútil. No dia 23, chegou em casa e encontrou tudo aberto, a cachorrinha desmaiada. Nada de valor foi levado. Apenas documentos pessoais, álbuns dela com seu pai no exílio, sua filmadora e alguns que ela pretendia encaminhar para a Comissão da Verdade. A casa estava um caos. Fez outro BO na 1ª DP de Parnamirim, onde o delegado prometeu uma perícia. (nunca aconteceu). No dia 30, novo atentado e invasão da casa dessa vez com minha filha e neta dentro de casa. Tiros e Neusah chamou a PM, que compareceu 3 horas depois, ficando 5 minutos, aconselhando-a como sempre a ir embora. Minha filha fez outro BO na 1 DP onde foi muito mal recebida. Devo relatar também que uns dias antes vinham se intensificando as ameaças, e chegou a haver nova invasão da casa e destruição da cerca elétrica que tinha acabado de ser concertada. Neusah não deu queixa policial, porque era período de provas bimestrais de seus alunos. 


Começaram a se intensificar as denúncias de seus companheiros, temendo por sua vida. Minhas também. No dia 31/07 recebeu um telefonema de uma senhora chamada Vanezza, dizendo que era da parte da Presidência da República, que ela e sua filha arrumassem uma pequena mochila, não levassem computadores, nem celulares que seriam retiradas do RN e levadas a Brasília. Disseram que seriam retiradas pela Polícia Rodoviária Federal, discretamente, e inclusive forneceram os nomes dos agentes. Forneceram-lhe por mensagem dois telefones para que ligasse assim que chegasse a seu destino. Minha filha já tinha tomado à decisão de pedir asilo político (que já estava inclusive em trâmites), mas ela pediu minha opinião: eu pedi a ela que fosse, desse uma chance... ela foi. Foi montado um verdadeiro aparato de guerra, com metralhadoras quando elas foram retiradas de casa. Foram numa viatura. Seguida de outras. Para surpresa de minha filha, não foi levada ao aeroporto e sim a uma pousada no Bairro de Ponta Negra, cuja localização é mais perigosa que sua casa. Chegando lá, com a polícia, foram instaladas num apartamento que dava para um descampado. De manhã foram abrir a janelas e foram fotografadas. Resumindo, Srª Presidente, minha filha ligou para os “telefones secretos” que lhe foram dados. Atendeu uma pessoa que não correspondia aos nomes que lhe deixaram. O Hotel lhe comunicou que deveria sair até o meio dia. Ficou aguardando, quando ligaram “as pessoas que se diziam secretas” argumentando que ficaria até sexta e que poderia sair à vontade para almoçar ir ao banco. Neusah, contou que já estava localizada. Nada demoveu aquelas pessoas. Pediram (Neusah e sua filha) um lanche no quarto e ambas ficaram bem doentes. Estavam sem dinheiro porque minha filha tinha medo de sair e sua filha ser morta ou sequestrada. No terceiro dia de cativeiro, sem comer, doente e tomando água da torneira, minha filha conseguiu me ligar pelo celular, porque alegando estar doente pediu que a gerente do Hotel fosse a seu, quarto com resumo da fatura e esclarecimento de quem fez as reservas. Estarrecida ficou sabendo que a Pousada era da sobrinha da Governadora do Estado do RN. Que inclusive conhecia, e lhe forneceu a reserva, que foi feita segundo a documentação por ela mesma: Neusah Cerveira por apenas uma diária. Posteriormente paga, por uma sigla desconhecida com pedido de nota fiscal eletrônica, por E: Mail da Srª Josy Campos. A proprietária inclusive perguntou por que ela tinha sido trazida pela polícia e a chamou de Drª Neusah Cerveira, dizendo: já falei para minha tia da sua presença aqui na nossa Pousada. (a tia no caso é a governadora do DEM, Rosalba Ciarline, inimiga política de minha filha e de todos os defensores de DH) Começamos então, ligar com insistência para autoridades possíveis de Brasília para que a resgatassem dali. Já sabíamos e isso Neusah tinha informado, que seus perseguidores eram pistoleiros de aluguel de uma cidade do RN, famosa por esses tão pouco ilustres moradores, que tem até uma tabela de preços para assassinatos por encomenda!
Srª Presidente, só conseguimos que alguém aparecesse lá no dia 03/08.

Disseram a minha filha que seria ouvida pelo Procurador da República, o que efetivamente aconteceu. 

Posteriormente disseram que agentes da Força Nacional, iriam com Neusah e sua filha, (que estavam e ainda estão fracas e com infecção gastrointestinal) Só que indicaram que fossem num camburão da Polícia Rodoviária Federal, os outros iriam fazer uma vistoria e a perícia do local e do carro.
Elas foram, e chegaram novamente ao escurecer, como criminosas em sua casa, que estava com a porta da frente aberta. Logo depois chegaram três senhoras de táxi e mais três senhores com a camiseta da Força Nacional. Tiraram algumas fotos e disseram que elas ficariam ali. Não adiantaram os protestos de minha filha, para que levasse ao menos minha neta. Quando Neusah percebeu que nada poderia ser feito pediu um telefone, já que jamais ninguém lhe mostrou uma credencial. Ao contrário enquanto minha filha prestava o depoimento para o Procurador, a Srª Vanessa ficou na sala, e por duas vezes pegou o celular da minha filha e ficou lendo suas mensagens e telefonemas, fotos, coisas pessoais. Neusah pediu para conversar a sós com o Procurador, que mesmo contrariando as referidas senhoras, aceitou. Toda hora a Vanezza abria a porta, tentando interromper essa conversa, cujo teor não levarei a público. Não agora.

Neusah, já tinha procurado inclusive a OAB/RN onde prestou depoimento e lhe foi recusada uma cópia. Mas, temos como comprovar. Disseram que o Presidente da Comissão da Anistia da OAB, não podia perder tempo, morava em outra cidade e tinha que cuidar de sua sobrevivência. Era um voluntário. 
Minha filha ficou sozinha na casa com sua filha. Fazia tempo que dormia por sua conta e dinheiro em pousadas o que voltou a fazer agora. Ontem tiveram que dormir em casa porque quando seus “protetores” foram embora, era muito escuro e perigoso para sair.
Antes de sair, a Srª Vanezza deu a minha filha 192,00 e pediu que Neusah assinasse uma diária de 300. Minha filha assinou. Estava tão debilitada que nem se preocupou mais com isso. Na verdade esses 192 reais pagos com cartão de crédito da minha filha foram motivados pelos muitos telefonemas a cobrar dados aos “telefones secretos” e recebidos dos mesmos telefones. Eu fiz questão e recomendei a minha filha guardar esses 192 reais em espécie, que foram trocados num pequeno comércio vizinho. Mas, porque Neusah assinou um recibo de diária de 300 reais?
Hoje minha filha e minha neta foram ao mesmo comércio e ouviram dos vizinhos que esperam que tudo corra bem. Qualquer um pode ser preso! Quem sabe confundiram sua mãe com traficante? Disseram a minha neta! Tudo vai dar certo. Consolaram pela prisão!


Então eu pergunto Presidente Dilma Russeft: isso vai ficar assim? A quem responsabilizo, por tanta incompetência ou maldade? Minha filha vai perder o emprego porque estava “protegida/presa” por defender os DH e a memória de seu pai? 


Faço-lhe um pedido, Presidente: tire minha filha e minha neta do RN e resgate pelo menos a memória recente! Minha filha vai passar por suspeita de ter sido presa como traficante, ou outra coisa? Vai ser morta? Deve pedir asilo? Não querem mais minha filha no Brasil? Não precisa matar. Em cinco dias fiquei com os cabelos totalmente brancos! Esse país não devolve os restos mortais do meu marido e agora quer matar minha filha por perseguir essa demanda com obstinação. 

Sem mais,
Saudações

Maria de Lourdes Romanzini Pires Cerveira
(Historiadora)
CI: 05 128 7750-7 MINISTÉRIO DA DEFESA
CPF: 160 174 639-34
Rio de janeiro, 04/08/2012.

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