sexta-feira, 30 de março de 2012

Fui ver a peça Memórias Torturadas, e não só gostei de ver a arte vivenciando a história, como fiquei emocionado pelo realismo do espetáculo

Os personagens reais de Memórias Torturadas, ainda presos, mas com o presídio sob a direção do oficial Elizeu Furquim, que amenizou e melhorou a qualidade de vida dos detidos


Quero cumprimentar a todos os que se envolveram neste projeto teatral (Gehad Hajar, Carlos Vilas Boas, Beth Capponi, Paulo Hey, Ricardo Alberti, Martin Esteche e Itamar Kirchner) tanto pelo tema abordado, que vai de encontro ao que daqui a pouco vai estar pautando a política nacional com a nomeação dos membros para a Comissão da Verdade, e o debate histórico que está trará, o que poderá levar com o levantamento das provas a punição dos envolvidos com os crimes de estado praticados pela ditadura.

O período este em que o Brasil, como um todo, foi vitimado direta ou indiretamente pelo flagelo que é viver em um estado onde todas as prerrogativas do estado de direito foram suprimidas para impor um sistema de governo, que do ponto de vista interno foi social excludente, e do ponto de vista internacional dependente eentreguista de nossas riquezas, onde para a sua manutenção o terrorismo de estado deu o tom, a iniciativa destes brilhantes jovens em resgatar a memória dos militantes do PCB, presos em 75 pela Operação Marumbi, é de vital importância para a consolidação do processo democrático.

Para podermos avançar, enquanto nação democrática socialmente includente e soberana temos de passar a nossa história recente a limpo .

O local escolhido para a encenação da peça não poderia ser melhor, já que foi no prédio do centenário presídio do Ahú, hoje desativado.

Lá chegando na recepção ao público um enorme portão de aço nos separava do palco tão real. Tal qual presos ingressando no sistema fomos submetidos a uma triagem, feita por atores vestidos com o uniforme de agentes penitenciários. Ali foi separado os que poderiam entrar, no caso os que já haviam comprado ingressos, já que muitos não puderam assistir a encenação por estes para ontem já estarem esgotados do que não. Após a triagem um dos diretores do espetáculo, tal qual fosse o diretor do presídio, elencou as normas de conduta que deveriamos seguir para adentrarao lúgubre ambiente. Sob as ordens dos agentes penitenciários foi organizada uma fila indiana, o que já gerou um clima. A fila adentrou o presídio e na minha mente, onde as memórias pessoais e coletivas sobre este triste período da nossa história ainda estão vivas, por também ter sido uma das vítimas da perseguição ditatorial, as histórias um dia ouvidas no pé do ouvido contadas pelos que um dia ali estiveram presos e foram torturados por só pensarem diferente do sistema, vieram a tona como fogo queimando e me emocionei profundamente.

Mesmo depois de tantos anos desativado o Ahú ainda mantém o terrível cheiro que só as cadeias possuem, o que somado ao ambiente escuro torna o cenário, que foi local de muitas dores, ainda mais terrível. Paro por aqui, pois for além tirarei a emoção que irão sentir os outros espectadores.

Vou abordar um pouco do que acredito sobre o que levou um dia a acontecer a publicação do livro do Ildeu Mando, Memórias Torturadas e Alegres de um Preso Político, base para o roteiro desta peça, tão bem escrita, dirigida e interpretada por este brilhante grupo de jovens capitaneados por Gehad Hajar.

Em um estado construído durante mais de 500 anos em cima de cadáveres insepultos. E nele a tortura em qualquer delegacia faz parte da históriacorriqueira desse nosso excludente país, o que se passou com dezenas de milhares de presos políticos, com a contribuição da mídia venal, que se locupletando com as verbas do erário do estado ditatorial calou e falseou coma verdade dos fatos ao impor suas mentiras convencendo a grande massa de que que as vítimas eram os bandidos, o resgate da memória nacional e a sua discussão com certeza será como o vento soprando suavemente ajudando a cicatrizar as feridas, ainda abertas expostas pelo proposital esquecimento, o que gera desconhecimento de algo tão importante, que afetou a todos.

Durante o regime ditatorial militar, com a entrada do capitalismo selvagem no campo, mais de 20 milhões de brasileiros foram obrigados a migrarem do campo para as cidades, tanto por causa da mecanização como pela concentração da propriedade da terra nas mãos de poucos. O projeto de desenvolvimento dependente aqui aplicado pela ditadura era baseado na produção em grande escala de produtos agrícolas para a exportação. Este tipo de atividade agropecuária, altamente mecanizada, necessitava de grandes extensões contínuas de terras par o plantio em grande escala, principalmente de soja. Outra atividade econômica, também altamente concentradora de renda e da propriedade da terra que a ditadura estimulou foi a pecuária de corte extensiva. Ambas altamente excludentes na distribuição de renda, e com o agravante de gerar poucos empregos.

Para impor está diáspora, está grande leva migratória para as insalubres periferias dos grandes centros, o que beneficiou a poucos capitalistas submisso aos grande capital internacional tinha de calar uma Nação, e o caminho para isto foi o uso excessivo de força. Após o golpe militar e civil de 64 paulatinamente pela proclamação dos Atos Institucionais foi imposto a desorganização da sociedade civil e suprimidas as garantias legais democráticas individuais e coletivas. Ocorreram intervenções nos sindicatos e demais entidades populares, a imprensa foi censurada, acabaram com o habeas corpus, foram proibidas as reuniões., foi imposto o bipartidarismo, etc..

Com a ditadura vigorando a cada novo dia de forma mais dura uma parte da oposição, que estava totalmente acuada, resolve reagir pelas armas contra um inimigo em maior número,muito mais equipado e melhor treinado. Estes jovens idealistas não passavam de dois mil, embora a oposição como um todo representasse muitas dezenas de milhares, com o apoio de milhões, já que perto de 60% da população considerava o seu governo bom.

Em uma guerra desigual os movimentos armados da esquerda foram arrebentados e mesmo assim a repressão não diminuiu. Os parlamentares progressistas eram cassados enquanto políticos biônicos, sem um voto sequer, eram empossados, os sindicatos sob intervenção eram controlados por pelegos, os sequestros de opositores, as torturas e os desaparecimentos de presos políticos eram a rotina. A última organização a ser perseguida foi o PCB, que na época havia aberto mão da luta armada. Para manter o sinal no vermelho os estrategistas a serviço da ditadura, sempre tiravam das mangas o "perigo vermelho", na época tão ao gosto dos magnatas e demais hospedes do palancão da reação. Quem não era do governo (ARENA/PDS) tinha grandes dificuldade para poder se manifestar, mesmo quem fosse da oposição "confiável", na época partido criado pela ditadura para legitimar a ditadura ao vender a falsa idéia que dentro dela havia "democracia".

Aos poucos o que era para ser somente a oposição cabresteada toma uma nova forma e dentro das fileiras do MDB começou a surgir a verdadeira oposição, e no meio desta a presença de organizações de esquerda começou a se fazer presente. primeiro para o MDB imigrou os opositores democratas e nacionalistas ligados no passado PTB e PSB e depois os comunistas, sendo que o clandestino PCB foi o primeiro partido comunista a ingressar neste que se tornava de fato uma trincheira de luta contra ditadura. Depois mais tarde vieram os outros agrupamentos marxistas que haviam feito autocrítica sobre o processo de luta armada e tinha optado pela luta política pela democratização. Entre eles os membros do MR-8/TL, PC do B e os remanescentes da AP , DA ALN, PCBR, etc..

Com toda a esquerda armada destroçada em 75, ano que novamente explodem as operações clandestinas de terrorismo de estado, só restava ainda organizado o PCB e este foi o novo alvo. Em cada estado as operações de caça aso quadros políticos do PCB teve um nome, aqui no Paraná era a Operação Marumbi, em São Paulo a OBAN, em Santa Catariana Operação Barriga Verde, etc.. Os sequestros, prisões, torturas e desaparecimentos dos membro deste partido, que não optou pela luta armada e seguia o caminho das reformas sociais, trucidaram com o a organização.

A peça trata da vida de alguns membros desta organização na prisão, entre eles Júlio Manso, Diogo Gimenez, Bereck Krieger, Antonio Brito, Romeu Bertol, Narciso Pires, etc., das suas convicções, dores, revoltas , incertezas e medo.

Este teatro de absurdos, digno de ser escrito e dirigido por Boal, merece ser visto!








3 comentários :

Unknown disse...

nao consegui ingressos para a peça. Sera que vao continuar a apresentacao depois do festival? Tomare!

Molina com muita prosa & muitos versos disse...

O Gehad, autor e diretor da peça, avisa que há alguns ingressos
para as sessões das 21h.

Molina com muita prosa & muitos versos disse...

O Gehad, autor e diretor da peça, avisa que há alguns ingressos para as sessões das 21h.

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