sábado, 4 de junho de 2011

Palocci finge que não há crise e não revela a lista de clientes


Na primeira entrevista em 20 dias de crise, o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, afirmou ontem ao Jornal Nacional da TV Globo que não fez lobby para empresas privadas em órgçãos públicos. Ele também manteve sob sigilo números sobre o faturamento de sua empresa, a Projeto, e a identidade de seus clientes. Disse apenas que trabalhou com demandas dos setores industrial, de serviços financeiros (fundos de investimento e mercado de capitais) e de serviços em geral.

“O que eu fazia era uma consultoria para empresas privadas. Se a empresa tinha uma necessidade junto a um órgão público, ela tinha lá seu departamento ou a sua prestação de serviços para isso. Eu não fazia isso porque isso a lei não me permitia e eu tinha perfeita clareza do que a lei permitia ou não permitia”, disse Palocci. “Por isso, eu tenho esclarecido, e reafirmo aqui pela oportunidade, que a minha empresa jamais atuou junto a órgãos públicos, ou diretamente prestando consultoria para órgãos públicos ou representando empresas privadas nos órgãos públicos”, declarou.

Até o momento, sabe-se quem foram três clientes de Palocci.Todos têm algum tipo de interesse no poder público federal. O banco Santander, um dos clientes de Palocci, é parceiro da Petrobras. A construtora WTorre também tem negócios com a estatal. Por último, o plano de saúde Amil tem o serviço que presta regulamentado pela União.

Números reservados

Sobre os motivos para manter o sigilo de certas informações, Palocci falou que gostaria de deixar os números da empresa reservados porque “não dizem respeito ao interesse público”. “Agora, os contratos, sim, aquilo que eu fiz, serviço que eu prestei, as empresas que eu atendi, as empresas que tinham contrato, posso falar perfeitamente sobre eles.”

Também disse que o faturamento de R$ 20 milhões da empresa no ano passado deveu-se ao encerramento dos trabalhos de consultoria no final de 2010. “Aqueles serviços prestados até aquele momento foram pagos nesse momento. Por isso que há uma arrecadação maior nesse final de ano, mas são contratos de serviços prestados. Hoje, por exemplo, a empresa não tem mais nenhum contrato, nenhuma arrecadação, nenhum valor.”

A respeito do sigilo dos clientes, o ministro afirmou temer que as empresas sejam alvo do jogo político. “Muitas pessoas pediram para divulgar a lista de clientes. Veja, na semana passada, uma empresa admitiu que teve contratos comigo. O que aconteceu? Deputados da oposição foram imediatamente apresentar acusação grave contra essa empresa, que teria conseguido restituição de impostos, em tempo recorde, por minha intermediação. Veja a gravidade da afirmação.”

Segundo Palocci, os clientes buscavam em sua empresa conhecimentos acumulados como ministro da Fazenda. Ao contrário do que chegou a prometer no começo da entrevista, ele não detalhou objetivamente os serviços que prestou. “São empresas que vivem da iniciativa privada e que consideraram útil o fato de eu ter sido ministro da Fazenda, de ter acumulado uma experiência na área econômica, de conhecer a área econômica.”

Já sobre sua possível saída do cargo, disse que a decisão depende da presidente Dilma Rousseff. E negou que o governo esteja passando por uma crise. “Não há uma crise no governo, há uma questão em relação à minha pessoa, eu prefiro encarar assim e assumir plenamente a responsabilidade que eu tenho nesse momento de prestar as informações aos órgãos competentes e dar as minhas explicações. Isso é uma coisa que cabe a mim.”

Outra entrevista

O ministro também concedeu ontem entrevista ao jornal Folha de S. Paulo. O site do jornal publicou, à noite, alguns trechos da fala do ministro, que disse não ter revelado os nomes das empresas que contrataram sua consultoria nem à presidente. “Não entrei em detalhes sobre os nomes dos clientes ou sobre os serviços prestados para cada um deles.”

A crise envolvendo o ministro começou com uma reportagem da mesma Folha de S.Paulo. Segundo a matéria, o patrimônio de Palocci cresceu 20 vezes entre 2006 e 2010 – de R$ 375 mil para R$ 7,5 milhões. O avanço se deve ao desempenho da empresa de consultoria Projeto, aberta por ele em julho de 2006.

No final do ano passado, a Projeto foi transformada em administradora de imóveis e passou a ter como função principal a gestão de um escritório de R$ 882 mil e um apartamento de R$ 6,6 milhões comprados por Palocci, em São Paulo, em 2009. Outra reportagem da Folha de S.Paulo mostrou ainda que, ao longo de 2010 (ano de campanha eleitoral), a Projeto faturou R$ 20 milhões.

Palocci fundou a Projeto pouco mais de três meses após deixar o Ministério da Fazenda, em março de 2006. Pouco depois, foi eleito deputado federal pelo PT de São Paulo e cumpriu mandato entre 2007 e 2010.

Até ontem, a defesa do ministro estava baseada no argumento de que não houve incompatibilidade entre o exercício parlamentar e o fato de possuir uma consultoria. De acordo com o Código de Conduta da Alta Adminis­­­tração Federal, porém, ex-ministros não podem prestar consultoria valendo-se de informações não divulgadas publicamente a respeito de programas ou políticas do órgão ou entidade a que esteve vinculado.

Palocci também tem alegado que todos os contratos contêm cláusulas de confidencialidade – ou seja, estaria cometendo um crime se decidisse revelar o nome dos clientes e o tipo de serviço prestado. Como ele não revela exatamente quais serviços prestou, não é possível saber se ele fere o Código de Conduta.

De carona nas informações divulgadas pela imprensa, a liderança do PSDB na Câmara dos Deputados apresentou suspeitas sobre pagamentos de R$ 9,2 milhões feitos em 2010 pela Receita Federal à WTorre (um dos poucos clientes revelados da consultoria). Tanto o governo quanto a empresa negaram qualquer irregularidade. Ontem, a Receita divulgou uma nota reiterando que agiu corretamente.

Oposição diz que ministro não convenceu

O líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias, afirmou que a entrevista concedida pelo ministro Antonio Palocci ao Jornal Nacional dá mais munição para que a oposição continue trabalhando para aprofundar as investigações no Congresso Nacional. “Ele foi inseguro, nervoso e não eliminou nenhum dos indícios que nos levam à necessidade de uma Comissão Parlamentar de Inquérito.”

O tucano disse que as explicações precisam deixar claro quais eram os tipos de serviço prestados. “Consultoria é produção intelectual. Em nenhum momento ele apresentou o que ele ofereceu de tão interessante para ter obtido um ganho financeiro milionário em tão pouco tempo. Os argumentos apresentados por ele foram pueris.”

Já o líder do PPS na Câmara dos Deputados, Rubens Bueno, disse que entrevista só serviu para levar a presidente Dilma Rousseff para o centro da crise. “Sem uma explicação convincente, se mantiver o ministro a presidente assume o risco de entregar as principais ações do governo a um suspeito de enriquecimento ilícito e tráfico de influência.” (AG)

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