sexta-feira, 13 de julho de 2012

TRABALHADORES GREVISTAS DESAPARECIDOS DEPOIS DE PRESOS NA GREVE NA USINA DE JIRAU


Diante dos graves fatos ocorridos no canteiro de obras da Usina Hidroelétrica de Jirau, todos que assinam esta petição vêm requerer à Secretaria Estadual de Segurança de RO; à Secretaria Estadual de Justiça de RO, assim como à Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo Federal, ao Ministério da Justiça e finalmente aos governos Federal e Estadual:
- A imediata liberdade para os trabalhadores que continuam presos, há mais de 90 dias, por participarem do movimento em defesa dos seus direitos, Jhonata Lima Carvalho e Carlos Moisés Maia da Silva;
- A imediata investigação e apuração urgentes das condições de trabalho nas obras de Jirau;
- O imediato cancelamento e arquivamento de qualquer processo contra os trabalhadores que tenham participado do movimento grevista. Assim como a revogação das ordens de prisão de todos;
- A localização e a responsabilização pela vida e integridade física dos trabalhadores que foram conduzidos à Delegacia entre os dias 28 de março e 3 de abril em função do movimento grevista e até hoje não foram encontrados. 

Desde o início das obras da Usina Hidrelétrica de Jirau, em Rondônia, têm sido feitas denúncias de irregularidades e os trabalhadores vêm realizando intensas mobilizações contra a exploração acentuada, o desrespeito completo aos direitos trabalhistas e a repressão policial.
Já em abril de 2008, a PLATAFORMA DHESCA (rede de entidades de direitos humanos) realizou uma missão de monitoramento de violações de direitos humanos no complexo hidrelétrico do Rio Madeira, que concluiu pela ocorrência das seguintes violações:
- Exclusão da bacia do Madeira do âmbito dos estudos sobre impactos ambientais e violação do princípio da autodeterminação dos povos e soberania dos países;
- Caracterização insatisfatória sobre necessidade do empreendimento e ausência de análise sobre alternativas de menor impacto;
- Ofensa aos princípios democráticos e ao direito humano à informação e participação;
- Violação dos Direitos dos Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais;
- Ofensa ao direito humano ao meio ambiente equilibrado e à proteção à biodiversidade;
- Ofensa ao Direito Humano à Saúde: risco de contaminação por mercúrio; proliferação da malária; ausência de estudos sobre qualidade da água;
- Ofensa ao direito à alimentação segura, trabalho, acesso à terra e moradia adequada;
- Agressão ao Patrimônio histórico-arquitetônico.
Uma nova Missão Emergencial de Monitoramento foi realizada nos dias 31 de março e 01 de abril de 2011, pela Relatoria Nacional do Direito Humano ao Meio Ambiente visando investigar as denúncias de violações de direitos humanos relacionadas às obras das usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, a partir da revolta ocorrida na obra da hidrelétrica de Jirau nos dias 15 e 17 de março de 2011, que resultou na queima de 54 ônibus e 70% do acampamento de trabalhadores na obra de Jirau (os relatores foram José Guilherme Carvalho Zagallo e Marijane Vieira Lisboa; assessoria de Luis Fernando Novoa Garzon e Cecília Campelo Mello e colaboração de Andressa Caldas e Patrícia Bonilha).
Nas entrevistas realizadas foi relatado que as obras das hidrelétricas de Santo Antonio e Jirau já causaram a morte de seis trabalhadores em acidentes de trabalho; que cada uma das obras já recebeu 1.000 autuações da Superintendência Regional do Trabalho por violação à legislação trabalhista; que havia uso ilegal de medidas coercitivas pela segurança patrimonial; que havia a utilização de um “cartão fidelidade” para o pagamento de vantagens fora da folha de pagamento “para empregados que não faltam, não tiram férias, não adoecem e não visitam a família” e que havia tratamento diferenciado e inferior para trabalhadores contratados fora do estado por intermediadores de mão de obra.
Quanto às condições de trabalho, verificou-se que o Ministério Público do Trabalho ajuizou ação contra a obra da hidrelétrica de Santo Antonio alegando “situação de extrema gravidade” e “acentuado grau de negligência”, em que foram requeridas 109 medidas liminares, das quais foram deferidas 51 medidas, e ainda o cumprimento do intervalo mínimo intrajornada e o repouso semanal remunerado por ter encontrado trabalhadores com jornada semanal superior a 60 horas.
Foram relatados problemas também quanto ao reassentamento de populações; migração com grande impacto ambiental; aumento do número de homicídios dolosos; aumento da quantidade de crianças e adolescentes vítimas de abuso ou exploração sexual; infraestrutura escolar que não atende a demanda da população, entre várias outras violações de direitos humanos.
Em 2011, a primeira grande greve contou com a participação de 20 mil operários. Naquela ocasião, foram feitos acordos e promessas de parte do Consórcio Brasil Sustentável, constituído pela GDF Suez (50,1%), Eletrosul (20%), CHESF (20%) e a Camargo Corrêa (9,9%). É bom lembrar que essa obra recebeu um dos maiores financiamentos do BNDES, que inicialmente era de R$ 8,9 bilhões e já está em mais de R$15 bilhões.
Na manhã do dia 8 de junho/2012, o arcebispo de Porto Velho (RO), dom Esmeraldo Barreto de Farias, o procurador chefe da Procuradoria Regional do Trabalho da 14ª Região (MPT – Rondônia e Acre), Ailton Vieira dos Santos e o desembargador do trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região (TRT – Rondônia e Acre), Francisco José Pinheiro Cruz, foram a Brasília entregar denúncias sobre as violações dos direitos humanos e trabalhistas nas usinas do Rio Madeira para o ministro chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho. 
Segundo o arcebispo, o desembargador e o procurador do trabalho, há uma clara comprovação de má conduta da empresa vencedora do certame para a construção de uma das usinas no Rio Madeira, Energia Sustentável do Brasil S/A (ESBR), na conduta e tratativa com seus empregados. Os três entregaram ao Ministro Gilberto Carvalho um documento intitulado “Carta de Porto Velho”, que é a síntese da Audiência Pública, que aconteceu no dia 30 de março passado, em Rondônia, sobre as violações dos Direitos Humanos aos trabalhadores das usinas do Madeira. A Audiência foi promovida pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Rondônia, e que contou com a participação de órgãos e instituições públicas, como a Igreja Católica; Procuradoria do Trabalho; Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); Ministério Público Estadual; Procuradoria da República; Sindicato da Construção Civil do estado de Rondônia; Comitê Permanente Regional das Comissões de Meio Ambiente de Trabalho da indústria da Construção e os trabalhadores e pessoas interessadas no tema.
“O grau de abuso na prática da 'terceirização' pode ser aferido a partir da quantidade de empregados próprios que integram o quadro da Concessionária ESBR, em torno de 60 empregados, que basicamente atuam na gestão de contratos de execução de serviços firmados com as empresas terceirizadas (que somam aproximadamente 400 contratos, considerados apenas aqueles firmados pela ESBR, sem levar em conta as centenas de outros contratos firmados pelas suas terceirizadas), enquanto os empreendimentos (Usina Madeira), considerados as maiores obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em andamento, já chegam a empregar mais de 40 mil trabalhadores diretos. Embora seja concessionária de uso de bem público, que assumiu em contrato administrativo firmado com a União Federal o encargo de construir a UHE Jirau, a ESBR enveredou pela conduta de rejeitar a sua responsabilidade pelos danos sociais trabalhistas causados por ela própria aos trabalhadores da obra, em contrariedade às cláusulas do contrato de concessão”, diz um trecho do documento entregue ao Ministro.
O documento aponta 11 propostas de ações e providências a serem observadas e implementadas pelo Poder Público quando outorgar ou conceder poder para empresas na construção de empreendimentos públicos.
As propostas, entre outras, incluem instituir condicionantes sócio trabalhistas; os futuros contratos firmados pela União Federal deverão conter cláusulas estabelecendo a assunção direta dos vínculos empregatícios de todos os trabalhadores que atuarem no empreendimento e a responsabilidade direta da Concessionária ou empresa vencedora do certame público; aditar os contratos administrativos firmados pela União Federal com as concessionárias das UHE de Jirau de Santo Antônio, de modo a excluir das cláusulas a previsão de execução de obra por terceiros; a imediata suspensão das transferências de recursos públicos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) quando constatado trabalho escravo ou análogo à escravidão e fiscalizar e exigir o cumprimento das instruções do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que dispõem sobre a emissão da Certidão Declaratória de Transporte de Trabalhadores (CDTT) e das normas trabalhistas para que os trabalhadores arregimentados em outras regiões do país se desloquem com garantia do emprego e com plena informação sobre as condições, direitos e deveres que abrangem o contato de trabalho.
Para o desembargador do trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região, Francisco José Pinheiro Cruz, um dos fatores que deve ser levado em consideração é a estruturação ou reestruturação prévia das localidades antes de receber obras de grandes impactos, como as Hidrelétricas. “Os impactos são subdimensionados por todos, desde o Governo Federal aos poderes estaduais e municipais. Não há uma preparação para receber o grande contingente de trabalhadores que se deslocam, como o caso de Santo Antônio e Jirau, que em grande parte saem de estados como Piauí e Maranhão. Temos relatos impressionantes de inchaço populacional em Altamira (PA), por conta da Usina de Belo Monte. Portanto, faltam condições mínimas para os trabalhadores, não há saúde, transporte, moradia, segurança, itens básicos para uma vida digna”, disse o desembargador do trabalho.
As condições irregulares em que essas obras têm sido conduzidas levaram, ainda no mês de junho/2012, a Justiça do Trabalho em Rondônia condenar as empresas responsáveis pela construção da usina de Santo Antônio, no rio Madeira, a pagar indenização de R$ 1 milhão por dano moral coletivo devido a irregularidades nas condições trabalhistas.
Em decorrência de todos os abusos e arbitrariedades, neste ano de 2012, no inicio do mês de abril, a mobilização dos trabalhadores culminou em mais uma grande greve em Jirau.
A atitude dos governos Estadual e Federal, ao invés de combaterem as irregularidades e exigirem o cumprimento dos acordos trabalhistas firmados pelas empresas, dentro das obras do PAC, foi desatar uma campanha de criminalização do movimento reivindicativo, com acusações e condenações à justa luta e aos trabalhadores.
Tanto na greve de 2011, quanto na de 2012, grande contingente policial foi enviado para o canteiro de obras (efetivo da COE da PMRO, polícia civil de Rondônia, da Força Nacional, da Polícia Federal, ABIN, etc.). Nessa onda de repressão, os operários Josivan França Sá, jovem de 24 anos, assim como Francisco Sousa Lima, pedreiro, natural do estado do Amazonas, foram mortos. A partir do dia 3 de abril, nessa escalada de repressão, foram enviados mais de 250 policiais; 113 da Força Nacional de Segurança, 80 PMs da COE, mais outros 60 policiais militares e agentes da Polícia Federal, que ocuparam os canteiros com armas pesadas para reprimir os trabalhadores. Os policiais, agindo como feitores, passaram a coagir os operários a aceitarem calados a “ordem” da exploração, transformando o canteiro de obras em um verdadeiro campo de concentração.
Em seguida, foi anunciada a “Operação Vulcano”, que prendeu 24 operários e mais outro operário foi também preso em outro operativo. Esta “Operação Vulcano” foi apresentada como aparatosa investigação, mas que, na verdade, teve o objetivo de ser usada como senha para o desencadeamento da mais violenta repressão contra operários que lutavam contra aquela exploração sem limites. É sintomático o fato de que dos R$ 67,5 milhões de compensação social que a Usina Jirau entregou ao Estado, R$ 33 milhões foram destinados à segurança pública, conforme admitiu o assessor da diretoria Institucional da ESBR, Carlos Alberto Silvestre.

As circunstâncias da prisão dos operários causam perplexidade e muita preocupação. 

A partir da realização dessa “Operação Vulcano”, originou-se o processo criminal nº 4388.89.2012.8.220501, em trâmite na 1ª vara criminal de Porto Velho. O promotor de justiça Rodrigo Levente Guimarães apresentou denúncia contra 24 operários, mandando citar e notificar todos eles no presídio Pandinha, pertencente ao complexo Urso Branco, já condenado pela Comissão de Direitos Humanos da OEA por seguidas violações dos direitos humanos.
Os advogados encontraram, no entanto, somente 11 operários nesse presídio. Dois deles continuam arbitrariamente presos. São eles: Carlos Moisés Maia da Silva, da Cipa, e Jhonata Lima Carvalho, da comissão eleita pelos trabalhadores na última greve. Desses, nove trabalhadores foram libertados através de Habeas Corpus, depois de muito esforço dos advogados para vencer todos os bloqueios e dificuldades de acesso aos presos.
Raimundo Braga de Souza, de 22 anos, do Piauí, o 25º preso, foi preso e acusado pela polícia como incendiário dos alojamentos, sob a “acusação” de portar um isqueiro e cigarros. Ele foi julgado e absolvido por falta de provas. Mas antes disso, Raimundo já havia sido preso no dia 3 de Abril, às 2:00 horas da madrugada; sendo que até as 6:30 horas, ele foi torturado em um quarto no alojamento A e B. Depois disso, foi enviado para o presídio Urso Branco e lá ficou preso por 54 dias, muitos desses em um “castigo” de 1m x 3m, com mais 6 presos. E assim como os outros operários presos, passou fome, ficou muitos dias sem materiais de higiene, sem direito a visitas de familiares, etc. Outros operários relataram a existência de cela de torturas dentro de Jirau, onde teriam ficado dois dias presos, sem receber alimentação.
Estranha e preocupante situação acompanha o caso. 

Os demais, treze ao todo, não foram encontrados, mas consta no processo que foram considerados pela oficiala de justiça, responsável pela citação, como “foragidos”! Desses 13 homens, pelo menos o operário Silvan Oliveira dos Santos e Leonilson Macedo Farias prestaram depoimento na 10ª Delegacia no dia 03 de Abril, recebendo ali voz de prisão do servidor Fernando Serra. No mesmo dia, esses dois funcionários teriam sido encaminhados ao IML para exame de corpo de delito, conforme fls 46/47/66/67 do processo. Ambos foram interrogados na Delegacia. O mandado de prisão foi emitido no dia 4 de abril, mas esses operários nunca mais foram vistos. Consta também no processo que onze operários foram presos na 10ª Delegacia de Nova Mutum, próxima a Jirau. E de todos esses também não há mais notícias. Várias famílias fazem todo esforço para encontrá-los, em vão.

Como se explica o fato de 25 operários conduzidos à Delegacia pelas mãos da própria polícia entre os dias 28 de março e 3 de abril, com mandado de prisão expedido para 24 deles no dia 4 de abril e poucos dias depois, treze deles terem sido considerados “foragidos da justiça”?

Dessa forma reiteramos:
Esta petição vem requerer à Secretaria Estadual de Segurança de RO; à Secretaria Estadual de Justiça de RO, assim como à Secretaria Especial de Direitos Humanos do governo Federal, ao Ministério da Justiça e finalmente aos governos Federal e Estadual:
- A imediata liberdade para os trabalhadores que continuam presos, há mais de 90 dias, por participarem do movimento em defesa dos seus direitos, Jhonata Lima Carvalho e Carlos Moisés Maia da Silva;
- A imediata investigação e apuração urgentes das condições de trabalho nas obras de Jirau;
- O imediato cancelamento e arquivamento de qualquer processo contra os trabalhadores que tenham participado do movimento grevista, assim como a revogação das ordens de prisão de todos;
– A localização, a responsabilização pela vida e integridade física dos trabalhadores que foram conduzidos à Delegacia entre os dias 28 de março e 3 de abril em função do movimento grevista e até hoje não encontrados: João de Lima Fontinele, Cícero Furtado da Silva, Antônio Luis Soares Silva, Ismael Carlos Silva Freitas, Lucivaldo Batista Moraes Castro, Antônio da Silva Almeida, Elielson Silva do Nascimento, Sebastião da Silva Lima, Herbert da Conceição Nilo, Leonilson Macedo Farias, José Ribamar dos Santos, Silvan Oliveira dos Santos.


Leia também entrevista com um ex operário da obra de Jirau:
http://www.jornalopcao.com.br/posts/ultimas-noticias/prisoes-desaparecimento-e-tortura-nas-grandes-obras-do-pac

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