Sim, o Nada despacha no principal gabinete do Ministério do Trabalho. Chama-se Brizola Neto. Experimente-se alcançá-lo com os olhos. Tente-se enxergá-lo em seu assento. Inútil. O olhar atravessa o Nada e vai bater no couro do espaldar da poltrona.
Dilma Rousseff queria um ministro invisível, que não lhe causasse os problemas do antecessor Carlos Lupi. Exagerou. Empossado em 3 de maio, o Nada discursou no Planalto com os olhos grudados no retrovisor.
“Não temos apenas um ciclo de progresso econômico, mas experimentamos um avanço social que incorporou mais de 40 milhões de brasileiros à vida moderna, onde a conquista do consumo e de níveis básicos de conforto e sobretudo do desejo de continuar progredindo torna nosso país uma nação com um momento muito especial.”
O parabrisa exibia um cenário diverso: crise internacional, paralisia da indústria nacional, ameaça ao emprego, queda do consumo, aumento da inadimplência e generalização de um desconforto que fazia a plateia sentir saudades do “momento muito especial.”
Decorridos 14 dias da posse do Nada, estourou a greve que paralisaria 55 mil professores e deixaria sem aula 600 mil alunos de universidades e escolas técnicas federais. Ganha um emprego vitalício quem encontrar no noticiário uma declaração do ministro do Trabalho sobre a encrenca.
Sob o silêncio do Nada, as greves de servidores adensaram-se. Num universo de 573 mil funcionários públicos, a Condsef (Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal) contabiliza em 370 mil o número de grevistas. A paralisia já alcança 28 órgãos públicos –da Polícia Federal ao Incra.
Ainda que se admita que o número do sindicalismo carrega uma dose de exagero, algo vai ficando claro: sob Dilma, o governo flerta com o mais denso e amplo movimento de reivindicação salarial do funcionalismo desde a instalação, em 2003, do primeiro reinado de Lula. E o Ministério do Trabalho nem tchum!
O Nada foi à poltrona da Esplanada sob contestações do seu partido, o PDT. Dilma deu de ombros para a legenda sob o argumento de que o novo ministro arrebanhara a simpatia das três maiores casas sindicais do país: CUT, Força Sindical e União Geral dos Trabalhadores. E daí? E daí nada.
Por trás das engrenagens que movimentam as greves na administração federal está a CUT. A própria Condsef, à frente do movimento, é filiada à central. Quer dizer: se Brasília fosse gerida à base de lógica, o Nada deveria servir-se do alegado apoio da CUT, braço sindical do PT, para coordenar uma boa e honesta negociação.
Como a lógica é materia prima escassa na Capital, Dilma escanteia o Nada e direciona os grevistas para os guichês do Ministério do Planejamento, gerido por Miriam Belchior. Petista como a CUT, a companheira trata o movimento açulado pela central a golpes de patrola. Dirige o trator um subordinado da ministra, Sérgio Mendonça, secretário de Relações do Trabalho.
Nesta quarta (8), a pretexto de abafar as cornetas da greve, o preposto de Miriam contestou a contabilidade dos sindicalistas: “Se fosse tal como é dito, teríamos o serviço totalmente comprometido, e não está. Há pouquinha gente parada e muita fazendo barulho.”
O ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência) ouviu o barulho ao comparecer à Conferência Nacional de Emprego e Trabalho Decente, inaugurada nesta quarta em Brasília. Gilbertinho, como Dilma e Lula o chamam, disse que, sob crise, a prioridade do governo é assegurar o emprego dos trabalhadores da iniciativa privada, que não dispõem de estabilidade.
Beleza. Mas por que diabos o governo do PT não expõe suas limitações fiscais numa negociação franca com o sindicalismo do PT? “Temos, ao longo de agosto, a possibilidade de vir a discutir e apresentar propostas, o que faremos”, diz Gilbertinho. “Mas temos a responsabilidade de fazer isso na hora em que tivermos segurança da proposta.”
Presentes à conferência, manifestantes da CUT brindaram o ministro com vaias e gritos de “traidor”. Esperava-se que Dilma comparecesse ao evento. Ela preveriu se abster. Fez bem. Livrou-se de ouvir a rima pobre dos descontentes: “A greve continua. Dilma, a culpa é sua!”.
A exemplo de Gilbertinho, Brizola ‘Nada’ Neto deu as caras na barulhenta conferência. Discursou sobre a necessidade de compatibilizar a justiça social com o trabalho decente. Pronunciou frases acacianas, de indecente primarismo. Por exemplo: “Trabalho digno é a raiz, a fonte da seiva que mantém forte e saudável um país.”
O contribuinte brasileiro, financiador da bilheteria que movimenta o circo, não encontrará no noticiário desta quinta (9) nenhuma frase do Nada sobre a greve que assedia sua insignificância. Diferentemente de Gilbertinho, o neto de Brizola não foi importunado pelas trombetas da CUT. Natural. De que adiantaria vaiar o Nada?