Relator da CPI mista dos Correios, que investigou o mensalĂ£o, o deputado federal Osmar Serraglio (PMDB) foi perseguido por um pavor durante a investigaĂ§Ă£o. “Tinha medo de dormir no meio de uma sessĂ£o com o paĂs inteiro assistindo”, revela o parlamentar, que descobriu ser vĂtima de apneia do sono no decorrer dos trabalhos, entre 2005 e 2006. Hoje, ao contrĂ¡rio, o que o incomoda Ă© o desfecho de um dos maiores escĂ¢ndalos da polĂtica brasileira no Supremo Tribunal Federal (STF).
Nascido em Erechim (RS) e radicado em Umuarama, no Oeste do ParanĂ¡, Serraglio Ă© um dos paranaenses mais ligados Ă apuraĂ§Ă£o do mensalĂ£o, cujo julgamento no STF começa na quinta-feira. O relatĂ³rio assinado por ele e aprovado em 2006 serviu como base para a denĂºncia elaborada em 2007 pelo entĂ£o procurador-geral da RepĂºblica, AntĂ´nio Fernando de Souza, e que desencadeou a aĂ§Ă£o penal 470 no Supremo. Ambos convergem numa tese fundamental para a possĂvel condenaĂ§Ă£o de parte dos 38 rĂ©us: o mensalĂ£o nĂ£o foi um simples caixa 2 de campanha do PT, como sustenta a maioria dos advogados de defesa, mas um esquema alimentado com dinheiro pĂºblico.
A questĂ£o Ă© crucial porque pode definir se os acusados sĂ£o passĂveis de puniĂ§Ă£o pelos crimes de peculato (apropriaĂ§Ă£o de dinheiro pĂºblico) e de corrupĂ§Ă£o ativa e passiva. A tendĂªncia Ă© que o nĂºcleo central do esquema – formado pelo ex-ministro JosĂ© Dirceu (Casa Civil), o ex-secretĂ¡rio-geral do PT SĂlvio Pereira e o ex-deputado federal JosĂ© Genoino, segundo definiĂ§Ă£o de AntĂ´nio Fernando – argumente que os recursos envolvidos no mensalĂ£o eram privados e foram captados apenas por iniciativa do ex-tesoureiro do PT DelĂºbio Soares. Se a teoria for assimilada, o caso pode ser reduzido Ă ideia de que o mensalĂ£o englobava apenas recursos financeiros de campanha nĂ£o contabilizados.
“NĂ£o importa [se Ă© caixa 2 ou nĂ£o Ă©]. O que importa Ă© que foi usado dinheiro pĂºblico e que ele foi distribuĂdo para comprar o apoio de parlamentares”, afirma Serraglio.
O relatĂ³rio do deputado e a denĂºncia de AntĂ´nio Fernando sĂ£o concordantes ao apontar que a empresa Visanet, ligada ao Banco do Brasil, seria a principal fonte do Valerioduto (suposta rede de distribuiĂ§Ă£o de dinheiro aos mensaleiros, estruturada pelo publicitĂ¡rio Marcos ValĂ©rio). Segundo eles, o esquema começava com contratos entre as empresas de ValĂ©rio e instituições ligadas ao governo (em especial, R$ 68 milhões originĂ¡rios da Visanet), o dinheiro era lavado em bancos privados, como o Rural e o BMG, atĂ© chegar aos parlamentares, que retribuĂam com apoio ao governo. A CPI rastreou R$ 55 milhões que passaram pelo Valerioduto.
O deputado diz que o uso de dinheiro pĂºblico no esquema Ă© um ponto que precisa nortear as reflexões sobre o julgamento. “Mais danoso que um homicĂdio Ă© tolerarmos desvios que levam a mortes na saĂºde pĂºblica”, avalia. Para Serraglio, “dormir no ponto” pode ser a pior consequĂªncia do desfecho do mensalĂ£o. (GP)
Fruet mantĂ©m crĂticas ao mensalĂ£o e defende apoio do PT Ă sua candidatura
O ex-deputado federal e hoje candidato Ă prefeitura de Curitiba Gustavo Fruet (PDT) Ă© enfĂ¡tico: “nĂ£o se auditou 5% dos dados que chegaram Ă CPI”. A complexidade do esquema, a quantidade de papĂ©is que foram enviados Ă comissĂ£o e o desgaste da investigaĂ§Ă£o que durou quase um ano ajudam a explicar por que isso ocorreu. Sub-relator de movimentações financeiras da comissĂ£o, Fruet conta que foram encaminhados Ă CPI mais de 30 milhões de ligações, alĂ©m de 6 milhões de registros bancĂ¡rios referentes Ă movimentaĂ§Ă£o de quase R$ 1 trilhĂ£o.
“A CPI levou quase quatro meses para acertar o sistema da sua base de dados. Para poder entender os dados bancĂ¡rios, fiscais e telefĂ´nicos e, a partir daĂ, estabelecer por onde circulavam as pessoas, os telefones, as ligações e a coincidĂªncia na votaĂ§Ă£o de temas importantes no Congresso”, revela.
O hoje pedetista conta que passava finais de semana no cofre [sala reservada onde ficam dados sigilosos encaminhados Ă s CPIs] analisando papĂ©is. A avaliaĂ§Ă£o dos dados feita pela relatoria de Fruet foi um dos elementos essenciais para desvendar como funcionava o valerioduto, sistema que abasteceu o mensalĂ£o. “NĂ³s começamos a apresentar relatĂ³rios parciais e a constatar todo o fluxo de recursos. Começamos a perceber os financiamentos do Banco Rural, BMG”, diz.
Novos aliados
Fruet e o atual prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB), eram tucanos na Ă©poca do mensalĂ£o e ganharam fama pelo trabalho que realizaram na CPI dos Correios. Opositores ao PT na Ă©poca, os dois hoje estĂ£o do lado oposto: contam com o apoio dos petistas no pleito municipal. Apesar da mudança polĂtica, Fruet afirma que nada mudou em relaĂ§Ă£o a sua convicĂ§Ă£o sobre o que investigou e rebate as crĂticas que tĂªm recebido por contar com o apoio do PT.
“Eu estou pagando o preço de ter brigado. Poderia ser um polĂtico como tantos outros. Como o Luciano [Ducci], que nĂ£o se posiciona. Como o Ratinho [Jr.], que nunca se posiciona no Congresso. Eu estou pagando por tomar posiĂ§Ă£o”, afirma, alfinetando os dois principais adversĂ¡rios nas urnas neste ano. E completa: “nĂ£o me arrependo de nada. Estou fazendo uma aliança comandada hoje pela Gleisi, que nĂ£o tem relaĂ§Ă£o nenhuma com o mensalĂ£o, nĂ£o tem participaĂ§Ă£o nenhuma do PT de Curitiba com o mensalĂ£o. Eu estou em paz”. (GP)
Presidente do PT diz que denĂºncia do mensalĂ£o 'nĂ£o se sustenta'
Faltando menos de uma semana para o inĂcio do julgamento do mensalĂ£o no STF (Supremo Tribunal Federal), o presidente do PT, Rui FalcĂ£o, divulgou vĂdeo nesta sexta-feira em que desqualifica a denĂºncia da Procuradoria.
O inĂcio do julgamento estĂ¡ marcado para o dia 2 de agosto. Entre os 38 rĂ©us da aĂ§Ă£o penal estĂ£o integrantes da cĂºpula do partido na Ă©poca, como JosĂ© Genoino (entĂ£o presidente do PT), e DelĂºbio Soares (tesoureiro), alĂ©m de JosĂ© Dirceu, que ocupava a Casa Civil.
No vĂdeo, FalcĂ£o afirma que os crimes pelos quais os petistas sĂ£o acusados nĂ£o se sustenta. "O processo incluiu alguns militantes do PT, injustamente acusados por crimes cuja a comprovaĂ§Ă£o nĂ£o se sustenta na longa denĂºncia da procuradoria."
FalcĂ£o nega que tenha havido compra de votos no Congresso ou pagamento a parlamentares para votar com o governo. Ele reafirma a tese do partido de que o partido contraiu emprĂ©stimos para pagar dĂvidas eleitorais do PT e de partidos aliados e que nĂ£o foram usados recursos pĂºblicos na operaĂ§Ă£o.
"Fica claro, portanto, que nĂ£o houve o chamado mensalĂ£o", diz FalcĂ£o, que trata o termo mensalĂ£o como "apelido" dado "por um ex-deputado [o petebista Roberto Jefferson, delator do suposto esquema e tambĂ©m rĂ©u na aĂ§Ă£o] e pela mĂdia".
"Outro fato importante que eu quero destacar: nĂ£o houve, da parte dos petistas denunciados, qualquer utilizaĂ§Ă£o de recursos pĂºblicos, nem recursos ilĂcitos. Foram emprĂ©stimos contraĂdos junto a bancos privados, que jĂ¡ foram quitados pelo partido", diz FalcĂ£o em outro trecho do vĂdeo.
Ele conclui o vĂdeo, de cerca de dois minutos e meio, manifestando "solidariedade" aos petistas denunciados e compara a eventual condenaĂ§Ă£o dos "companheiros" a um "linchamento moral".
Entre os petista que sĂ£o rĂ©us no processo do mensalĂ£o estĂ£o, alĂ©m de Genoino, Dirceu e DelĂºbio --que foi expulso do partido, mas readmitido no ano passado --, o deputado JoĂ£o Paulo Cunha (entĂ£o presidente da CĂ¢mara), os ex-deputados Paulo Rocha (PA), JoĂ£o Magno (MG), Luiz Carlos Rodrigues (SP), o ex-ministro Luiz Gushiken e o ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato. (JF)