
Apresentado o cenário, nomeie-se as testemunhas. Andrew sagrou Garnero no dia em que o homenageado principal era o ex-presidente americano George Bush, o pai – os três ocuparam cadeiras vizinhas na mesa central. A poucos metros de distância, a ex-primeira ministra Margareth Thatcher, lendária Dama de Ferro britânica. Espalhada pelo salão, a elite da nobreza e dos negócios em cinco continentes, ostentado títulos de lordes e sobrenomes como Rothschild, Churchill, De Benedetti... Foi o fecho dourado para uma breve temporada de pompa, circunstância, poder e bilhões. Garnero comandou em Londres a reunião anual do Conselho Internacional do Brasilinvest, o banco de negócios que lidera cerca de US$ 3 bilhões de investimentos ao redor do mundo. Durante três dias, os melhores salões da corte britânica se abriram para a não menos impressionante corte de conselheiros do brasileiro. Bush pai, amigo dos Garnero há três décadas, não é membro do board, mas, como convidado especial, foi a estrela maior em um clube cujos sócios reúnem patrimônio que, somado, se aproxima dos US$ 20 bilhões. A tradicional família de banqueiros ingleses Rothschild, por exemplo, tem um assento lá, ocupado pelo jovem Nathanael, 38 anos, presidente do fundo Atticus, com US$ 3 bilhões em ativos. Os petrodólares do Oriente Médio falam pelas vozes do sheik Salman Bin-Khalifa Al Khalifa, vice-presidente da estatal petrolífera do Bahrein – cuja produção de óleo corresponde a três Petrobras --, e de Youssef Hamada Al-Ibrahim, ex-ministro das finanças do Kuwait. Rei da seda e sócio de um império no varejo de luxo, David Tang faz a ponte com a emergente China, nova fronteira dos negócios dos Garnero. Oleg Deripaska, russo de US$ 12 bilhões que lidera a produção mundial de alumínio, e Armen Sarkissian, ex-primeiro ministro da Armênia, abrem as portas para a riquezas do antigo bloco soviético. E é só o começo.
Seria uma Babel dos negócios, não houvesse a uni-los a linguagem universal das oportunidades e o magnetismo de Garnero. Todos lucram com a convivência. Conselheiros, não raro, viram parceiros em empreitadas milionárias. E, com seus dólares e prestígios unidos, fazem do conselho do Brasilinvest uma entidade multinacional da qual todo mundo quer se aproximar. Garnero colhe os louros por onde passa.
“Quando ele me convidou para participar do conselho, há alguns anos, durante o Carnaval do Rio, não tinha idéia do que era o Brasilinvest”, conta o elétrico e bem humorado Tang. “Aceitei mais porque estava seduzido pelas mulatas, mas hoje sei do que Garnero é capaz. E ele leva o nome do Brasil com ele”. Bush, o amigo fiel, não cansa de disparar elogios ao brasileiro. Desta vez, repetiu a dose em pelo menos quatro diferentes eventos em Londres. No Palácio St. James, dividiu as honras reais com Garnero. “Espero que mais homens de negócios do mundo sigam o exemplo de Mário e procurem construir parcerias internacionais pela prosperidade”, discursou. Ergueu sua taça e brindou.
NA CASA DOS ROTHSCHILD
No domingo 16, Lorde Rothschild abriu as portas da casa no ensolarado fim de tarde de primavera. Serviu champanhe no terraço, diante da bucólica vista do Green Park. O sol se punha quando um arauto esmurrou o piso de madeira da biblioteca para atrair a atenção – assim manda a tradição da corte – e, com voz impostada, anunciou que era chegada a hora do banquete. Os convidados – o estelar elenco de conselheiros do Brasilinvest, acrescido de poucos convidados de Garnero (entre eles o governador de Minas Gerais, Aécio Neves) e de Rothschild (como Javier Valls Taberner, controlador do Banco Popular, o terceiro maior da Espanha) – foram guiados para o Great Room, no andar superior. Desfilaram por entre o mais completo acervo de mobiliário de época existente fora dos palácios reais e uma coleção ímpar de obras dos melhores artistas ingleses, com destaque para uma série de pinturas de Benjamin West cedida pela rainha. Para chegarem ao salão, cruzam portas emolduradas por colunas em estilo corinto em puro mármore grego, retirado das ruínas do antigo templo Erechteum. O mármore branco também abraça as esquadrias das janelas e dá acabamento à lareira. O teto, ricamente trabalhado, é réplica da capela de Greenwich, um dos orgulhos da arquitetura inglesa.
Terá surgido ali uma futura transação? Dará frutos aquele breve bate-papo no terraço em que o sheik Al-Khalifa disse, com todas letras, a Garnero que tem o maior interesse em qualquer negócio envolvendo a Petrobras? Nesse universo, conversas informais devem ser levadas a sério, assim como o jogo da diplomacia, explicitamente trabalhado na Spencer House. Ao final do jantar, Al-Khalifa entregou a Bush um presente. O relógio, cravejado de diamantes e com valor estimado em US$ 50 mil, era uma homenagem pelos 80 anos que o ex-presidente americano completa no dia 12 de junho. “Mas também um agradecimento por ter expulsado Saddam Hussein do Kuwait na primeira Guerra do Golfo, preservando os poços de petróleo da região”, disse o sheik à DINHEIRO. O local para a expressão de gratidão não podia ter sido melhor escolhido. A Spencer House ficou marcada na biografia de Bush como um de seus grandes palcos. O local serviu de cenário para uma histórica reunião de cúpula do G7, o grupo das nações mais ricas do mundo, em julho de 1991. O convidado especial era Mikhail Gorbatchov, líder da União Soviética. Ali, os dois líderes das superpotências encerraram de vez a era da Guerra Fria. Em dezembro daquele ano, Gorbatchov seria deposto e a União Soviética, desmantelada. “É como uma volta no tempo”, suspirou Bush.
O CLUBE DO CHURCHILL
Na entrada voltada para as margens do rio Tâmisa, um comboio de Land Rovers movimenta a pacata viela. O séquito de seguranças desembarca primeiro. Em seguida, David Tang, Mário Bernardo Garnero, filho do anfitrião, e George Bush. Chegam de um seção de compras na Asprey’s, nova meca do consumo de luxo na cidade. A loja só seria inaugurada no dia seguinte, mas Tang conseguiu que o dono, Lawrence Stroll, a abrisse exclusivamente
para o grupo. A escolha era de Bush, a conta, um presente de Tang. O ex-presidente levou três echarpes, lembranças para a mulher Barbara, que ficou nos EUA. O almoço é em um dos salões do Savoy. Bush senta-se à cabeceira, ao lado de Winston Churchill. Ele mesmo, o mítico primeiro-ministro que comandou a reação inglesa na II Guerra Mundial. Um busto de Churchill fazendo o sinal da vitória indica que sua alma está ali. Antes de ascender ao poder, ele caminhava os 500 metros que separam o Parlamento britânico do Savoy e reunia-se com seus pares para discutir a situação internacional. Naquela sala revestida de madeira nobre, fundaram o The Other Club, cujo ritual de chá e política se repete até hoje.
Às quartas-feiras, no final da tarde, os últimos remanescentes do clube ainda se reúnem e mantêm mais essa tradição.