terça-feira, 17 de maio de 2011

TEMPLO É DINHEIRO

Reportagem mostra como as novas igrejas se transformaram em eficientes centros de arrecadação de fundos
Foto Rodrigo Félix Leal

“Crédito ou débito?” - Quem pergunta é o pastor da Igreja Internacional da Graça de Deus que recolhe o dízimo e outras doações munido da máquina para registrar operação com cartão de crédito. Pois, pois, as novas pentecostais aderiram rápido à nova tecnologia bancária para não perder uma oportunidade sequer de faturar.

Durante um mês a jornalista Sarah Corazza e o fotógrafo Rodrigo Félix Leal percorreram os templos das neopentecostais em Curitiba para testemunhar o fenômeno de religiosidade que arrasta milhões e transforma as novas igrejas em eficientes centros de arrecadação de fundos, o que ajuda a explicar a rapidez com que proliferam essas instituições e a indiscutível influência que exercem no novo tecido social. Observaram os cultos, entrevistaram pastores e fiéis, consultaram os mestres do assunto e produziram a reportagem que leva no título uma expressão que se tornou comum pelo uso e pela verdade que encerra.

AS NEOPENTECOSTAIS FAZEM SUCESSO DE PÚBLICO E BILHETERIA. Houve um tempo em que Curitiba era conhecida como a cidade que tinha uma farmácia em cada esquina. Isso na época em que o Fernando Pessoa Ferreira escreveu a crônica antológica “Curitiba, a fria, ou onde Jânio comia moscas”, pelos idos da década de 60 do século passado.

Hoje, além das farmácias, Curitiba tem muitos templos em cada esquina. É uma das cidades do Brasil em que as novas igrejas pentecostais mais prosperam. Olhe a sua volta e verá. Onde havia um cinema, agora há uma igreja. Onde havia um supermercado, há um templo. E para coroar essa investida sobre os grandes imóveis urbanos que perderam a utilidade original, a Igreja Universal do Reino de Deus comprou a antiga fábrica do Matte Leão para abrigar o seu rebanho que não para de crescer.

Logo se vê que as neopentecostais fazem sucesso não apenas de público, mas também de bilheteria. É incalculável o que arrecadam diariamente. O suficiente para abrir templos e também para financiar o proselitismo eletrônico que ocupa boa parte do horário televisivo e radiofônico. Isso custa dinheiro. Muito dinheiro. Tanto que a Universal do Reino de Deus, do
financista e bispo Edir Macedo, comprou a sua própria rede de televisão. A antiga Record, mais os restos da Manchete, agora são propriedade do Altíssimo e dedicam boa parte de seu tempo à pregação que oferece, em troca do dízimo e
de outras ofertas pecuniárias, a felicidade imediata na forma do milagre. E felicidade para os novos pentecostalistas significa, além de saúde, dinheiro em caixa. Para o doador, é claro, mas principalmente para a Igreja.

Assim caminha a humanidade. A grande transformação social das últimas décadas, que moveu grandes massas da população do campo para a periferia das cidades, criou o espaço perfeito para a instalação de novas crenças e novas igrejas que oferecem identidade, segurança e uma rede de iguais que comungam os mesmos valores e mesma fé, para gente que procura se encontrar no novo universo urbano e de relações competitivas e degradadas.

Mas essa é apenas uma parte da explicação para esse fenômeno que hoje mobiliza não apenas os fracos e oprimidos da periferia que ainda não conseguiram se integrar na vida urbana e moderna. É necessário perceber outro fenômeno mais amplo e que tem raízes idênticas.

Contrariando todas as previsões erguidas no século XIX, a velocidade e amplitude da produção e distribuição de riquezas, em vez de nos darem asas, proporcionaram o surgimento de sociedades de maioria absoluta de pedestres morais e intelectuais.

Entramos no século XXI angustiados pelo destino sem grandeza que é a marca de nosso tempo. Nem por isso conseguimos escapar facilmente da servidão ideológica que a sociedade industrial nos impôs. Sucumbimos às evidências e às tentações do progresso material e nos recusamos a questionar o empobrecimento da vida intelectual que patina no lamaçal da bricolagem pós-moderna que inclui a religiosidade mais chã.

Ninguém, em sã consciência, põe em dúvida as vantagens que as descobertas científicas nos proporcionam. A medicina avançou em algumas áreas e com ela a expectativa de vida praticamente dobrou. Agora o homem vive mais e dispõe de mais tempo para o ócio criativo, mas prefere gastá-lo no consumo conspícuo da cultura de baixa densidade.

As comunicações tornaram-se virtualmente instantâneas e compulsórias, além de universais, o que ampliou o mercado de ilusões e expectativas. O mundo contemporâneo, com sua classe média emergente, tornou-se ávido pelo besteirol produzido incessantemente pelos meios de comunicação. Besteirol que constitui 99% da programação da mídia de massa e do acervo da internet, fontes mais consultadas para esclarecer dúvidas da manada.

Há um terreno em que as virtudes da moderna tecnologia mostraram-se pouco eficazes e até contraproducentes. É o da criação intelectual, que perdeu em quantidade e até em qualidade. Atrofiou-se.

Ora, pois, a demanda cresceu, a produção encolheu, a solução do século foi mediocrizar para atender as expectativas da maioria. Basta ver as nossas universidades. De centros de produção do saber passaram a produtoras em massa de técnicos de baixa extração.

O que a massa exige não é a grandeza, o gênio criador ou até a incômoda dimensão heróica de outras épocas. E isso carrega hoje ricos, pobres e remediados homogeneizados culturalmente pela mediocridade. Nesse chão, as pentecostais de baixa densidade avançam com extrema facilidade.
Avião do bispo Rodrigues

UM NEGÓCIO MUITO RENTÁVEL. Vamos separar o joio do trigo. Nem todas as igrejas pentecostais ou neopentecostais são apenas balcões de negócios. E nem todas as seitas e correntes do tipo são protestantes. Há réplicas antigas e modernas dentro do catolicismo, que continua a ser majoritária. Ao menos nominalmente, como sabemos.

As antigas igrejas evangélicas e pentecostais passaram a conviver com os novos empreendimentos religiosos que se instalam com a proteção da legislação e os benefícios fiscais que os eximem do pagamento de impostos e da declaração
legal do quanto arrecadam e aplicam. Num país em que a carga tributária beira os 38% sobre os comuns dos mortais, a isenção tributária é um regalo divino que ajuda a explicar o sucesso financeiro das novas seitas.

Para abrir uma Igreja são necessários apenas R$ 418,42 em taxas e emolumentos e cinco dias úteis. Simples. Não existem requisitos teológicos ou doutrinários para criar um culto religioso. Tampouco se exige número mínimo de fiéis. Com o registro da Igreja pode-se abrir uma conta bancária e realizar aplicações financeiras isentas de Imposto de Renda e Imposto de Operações Financeiras.

Esses não são os únicos benefícios fiscais da empreitada. Nos termos do artigo 150 da Constituição, templos de qualquer
culto são imunes a todos os impostos que incidam sobre o patrimônio, a renda ou os serviços relacionados com suas finalidades essenciais, as quais são definidas pelos próprios criadores. Ou seja, todos os bens colocados em nome da Igreja estão livres de IPVA, IPTU, ISS, ITR e vários outros impostos.

Há também vantagens extratributárias. Os templos são livres para se organizarem como bem entenderem, o que inclui escolher seus sacerdotes. Uma vez ungidos, eles adquirem privilégios como a isenção do serviço militar obrigatório e direito a prisão especial.

Sem controles, beneficiadas pelo princípio constitucional da liberdade de crença e de religião, as novas igrejas quando dirigidas por condutores sem escrúpulos podem se transformar em fachadas para um longo rol de crimes e contravenções. Um delegado da Polícia Federal, experimentado e que estuda esse fenômeno há anos, acredita que alguns templos podem servir de lavanderias de dinheiro e esconder redes criminosas. Mas essa é uma investigação policial
que ainda está a caminho. Em sigilo absoluto, porque esse tipo de iniciativa sempre esbarra na forte reação de todas as igrejas em nome de seus direitos constitucionais.

O certo é que as novas igrejas dão rendimentos vultosos que se tornam explícitos quando se materializam em grandes obras ou transferidos para sustentar a vida nababesca de bispos e pastores. Em tudo há um traço de desfaçatez que
insulta a inteligência ao mesmo tempo em que entusiasma milhares de contribuintes.

Um dos exemplos mais gritantes é a do bispo Edir Macedo e a campanha da Igreja Universal do Reino de Deus de coleta de doações para a construção da milionária réplica do Templo de Salomão, do tamanho de um estádio de futebol
e custo em torno de R$ 200 milhões.

Em seu proselitismo arrecadador, Macedo começa ressaltando que o projeto do templo foi “desenhado por Deus”. Segue com um discurso muito usado por ele: “Se você for tocado pelo Espírito Santo a colaborar, então, por favor, use a seguinte conta bancária para fazer sua doação em nome da Igreja Universal do Reino de Deus e entregue o recibo de depósito numa IURD.” Termina citando a Bíblia, “Deus suprirá as necessidades de cada um dos doadores.” Filipenses 4.19. E repete os números das contas bancárias para os depósitos nos bancos do Brasil e Bradesco.

Sucesso absoluto que provoca inveja e dissensões dentro da hierarquia das igrejas, provocando o surgimento de novas, que se multiplicam com a velocidade da cretinice. Um exemplo clássico é o do cunhado de Edir Macedo, o pastor R. R. Soares, que decidiu criar a sua própria Igreja e hoje é o recordista mundial de permanência na telinha. São mais de 16 horas em diversas redes, com horários comprados a preço de bezerro de ouro.

Para que se tenha uma pálida ideia da prosperidade alcançada pela dissidência da Universal, o pastor R. R. Soares, que é fundador da Igreja Internacional da Graça de Deus e apresenta o programa “Show da Fé”, comprou por US$ 5 milhões (cerca de R$ 8,6 milhões) um avião turboélice King Air 350 com banheiro a bordo e capacidade para oito passageiros. A aeronave abençoada permite ao pastor percorrer o país e fazer shows e apresentações que lhe proporcionam uma arrecadação extra que não é de somenos.

Além de apresentar o “Show da Fé” na Band — que também é exibido pela CNT e pela RIT (Rede Internacional de televisão), o pastor, uma espécie de Silvio Santos evangélico, mantém horários alugados nas madrugadas e fins de tarde
na emissora Rede TV.

Histórias de sucesso financeiro, maiores ou menores que os de Edir Macedo e R. R. Soares, há incontáveis em todo o país. E na esteira desse crescimento uma legião de fanáticos e outra de arrependidos que entregaram o que tinham e
não receberam em troca o que esperavam. Vivem o inferno da desolação e de um sentimento envergonhado de que se deixaram enganar explorados pela cupidez.

A NOVA SEITA DOS ARREPENDIDOS. “Se arrependimento matasse”, confessa o ex-deputado estadual Waldemar Alves Faria Jr. (PL-SP), “eu estaria morto e enterrado há muito tempo.” O desabafo do ex-parlamentar — que foi eleito com o apoio da Igreja Universal do Reino de Deus — deve-se ao fato de ter doado diretamente ao fundador da igreja, bispo Edir Macedo, entre 1997 e 1998, cerca de US$ 3,2 milhões.

O arrependimento se transformou numa Ação de Revogação de Doação por Ingratidão, acolhida pelo juiz Wanderlei Sebastião Fernandes, titular da 39ª Vara Cível de São Paulo, que determinou a imediata citação de Macedo. Faria Jr. disse que, na condição de ex-obreiro e crédulo seguidor dos ensinamentos evangélicos difundidos pela Igreja Universal, ficou totalmente submetido aos interesses pessoais e empresariais de Macedo: “Os US$ 3,2 milhões foram transferidos diretamente a Edir Macedo e não à Igreja Universal, como deveria ser feito. O bispo havia me pedido dinheiro como empréstimo pessoal, que acabou se transformando em “doação” a ele, Macedo, diante do seu irresistível apelo e da promessa de que todas as portas da igreja e da Rede Record me seriam abertas”, desabafa Faria Jr. “Eu destinava
mensalmente dízimos milionários à igreja, chegando inclusive a doar um automóvel BMW 540I, que passou a ser usado por um dos bispos que atuam no Rio de Janeiro.”

Ao se ver totalmente descapitalizado, já que sua empresa, que tinha 400 empregados, hoje só conta com quatro, o ex-deputado tentou de todas as formas contato com o bispo Macedo, que se recusava a recebê-lo. Faria Jr. diz ainda que o fundador da Universal, em diversos eventos religiosos, fez referências a ele, acusando-o de “não estar mais na fé e haver se transformado num perdido, que, por ter pecado tanto, tudo havia perdido”. Nos autos da ação há acusações também contra a Record: “A emissora teria emitido um grande número de duplicatas falsas, entre 1997 e 1999, apoderando-se de mais de R$ 15 milhões de recursos da empresa de telemarketing pertencente a mim e a meu irmão.”

Faria Jr. adiantou que vai procurar o Ministério Público Federal para denunciar Macedo e a Rede Record, que fraudaram segundo afirma, a determinação que proibia a realização de sorteios lotéricos pela televisão, no sistema conhecido como disque 0900. Prestando serviços para a Record, segundo o próprio Faria Jr., sua empresa faturou R$ 125 milhões entre
fevereiro de 1997 e julho de 1998. Nem o bispo Macedo nem a direção da Rede Record quiseram se manifestar sobre as acusações feitas pelo ex-deputado.

Outra história emblemática é a de um empresário paranaense do oeste que entregou sua poupança para a Igreja. De católico fervoroso passou a membro fanático da Igreja Universal do Reino de Deus.

Tudo começou quando a igreja comprou o cinema da cidade para construir seu templo. Toda a população via com curiosidade e desconfiança a nova igreja que se instalava. Assim que o templo iniciou suas atividades, o programa de rádio do bispo Edir Macedo se popularizou.

O empresário, assim como milhares de outros fiéis, começou a ouvir o bispo todas as noites, antes de dormir. Sua curiosidade foi aguçando, afinal muitas graças e milagres eram propagados por Macedo. Interessado em conhecer mais
a igreja, o empresário decidiu ir até o templo e ver como tudo realmente funcionava.

Assim que entrou, começou a observar tudo. Estranhou a piscina infantil instalada em frente ao palco. Neste momento, o pastor responsável por arrebanhar as ovelhas no município, chegou simpático, conversou e convidou o empresário
a participar do culto que começaria em seguida. Ele saiu encantado com a articulação e a oratória do pastor.

No dia seguinte voltou e foi apresentado à família do pastor. A esposa acompanhava o celebrante nos cultos e ajudava nos serviços do templo, o que passou ainda mais credibilidade ao empresário. Em pouco tempo, o empresário passava ao menos uma hora do seu dia na igreja e as outras tentando converter a família e os amigos. Foi assim até que a família descobriu o rombo na conta bancária que essas idas diárias estavam causando.

Em pouco menos de dois anos foram mais de R$ 100 mil. Entre a aquisição de um terreno no céu no valor de R$ 7 mil, doação de geladeira e de um terreno na terra, além de depósitos em dinheiro, os números no patrimônio e na conta bancária foram reduzidos gradativamente. Mas não foi isso que fez com que o empresário largasse a igreja. O que intrigou
o fiel foi a mudança repentina de pastores. Após a saída do primeiro pastor que conheceu, os outros permaneciam menos de dois meses na cidade e já não apresentavam a família. Foi neste momento que ele começou a questionar a credibilidade da igreja e deixou de frequentar a Catedral da Fé.
Liquidação de milagres

TEORIA DA PROSPERIDADE. Das igrejas procuradas, o padre Reginaldo Manzotti foi o único que se dispôs a conversar e permitiu que a celebração fosse fotografada. Disse que não concorda com a “teoria da prosperidade”, amplamente divulgada pelas outras igrejas. Contou que não cobra cachê pelos seus shows e nem permite que os organizadores cobrem bilheteria. “O que permitimos é apenas a doação de alimentos não perecíveis. Entendo que o show é um primeiro
passo para que as pessoas voltem à Igreja e não acho certo que alguém deixe de participar por não ter R$ 3,00 para o ingresso. Sei que muitas vezes ela vai sem dinheiro nem para comprar um cachorro-quente e mesmo assim, passa o
dia esperando a celebração”, conta Manzotti.

O padre explica ainda que o dinheiro da venda dos seus Cds é todo revertido para a sociedade Evangelizar é Preciso, que mantém no centro da capital paranaense, junto a Igreja do Guadalupe. Esse recurso é utilizado na produção dos programas de rádio e TV que são distribuídos gratuitamente pelo Brasil. “Todas as nossas aquisições, equipamentos para a transmissão dos programas estão registradas em cartório em nome da arquidiocese. Nada está no meu nome. Eu sobrevivo com o salário que a Igreja me paga, assim como paga para todos os padres. Tudo isso ficará para os próximos sacerdotes que darão continuidade ao trabalho que iniciei”, explica Manzotti.

A CAMPO. Para verificar como funcionava cada culto e como as pessoas conseguiam as doações virtuosas, resolvemos percorrer anonimamente as principais igrejas neopentecostais de Curitiba. Iniciamos a peregrinação por uma missa do padre Reginaldo Manzotti, na Igreja do Guadalupe.

Na última quarta-feira de março, dia 30, ao meio-dia, cheguei com centenas de fiéis para acompanhar a missa. A igreja estava lotada. Pessoas de diferentes idades, de jovens a idosos. Quando o padre entrou, a música animada começou a tocar. Talvez o que mais diferencie das celebrações católicas tradicionais. A maioria acompanhava os passos e demonstrava adoração ao rito. No meio da celebração, os coroinhas se posicionam em locais estratégicos com as sacolas para receber as doações. Antes disso, no momento do sermão, Manzotti já havia falado da importância de se doar o dízimo, os 10% de tudo o que se recebe para a igreja, como manda a bíblia. Esta outra doação, menor e simbólica, que acontece no momento da comunhão e que semanalmente recebe uma contribuição, por menor que seja, da maioria dos fiéis, ajuda a manter as necessidades básicas da igreja. Olhando ao meu redor, percebo que a maioria dos fiéis deposita valores baixos, moedas ou notas pequenas de R$ 2,00 e R$ 5,00.

A missa durou exatamente uma hora. Quando termina as pessoas se apressam para sair da igreja. A maioria nem olha para o pedinte sentado junto ao portão. Uma senhora, que saía próximo de onde eu estava, comenta com a amiga: “Quer dinheiro para comprar pinga. Eu é que não vou ajudar. Por que não vai trabalhar?”. A amiga apenas ri. Nesta hora entendo quando o padre ressalta que busca a qualidade dos cristãos e não somente a quantidade.

Da Igreja do Guadalupe sigo a minha peregrinação para a Igreja Internacional da Graça de Deus. Lá o culto começa às 14 horas. Como fica a menos de quatro quadras da católica, sigo direto. Chego com meia hora de antecedência. Na entrada, uma espécie de antessala, sou recebida pelo pastor. Simpático, pergunta se preciso de ajuda. Sem jeito digo que quero assistir ao culto. Ele me entrega uma rosa branca, brinca que não preciso pagar nada por ela e posso entrar e esperar. Assim faço. Quando chego somente uns três fiéis já estão no templo. Todos sentados distantes uns dos outros.

Conforme os minutos vão passando, mais fiéis chegam. A maioria são mulheres e com mais de 50 anos. Uma senhora japonesa, sentada três fileiras a minha frente, entra sem a rosa. Acho estranho, mas como não sei qual o significado da flor só observo.

Pouco antes do culto começar, o pastor que me recebeu na porta, passa entre as cadeiras entregando as rosas para quem não pegou na entrada. Ele é simpático com todos. Quando chega na senhora sentada a minha frente pergunta porque ela não pegou a rosa. Ela responde que não trouxe o dinheiro. Meus sentidos ficam aguçados. Ele sorri e brinca que ela pode trazer o dinheiro no dia seguinte, ou ele passa o número da conta para ela. Com certeza se soubesse que sou jornalista e estava ali para escrever esta matéria não brincaria com isso. Se é que era brincadeira.

O culto começa com um menino engravatado no teclado e uma mulher que canta. Conforme ela aumenta o volume da voz e clama pelas graças de Deus, o som do teclado fica mais grave. Estranho porque eles utilizam muito a palavra de Satanás e Diabo. Logo percebo pelas falas e preces que a Igreja parte do princípio de que todos estão cheios e desanimados com tantos problemas. A mulher canta e ora por meia hora. Neste momento estava desconfiada que ela iria realizar toda a celebração. Mas eis que surge outro pastor.

Ele inicia sua celebração com um tom de voz alto, o menino do teclado termina a música e sai do palco. Ele fala muito. Coisas comuns a outras igrejas como que devemos fazer o bem e não podemos julgar os outros. A única pessoa apta para isso, segundo ele, é o Senhor. Aliás, a palavra “Senhor” é usada quase como um vício de linguagem. Assim como as palavras “Diabo” e “Satanás”. Presto atenção ao discurso e vejo que em vários momentos o pastor se contradiz. Diferente do início, agora além “do Senhor” os pastores também estão aptos a julgarem as pessoas. Afinal, são os escolhidos.

Ele lê alguns trechos do Novo Testamento e em seguida utiliza alguns exemplos pessoais, para aproximar mais a palavra dos fiéis. Conta quando ele chegou para cuidar da igreja em Paranavaí e só encontrou pessoas trajadas de maneira simples, a maioria de bermuda e chinelos. Na hora disse que pensou “Senhor, dê prosperidade para essa população senão não poderão ajudar a igreja”. Mais tarde, andando pela cidade, descobriu que aqueles homens de chinelos eram fazendeiros, e, portanto, poderiam contribuir — e muito — com a igreja.

Olho no relógio e vejo que já passou 1h15 de culto, e apesar do pastor falar muito em dinheiro, ainda não pediu a doação. Mas não demorou a vir. Menos de 15 minutos depois, pede aos seus ‘obreiros’ para pegar a contribuição de todos. Duas senhoras surgem com dois tipos de envelopes nas mãos. Ambos com espaço destinado para o nome e o telefone do fiel. Noto que a senhora que no início da celebração não pegou a flor porque disse que não tinha dinheiro, colocou uma nota de R$ 20,00 em um dos envelopes. Em seguida surge outro pastor com uma sacolinha. Nela os fiéis, ao menos os que consigo observar, depositam moedas. Me espanto quando vejo ao longe o pastor que me recebeu na entrada com uma máquina de cartão de crédito. Ele passa em todas as fileiras e para os fiéis que preferem utilizar o cartão para dar sua contribuição pergunta se preferem no débito ou crédito. A senhora atrás de mim doa R$ 513,00. Durante a peregrinação dos obreiros pelas oferendas, o pastor ressalta do palco a importância de se doar. Esta também não permite que se tirem fotos das celebrações ou que os pastores deem entrevista para a imprensa.

Já na semana seguinte (7 de abril, quinta- -feira), inicio a minha peregrinação pela Igreja Universal do Reino de Deus. Chego para o culto do meio-dia. Imaginei que o templo estaria lotado, mas, para minha surpresa, somente umas 20 pessoas participam da celebração. Maioria mulheres e de idade variada. O pastor tem no máximo 25 anos, sotaque carioca e uma oratória irrepreensível. Para meu espanto ele já começa o culto falando do dízimo. A importância em se doar 10% de tudo o que “passar pela nossa mão”, como faz questão de frisar. E ressalta ainda a importância de ser fiel a este
pagamento e a igreja, caso contrário, tudo o que se conquistar será perdido.

O REINO DO CÉU. Na realidade, pelo discurso do pastor dá para perceber claramente que a ‘felicidade’ e o ‘reino do céu’ para eles está ligado ao dinheiro, às conquistas financeiras. O exemplo que ele utiliza, de um mendigo que chegou na
igreja sem nada e que depois conquistou casa, carro, emprego e quando parou de pagar a igreja perdeu tudo, reforça a minha impressão.

Como em todas as outras igrejas que frequentei, o pastor tem a ajuda de uma outra pessoa para recolher as doações. No caso da Universal é um outro pastor. Ele distribui uma sacolinha para as pessoas interessadas em pagar o dízimo. O celebrante reforça a importância de entregar o dinheiro à igreja no dia em que recebe, “para não ser tentado pelo diabo a gastar com outra coisa”. Muitas pegam o envelope. Diferente da Igreja da Graça de Deus, nesta não tem local para colocar os dados pessoais do doador, mas os envelopes entregues são colocados sobre a Bíblia, uma forma de já abençoar.

JEJUM DE INFORMAÇÃO. Outra coisa que chama atenção é o jejum praticado pela igreja. Os fiéis são convidados a ficar 21 dias sem consumir nenhuma espécie de notícia. É o “jejum da informação”. Não assistem a jornais, escutam rádio ou leem revistas. Só podem sair do jejum para escutarem a palavra do bispo Edir Macedo, diariamente às 6, 12 e 23 horas.

Depois ele chama todos os fiéis a pegar o óleo consagrado. Todos fazem uma fila e ele passa o óleo nas mãos de todos, diz que é bom para atrair prosperidade, o que para eles é igual a dinheiro. Na saída, mais um convite para contribuir com a igreja, desta vez com o dinheiro que se tem na carteira, sem ser necessariamente o dízimo. Saio impressionada com a oratória do pastor e com a maneira como aquelas pessoas se deixam ludibriar.

Quando o fotógrafo Rodrigo Felix Leal vai à Universal tirar fotos da igreja é coagido pelos seguranças. Félix pergunta ao pastor se pode fotografar o culto, e é imediatamente proibido. Então atravessa a Avenida 7 de setembro para tirar fotos da fachada e um dos seguranças se aproxima dele e manda que vá embora. Ao responder prontamente que está na rua e que a rua é pública escuta do segurança: “Estou conversando com você na boa, não queira que os outros engrossem”. Coagido, o fotógrafo deixa o local.

O TEMPLO DE EDIR MACEDO

A réplica do templo de Salomão que o Bispo Edir Macedo pretende construir para justificar uma campanha de arrecadação e dar magnitude à sua igreja terá mais de 70 mil metros quadrados de área construída e ocupará um quarteirão na zona
leste de São Paulo.

Haverá lugar para que 10 mil fiéis assistam sentados aos cultos. O estacionamento abrigará 10 mil veículos.

O bispo, mestre desse tipo de pregação, cita três características para a construção:
1. Projeto desenhado por Deus;
2. Construção executada pelos Seus servos e
3. Única em todo o mundo.

Ele recorre à Bíblia para justificar seu pedido de dinheiro. Cita I Crônicas 29.5: “Quem, pois, está disposto, hoje, a trazer ofertas liberalmente ao Senhor?”

Edir informou que aplicará cerca de R$ 70 milhões só na terraplenagem do terreno e que as pedras serão importadas de Israel. O custo total da obra está estimado em R$ 200 milhões.

CURITIBA TEM A MAIOR IGREJA UNIVERSAL DO BRASIL

No início deste mês a Igreja Universal do Reino de Deus começou a demolição da sede histórica da Matte Leão S.A. O terreno de 16,3 mil metros quadrados no bairro Rebouças, dará lugar a uma nova Catedral da Fé – a maior do país.

A igreja do bispo Edir Macedo comprou a indústria por cerca de R$ 32 milhões, R$ 7 milhões a mais do o valor avaliado e com isso adquiriu o terreno e o direito de demolir o prédio histórico de 1901.

Mas algumas questões referentes ao novo templo ainda são confusas. A Igreja não comenta o assunto, nem este e nenhum outro, já que todos estão orientados a não dar nenhum tipo de declaração para a imprensa. A prefeitura de Curitiba
diz que desconhece a construção de uma igreja no local, já que a Secretaria Municipal de Urbanismo expediu até o momento apenas o alvará de demolição. Já os banners mostram a imagem de um templo da Universal. Apesar do projeto final ser uma incógnita, a parte que os técnicos do Ippuc e da Fundação Cultural tiveram acesso, mostram que está previsto a construção de um subsolo gigantesco, heliponto, torres de diferentes alturas, anfiteatro e uma cobertura para as autoridades eclesiásticas. (Revista Idéias)

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