sexta-feira, 11 de março de 2011

O terremoto no Japão, o Kasato Maru e nós brasileiros


Logo que acordei, como de costume, liguei a TV para ver as últimas notícias e me apavorei com o que vi. A notícia central era o terremoto precedido de um enorme tsunami a flagelar o povo japonês, com o qual tenho fortes ligações, já que nasci em Tupã, interior de São Paulo e cidade vizinha de Bastos, que foi uma dos principais regiões do Brasil colonizadas pelos imigrantes oriundos do Japão.

Desde pequeno fui criado convivendo com os descendentes da colônia japonesa, com os quais sempre tive fortes laços fraternos de amizade. As famílias Kawakami, Maeda, Otsubo, Kawazaki, Takarara, Kondo, Hamada, Sato, etc. sempre conviveram com os Molina, e em relação a estas sempre tivemos e temos o mais profundo respeito, por serem bons amigos e acima de tudo por serem pessoas extremamente dignas e honradas.

Com o decorrer do tempo aos poucos com as feridas ocorridas pós última guerra sendo cicatrizadas, pois na guerra mundial, aqui até campos de concentração existiram para aprisionar membros desta colônia, a interação da colônia japonesa com os demais, descendentes de europeus ou brasileiros de origem, foi crescendo e com o aumento do respeito a multiculturalidade isto se expressou na união de famílias pelo casamento, o que geneticamente deu bons resultados, pois a mestiçagem, que é uma coisa muito boa, produz belos brasileiros.

Tenho primos casados com nisseis, sanseis e yonseis, sendo que o meu primo Paulinho e a sua esposa se tornaram dekasseguis, imigraram para o Japão, o que junto com o fato dos amigos e filhos de amigos de origem nipônica que tomaram o mesmo caminho hoje com a tragédia ocorrida com o terremoto a situação em que lá vivem nos trás profundas aflições, pois estão fazendo parte das consequências desta catástrofe.

Uma grande parte dos meus amigos de infância hoje vivem no Japão e para lá foram em busca das suas raízes e de uma vida melhor, o que nem sempre obtiveram, pois lá confundidos com os descendentes dos japoneses que de lá emigraram no pós guerra não são bem vistos, pois estes são tidos como os que fugiram da luta, do esforço, para recuperar o Japão. E sua maioria os brasileiros nisseis, sansei e yonseis que se tornaram dekasseguis são os que descendem dos que aqui aportaram em 1908 vindos a bordo do Kasato Maru. os seus antepassados vieram para o Brasil em um período em que o Japão passava por uma profunda crise econômica e o Brasil com a economia cafeeira em expansão necessitava de mão de obra para os trabalhos no campo, sendo este na época um trabalho semi-escravo.

Aqui, enganados, aportaram, pois lá lhes haviam prometido o acesso fácil a terra, casas, escolas bilingues, hospitais, etc., mas o que aqui encontraram foi o sistema do "barracão". Neste sistema semi-feudal de produção eles, como os outros imigrantes de outras origens, eram obrigados a consumir os produtos vendidos nos armazéns de propriedade do próprio patrão, o que no final do mês ao se fazer as contas só lhes restavam dívidas a pagar e o sonho de uma vida digna que se esvaia a cada dia. Em vez de casas o que a vida lhes deu foi casebres de pau a pique, a alimentação diferente os matavam de diarréia, as escolas para aprenderem a nova língua não existiam, os hospitais mais um engôdo e sem eles sucumbiram as epidemias de malária. Por causa desta dura realidade muitos fugiram destas fazendas localizadas na zona velha da cafeicultura e com os poucos recursos que tinham foram colonizar as frentes pioneiras no Oeste e Centro Oeste Paulista, como também no norte novo aqui no Paraná.

Nas frentes pioneiras foram trabalhar na derrubada da mata e com o dinheiro obtido compraram pequenos pedaços de terra, continuando como agricultores, outros imigrantes japoneses tinham estudo e muitos no Japão já haviam morado em cidades e trabalhado como comerciantes, carpinteiros e ferreiros, e ao fugir das fazendas voltaram a exercer a profissão que anteriormente tinham como trabalhadores independentes. Eles montaram pequenos comércios ou micro-indústrias (quitandas, lavanderias, alfaiatarias, salões fotos, bares, ferrarias, carpintarias, etc.).

http://www.imigracaojaponesa.com.br/histo%20imigra%20banana.jpgEm suas origens acostumados a produzirem muito em pequenos pedaços de terra através da integração e diversificação de culturas vegetais (hortas, fruticultura, pequenas lavouras, etc., complementados com a criação de pequenos mamíferos, aves e peixes acabaram por ajudar em muito a construção de uma nova visão de como desenvolver racionalmente as atividades produtivas no campo. Grand parte dos legumes, verduras, frutas, etc., que hoje fazem parte importante na nossa alimentação, foram aqui introduzidos pela colônia japonesa.

Só em 1928 a organização japonesa com o nome de Federação das Cooperativas Imigratórias ao Exterior, o que era já para ter acontecido em 1908, quando atracou o Kassato Maru, se instalou legalmente no Brasil a Burajiru Takushoku Kumiai, com o nome no Brasil de Sociedade Colonizadora do Brasil Ltda a Bratac e Bastos surge neste contexto.

Anteriormente em 1912, em Registro, havia se instalado aqui no Brasil a Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha. Ela era uma empresa de desenvolvimento industrial e rural de apoio aos imigrantes japoneses foi implantada em Registro, na época um distrito rural pertencente ao município de Iguape. A KKKK, como ficou conhecida, funcionava como beneficiadora de arroz e como entreposto cooperativo, mas o projeto só foi desenvolvido lá. Os japoneses que para São Paulo imigraram como mão de obra barata para a frente cafeeira ficaram abandonados a própria sorte até 1928.

Em 1935 o Barão Hisaya Iwasaki, presidente do grupo empresarial Mitsubishi, Mandou ao Brasil um representante incumbido da instalação de uma fábrica de Saque, a bebida mais tradicional do Japão como aqui da colônia: a Indústria Agrícola Tozan Ltda.. Com este projeto vingando o grupo Tozan, funcionando como cooperativa, expandiu as suas atividades para outros segmentos agroindustriais, principalmente na área cafeeira, tendo como um dos seus centros de atividade o interior de S. Paulo e o norte do Paraná.

Outra importante Cooperativa foi a Cotia, que nasceu na cidade de mesmo nome em 1926, mas depois acabou pela força produtiva da colônia, mas sendo aberta a todos os agricultores, tendo na cadeia agro-produtiva um importante alcance nacional.

Com a profunda crise econômica surgindo no estertor da ditadura militar somada a grande crise na cafeicultura e em outras atividades agrícolas, ocorridas após a grande geada de 75, sendo que na mesma época o Japão estava em um forte período de expansão econômica e portanto necessitando de mão de obra começou a imigração ao inverso, a volta da colônia ao Japão.

Aqui muitos dos descendentes de japoneses se sentiam ainda enquanto tais, sendo emocionalmente a cidadania brasileira a segunda e não a primeira. O retorno ao que consideravam a pátria mãe foi difícil, pois lá foram pessimamente tratados como brasileiros. os seus empregos eram aqueles que os nacionais do Japão rejeitavam nem ao menos o idioma japonês que aprenderam em casa era o mesmo praticado atualmente no Japão, pois o falado pelos nipo-brasileiros em muitos casos não passavam de antigos dialetos arcaicos microregionais. Lá muito destes finalmente conquistaram a identidade brasileira por se sentirem enquanto tal.

A vida que estes imigrantes nipo-brasileiros levam no Japão é muito dura, pois as jornada de trabalho chegam a atingir doze horas diárias e para economizarem e mandarem o dinheiro para as suas famílias no Brasil são obrigados a passarem privações. Todo ano os perto de 250.000 dekasseguis remetem para o Brasil US$ 2,5 2,5 bilhões, o que equivale no câmbio de hoje a aproximadamente 3,8 bilhões de reais.

As famílias destes brasileiros, que tanto contribuíram e contribuem para o desenvolvimento nacional, estão aflitas e nós com elas.

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