domingo, 21 de agosto de 2011
Gilson Carvalho: 'Tem gente querendo acabar com o SUS'
Gilberto Carvalho, o grilo falante, é sério candidato a ser a voz do além
Rebeldes líbios chegam ao centro da capital
Kadafi diz que ficará em Trípoli "até o final"
O líder líbio, Muammar Gaddafi, disse neste domingo que ficará em Trípoli "até o final" e pediu a seus simpatizantes pelo país que ajudem a liberar a capital de uma ofensiva rebelde.
Ele acrescentou em uma mensagem de áudio divulgada pela televisão estatal que estava "com medo que Trípoli irá queimar" e disse que disponibilizará armas a seus apoiadores para que enfrentem os rebeldes.
Kadafi disse " Não existe lugar para os agentes do colonialismo nem em Tripoli e nem na Líbia. Estou ordenando que abram os depósitos de armas. Conclamo a todos os líbios a aderirem a essa luta. Aqueles que tiverem medo podem dar suas armas às suas mães ou irmãs."
Filho de Kadafi foi capturado, dizem rebeldes líbios
Além de Saif, informou a Al-Jazeera citada pela rede NBC, outros dois filhos de Kadafi também estariam sob custódia da oposição. Saadi teria sido capturado, enquanto Mohammed teria se rendido. De acordo com a Associated Press, um rebelde líbio afirmou que a unidade militar encarregada de proteger Kadafi também se rendeu.
O anúncio das prisões e rendições foi feito em meio ao avanço rebelde na capital, Trípoli, depois de seis meses de guerra civil e no último passo para pôr fim ao regime de 41 anos de Kadafi. De acordo com o Ministro da Informação líbio, Moussa Ibrahim, os confrontos em Trípoli deixaram 1,3 mil mortos e 5 mil feridos. A informação não pôde ser confirmada por fontes independentes.
Além de confirmar a prisão de Saif à Al-Jazeera, Waheed Burshan, um porta-voz do CNT disse que os rebeldes agora "controlam a maior parte da capital". O embaixador da Líbia na ONU, que desertou do regime, disse à BBC que os rebeldes teriam o controle de 90% da capital. De acordo com a Al-Jazeera, residentes de uma área de Trípoli sob controle rebelde saíram às ruas para comemorar os acontecimentos.
Além das imagens de celebração, a rede de TV também transmitiu o que parece ser o terceiro áudio de Kadafi desde sábado, em que voltou a conclamar seus partidários, particularmente os líderes religiosos, a defender Trípoli dos rebeldes e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) em nome do islã.
Avanço rebelde
Vindos do mar a partir de Misrata, a 200 km a leste de Trípoli, e por terra a partir das cidades conquistadas no oeste do país, centenas de rebeldes líbios entraram na capital desde sábado. Confrontos intensos ocorreram em diversos pontos da cidade neste domingo, de acordo com jornalistas que viajam com os rebeldes. Segundo a Associated Press, os rebeldes estão a apenas três quilômetros do centro da cidade. Já de acordo com Zeina Khodr, correspondente da Al-Jazeera que chegou à capital com os rebeldes vindos de Zawiya, os militantes da oposição agora batalham contra as forças do governo na Praça Verde, perto do centro da cidade.
Em meio aos acontecimentos, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) afirmou neste domingo que o regime de Kadafi "desmorona". "O que estamos prestes a ver nesta noite é o desmoronamento do regime", disse à AFP a porta-voz da Otan, Oana Lungescu.
"Quanto mais cedo antes Kadafi se der conta de que não tem possibilidade alguma de vencer, melhor para todos. O regime está claramente em seu último estágio", disse. "Vemos pessoas fazendo suas bagagens, três pessoas de alto escalão desertaram nos últimos dias, e o território controlado por Kadafi encolhe diante de nossos olhos", afirmou Oana. Mais de 4 mil alvos militares foram danificados ou destruídos nos quatro últimos meses pela Aliança Ocidental, informou sem fornecer mais detalhes.
À medida que os rebeldes chegaram a Trípoli, eles foram saudados por uma multidão de civis nas ruas, que gritavam frases contra o regime de Kadafi e agitavam a bandeira dos rebeldes. Horas antes, as forças antigoverno haviam tomado o controle de postos militares nas vias de acesso a oeste de Trípoli, onde pegaram armas e munições. Outro grupo de rebeldes levantou bases de controle nos subúrbios a leste da capital, intensificando o cerco às forças de Kadafi em Trípoli.
Apesar do avanço rebelde em direção ao complexo de Bab al-Aziziya, de Kadafi, o líder líbio disse previamente que ficará em Trípoli "até o fim" e conclamou seus partidários, em um áudio transmitido na televisão estatal líbia, a lutar contra os infieis e "libertar" a terra. Em sua segunda alocução em menos de 24 horas, Kadafi ordenou que fossem disponibilizados os depósitos de armas e arsenais de Trípoli para os cidadãos para que estes "defendam a capital".
"Lutaremos até liberarmos cada centímetro de terra e evitar que ela seja ocupada. Estou com vocês nessa batalha. Não entregaremos Trípoli para os colonialistas e traidores", disse Kadafi. "Saiam às ruas aos milhares. Os que não tiverem armas devem nos procurar para receber uma. As massas devem se armar."
Também em tom de desafio, Ibrahim afirmou que milhares de mercenários e voluntários estão dispostos a defender a capital. "As pessoas não são somente patriotas, mas também têm famílias e casas que devem proteger e compreendem que, se os rebeldes entrarem, haverá derramamento de sangue", disse.
Ibrahim acusou os rebeldes de massacrar a população de cidades e vilarejos nos últimos dias. Ao mesmo tempo, ele fez um apelo para que os rebeldes aceitem negociar. "Se vocês querem paz, estamos prontos", disse. Ibrahim também acusou a Otan de "abrir estradas para os rebeldes, que são fracos demais para fazer qualquer coisa sozinhos".
O cerco dos rebeles à Trípoli se intensificou desde sexta-feira, quando conquistaram importantes cidades perto da capital que até então estavam sob domínio do governo. Entre elas estão Zawiya, a 50 quilômetros a oeste de Trípoli, e Zlitan, a 160 quilômetros a leste. (AFP, Reuters, AP e BBC)
Brasil encara o desafio do envelhecimento: A terceira idade bate à porta
Segundo o relatório Envelhecendo em um Brasil Mais Velho, do Banco Mundial, a população idosa do país irá mais do que triplicar em quatro décadas: de menos de 20 milhões, em 2010, para cerca de 65 milhões, em 2050.
Uma nação é considerada envelhecida quando mais de 14% da população tem acima de 60 anos, aponta o médico gerontologista Alexandre Kalache, que foi diretor do programa de envelhecimento global da Organização Mundial da Saúde. Ele calcula que o Brasil deve atingir esse índice em quatro ou cinco anos – a taxa atual é de 11%.
Segundo Kalache, avanços foram feitos com a criação do Sistema Único de Saúde, o sistema de pensões sociais a pessoas idosas e o Estatuto do Idoso. No entanto, aponta, ainda é preciso fazer uma ampla reforma no sistema previdenciário, criar um serviço de proteção social e incluir os idosos na sociedade e valorizá-los. “O Brasil está envelhecendo muito rapidamente, mas ainda com problemas sociais grandes.”
Razão de dependência
Uma mudança importante deve ocorrer já na próxima década. A partir de 2025, a razão de dependência da população considerada inativa (crianças e idosos) deve crescer, a cada ano, sobre a população potencialmente ativa. O motivo é o evelhecimento da população.
Para o doutor em Demografia José Eustáquio Diniz Alves, professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE, o país deveria aproveitar o período atual para gerar empregos e investir em saúde, educação de qualidade, habitação e infraestrutura, além de fazer reformas na Previdência.
“Na situação atual, você tem maior proporção de pessoas em idade de trabalhar. Essa é uma ótima situação demográfica porque tem muita gente trabalhando e pouca gente dependente, como idosos e crianças”, explica. “É preciso aproveitar bem esse bônus demográfico. Nesse sentido, o Brasil melhorou na última década, mas ainda não está fazendo 100%.”
Asilos
A doutora em Saúde Pública Solange Kanso, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, destaca que o número de asilos é insuficiente e que menos de 1% da população idosa reside neles. Para ela, o país ainda não sabe cuidar da população idosa.
A coordenadora da Saúde do Idoso do Ministério da Saúde, Luiza Machado, explica que o processo de envelhecimento é recente e que o país precisa se preparar. Ela revela que a pasta tem uma política voltada aos idosos e que há uma interlocução entre os ministérios para haver uma macropolítica no setor. “Se todos se unirem em prol do melhor envelhecimento, com certeza seremos exemplos para muitos países.” (GP)
Abaixo, a animação mostra a mudança na pirâmide etária brasileira: nos próximos anos, o Brasil deixará de ser um país jovem e se tornará um país envelhecido.
Planos de saúde não podem exigir nova carência de quem alterar contrato
As operadoras não podem recontar ou impor novos prazos de carência para cliente que muda de categoria de plano de saúde dentro da mesma operadora. A regra já vigora, mas a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) publicou uma súmula para reforçar a norma.
O usuário que muda de plano, mas não muda de empresa (como sair do plano individual para entrar em um empresarial), não é obrigado a cumprir novamente prazos de carência pelos serviços que já tinha acesso na cobertura original. Nesses casos, a carência é considerada cumprida pela ANS.
Apenas no caso de coberturas adicionais, não previstas no plano anterior, como novas modalidades de atendimento, ampliação da lista de profissionais e hospitais credenciados e melhoria do padrão de acomodação (de enfermaria para quarto individual, por exemplo), as operadoras podem fixar nova carência, limitada a seis meses, conforme determina a legislação do setor. O período de carência deve ser comunicado com antecedência ao cliente.
Para o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), a súmula da ANS ajuda a sanar as dúvidas dos usuários para evitar a recontagem de carência. Para reclamações contra planos de saúde, o usuário deve ligar para o Disque ANS 0800 701 9656, de segunda a sexta-feira, das 8h às 20h ou procurar um dos 12 núcleos da agência reguladora. (AB)
Empresas usam brechas do Mercosul para não pagar imposto no Brasil
Ao se estabelecer na Argentina, no Uruguai ou no Paraguai, empresas brasileiras e multinacionais obtêm benefícios como importar insumos sem pagar tarifa de importação e isenção de Imposto de Renda. Além disso, aproveitam a guerra fiscal no Brasil e trazem o produto por portos que cobram menos ICMS.
Como os países do Mercosul integram um mercado comum, os produtos circulam sem pagar impostos. Também há reclamações contra Chile, Bolívia e México, nações com as quais o Brasil mantém acordos que permitem a movimentação de mercadorias sem taxas aduaneiras.
O Estado apurou que o esquema se repete nos setores químico, automotivo, têxtil, siderúrgico e máquinas. São máquinas da Argentina, carros do Uruguai, lençóis do Paraguai, chapas de aço do México. Um dos casos mais delicados em investigação pela Receita Federal é a importação de veículos montados no Uruguai pela chinesa Lifan.
O governo está investigando e punindo fraudes na origem do produto quando ocorre "maquiagem" - o valor agregado dentro do Mercosul é menor que o exigido. No entanto, se as empresas utilizam brechas do bloco, o Brasil fica de mãos atadas.
Brechas. Três brechas técnicas no Mercosul são as mais usadas: regras de origem, drawback e ex-tarifários. As regras de origem determinam se um produto pode ser considerado fabricado no Mercosul. Criadas em 1994, as regras variam conforme a mercadoria. Em geral, preveem um porcentual de valor agregado e/ou mudança na nomenclatura.
Segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), tecidos da China, Paquistão e Índia recebem uma costura no Paraguai e se tornam lençóis, entrando no Brasil sem tarifa de importação. Na confecção, a regra de origem é "frouxa" e diz que basta o produto mudar de nome para ser "made in Mercosul".
De janeiro a julho, o País importou 250 toneladas de lençóis paraguaios, 63% mais que nos primeiros sete meses de 2010. Em lençóis de fios sintéticos (especialidade asiática), o volume saiu de zero para 120 toneladas. "Está na hora de uma profunda revisão nas regras de origem do Mercosul", diz Aguinaldo Diniz Filho, presidente da Abit.
A segunda brecha é o drawback, que permite importar insumos sem tarifa desde que o produto final seja exportado. No Mercosul, o benefício vale mesmo que o destino seja outro país do bloco. Na União Europeia, só vale se o destino for extrazona.
Segundo uma empresa do setor químico, resinas termoplásticas estão sendo importadas sem pagar tarifa em regime de drawback no Uruguai e Paraguai. As resinas são processadas nesses países por empresas que gozam de isenção de IR e os produtos chegam ao Brasil por portos com incentivos fiscais.
A terceira brecha é falta de harmonização nas exceções à Tarifa Externa Comum (TEC). A Argentina possui mais de 600 concessões para importar insumos sem tarifa. É o caso do aço inox, que os fabricantes de máquinas trazem da Europa. "As máquinas pesadas argentinas, como reatores, já tomam o lugar das brasileiras ", diz Nelson Deoduque, diretor da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq). (AE)
Agostinho da Silva: "Ser companheiro vale mais do que ser chefe"
Agostinho da Silva (1906/1996) Filósofo/Poeta/Ensaísta
Entrevista: Darci Frigo, um homem do Velho Oeste
Ele nasceu nas terras do Contestado. Um dia, se encantou com São Francisco. Em outro, assumiu-se como camponês, formou-se em Direito e escreveu seu nome nos movimentos de luta pela reforma agrária
A história de Darci começa numa família de pequenos camponeses do interior de Santa Catarina, passa pelo claustro de um convento e pela turbulenta Teologia da Libertação. Por fim, bate na porta do Centro de Direitos Humanos e na Comissão da Pastoral da Terra, a CPT, organizações onde o militante ganhou estatura e fama.
Em 2001, para tranquilidade da cunhada, a assessoria jurídica dada por Frigo aos pequenos trabalhadores rurais lhe rendeu o Prêmio Robert F. Kennedy, em Washington. O catarinense foi o único brasileiro até hoje a ganhar a homenagem.
Ele hoje vive com a mulher e os dois filhos em um minifúndio com um quintal de 200 m² no bairro Órleans, em Curitiba. A terra – assunto de seu expediente de segunda a sexta-feira –, diz, lhe mantém ocupado também nos fins de semana. Confira edição da entrevista feita num dos prédios antigos da Boca Maldita, onde funciona a Terra de Direitos.
Uma curiosidade: o militante Darci Frigo lida com a enxada?
A maioria dos meus vizinhos colocou cimento em tudo. Mas eu cultivo uma horta no quintal da minha casa e mantenho plantas e árvores. Estou esperando a segunda florada do ipê roxo. Tenho pés de romã, de limão e flores de que gosto muito de cuidar.
As origens rurais ainda calam...
Sim. Sou nascido em Capinzal, hoje município de Ouro, no Meio Oeste de Santa Catarina, à margem direita do Rio do Peixe. É uma região agrícola e colonial, numa área montanhosa. Ali ocorreu a Guerra do Contestado. Meus pais moram lá até hoje. O casamento deles é um dos primeiros entre italianos e alemães na região . Vivi em Capinzal até meus 12 anos.
Antes do advogado dos direitos humanos veio o seminarista Darci. Por que o convento?
Para a família era importantíssimo ter um filho religioso. Além do mais, naquela época a única autoridade que chegava à cidade era o padre. Fui para a ordem dos capuchinhos em 1975. Para fazer os estudos iniciais cursei numa classe multisseriada, daquelas com quatro turmas ao mesmo tempo e uma professora para todos os anos. No convento, além da formação, pude praticar esportes. Sou apaixonado por futebol.
Por qual time torce?
Pelo Atlético [risos], desde que vim para o Paraná, em 1983.
A vida religiosa o marcou muito?
A fase mais interessante da minha vida no seminário foi quando conheci a Teologia da Libertação, já no início dos anos 1980. Essa experiência permitiu que eu me iniciasse na militância. Até então eu não tinha acesso ao debate político. A gente tinha pouco contato com o mundo externo. Eu me sentia limitado no trabalho social. Tinha de me submeter, mas me sentia tolhido e resolvi sair. No ano de 1984, em Ponta Grossa, soube do funcionamento de um Centro de Direitos Humanos na cidade. Foi minha primeira grande oportunidade pastoral.
Lembra de alguma das primeiras lutas em especial?
Em 1986, soube no Centro de Direitos Humanos que havia a possibilidade de despejo de famílias da fazenda de Cavernoso, na região de Cantagalo. Seria um dos primeiros despejos dos agricultores ligados ao MST, que ainda estava se formando. Por causa desse episódio, me envolvi na luta pela reforma agrária. Naquele momento, igualmente, redescobri minha origem camponesa, de onde vim, e me engajei na Comissão da Pastoral da Terra, a CPT...
Caminho sem volta...
Desde que reencontrei minha identidade camponesa, nem passa pela minha cabeça deixar de fazer esse trabalho. Além do mais, logo aconteceu um episódio que marcou minha vida. Algumas mães foram procurar o Centro de Direitos Humanos porque os filhos delas tinham sido levados para fazer roçada em uma fazenda entre Cerro Azul e Bocaiuva do Sul. Descobrimos trabalho escravo lá...
Esse episódio marcou uma batalha judicial...
O Centro de Assessoria, Pesquisa e Planejamento fazia o projeto de reflorestamento e contratava garotos em Ponta Grossa para o plantio de pinus. Os meninos passavam frio e não tinham cama para dormir. Os capatazes estavam sempre armados. Era uma jornada extensa combinada com a escravidão, pois a turma era obrigada a consumir tudo na fazenda, desde equipamentos até comida, naquele esquema de ficar devendo e nunca mais conseguir sair. Mas um deles conseguiu. E foi ao Centro de Direitos Humanos...
E você acabou processado...
Fizemos a denúncia. O problema foi na hora de apurar. A polícia disse não ter achado vestígio. Mas o que não encontrou foi o toco onde ficaram amarradas as correntes. O trabalho escravo moderno tem outros contornos. Eu sofri um processo, que se estendeu por longos anos.
Você chegou a ser condenado a um ano de prisão...
Fui condenado, mas depois o Tribunal diminuiu a pena, estabelecendo o fim do processo. O grave é saber que ninguém jamais apurou a responsabilidade do que aconteceu àqueles jovens.
Como nasce o Frigo da CPT?
Comecei organizando pequenos agricultores na região metropolitana de Curitiba, para que conhecessem seus direitos. Mas a experiência mais interessante se deu em âmbito nacional, ao me envolver no combate aos latifúndios e na defesa dos camponeses. Digo que foi quando eu conheci de fato a desigualdade do Brasil.
Essa história o levou à Praça Nossa Senhora de Salete, em Curitiba. Vamos falar disso?
Foi no final do ano de 1999 para 2000 [quando da ocupação do MST na Praça Nossa Senhora da Salete]. Fui de madrugada ajudar os agricultores que estavam sendo despejados. Fui chamado como advogado porque algumas pessoas estavam sendo presas. A polícia não permitiu que a gente entrasse e acabei sendo detido. No dia em que saí da prisão, uma cunhada, que acompanhava minha militância, disse: “Eu sabia que um dia iria tirar você da cadeia”. [risos]
Qual foi a acusação?
Na delegacia disseram que eu tinha quebrado a perna de um policial. E nos jornais saiu que eu tinha batido na perna do PM com um pedaço de pau. A situação ficou muito grave. Recebi ameaças. Se eu saísse de casa: quebrariam minhas pernas, nunca mais andaria. Durante 45 dias recebi proteção da Polícia Federal. Tempos depois, localizei fotos que provavam que eu não tinha empurrado ninguém. O sujeito que se dizia agredido sequer foi depor e o caso foi arquivado.
O que acha da atuação do MST nos últimos 30 anos?
Acho que o movimento trouxe para o primeiro plano o que sempre ficou invisível. Nestes últimos dias, tivemos o primeiro júri de um pistoleiro pelo assassinato de um trabalhador rural. Quantos trabalhadores, quantos camponeses e quantos posseiros foram assassinados no Paraná? Quem tem ideia? Ao longo dos anos acompanhei mais de três dezenas de assassinatos no estado. Só posso achar que a luta social do MST, do sindicato e da CPT foi fundamental para a democracia brasileira.
O que falta para resolver a questão agrária no Brasil?
Estamos numa encruzilhada. O fato de o Brasil ter nas commodities agrícolas a solução aparente para os seus problemas de balança comercial gera uma propaganda, o que blinda o processo de concentração de terra e de renda no campo. Esse modelo perpetua as desigualdades, mas seu discurso convence até a presidente. Bem, o horizonte da reforma agrária está nos movimentos sociais. Depende deles. É o que penso.
Um partido ou uma ONG? Você fez a segunda opção...
A possibilidade de uma candidatura bateu à minha porta várias vezes. Mas entendi que meu trabalho político devia de ser feito no âmbito da sociedade civil. Nos anos 1990, quando recrudesce a criminalização do MST, começamos a organizar uma rede nacional de advogados populares. É uma iniciativa importante. Precisávamos de uma organização de direitos humanos que desse suporte aos trabalhadores e militantes do campo.
Daí nasceu a Terra de Direitos. “A luta continua”?
Quando comecei na militância, achava que dos anos 1980 para 1990 a questão agrária se resolveria. Mas não. O problema permanece. A terra continua concentrada. Há problemas de trabalho escravo no campo e extrema pobreza. A estrutura de distribuição da terra é desigual e vigora a cultura patrimonialista. Os trabalhadores rurais não são vistos como sujeitos de direito. São tratados como pessoas de segunda categoria. (GP)